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CÂMARA DOS DEPUTADOS
SERVE COMO PALANQUE CONTRA HOMOLOGAÇÃO
EM ÁREA CONTÍNUA DA TI RAPOSA
SERRA DO SOL
Panorama
Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Maio de 2005
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12/05/2005 Em meio
a uma enxurrada de críticas ao processo de
demarcação da área, deputados
e governador de Roraima aumentam a pressão
pela transferência ao patrimônio estadual
de terras de domínio da União. Gabeira
considera argumentos apresentados contra a homologação
“papo furado”.
Composição da mesa deu margem a suspeitas.
Da esquerda para a direita: Marinaldo Trajano, Hamilton
Gondim, Ottomar Pinto, Luciano Castro, Artur Mendes,
José Novaes e Luiz Fernando Faccio.
O que era para ser uma audiência pública
com o fim de discutir e avaliar as conseqüências
do processo demarcatório da Terra Indígena
Raposa-Serra do Sol (RR) transformou-se em palanque
contra a sua homologação em área
contínua. O debate foi realizado ontem, dia
11 de maio, durante reunião da Comissão
de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
(CMADS) da Câmara dos Deputados, convocada
pelo deputado Fernando Gabeira (PV-RJ).
A composição da mesa deixou margem
à suspeita de que a audiência seria
na verdade um espaço aberto para que políticos
contrários à homologação
se manifestassem livremente. De um lado, o governador
de Roraima, Ottomar Pinto (PTB), o presidente da
Associação dos Produtores de Arroz
de Roraima, Luiz Fernando Faccio, o presidente da
Sociedade de Defesa dos Índios Unidos do
Norte de Roraima (Sodiur), José Novaes, e
o ex-prefeito de Boa Vista (RR) e perito da Justiça
Federal, Hamilton Gondim. De outro, o diretor de
Assuntos Fundiários da Fundação
Nacional do Índio (Funai), Artur Nobre Mendes,
e o coordenador-geral do Conselho Indígena
de Roraima (CIR), Marinaldo Justino Trajano. Quatro
contra dois. O mediador da discussão foi
o presidente da CMADS, Deputado Luciano Castro (PL-RR),
que já ingressou em juízo para contestar
a demarcação da Terra Indígena.
Além disso, os expositores escolhidos para
defender a homologação foram colocados
para falar em primeiro lugar, cabendo o restante
de tempo à “acusação”, o que
contraria as regras elementares de qualquer debate.
Passaram pela audiência 14 parlamentares,
grande parte da bancada de Roraima. Todos os deputados
que se manifestaram condenaram a homologação
em área contínua, com exceção
de Babá (PT-PA) e Gabeira.
Por sugestão do deputado do PV do Rio de
Janeiro será nomeada uma comissão
externa de parlamentares para acompanhar o trabalho
do grupo interinstitucional criado pelo presidente
Lula com representantes dos governos federal e estadual
para discutir e implementar as medidas compensatórias
à homologação oferecidas pelo
governo federal. São elas: destinar 150 mil
hectares de terras da União para implantação
de pólos agropecuários no Estado;
o Incra vai cadastrar e assentar famílias
não-indígenas que estão na
TI e regularizar 10 mil propriedades, que assim
terão acesso a crédito rural; concluir
a avaliação das benfeitorias construídas
na região; nenhum ocupante de boa fé
será retirado da área sem indenização
e sem um local para seu reassentamento.
A classe política de Roraima considera que
a garantia dos direitos territoriais dos índios
da região vai implicar atraso no desenvolvimento
econômico do Estado e vem exigindo uma “compensação”
maior que as medidas anunciadas pelo governo pela
demarcação da área.
Homologação
é irreversível
“A homologação
foi amadurecida durante dois anos e não há
disposição do governo em rever a decisão,”
sentenciou Mendes. Ele apontou que as medidas compensatórias
propostas pelo Palácio do Planalto já
estão em curso e que elas serão capazes
de “reconciliar” as facções políticas
existentes no seio das comunidades indígenas
e apoiar o desenvolvimento econômico de Roraima.
