Ex-ministros
do Meio Ambiente: novo Código Florestal é
perverso
Veja a carta aberta entregue a presidente Dilma Rousseff
24/06/2011
- Foi apresentada na Câmara dos Deputados, um a carta
aberta redigida por dez ex-ministros do Meio Ambiente contrária
ao relatório do novo Código Florestal proposto
pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Na carta eles disseram
que a atualização do Código Florestal
é um retrocesso na legislação ambiental
do país. O documento foi entregue à presidente
Dilma Rousseff e aos presidentes da Câmara, Marco
Maia (PT-RS), e do Senado José Sarney (PMDB-AP).
Um
trecho da carta diz que “É por compreender
a importância do papel na luta por um mundo melhor
para todos e por carregar essa responsabilidade histórica
que nos sentimos na obrigação de dirigirmos
à Vossa Excelência e ao Congresso Nacional
o nosso pedido de providências. Em conjunto com uma
política nacional de florestas, o código deve
ser atualizado para facilitar e viabilizar os necessários
esforços de restauração e de uso das
florestas, além que de sua conservação.
É necessário apoiar a restauração,
não dispensá-la. O código pode e deve
criar um arcabouço para os incentivos necessários
para tanto”.
Marina
Silva, ex-ministra, destacou que é necessário
adiar a votação do novo código. De
acordo com ela é importante ter mais tempo para discutir
as propostas. “Há um acordo [para votação
do relatório] do qual a sociedade não participou.”
Para Marina o melhor é adiar a votação
do que fazer campanha para a Dilma vetar parte da lei.
Carlos
Minc, ministro do Meio Ambiente no governo Lula, afirmou
que o Brasil não deve ser “o único país
que aprovará uma legislação de fragilização
do sistema”. “O que nos une é o esforço
para impedir que o arcabouço de proteção
dos biomas seja desmantelado, seja por açodamento
ou conveniência. Não queremos que passem a
motosserra no Código Florestal.”
O
líder do PV na Câmara, o deputado Sarney Filho
(MA), que já foi ministro do Meio Ambiente, alegou
que a mudança do Código Florestal é
cruel. “Sem uma pressão clara do governo e
da sociedade civil, vamos ter uma derrota”, disse
ele a respeito da votação.
De
acordo com os ex-ministros que escreveram a carta, o novo
Código é incoerente quando levado em conta
o processo histórico do país. “Não
vemos, portanto, na proposta de mudanças do Código
Florestal aprovada pela Comissão Especial da Câmara
dos Deputados em junho de 2010, nem nas versões posteriormente
circuladas, coerência com nosso processo histórico,
marcado por avanços na busca da consolidação
do desenvolvimento sustentável. Ao contrário,
se aprovada qualquer uma dessas versões, o país
agirá na contramão de nossa história
e em detrimento do nosso capital natural.”
Leia
no boxe abaixo a íntegra da carta dos ex-ministros.
Carta
Aberta à Presidente da República e ao Congresso
Nacional
Os
signatários desta Carta Aberta, ao exercerem as funções
de Ministros de Estado ou de Secretário Especial
do Meio Ambiente, tiveram a oportunidade e a responsabilidade
de promover, no âmbito do Governo Federal, e em prol
das futuras gerações, medidas orientadas para
a proteção do patrimônio ambiental do
Brasil, e com destaque para suas florestas. Embora com recursos
humanos e financeiros limitados, foram obtidos resultados
expressivos graças ao apoio decisivo proporcionado
pela sociedade, de todos os presidentes da Republica que
se sucederam na condução do país e
do Congresso Nacional. Mencione-se como exemplos: a Política
Nacional do Meio Ambiente (1981), o artigo 225 da Constituição
Federal de 1988, a Lei de Gestão de Recursos Hídricos
(97), Lei de Crimes e Infrações contra o Meio
Ambiente (98), o Sistema Nacional de Unidades de Conservação
(2000), a Lei de Informações Ambientais (2003),
a Lei de Gestão de Florestas Públicas (2006),
a Lei da Mata Atlântica (2006), a Lei de Mudanças
Climáticas (2009) e a Lei de Gestão de Resíduos
Sólidos (2010).
Antes
que o mundo despertasse para a importância das florestas,
o Brasil foi pioneiro em estabelecer, por lei, a necessidade
de sua conservação, mais adiante confirmada
no texto da Constituição Federal e sucessivas
regulamentações. Essas providências
asseguraram a proteção e a prática
do uso sustentável do capital natural brasileiro,
a partir do Código Florestal de 1965. Marco fundante
e inspiração nesse particular, o Código
representa desde então a base institucional mais
relevante para a proteção das florestas e
demais formas de vegetação nativa brasileiras,
da biodiversidade a elas associada, dos recursos hídricos
que as protegem e dos serviços ambientais por elas
prestados.
