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ENCONTRO DEBATE CONSENTIMENTO
PRÉVIO PARA PESQUISA CIENTÍFICA
E USO DE CONHECIMENTOS TRADICIONAIS
Panorama
Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Abril de 2005
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13/04/2005 ISA e
Foirn usam encenações para explicar
e aprofundar a discussão dos temas com representantes
de comunidades indígenas que habitam a bacia
do Rio Içana, no Alto Rio Negro (AM).
O encontro estimulou a reflexão sobre como
os povos indígenas devem proceder quando
estiverem diante da necessidade de autorizar uma
pesquisa cientifíca que implique o acesso
a um conhecimento tradicional ou a recursos naturais
de que sejam detentores.
Durante três dias – de 22 a 24 de março
– representantes da Coordenação das
Associações Baniwa e Coripaco (CABC)
e de comunidades indígenas da bacia do Rio
Içana, no Alto Rio Negro, estiveram reunidos
na Comunidade Boa Vista, no município de
São Gabriel da Cachoeira (AM), para debater
temas como propriedade intelectual, pesquisas científicas,
bioprospecção, consentimento prévio
informado e repartição de benefícios
da biodiversidade. O encontro denominado Biodiversidade,
Biotecnologia e Conhecimentos Tradicionais foi promovido
pela Federação das Organizações
Indígenas do Rio Negro (Foirn) e pelo Instituto
Socioambiental (ISA). Algumas das recomendações
para a realização de pesquisas na
bacia do Içana, sugeridas no evento, aprofundaram
orientações do 1º Seminário
de Pesquisa em Terras Indígenas do Rio Negro,
realizado em 2000 e igualmente organizado pelo ISA
e pela Foirn (saiba mais).
A realização da atividade decorreu
de uma sugestão dos participantes da última
assembléia da CABC, em junho de 2004. Nessa
ocasião, as comunidades demonstraram apreensão
com as conseqüências que as pesquisas
poderiam ter sobre os conhecimentos tradicionais
Baniwa e a biodiversidade a eles associada. A iniciativa
atendeu também ao compromisso do ISA de levar
até seus parceiros locais as discussões
realizadas no âmbito do Conselho de Gestão
do Patrimônio Genético (CGen) e da
Convenção da Diversidade Biológica
(CDB).
Além de abordar os temas polêmicos
mais gerais relativos tanto ao CGen quanto à
CDB, debateu-se também a importância
das pesquisas científicas na bacia do Rio
Içana e dos conhecimentos tradicionais para
as atividades de bioprospecção, bem
como as condições para a realização
desses estudos. O encontro estimulou a reflexão
sobre como os povos indígenas devem proceder
quando estiverem diante da necessidade de autorizar
o acesso a um conhecimento tradicional de que sejam
detentores. Em linguagem simples, foram explicadas
as regras sobre consentimento prévio informado
definidas na Resolução nº 05/2003
do CGen, que atualmente regulamenta o tema.
O consentimento prévio informado é
a autorização preliminar das comunidades
para o acesso aos seus recursos e conhecimentos.
A bioprospecção é a atividade
exploratória que visa identificar componente
do patrimônio genético e informação
sobre o conhecimento tradicional associado, com
potencial de uso comercial.
Metodologia alternativa
Para facilitar a
compreensão, já que se trata de assunto
bastante complexo, foram feitas encenações
com caricaturas de situações reais
sobre o acesso a conhecimentos tradicionais que
levantavam questões polêmicas ou desconhecidas
dos participantes. Membros da equipe do ISA e alunos
da escola Baniwa Pamáali colaboraram nas
dramatizações.
Uma das peças teatrais, encenada exclusivamente
pelos estudantes indígenas, buscou introduzir
conceitos e questões pertinentes ao tema
– biodiversidade, bioprospecção, anuência
prévia, CGen, repartição de
benefícios etc – e foi baseada numa cartilha
elaborada pelo Centro Universitário do Pará
(Cesupa). Outra das apresentações
tratou de um conhecimento difundido em toda a calha
do Içana: o uso de uma planta de conhecimento
Baniwa, para fabricação de um xampu,
mas cujo acesso havia sido negociado por apenas
uma comunidade. Também foi encenada a história
de um estudante universitário indígena,
detentor de um conhecimento Baniwa, que o utilizou
para fazer bioprospecção. Por último,
foi dramatizado um caso de acesso cuja anuência
havia sido feita exclusivamente entre o pesquisador
e o pajé, único detentor do conhecimento
entre seu povo.
