Poluição marinha
O planeta que habitamos,
tal como as fotografias tiradas por satélite ilustram,
mais do que "TERRA" dever-se-ia chamar "MAR"!
É que 71% da sua superfície é recoberta
por água, 97.2% da mesma correspondendo à
imensidão dos oceanos. O ambiente marinho constitui,
pois, uma parte essencial da biosfera. A sua produtividade
primária equivale mesmo à do crescimento anual
das plantas terrestres; é um elemento crucial como
elo nos grandes ciclos do Carbono, do Azoto, do Oxigênio
e do Hidrogênio - elementos essenciais à vida.
Além disso a constante interação entre
a atmosfera e os oceanos influencia e determina os complexos
comportamentos dos fluxos climáticos globais, que
diretamente se relacionam com o ciclo hidrológico.
Deste modo as massas oceânicas exercem uma influência
estabilizadora no clima, que tanto afeta a existência
da comunidade humana. Pode considerar-se que, globalmente,
os mares ainda se encontram em boas condições
ambientais. Há, contudo, indícios - sobretudo
nas faixas costeiras - de graves disfunções
ambientais, com situações de ultrapassagem
das capacidades de carga e de sobre utilização
excessiva dos recursos. Por demasiado tempo os mares foram
(e por alguns ainda o são) considerados como fonte
inesgotável de recursos - alimentares, minerais ou
energéticos -, com capacidade infinita para absorver
e purificar os resíduos da civilização
humana. Por outras palavras, a capacidade de diluição
dos oceanos tem sido tida como a solução para
a poluição gerada pelo Homem. Formas de Poluição
Agora, mais do que nunca, é manifesto que nenhum
destes pressupostos é verdadeiro: a capacidade dos
oceanos, apesar da sua vastidão, não é
infinita para absorver os resíduos, e alguns dos
resíduos produzidos, mesmo em quantidades muito pequenas,
podem ter efeitos significativos nas comunidades e espécies
a longas distâncias dos próprios pontos de
descarga.
As praias poluídas, focos de inúmeras doenças;
os estuários que deixam de produzir espécies
tradicionalmente utilizadas na alimentação;
os acidentes ligados ao transporte marítimo de hidrocarbonetos
e de outras substâncias perigosas que conspurcam -
por vezes irremediavelmente - o litoral, são alguns
dos muitos exemplos perceptíveis pelo cidadão
comum e que urgem na tomada de medidas. A população
humana, ao nível atual do desenvolvimento tecnológico,
tem nas suas mãos a possibilidade de provocar a destruição
missiva dos mares, à semelhança do que já
tem feito em terra; mas detém também os conhecimentos
que lhe permitem minimizar os impactes negativos dos requisitos
do seu desenvolvimento. Efluentes de origem doméstica
São a principal origem de microrganismos patogênicos
e de matérias em suspensão. Os primeiros originam
a poluição das águas das praias da
fauna piscícola e dos viveiros de moluscos, causando
doenças como hepatites, otites e conjuntivites. Os
moluscos, em particular os bivalves, podem mesmo desaparecer
ou tornar-se nocivos à saúde humana quando
ingeridos, pois têm grande capacidade de assimilação
de microorganismos patogênicos. A dificuldade de detectar
quais os que estão atingidos pela poluição
exige que todos os moluscos sejam depurados antes de consumidos.
Em determinadas situações (em geral com o
aparecimento das chamadas "marés vermelhas"
devidas ao crescimento acelerado do número de dinoflagelados)
podem mesmo tornar-se tóxicos para o Homem. O impacte
dos efluentes de origem doméstica é maior
junto ao ponto de descarga, diluindo-se a sua concentração
com a dispersão no meio.
Atividade agrícola intensiva A utilização
cada vez maior de adubos pode originar um excesso de nutrientes(nitratos
e fosfatos) na água, que favorecem o crescimento
descontrolado de algas e plantas aquáticas, podendo
mesmo chegar a asfixiar a vida marinha nalgumas zonas mais
sensíveis, como os estuários, as rias e as
lagoas (mecanismo de "eutrofização").
A utilização intensiva de pesticidas na atividade
agrícola e de retardadores de incêndios nas
operações de combate podem também ser
fatores de degradação do ambiente. As chuvas,
lixiviando os solos, arrastam os poluentes para os cursos
de água que vão desaguar ao mar. Este tipo
de poluição, apesar de ser difusa e sendo
impossível a detecção de fontes específicas,
assume grande importância, sobretudo em zonas de agricultura
intensiva.
As grandes concentrações pecuárias
colocam também diversos problemas, semelhantes aos
dos efluentes urbanos. Efluentes de origem industrial A
indústria é responsável pela descarga
de elevadas cargas de poluentes no meio marinho, em grande
parte porque a maioria delas se encontra na faixa litoral.