“Já disponibilizamos R$ 1 milhão para
as indenizações. Até o final
deste mês, 28 proprietários que já
haviam concordado com a retirada serão indenizados.
A partir de junho, vamos concluir o levantamento
das ocupações restantes.”
“A reserva Raposa-Serra do Sol é um fato
irreversível. O que se discute é a
possibilidade de atenuar a dureza da medida, como
por exemplo, deixando as quatro comunidades [não
indígenas] que vivem lá há
muitos anos e também preservando o polígono
dos arrozais,” insistiu Ottomar Pinto. Ele voltou
a afirmar que a homologação em área
contínua não tem “suporte antropológico”
e também reivindicou a transferência
para o seu Estado de uma área equivalente
à da TI – 1,7 milhão de hectares –
para ser destinada à produção
agropecuária. O decreto homologatório
assinado pelo presidente Luís Inácio
Lula da Silva, em 15 de abril, incluiu no território
da TI todas as ocupações não
indígenas, com exceção da sede
urbana do município de Uiramutã, e
deixou de fora o leito das rodovias que cortam a
região, aparelhos públicos (escolas
e linhas de transmissão) e a base do Exército
localizada na área. (Saiba mais).
“Ao contrário do que se diz, a homologação
não vai prejudicar o desenvolvimento do Estado.
O que prejudica o desenvolvimento são os
desvios de dinheiro público que lá
ocorrem. Somos brasileiros também, respeitamos
as leis e o Estado Democrático e também
queremos o desenvolvimento com respeito ao meio
ambiente”, defendeu Marinaldo Trajano. Ele citou
os problemas de contaminação de rios
e desmatamento descontrolado existentes nas áreas
ocupadas pelos rizicultores. Trajano também
lembrou que os índios favoráveis à
homologação em área contínua
são a imensa maioria na região e que
eles vêm defendendo isso de forma pacífica
há mais de 30 anos.
Em resumo, contra a homologação da
TI Raposa-Serra Sol em área contínua
foram repisados os mesmos velhos argumentos de que
ela prejudicaria o desenvolvimento econômico
de Roraima, de que parte considerável dos
índios seria contrária à medida
e de que ela ameaçaria a segurança
nacional ao esvaziar a região e impedir a
presença do Poder Público. Em relação
a este último ponto, as ONGs com atuação
local voltaram a ser acusadas de defender uma suposta
“internacionalização” da Amazônia
e os interesses de grandes potências sobre
os recursos naturais do País.
Luiz Fernando Faccio classificou de “forjado” o
laudo antropológico que baseou o processo
de demarcação da TI. “Estamos entregando
mais de 1,7 milhão de hectares para uma população
‘mínima’ de indígenas, que não
deve passar de 9 mil pessoas, porque os dados da
Funai extrapolam”, atacou. As estimativas mais recentes
apontam a existência de mais de 16 mil índios
na área. Faccio sugeriu que haveria um plano
arquitetado por organizações indígenas
e indigenistas de criar um “novo país” em
Roraima com a aglutinação de várias
TIs.
O próprio deputado Fernando Gabeira qualificou
de “papo furado” o discurso da “internacionalização”
e as acusações contra as ONGs. Segundo
o parlamentar, sua intenção ao pedir
o debate foi de tentar resolver o conflito político
em Roraima da maneira mais pacífica possível.
“Não estou satisfeito com a situação.
Precisamos negociar, avaliar as medidas compensatórias
propostas pelo governo federal e as reivindicações
de Roraima para chegarmos a um consenso”, afirmou.
Questionado sobre a composição da
mesa do evento ele respondeu que ela havia sido
alvo de “negociações políticas”
conduzidas pelo presidente da CMADS, Luciano Castro.
”É um espaço para se espernear,"
disse Gabeira.
Fonte: ISA – Instituto Socioambiental
(www.socioambiental.org.br)
Oswaldo Braga de Souza