Os organizadores buscaram avaliar como os presentes
reagiam a cada situação e o que sugeriam
como procedimento ideal. Após as apresentações,
os participantes foram divididos em grupos por região
(Aiari, Alto Içana, Médio Içana
e Baixo Içana), para discutir detalhadamente
cada um dos temas. Depois, cada grupo fez sua apresentação
em uma plenária, onde foi aprofundado o debate.
“Experiências positivas como essa devem ser
difundidas para todas as populações
tradicionais brasileiras, qualificando-as a autorizar,
com segurança e autonomia, pesquisas e contratos
de bioprospecção”, avalia Henry Novion,
biólogo do ISA. Ele e o advogado do ISA,
Raul. Teles do Valle, foram organizadores do evento
ao lado da CABC. Novion lembra que a inclusão
de jovens cientistas indígenas nas pesquisas
realizadas em suas terras ou com seus conhecimentos
contribui para o protagonismo dos povos indígenas
e fortalece a autonomia destes na solução
de seus problemas, além de promover o respeito
e a valorização dos conhecimentos
tradicionais e de auxiliar na consolidação
dos direitos indígenas. “Somente através
do diálogo multicultural, que revela as diferentes
óticas e éticas sobre o tema, seremos
capazes de formular políticas públicas
inclusivas, que realmente garantam a autonomia e
os direitos das populações tradicionais”.
Confira algumas conclusões
do encontro
• Importância
da pesquisa para a vida dos povos indígenas
Os participantes
discutiram as condições para que uma
pesquisa científica em Terras Indígenas
atenda os interesses das comunidades, valorize os
seus conhecimentos e de que forma poderá
auxiliar os povos indígenas na elaboração
de estratégias de gestão de seus territórios.
Nas discussões, foram apontadas diretrizes
para a realização de pesquisas na
bacia do Içana: 1) devem partir de demandas
e necessidades das próprias organizações
indígenas (associações de base
ou Foirn); 2) quando a iniciativa vier “de fora”,
a pesquisa deverá produzir informações
relevantes para a região, divulgar para as
comunidades e associações os resultados
alcançados e, sempre que possível,
utilizar “agentes indígenas de pesquisa”,
isto é, incluir a formação
de alunos indígenas na metodologia das pesquisas.
• Diretrizes quanto
ao conteúdo da anuência prévia
Nesse ponto, os resultados
– espontâneos – foram similares aos propostos
no seminário de pesquisa do Rio Negro (2000).
Em linhas gerais, apontam para a necessidade de
se explicar a pesquisa em linguagem simples, apresentar
todos os objetivos e condiciona a autorização
à divulgação de todos os resultados
após sua conclusão.
• Casos polêmicos
de acesso ao conhecimento tradicional
Entendeu-se que,
quando o conhecimento está difundido entre
todas as comunidades indígenas da região,
a anuência deve ser dada primeiramente pelas
organizações representativas (CABC
e Foirn), para depois se concedida pela(s) comunidade(s)
na(s) qual(is) será realizada a pesquisa
de campo. A repartição de benefício
deve ser negociada com as organizações
e deve sempre que possível corresponder às
necessidades gerais da região. Os presentes
concordaram que um indivíduo não poderia,
mesmo que seja parte daquele povo e tenha adquirido
o conhecimento pelas formas “tradicionais”, autorizar
uma pesquisa ou desenvolvimento de produtos sem
uma anuência coletiva, nos mesmos moldes do
caso anterior. Quando o conhecimento está
restrito a uma família ou clã, ou
mesmo a um indivíduo em específico
(pajé ou raizeiro), não é preciso
haver anuência prévia coletiva, pois
o direito de negociar o seu uso por terceiros é
exclusivo de seus detentores. Nesses casos, os benefícios
também serão negociados e concedidos
individualmente, mas, em qualquer dos casos, a negociação
pelo uso deve ser acompanhada pela Foirn, não
como quem autoriza, mas como assistente da negociação.
Fonte: ISA – Instituto Socioambiental
(www.socioambiental.org.br)
Assessoria de imprensa