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ARTIGO: IMPACTOS DO GASODUTO URUCU-PORTO
VELHO SOBRE AS POPULAÇÕES INDÍGENAS DA REGIÃO

Panorama Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Março de 2002

Subsídio preparado pelo antropólogo Gunter Kromer que trabalha há muitos anos com índios da região afetada pelo gasoduto Urucu-Porto Velho

Os povos indígenas Deni e Paumari, ambos habitantes do médio e alto Cuniuá, respectivamente, ainda hoje têm uma compreensão diferenciada em relação à terra e ao meio ambiente. O processo de sedentarização deixou aberta a perspectiva de uma vida semi-nómade. Depois de esgotada uma área habitada durante alguns anos, provocando escassez de peixes, de caça, de frutos silvestres e de matéria prima, as comunidades indígenas podem deslocar-se para outras áreas, ainda ricas em recursos para sua subsistência e seu modo cultural de produção indígena, como cestaria, tecelagem, cerâmica, confecção de armas, de artesanato e de outros artigos de sua cultura.

Prevalece a lógica de deixar descansar áreas já exploradas ao redor de suas aldeias e procurar outras ainda virgens, garantindo, assim, por essa classificação de recursos naturais, uma abundância satisfatória para sua vida que se resume numa economia do Bem-Viver, de festa, onde o excedente, os recursos, a abundância é celebrada por uma ideologia de produção que visa não acumular os recursos, mas sim distribuí-los em grandes festas, convidando, para isso, comunidades vizinhas. É um jeito de intercomunicação, de interrelacionamento entre várias comunidades onde novas relações sociais são criadas, casamentos arranjadas e caçadas e pescarias organizadas. É uma troca de bens num sistema recíproco de economia de partilha.

As comunidades paumari, no verão, se deslocam para áreas de praias fluviais, onde procuram recursos de quelônios para sua dieta diária. Este jeito semi-nómade é vulnerável em vista à implantação de grandes projetos, como a construção do gasoduto em área de influência. Os contatos são iminentes e reais, provocando mudanças de hábitos e costumes, afastando os homens de suas comunidades para servirem de mão-de-obra como pescadores, caçadores, coletores de matérias primas ao serviço da empresa. Por seu modo econômico individual e de lucro, o projeto interfere no seu sistema sócio-econômico de obrigações e responsabilidades para com seus parentes.

O mundo dos homens é a floresta, o das mulheres é a aldeia. A empresa do gasoduto confere aos homens um novo papel e função que é a relação com a empresa, e não com a aldeia. A desorganização da vida na aldeia é inevitável.

Ameaçadas também são as comunidades indígenas de pouco contato em área de influência, como o Rimarimã, Catawixi e Juma. Os primeiros fazem suas excursões entre o rio Piranhas, o rio Riozinho e o rio Cuniuá, numa área de recursos ainda abundantes de caça, peixe e quelônios, cobiçada, portanto, pelos ribeirinhos, e mais ainda por uma empresa deste volume, que necessita de recursos para o fornecimento de alimentos para um grande contingente de homens. Invasão, contatos indiscriminados, penetração de doenças, exploração dos recursos e empobrecimento da área são alguns dos impactos que podemos citar.

Os Catawixi vivem na área de influência do rio Mucuim, no igarapé Jacareúba, no município de Canutama. Estes índios vivem encurralados pelo avanço da soja, vindo de Porto Velho. As cabeceiras do Jacareúba se encontram nas extremas da construção do gasoduto. Por isso, a empresa representa um perigo iminente de contatos indiscriminados com este povo, ainda mais, porque não existe nenhuma garantia de prevenção, proteção e defesa deste povo.

Os Juma, habitantes da área diretamente afetada, entre o rio Mucuim e o Joari, foram transferidos para a área dos índios Uru-eu-wau-wau, com o intuito de garantir-lhes a sobrevivência física através de casamentos com este povo do mesmo tronco lingüístico Kawahib. Por esta manobra da Funai de Porto Velho, a área Juma ficou livre para a implantação do projeto do gasoduto. O próprio PPTAL retirou a proposta de demarcação desta área - prevista para 2001 - do calendário, sem definir, daqui para frente, o seu destino como área indígena.

Os Uru-eu-wau-wau e os Juma, acompanhados pelo Cimi e a Funai de Lábrea, em 2002, fizeram uma visita a esta área, declarando-a área indígena Juma, exigindo que sua demarcação volte a entrar no programa do PPTAL o mais rápido possível.

Fonte: CIMI – Conselho Indigenista Missionário (www.cimi.org.br)
Gunter Kroemer é membro do CIMI regional Amazonas, padre, indigenista e antropólogo

 
 
 
 

 

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