A
16ª Conferência do Clima terminou em
Cancun com resultados pífios, muito aquém
do necessário para que o mundo possa controlar
o aquecimento global.
O
clima de férias na praia não contribuiu
para que mais de 190 países reunidos em Cancun,
na COP16, se recuperassem do fracasso da conferência
anterior e avançassem na negociação
de um acordo global de redução das
emissões de gases de efeito estufa.
Enquanto
Japão, Rússia e outros defendiam a
proposta de “cada um por si e fora Protocolo
de Kyoto”, a comunidade internacional ao menos
reconheceu a necessidade de seguir negociando um
acordo comum. Foi em torno da manutenção
do processo dentro da Convenção do
Clima que se concentraram os esforços.
Entretanto,
após 12 dias de negociação,
não se sabe o mais importante e mais urgente:
como e qual será a natureza do acordo que
deverá se seguir a Kyoto, a partir de 2013.
O trabalho dos negociadores se perde no mar de Cancun.
“A COP16 pode ter salvo o processo mas não
salvou o clima”, afirma o diretor de políticas
climáticas do Greenpeace Internacional, Wendel
Trio.
Não
se sabe como serão distribuídos os
recursos financeiros prometidos na COP15, em Copenhague,
para que os países em desenvolvimento se
adaptem às mudanças climáticas.
Não se sabe como fica o regime da redução
das emissões pelas florestas dentro de um
plano de controle do aquecimento global.
No
acordo sobre como devem se portar os países
emergentes que hoje emitem grandes volumes de gases-estufa,
como Brasil, Índia e China, sobraram palavras
desprovidas de intenção. As metas
de redução de emissões desapareceram
e permaneceu apenas uma indicação
de que esses países levam em consideração
as evidências do IPCC (Painel Intergovernamental
de Mudanças Climáticas), que coloca
um aquecimento de 2ºC como perigoso. Espremendo,
nada sai.
O
fato de o Protocolo de Kyoto não ter morrido,
a despeito do esforço de alguns países
para fazê-lo, é uma vitória
vazia enquanto números audaciosos, que respondam
ao desafio, não forem colocados na mesa.
Nessa conferência, quando o que está
em jogo é o futuro do mundo, prevaleceram
a falta de liderança e vontade política
necessárias para que os países dêem
um passo além de Kyoto e equacionem um acordo
global. Sem ele, cada nação continuará
a olhar para seu próprio umbigo, emitindo
gases-estufa sem controle, a seu bel prazer.
Fica
claro que o destino do planeta está cada
vez mais nas mãos da sociedade. A ela foi
jogada a responsabilidade de construir um futuro
sem desmatamento, com energias limpas, mais justiça
e com uma economia verde. A bola está conosco.
+
Mais
A
revolução brasileira
O
país do futuro cresce com energia limpa,
empregos verdes e menos emissões de gases
do efeito estufa. É o que mostra a 2ª
edição do relatório "Revolução
Energética", publicado pelo Greenpeace
no Brasil.
Até
2050, mesmo com a economia crescendo em seus níveis
atuais, 93% da eletricidade produzida no Brasil
pode muito bem ter origem em fontes renováveis
como solar, eólica ou biomassa – o
que nos deixaria a praticamente um pulo para tornar
realidade, ainda no século 21, o plano de
o país funcionar com uma matriz elétrica
100% limpa.
Chegar
lá é mais fácil e mais barato
do que se imagina, e é um bom caminho para
garantir a geração de 3 milhões
de empregos, boa parte deles qualificados, com desenvolvimento
e produção de equipamentos de ponta.
Melhor ainda: essa revolução no setor
de energia ajudaria o Brasil a reduzir mais rapidamente,
e sem ameaçar seu desenvolvimento, suas emissões
de gases do efeito estufa.
