Morre
em São Paulo, Paulo Nogueira-Neto
Dr.
Paulo Nogueira-Neto foi um dos maiores ambientalistas do
Brasil
26/02/2019 – Morreu
na última segunda-feira (25), aos 96 anos, de falência
múltipla dos órgãos, o advogado, biólogo,
pesquisador e ambientalista Paulo Nogueira-Neto. Nascido
em 18 de abril de 1922, Dr. Paulo, como era comumente chamado,
foi o primeiro secretário de meio ambiente no Brasil,
posto equivalente ao atual ministro do Meio Ambiente.
Pode-se dizer que toda a
estrutura da política ambiental do país saiu
das mãos de Nogueira. O biólogo paulistano
foi professor de ecologia da Universidade de São
Paulo – USP; entre 1974 e 1986, comandou no governo
federal a Secretaria Especial do Meio Ambiente (SEMA), hoje
Ibama e Ministério do Meio Ambiente; foi um dos idealizadores
do conceito de desenvolvimento sustentável, adotado
pela Organização das Nações
Unidas – ONU, em 1987, que fundamenta até hoje
os preceitos da preservação e conservação
ambiental no mundo.
Nogueira foi responsável
pela criação da maioria das Unidades de Conservação
federal do país e da formulação das
principais leis ambientais vigentes no Brasil. Sua atuação
foi imprescindível na preservação ambiental,
criou 26 reservas, estações ecológicas
e parques nacionais, protegendo cerca de 3,2 milhões
de hectares de vegetação de vários
biomas.
Reprodução/Wilson
Mahana/Pick-upau
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Dr. Paulo Nogueira-Neto acompanha
o lançamento do
livro de 50 anos do Zoo São Paulo, em 2009.
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Foi responsável,
junto com universidades, órgãos governamentais
e instituições de pesquisa pela Política
Nacional de Meio Ambiente, a espinha dorsal da legislação
ambiental do país, que auxiliou nas disposições
ambientais da Constituição Federal. Entre
os critérios criados estão a obrigação
de recuperação ambiental causada por parte
de empresas, agentes e pessoas; a normatização
dos recursos naturais; a divulgação ampla
de dados ambientais; e os padrões da qualidade ambiental.
Nogueira-Neto construiu
ao longo dos anos e dos governos Médici, Geisel,
Figueiredo e Sarney, um perfil conciliador, de realizações
e sempre aberto ao diálogo. Em 1984, foi o principal
articulador para a criação do Conselho Nacional
do Meio Ambiente – CONAMA, que passou a definir licenciamentos
e normas para as atividades no país, como o controle
da poluição e a implantação
de grandes obras de infraestrutura.
Reprodução/Wilson
Mahana/Pick-upau
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Dr. Paulo Nogueira-Neto acompanha
o lançamento do
livro de 50 anos do Zoo São Paulo, em 2009.
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Mas seu prestigio não
se limitava as cúpulas governamentais. Era muito
respeitado por instituições estrangeiras,
organizações não governamentais e órgãos
das Nações Unidas. Sempre foi um entusiasta
por facilitar o acesso a informação ambiental
de interesse público, mesmo nos anos de regime militar.
Como em 1975, quando descreveu em seu diário a situação
da contaminação por mercúrio na Baía
de Todos os Santos, que até então encontrava-se
em sigilo pelos governos federal e da Bahia. “Quando
a notícia estiver nas ruas, ninguém mais segura
a coisa. Chega de empurrar o lixo para debaixo do tapete”,
escreveu. . “Quando a notícia estiver nas ruas,
ninguém mais segura a coisa. Chega de empurrar o
lixo para debaixo do tapete”, completou, após
anunciar o fato a imprensa.
Reprodução/Wilson
Mahana/Pick-upau
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Biólogo, ambientalista
e conselheiro honorário do Zoo, Neto é
ovacionado pela plateia na Livraria Cultura, em
2009.
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Seu bom trânsito pelas
esferas do poder e com apoio da opinião pública
conseguiu, impedir em 1982, durante a construção
da hidrelétrica de Tucuruí, no Pará,
um produto desfolhante para facilitar a remoção
da floresta. O produto era semelhante ao conhecido “agente
laranja”, utilizado pelos Estados Unidos, durante
a Guerra do Vietnã. Inclusive alertando a comunidade
mundial durante uma conferência na Unesco (Organização
das Nações Unidas para Educação,
Ciência e Cultura). Sua afirmação causou
grande repercussão. Em agosto daquele ano, a Eletronorte
e o Ministério de Minas e Energia desistiram de utilizar
o produto.
Nogueira Neto se formou
em direito pela USP em 1945, um ano após se casar
com Lúcia Ribeiro do Valle, com que viveu até
1995, ano de falecimento de sua esposa. Teve três
filhos Paulo, Luiz Antonio e Eduardo Manoel. Dr. Paulo era
descendente do “Patriarca da Independência”
José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838)
e bisneto do presidente Campos Salles (1845-1913).