Elevadas concentrações de metais pesados,
de compostos orgânico sintéticos, etc., são
descarregadas, direta ou indiretamente no mar, muitas das
vezes sem qualquer tratamento prévio. A indústria
transformadora é a principal consumidora de água
e a maior responsável pelas descargas poluentes.
Cerca de 77% do consumo de água total é feito
pelas indústrias têxtil, química, alimentar
e do papel. Para além das descargas líquidas
diretas, há ainda que considerar as águas
de lixiviação originadas nos muitos locais
de deposição de resíduos sólidos
sem controlo. As zonas mais atingidas pela poluição
por efluentes industriais são: toda a Costa Norte,
com as descargas da indústria têxtil e da cintura
industrial do Porto; a ria de Aveiro, afetada pela grande
concentração industrial dessa zona; e os estuários
do Tejo e do Sado onde se localizam as grandes concentrações
industriais do país.
Tráfego marítimo Habitualmente o tráfego
marítimo origina poluição, na maior
parte dos casos com hidrocarbonetos, provocada tanto pelas
descargas voluntárias da limpeza dos tanques dos
navios, como pelos acidentes, muitas vezes dando origem
às chamadas "marés negras". Na costa
portuguesa Leixões, Sines e as ilhas dos Açores
e da Madeira são os locais mais vulneráveis,
por se encontrarem em zonas de alto risco pela proximidade
de áreas industriais e dos corredores de tráfego
marítimo, e têm sido vítimas freqüentes
deste tipo de poluição. A presença
de hidrocarbonetos no meio marinho tem origem em diversas
fontes. Os acidentes com petroleiros são as mais
evidentes e conhecidas. Estes derrames constituem, no entanto,
uma pequena percentagem, já que não ultrapassam
os 12% do total de petróleo que contamina o ambiente
marinho. Estima-se que mais de 4 milhões de toneladas
são lançados no mar todos os anos, cujas origens
se podem sistematizar da seguinte forma: exploração
de poços de petróleo no mar; deslastragem
e limpeza dos tanques dos petroleiros; acidentes com petroleiros;
refinarias e instalações petroquímicas
costeiras; resíduos urbanos; arrastamento por águas
das chuvas em áreas urbanas; arrastamento pelas águas
dos rios; barcos recreativos e/ou de pesca; infiltrações
naturais; precipitação atmosférica.
Muitos dos efeitos deste tipo de poluição
são imediatamente visíveis: a morte de aves
marinhas e peixes, o sabor a petróleo de muitos peixes
e bivalves, as areias e rochas sujas que tornam as praias
impraticáveis, são alguns deles. Mas, sendo
os mais visíveis, nem sempre são os mais graves,
pois os efeitos sub-letais nas espécies marinhas
têm consequências imprevisíveis a médio
prazo. Têm sido detectadas mudanças nas características,
nas funções celulares e fisiológicas
e na estrutura ecológica das comunidades, originando
alterações no processo alimentar e de reprodução,
levando ao seu desaparecimento em certas zonas. E as frações
carcinogénicas dos hidrocarbonetos acumuladas nos
tecidos de algumas espécies podem passar para o homem
através da alimentação.
Medidas para que os oceanos continuem a ser fonte de recursos
agora e no futuro é necessário aplicar princípios
que respeitem o equilíbrio dos ecossistemas. Salientam-se:
o princípio do utilizador-pagador, o do poluidor-pagador,
o da utilização das melhores tecnologias disponíveis,
o da reciclagem e reutilização, o da preferência
de medidas preventivas sobre as curativas, ... enfim, um
conjunto de instrumentos que são indicados ao nível
das várias instâncias internacionais com responsabilidade
na gestão do ambiente, e que só se poderão
aplicar no âmbito duma integração da
política de ambiente nas restantes políticas
sectoriais. Dois grandes grupos de orientações
são essencialmente necessários: reforçar
a observação do meio marinho, e prevenir e
combater as poluições, sendo este último
ponto centrado sobretudo na poluição de origem
telúrica (com origem em terra e nas atividades humanas).
A prevenção começa necessariamente
por um bom conhecimento e uma vigilância permanente
do meio marinho. Para isso é preciso manter uma vigilância
geral sobre a qualidade da água, sedimentos e seres
vivos, tendo especialmente em atenção a qualidade
das águas das praias, dos portos e das zonas mais
sensíveis do ponto de vista ecológico. A redução
da poluição inclui o tratamento dos vários
tipos de efluentes e o combate aos acidentes de poluição.