Esse
horizonte está longe de ser fantasioso, como
comprova a segunda edição do relatório
“Revolução Energética”,
estudo elaborado pelo Greenpeace, em parceria com
especialistas do setor energético, e lançado
hoje na COP16, em Cancun. Alguns destaques são:
Matriz limpa
Em
2050, a matriz pode ser 93% limpa, com ampla gama
de fontes renováveis e investimento em eficiência
energética. O gás natural aparece
como fonte de transição, ou seja,
é possível pensar em um Brasil 100%
renovável dali em diante;
PIB
em alta
A
matriz de renováveis pode crescer sem reduzir
o crescimento do PIB. Ou seja, desenvolvimento não
significa mais poluição;
Economia
A
matriz de renovável pode crescer sem custar
mais caro para o Brasil. Aliás, muito pelo
contrário. Pode-se economizar entre R$ 100
bilhões e R$ 1 trilhão no período
entre 2010 e 2050;
Ar
limpo
Em
2050, o setor de eletricidade pode emitir apenas
23 milhões de toneladas de CO2. Hoje são
26 milhões de toneladas de CO2. Porém,
se os planos do governo de investir em fósseis
forem adiante, o número sobe para 147 milhões
de toneladas de CO2.
Dois futuros, uma escolha
O
relatório traça dois cenários
de geração de energia para os próximos
40 anos, partindo das mesmas projeções
de crescimento da população e do PIB
(Produto Interno Bruto) do país.
O
primeiro cenário, pouco ambicioso, usa os
dados do governo. O segundo, que chamamos de Revolução
Energética, projeta um futuro a partir de
mudanças na forma como a energia é
gerada, distribuída e consumida. Por esse
cenário, pode-se aumentar, até 2050,
em até três vezes a taxa de consumo
de energia e em até 4% o PIB dispensando
o uso de termelétricas a óleo diesel,
a carvão e nucleares.
No
cenário Revolução Energética,
o Brasil chega ao meio do século com metade
(45,6%) da geração de energia vindo
da água, em parte com a aplicação
de pequenas centrais hidrelétricas, com menor
impacto ambiental do que as grandes usinas. Em seguida
aparece a energia eólica (20,38%), biomassa
de cana-de-açúcar e outras culturas
(16,6%), solar (9,26%) e uma parcela de gás
natural para um período de transição
(7,3%).
Os
cálculos são conservadores, pois consideram
apenas 10% do potencial eólico brasileiro
e 1% do solar. "Os estoques de energias renováveis
são de fácil acesso e abundantes o
suficiente para fornecer mais energia do que a quantidade
consumida no Brasil hoje e que virá a ser
consumida no futuro. O potencial é inesgotável",
diz Ricardo Baitelo, coordenador da campanha de
Energia do Greenpeace e coordenador do estudo.
Investimento
inteligente
Além
de bom para o ambiente, investir em renováveis
é ótimo para a economia. Seus preços
ficam gradativamente mais atrativos e a tendência
de queda certamente vai se consolidar nas próximas
décadas. Somados os custos de implantação
de novas usinas termelétricas ou nucleares,
mais caras, e o crescente valor do óleo combustível
no mercado, a economia do cenário Revolução
Energética chega à cifra de centenas
de bilhões de reais.
"No
mercado internacional, a energia eólica e
o mercado de painéis fotovoltaicos desafiaram
a recessão econômica e cresceram em
2009", diz Baitelo. No Brasil, o resultado
do último leilão de energia renovável,
em agosto de 2010, confirmou a tendência internacional:
foram contratadas 70 novas usinas eólicas,
alçando essa fonte ao lugar de segunda energia
mais barata do país.
"Apesar
do avanço no setor de eólicas, o Brasil
tem um sistema de leilão para a ampliação
da participação de energia renovável
que não tem obrigatoriedade por lei, ou regularidade
em sua realização", diz Ricardo
Baitelo. "Para criar efetivamente um mercado
para as renováveis, o Greenpeace propõe
que haja uma política para o setor, com pacotes
de incentivos mais abrangentes."