Entrevista
com Suzana Kahn, secretária de Mudanças Climáticas
e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente
"Debate
não se encerrará na Dinamarca"
A secretária de Mudanças Climáticas
e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente,
Suzana Kahn, fala sobre as expectativas em relação
às negociações em Copenhague. Ela,
que também é cientista da área de transportes
e prêmio Nobel 2007 pelo Painel Intergovernamental
sobre Mudanças do Clima (IPCC), destaca as ações
previstas no Plano Nacional de Mudanças Climáticas
O Brasil vai a Copenhague com compromissos voluntários
ousados. É uma situação favorável
para defender com mais ênfase um acordo climático
forte e cobrar aportes significativos de recursos e de tecnologia.
Trata-se da consolidação do protagonismo brasileiro?
Quando os países em vias de desenvolvimento assumem
compromissos numéricos com a mudança das suas
trajetórias de emissão, estão demonstrando
que de fato querem crescer em um novo modelo, rumo a uma
economia verde. No entanto, para que possamos sair da trajetória
business as usual [crescimento tendencial das emissões],
e seguir um modelo inovador, criativo, com tecnologias limpas,
é preciso investimento.
Não
se trata de doação. É cooperação
internacional. É respeito ao princípio das
responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Quando
as nações ricas ajudam os países em
desenvolvimento a mudar seu padrão de crescimento
estão ajudando a si mesmas. A atmosfera não
tem nacionalidade e o mundo é um só.
Infelizmente
o eixo sobre financiamento nas negociações
do clima ainda está muito aquém do necessário.
A arquitetura financeira é um ponto nevrálgico
e com certeza a delegação brasileira vai discutir
firmemente esse ponto.
Com
a redução expressiva do desmatamento, matriz
energética limpa e compromissos numéricos
com a redução de emissões futuras,
temos um excelente portfólio de ações
que nos colocam em uma forte posição de negociação,
reforçando nosso protagonismo.
Quais
são suas expectativas para a COP 15?
São
otimistas, mas realistas. O debate não se encerrará
na Dinamarca. Esse é na verdade ao ponto de partida,
pois na sequência temos a fase de detalhamento e implementação
desse redirecionamento da economia mundial.
No
plano doméstico, quais os principais objetivos já
expressos no Plano Nacional sobre Mudanças do Clima?
Podemos
citar metas de eficiência energética, as medidas
nessa área podem gerar uma economia de 106 mil GWh
em 2030, o que representa a não emissão de
cerca de 30 milhões de toneladas de CO2.
O
governo também quer manter elevada a participação
de energia renovável na matriz elétrica, com
o aumento da oferta de energia elétrica de co-geração,
principalmente do bagaço da cana-de-açúcar,
para 11,4% da oferta total de eletricidade no País
em 2030.
A
hidroeletricidade deverá agregar ao sistema 34 GW
e o estímulo à utilização de
sistemas de aquecimento solar de água, que pode gerar
a redução do consumo de energia em 2015 de
2,2 mil GWh/ano.
No
que se refere à ampliação de termelétricas,
o Ministério do Meio Ambiente está trabalhando
para que sejam adotadas pelos empreendedores medidas que
visem à mitigação das emissões
de dióxido de carbono (CO2) oriundas da operação
de usinas termelétricas movidas a óleo combustível
e a carvão mineral. O empreendedor deverá
mitigar parte das emissões geradas ao longo da vida
útil do empreendimento, por meio de atividades de
recuperação florestal, utilizando-se tanto
espécies exóticas quanto nativas.
Já
para a siderurgia, queremos adotar o aço verde e
estimular a utilização de carvão oriundo
de reflorestamento, melhoria da eficiência energética
e utilização de selos verdes.
As
metas apontadas no Plano terão alguma interferência
no crescimento do País?
O
Plano não deve interferir no crescimento do País
justamente porque os mecanismos de redução
dos gases do efeito estufa estão baseados em eficiência
energética, com a adoção dos biocombustíveis
e fontes alternativas, como a eólica. Os investidores
precisam sentir segurança.
O
Ministério do Meio Ambiente está incentivando
a participação de estados e município
para a execução do Plano Nacional. Os governos
locais estão engajados nesse processo?
A
participação de estados e municípios
na consolidação do Plano Nacional é
fundamental, pois ele está entrando em uma fase que
vai exigir extrema capilaridade. Nossa abordagem agora é
sobre o que está sendo feito nos estados para que
essas ações de enfrentamento se ajustem ao
PNMC. Melhorar a comunicação de informações
entre as esferas de poder se tornou um aspecto indispensável
para a efetivação das metas propostas pelo
o Brasil
"Quando
as nações ricas ajudam os países em
desenvolvimento a mudar seu padrão de crescimento
estão ajudando a si mesmas"
Como
exemplos de ações dos estados para a redução
de emissões e cumprimento das metas do PNMC, podemos
listar as concessões de licenciamento ambientais
que devem prever critérios relacionado à emissão
de gases de efeito estufa, a criação de fóruns
estaduais de mudanças climáticas, que já
vêm elaborando seus inventários de emissão,
considerados um importante instrumento de política
ambiental.
Em
qual estágio está o monitoramento das ações
do Plano Nacional? Já existe alguma previsão
de quando esses dados estarão disponíveis?
O
monitoramento do plano se dá através das estimativas
de emissão vis a vis o cenário tendencial
de emissões, que também será divulgado
na COP15. Na medida em que as emissões estão
abaixo do esperado no cenário tendecial, fica comprovado
o sucesso das ações de mitigação
descritas no Plano. O que muda com a aprovação
pelo Congresso do Fundo Clima e da Política Nacional
para as ações que estão previstas no
Plano?
O
Fundo Clima é essencial para a implementação
das ações elencadas no Plano, sobretudo as
relativas a medidas de adaptação. A ideia
é que o Plano seja uma forma de orientar o uso do
Fundo.
Quais
são os principais resultados dos pactos setoriais
que estão sendo negociados como ações
de combate ao desmatamento?
Os
pactos setoriais têm enorme importância na medida
em que promovem a participação de outros agentes
da sociedade e não apenas governo. De forma a podermos
atingir nossos objetivos é fundamental o engajamento
de toda a sociedade. No momento em que o consumidor deixa
de comprar carne cuja procedência é suspeita
os supermercados reavaliam os seus fornecedores e em uma
reação em cadeia, só permanecem os
produtores que possuem boas práticas. Da mesma maneira,
a indústria automobilística ao tornar público
o nível de emissão de seus veículos
faz com que os consumidores tenham a possibilidade de optar
pelos que causam menor impacto ambiental, estimulando a
competição saudável para a produção
de veículos mais eficientes e menos poluidores.
Do MMA