Redução da poluição O desenvolvimento
da recolha e do tratamento das águas residuais urbanas
é uma das principais medidas para diminuir a poluição
lançada nas águas do mar. As águas
residuais urbanas são os principais responsáveis
da contaminação das águas das praias.
Em Portugal os últimos dados disponíveis indicam
que apenas cerca de 20% da população é
servida com tratamento de águas residuais adequado.
A Agenda 21, assinada na Conferência das Nações
Unidas sobre Desenvolvimento e Ambiente, em Junho de 1992,
compromete os países industrializados a tratar apropriadamente
50% das suas águas residuais e, tanto a nível
da Europa comunitária como do nosso país,
existe legislação nesse sentido. Obviamente
que os efluentes industriais deverão também
ser sujeitos a tratamento adequado antes de serem lançados
no meio, existindo já legislação nacional
aplicável às mesmas.
Tanto ao nível dos efluentes domésticos como
dos industriais o cumprimento dos valores de emissão
e dos objetivos de qualidade para as diferentes utilizações
estabelecidas para o meio permitirá, no âmbito
de uma responsabilidade partilhada, atingir uma melhor qualidade
do ambiente em geral e do meio marinho e costeiro em particular.
Redução dos acidentes de navegação
A vigilância e a prevenção da poluição
devida ao transporte marítimo de hidrocarbonetos
e de outras substâncias perigosas passa pelo cumprimento
das múltiplas convenções internacionais
e regionais, a maior parte delas ratificadas por Portugal.
De entre estas é de salientar a Convenção
para a Proteção do Meio Marinho no Atlântico
Nordeste (OSPAR).
O nosso país foi o principal impulsionador da assinatura
do que ficou a ser chamado por Acordo de Lisboa, que reúne
com iguais objetivos de combate à poluição
marinha no Atlântico Nordeste Portugal, Espanha, França,
Marrocos e a União Européia. No quadro do
Acordo de Lisboa foi criado o CILPAN - Centro Internacional
de Luta Contra a Poluição no Atlântico
Nordeste, com o objetivo de contribuir para melhorar a preparação
para a luta contra as marés negras através
de divulgação de informação
entre os centros nacionais operacionais das partes contratantes,
criação de bases de dados, preparação
de planos de urgência e cursos de formação.
A redução dos acidentes passa também
pelas ações estabelecidas no chamado "Plano
Mar Limpo" recentemente aprovado, no qual partilham
responsabilidades diversos ministérios e organismos
de nível regional e local.
A estratégia de atuação em caso de
acidente deve também estar bem definida, com a descrição
detalhada de "quem é quem" em planos de
emergência aos vários níveis de intervenção.
Estes planos são essenciais e devem ter em consideração
as diversas sensibilidades ecológicas e econômicas
da orla costeira, a fim de poderem ser estabelecidas prioridades
de intervenção e de poder ser selecionada
a melhor técnica de combate num mais rápido
espaço de tempo e com menor impacto ambiental. Para
fazer face à necessidade de limpeza dos tanques transportadores
de águas de lastro, devem os portos estar equipados
com estações adequadas a essa mesma operação.
A própria fiscalização do cumprimento
das diversas normas internacionais de segurança do
transporte marítimo é um meio essencial para
evitar a poluição com esta origem. O mesmo
acontece com a vigilância de toda a vasta Zona Econômica
Exclusiva portuguesa (474.600 milhas marítimas quadradas).
Medidas a nível das autarquias As autarquias têm
um papel particularmente importante no controlo da poluição
marinha, salientando-se: Licenciamento de urbanizações,
equipamentos turísticos, pecuários e instalações
industriais, exigindo o tratamento dos seus efluentes; Desenvolvimento
de infra-estruturas de saneamento básico com a instalação
de estações de tratamento de águas
residuais e eventual melhoria das condições
dos aterros sanitários camarários, com particular
atenção para as águas de lixiviação;
Vigilância do destino dado aos resíduos sólidos
pelas várias indústrias; Equipamento de praias,
com sanitários e caixotes do lixo e preparação
das zonas de banho (por remoção de resíduos
e limpeza de areias); Promoção da participação
das populações na resolução
dos problemas de defesa do litoral, lançando campanhas
regulares de limpeza e de vigilância das praias, promovendo
ações de informação e educação
ambiental. Exemplo deste tipo de campanhas é a conhecida
Campanha da Bandeira Azul da Europa. A obtenção
deste galardão europeu sendo um incentivo positivo,
procura influenciar a mudança de atitude tanto dos
decisores como do público em geral sobre os problemas
de gestão do meio marinho e costeiro abrangendo diretamente
praias, marinas e detentores de barcos de recreio. |