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TERRITÓRIOS
INDÍGENAS: EMENDA CONSIDERADA
INCONSTITUCIONAL EM VOTAÇÃO
NO SENADO
Panorama Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Junho de 2003
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A proposta de Emenda
à Constituição, número
38, do senador Mozarildo Cavalcante (PPS-RR), que
volta à pauta de votação do
Senado Federal no próximo dia 11, foi condenada
por antropólogo, jurista e lideranças
políticas.
A PEC que visa limitar o tamanho dos territórios
indígenas e das unidades de conservação
de forma que não ultrapassem, conjuntamente,
50 % da superfície de cada unidade da federação,
e, além disso, transfere para o Senado Federal
a responsabilidade de aprovar a demarcação
das terras indígenas, foi considerada inconstitucional
conforme se depreende pelas declarações
a respeito.
A proposta teve o posicionamento contrário
do líder do Governo no Senado, senador Aloísio
Mercadante (PT-SP). Ontem (4), em audiência
com lideranças indígenas dos povos,
Kayapó, Xavante, Pankararu, Tupinambá,
Fulni-ô e Maxakali e com os senadores João
Capiberibe (PSB-AP), Fátima Cleide (PT-RO)
e Sibá Machado (PT-AC), Mercadante, afirmou
"o governo não apóia a aprovação
da PEC, portanto ela não deve ser aprovada"
ressaltou.
Proposta como esta que dispõe contra os direitos
dos povos indígenas não deveria estar,
pela terceira vez, na pauta de votação
do Senado de um governo que tem um compromisso assumido
com os povos indígenas, acrescentou, o deputado
Luiz Eduardo Greenhalgh, presidente da Comissão
de Constituição, Justiça e
Cidadania, "espero que o posicionamento do
governo seja contrário efetivamente e que
esta proposta saia do Senado de uma vez por todas"
.
O jurista, professor Dalmo Dallari, analisou a proposta
sob dois pontos, considerados por ele importantes.
O primeiro, o fato da constitucionalidade. Segundo
ele, projetos que tendem a reduzir direitos e garantias
individuais, não podem ser objeto de deliberação
constitucional, segundo o artigo 60º da Constituição,
"esta emenda se encaixa neste contexto. Caso
ela seja aprovada, pode-se pedir a anulação
no Supremo por ser inconstitucional". O segundo
aspecto abordado por Dallari é o da conveniência,
onde fez duas analises. A primeira, da preservação
ambiental, "desde o início os índios
são os maiores preservadores ambientais"
disse. Para ele, tirar as terras dos índios
e entregar para empresas nacionais e multinacionais
de mineração e extração
de madeira, significa abrir as comportas para a
destruição da natureza "os mineradores
despejam mercúrio nos rios destruindo qualquer
forma de vida o que jamais é feito pelos
índios, e a extração de madeira
significa a destruição da mata amazônica.
Por isso, é importante para o Brasil que
a terra fique com os índios". A segunda
analise do professor é com relação
à defesa de fronteiras "já se
comprovou que os índios vigiam melhor que
o Exército" e ressaltou "Portanto,
por legalidade e conveniência, esta proposta
não pode ser aprovada, porque levaria à
matança dos índios e iria contra os
interesses brasileiros; no sentido mais amplo iria
contra os interesses da humanidade, na medida em
que sua aprovação acarretaria gravíssimas
agressões ao meio ambiente".
O professor concluiu sua análise afirmando
que não há justificativas para que
seja usada uma Proposta de Emenda à Constituição
para benefícios individuais, "uma PEC
não pode ser instrumento para proporcionar
benefícios econômicos a meia dúzia
de pessoas, sem qualquer comprometimento ético,
causando graves prejuízos aos brasileiros".
João Pacheco, antropólogo e Professor
Titular do Museu Nacional, considera que existem
dois erros e preconceitos em relação
à argumentação da proposta.
O primeiro, o de arbitrariedade para o reconhecimento
de direitos prescritos pela Constituição
Federal. "O que define uma área indígena
não é de maneira alguma a sua proporção
com o tamanho da unidade da federação
em que se localiza, mas sim o fato que se constitua
de terras de ocupação tradicional
pelos indígenas, necessárias à
sobrevivência física e cultural das
coletividades em que estão reunidos socialmente"
afirmou Pacheco.
O segundo, é sobre a limitação
de terra. Para ele, as terras indígenas estão
longe de serem consideradas como latifúndios
ou setores privilegiados "Na maior parte dos
estados brasileiros, incluindo nordeste, leste e
sul, indo do Rio Grande do Sul ao Ceará,
as áreas indígenas correspondem a
frações de alguns milésimos
das terras desses estados. Os índios nessas
regiões vivem em condição de
pauperização, com terras reduzidas
e com recursos ambientais devastados Se na região
amazônica os índios e as unidades de
conservação ocupam parcelas significativas
dos estados, isso decorre de fatores históricos,
que permitiram uma presença indígena
mais forte em termos demográficos, bem como
da maior preservação da biodiversidade"
.
O professor afirma que a PEC, ao invés de
incorporar pontos positivos à política
ambiental elaborada pelo governo brasileiro, colocada
em prática nos últimos dez anos, continua
a pensar o progresso econômico como em antagonismo
frontal com os programas de desenvolvimento sustentável,
colocando o Brasil na contra-corrente de todas as
concepções modernas de ocupação
de território e de uso dos recursos naturais,
"esta proposta alinha a política brasileira
com o pensamento mais conservador possível
em matéria ambiental. Ao afirmar em seus
pressupostos que desenvolvimento é sinônimo
de devastação, a PEC de fato propõe
aos legisladores que estabeleçam uma absurda
e draconiana (50%!) cota de incentivo à destruição
ambiental", concluiu.
A professora de filosofia da Universidade de São
Paulo, Marilena Chauí, que em seus estudos
e reflexões, acerca da cultura, acompanha
a questão indígena, enfaticamente
disse, "nem preciso me posicionar, eu acho
está proposta é mais uma aberração,
como sempre. Eu sou contra
e ela não pode prosseguir".
O CIMI reafirma seu posicionamento de que essa proposta
é uma clara sinalização contra
os direitos constitucionais dos povos indígenas.
Fonte: Amazônia (www.amazonia.org.br)
Cimi – Conselho Indigenista Missionário (www.cimi.org.br)
Assessoria de imprensa