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HEPATITE
PODE DIZIMAR POVOS DE RESERVA INDÍGENA
NA AMAZÔNIA
Panorama
Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Junho de 2004
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Uma
síndrome aguda, provavelmente ocasionada
pela união dos vírus B e delta da
Hepatite, pode dizimar, em 20 anos, os povos que
vivem na segunda maior reserva indígena do
Brasil: o Vale do Javari. O alerta, quem faz, é
a Coordenação das Organizações
Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab),
por meio de seu presidente, Jecinaldo Satere-Mawé.
Não existem estatísticas oficiais,
nem sequer estimativas, mas, de acordo com o Conselho
Indígena do Vale do Javari (Civaja), semanalmente
índios são transportados da reserva
para receberem atendimento de saúde.
Em 2003, 15 indígenas, de diferentes povos,
morreram vítimas da síndrome. O diagnóstico,
de acordo com o Civaja, é sempre o mesmo:
Síndrome Febril Ictero Hemorrágica
Aguda. A entidade revela que, naquela ocasião,
somente duas das vítimas tinham feito sorologia
(exame para identificar a presença do vírus
da hepatite no sangue). Os resultados foram positivos.
A reserva do Vale do Javari é a segunda maior
do país, com dimensão semelhante à
de Portugal. Nela vivem 3.500 índios, das
etnias Kanamari, Kulina, Matis, Mayuruna e Marubo.
Em todo o território existe um único
posto de saúde, localizado na cidade de Atalaia
do Norte. A dificuldade de acesso à região
é grande e as possibilidades de deslocamento
reduzidas, especialmente em certas épocas
do ano.
Hepatite
hemorrágica
Thor Dantas, médico
infectologista, especialista em doenças tropicais
e gerente do Hospital Geral das Clínicas
de Rio Branco, no Acre, confirma que a região
do Javari apresenta alto grau de contaminação
pelos vários tipos de vírus de hepatite.
Entre eles, aponta, o da hepatite delta, forma muito
agressiva e de difícil reversão da
doença, que em sua forma aguda passou a ser
registrada pela história como “peste negra
de Lábria”.
O vírus da hepatite delta só pode
se manifestar a partir da convivência no organismo
com o vírus tipo B da hepatite. É
a união destes dois agentes infecciosos que
provoca a síndrome aguda. Os medicamentos
para combater o vírus tipo delta tem se mostrado
ineficazes, alcançando sucesso em menos de
10% dos casos e resultando em graves efeitos colaterais.
Porém, a vacina contra o tipo B é
altamente eficaz. Isso, na avaliação
do especialista, poderia impedir o aparecimento
da chamada ‘superinfecção’ – resultante
da combinação desses dois vírus
no organismo humano.
A manifestação da hepatite delta desencadeia
febre, hemorragia generalizada e outros inúmeros
sintomas. Vários exames são necessários
para confirmar o diagnóstico. “Uma vez manifestada
a síndrome, as chances de salvar esta vida
estão sempre próximas de zero. Apenas
a prevenção, através de vacinação
e uso de preservativo nas relações
sexuais, pode salvar estas pessoas, evitando a infecção
simultânea pelos tipos B e Delta”, alerta
o especialista.
Responsabilidade
da Funasa
A Fundação
Nacional de Saúde (Funasa), órgão
federal responsável pela saúde indígena,
é acusada pelas entidades do Vale do Javari
de omissão no atendimento às vítimas
da síndrome. Afirmação com
a qual concorda o sertanista Sidney Possuelo, coordenador-geral
de Índios Isolados da Fundação
Nacional do Índio (Funai). Segundo ele, se
essa mesma situação fosse verificada
em “qualquer cidadezinha do País” as autoridades
sanitárias mandariam isolá-la.
Iraneide Barros, Coordenadora Geral de atenção
à saúde indígena da Funasa,
rebate as críticas. Ela afirma que o órgão
tem uma política para aquela região,
mas encontra dificuldades para colocá-la
em prática. “Estávamos trabalhando
apenas com um barco”, relata, reconhecendo que a
instituição sabe do alto grau de contaminação
por hepatite na região. “Agora, nem todos
apresentavam os sintomas da superinfecção,
mistura dos tipos B e D de vírus. Não
morreram de febre hemorrágica. Precisamos
testar outras doenças, como o hantavírus
e mesmo a malária”, defende.
Fonte: Radiobras (www.radiobras.gov.br)
Beth Begonha