O
processo de construção do aparato legal transcorreu
com transparência e a decisiva participação
da sociedade, em todas as suas instâncias. E nesse
sentido, é importante destacar que o CONAMA - Conselho
Nacional do Meio Ambiente já se constituia em excepcional
fórum de decisão participativa, antecipando
tendências que viriam a caracterizar a administração
pública, no Brasil, e mais tarde em outros países.
Graças a essa trajetória de responsabilidade
ambiental, o Brasil adquiriu legitimidade para se tornar
um dos participantes mais destacados nos foros internacionais
sobre meio ambiente, além de hoje dispor de um patrimônio
essencial para sua inserção competitiva no
século XXI.
Para
honrar e dar continuidade a essa trajetória de progresso,
cabe agora aos líderes políticos desta nação
dar o próximo passo. A fim de que o Código
Florestal possa cumprir sua função de proteger
os recursos naturais, é urgente instituir uma nova
geração de políticas públicas.
A política agrícola pode se beneficiar dos
serviços oferecidos pelas florestas e alcançar
patamares de qualidade, produtividade e competitividade
ainda mais avançados.
Tal
processo, no entanto, deve ser desenvolvido com responsabilidade,
transparência e efetiva participação
de todos os setores da sociedade, a fim de consolidar as
conquistas obtidas. Foram muitos os êxitos e anos
de trabalho de que se orgulham os brasileiros, e portanto
tais progressos não devem estar expostos aos riscos
de eventuais mudança abruptas, sem a necessária
avaliação prévia e o conveniente debate.
Por outro lado, não consideramos recomendável
ou oportuno retirar do CONAMA quaisquer de suas competências
regulatórias no momento em que o país é
regido pelo principio da democracia participativa, consagrado
na nossa Carta Magna.
Não
vemos, portanto, na proposta de mudanças do Código
Florestal aprovada pela Comissão Especial da Câmara
dos Deputados em junho de 2010, nem nas versões posteriormente
circuladas, coerência com nosso processo histórico,
marcado por avanços na busca da consolidação
do desenvolvimento sustentável. Ao contrário,
se aprovada qualquer uma dessas versões, o país
agirá na contramão de nossa história
e em detrimento de nosso capital natural.
Não
podemos, tampouco, ignorar o chamado que a comunidade científica
brasileira dirigiu recentemente à Nação,
assim como as sucessivas manifestações de
empresários, representantes da agricultura familiar,
da juventude e de tantos outros segmentos da sociedade.
Foram suficientes as expectativas de enfraquecimento do
Código Florestal para reavivar tendências preocupantes
de retomada do desmatamento na Amazônia, conforme
demonstram de forma inequívoca os dados recentemente
divulgados pelo INPE.
Entendemos,
Senhora Presidente e Senhores congressistas, que a história
reservou ao nosso tempo e, sobretudo, àqueles que
ocupam os mais importantes postos de liderança em
nosso país, não só a preservação
desse precioso legado de proteção ambiental,
mas, sobretudo, a oportunidade de liderar um grande esforço
coletivo para que o Brasil prossiga em seu caminho de nação
que se desenvolve com justiça social e sustentabilidade
ambiental.
O
esforço global para enfrentar a crise climática
precisa do ativo engajamento do Brasil. A decisão
de assumir metas de redução da emissão
dos gases de efeito estufa, anunciadas em Copenhagen, foi
um desafio ousado e paradigmático que o Brasil aceitou.
No próximo ano, sediaremos a Conferencia das Nações
Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20,
e o Brasil poderá continuar liderando pelo exemplo
e inspirando os demais países a avançar com
a urgência e a responsabilidade que a realidade nos
impõe.
É
por compreender a importância do papel na luta por
um mundo melhor para todos e por carregar esta responsabilidade
histórica que nos sentimos hoje na obrigação
de dirigirmos a Vossa Excelência e ao Congresso Nacional
nosso pedido de providências. Em conjunto com uma
Política Nacional de Florestas, o Código deve
ser atualizado para facilitar e viabilizar os necessários
esforços de restauração e de uso das
florestas, além que de sua conservação.
É necessário apoiar a restauração,
não dispensá-la. O Código pode e deve
criar um arcabouço para os incentivos necessários
para tanto. O próprio CONAMA poderia providenciar
a oportunidade para que tais assuntos sejam incorporados
com a devida participação dos estados, da
sociedade civil e do mundo empresarial. De nossa parte,
nos colocamos à disposição para contribuir
a este processo e confiamos que sejam evitados quaisquer
retrocessos nesta longa e desafiadora jornada.
Brasília,
23 de maio de 2011
Carlos
Minc (2008-2010)
Marina Silva (2003-2008)
José Carlos Carvalho (2002-2003)
José Sarney Filho (1999-2002)
Gustavo Krause (1995-1999)
Henrique Brandão Cavalcanti (1994-1995)
Rubens Ricupero (1993-1994)
Fernando Coutinho Jorge (1992-1993)
José Goldemberg (1992)
Paulo Nogueira Neto (1973-1985)
Da
Redação
Com informações da Agência Brasil