Reprodução/Wilson
Mahana/Pick-upau
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Dr. Paulo Nogueira-Neto recebe
homenagem durante lançamento do livro “Zoo
de São Paulo – 50 Anos de História
da Fundação Parque Zoológico
de São Paulo”.
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Foi um grande estudioso
sobre abelhas sem ferrão, tema que reforçou
seu interesse pela questão ambiental. Em 1955, Nogueira-Neto
se mobilizou para a criação a reserva do Pontal
do Paranapanema, uma região até então
ameaçada pela grilagem em áreas remanescente
de Mata Atlântica. Em 1956 fundou a Adema (Associação
em Defesa do Meio Ambiente) e intensificou sua relação
com pesquisadores e conservacionistas o almirante Ibsen
Gusmão Câmara (1923-2014), da Fundação
Brasileira para a Conservação da Natureza,
Augusto Ruschi (195-1986), Alceo Magnanini, Adelmar Coimbra
Filho.
Em 1959 formou-se em história
natural na USP. Em 1964 passou a lecionar na universidade,
a convite do zoólogo Ernest Marcus, um dos fundadores
da instituição em 1934. Ajudou a criar o Laboratório
de Abelhas e atuou para a fundação do Departamento
de Ecologia Geral, da universidade.
Nogueira Neto foi um dos
poucos representantes da América do Sul na Comissão
Brundtland, da ONU, onde se criou o conceito de desenvolvimento
sustentável. Recebeu o Troféu Guerreiro da
Educação em 2005, como professor emérito,
concedido pelo Estado. Em seu discurso de agradecimento,
Nogueira Neto contou que, para enfrentar os freios impostos
pelos militares, sempre se valeu da estratégia de
muita conversa e trabalho de convencimento. Foi com essa
política que ele conseguiu se contrapor ao programa
nuclear do regime militar e ainda proteger a Jureia. “Um
dia me chamaram no Palácio do Planalto e falaram
que tinham uma boa notícia: ‘Vamos fazer oito
usinas e cada uma vai ser estabelecida dentro de uma estação
ecológica’. Aí pus a mão na cabeça,
né? E disse a eles que era contra, mas eles não
desistiram. (....) Hoje nós temos a Estação
Ecológica da Jureia, que é a joia da coroa
em São Paulo em matéria de unidades de conservação.
(...) No momento que o Brasil fez as pazes com a Argentina,
cancelaram o programa nuclear”, disse à época.
Reprodução/Wilson
Mahana/Pick-upau
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Foi um dos primeiros a
debater as questões climáticas no Brasil.
“Ou se controlam as emissões de gás
ou teremos problemas seriíssimos daqui para frente,
não só com as tempestades.”, dizia.
“Só há uma maneira prática de
parar esse processo, que é plantar floresta, que
é capaz de retirar carbono da atmosfera. E o custo
do reflorestamento é de quem gera carbono.”
Ativistas da Agência
Ambiental Pick-upau conviveram com Nogueira-Neto, durante
os seis anos que a Organização integrou o
Conselho Estadual de Ambiente de São Paulo –
CONSEMA. Em um desses encontros, a então presidente
da Pick-upau, Andrea Nascimento, foi presenteada com a biografia
do ambientalista “Uma Trajetória Ambientalista.
Diário de Paulo Nogueira-Neto”, uma publicação
com cerca 900 páginas contando a vida e os desafios
enfrentados, pelo incansável naturalista. Um dos
livros mais importantes da Biblioteca da Organização,
a publicação traz uma dedicatória ode
se lê “Ao Pick-upau, defensor do meio ambiente,
o meu abraço cordial e verde”, Paulo Nogueira-Neto,
18 de abril de 2012 (90 anos).
Reprodução/Wilson
Mahana/Pick-upau
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Dr. Paulo Nogueira-Neto e a então
presidente da Pick-upau, Andrea Nascimento.
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O CEO da Pick-upau, Julio
Andrade, relata o prazer em conhecer Nogueira-Neto, durante
um evento no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo
do Estado de São Paulo, em 2014. “Era Dia do
Meio Ambiente. Estava em São Sebastião, no
litoral norte de São Paulo, participando um de plantio
comemorativo com o Ministério Público do Estado
e havia esse evento na capital. Era provável que
não conseguiríamos chegar. Chegamos. Bem atrasados.
Lembro que troquei algumas palavras com Bruno Covas, então
secretário de Meio Ambiente de São Paulo,
já de saída, e caminhei para o saguão.
Nogueira-Neto estava lá. Foi uma emoção
indescritível, era um ícone para mim e um
dos motivos pelos quais estou nessa luta. Foi um dos dias
mais felizes da minha vida. Deixo um grande agraço
a toda família.”, finalizou Andrade.
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Biografia do ambientalista “Uma
Trajetória Ambientalista. Diário de
Paulo Nogueira-Neto”, uma publicação
com cerca 900 páginas contando a vida e os
desafios enfrentados, pelo incansável naturalista.
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Paulo Nogueira-Neto
(1922-2019)
Da Redação,
com informações de agência de notícias
Fotos: Reprodução/Pick-upau