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PAU-ROSA Nº 5: FOLHAS
DE ÁRVORE DA AMAZÔNIA GARANTEM
PERFUME CHANEL
Panorama
Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Maio de 2005
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10/05/2005 A Lendária
frase dita pela atriz Marilyn Monroe de que dormia
vestida apenas com algumas gotas de Chanel nº
5 guarda, quem diria, um toque bem brasileiro. O
principal ingrediente do famoso perfume francês
lançado pela empresa de mademoiselle Coco
Chanel em 1921 é o óleo essencial
extraído da madeira do pau-rosa, uma árvore
nativa da Amazônia. Estimativas indicam que
cerca de 500 mil árvores dessa espécie
já foram abatidas desde o início da
exploração do pau-rosa, o que levou
o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (Ibama) a incluí-lo
na lista das espécies em perigo de extinção
em abril de 1992. Para preservar a preciosa madeira,
e garantir o fornecimento da matéria-prima
para a indústria perfumista, o professor
Lauro Barata, do Laboratório de Química
de Produtos Naturais da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp), começou a desenvolver
em 1998 um projeto de extração do
óleo essencial das folhas que resultou em
rendimento e qualidade semelhantes aos obtidos da
madeira. "Aprendi que o óleo poderia
ser tirado das folhas em trabalhos publicados pelo
professor Otto Gottlieb", diz Barata. Ele se
refere a um estudo publicado no final da década
de 1960 pelo químico que nasceu na República
Checa e se naturalizou brasileiro, professor aposentado
da Universidade de São Paulo (USP) e lembrado
até pela comunidade científica brasileira
para concorrer ao Prêmio Nobel. "Aprendi
também com a experiência de Raul Alencar,
um ribeirinho de 80 anos que sempre viveu dos produtos
da floresta e é produtor tradicional de óleo
de pau-rosa", diz Barata. Essas duas referências
serviram de base para o seu projeto, financiado
pelo Banco da Amazônia (Basa), no valor de
R$ 25 mil. O interesse do professor da Unicamp em
estudar a árvore amazônica surgiu em
1997, quando ecologistas franceses iniciaram uma
campanha para boicotar os produtos da Chanel por
conta da extração do pau-rosa, que
tem como nome científico Aniba rosaeodora,
e a conseqüente devastação da
floresta. Em resposta, a empresa francesa contratou
a ONG Pro-Natura, de origem franco-brasileira, que
trabalha em parceria com empresas para desenvolver
programas de desenvolvimento sustentável.
O objetivo era encontrar uma solução
que acalmasse o ânimo dos grupos ambientalistas.
Barata foi então chamado pela ONG para fazer
um diagnóstico da situação
da extração do óleo da árvore
amazônica. No relatório final, ele
ensinava como trabalhar com a produção
sustentável do pau-rosa, que começava
com o cultivo e o manejo e passava pela extração
das folhas. "Fizemos um levantamento inventariando
a situação e a empresa se comprometeu
a adotar o desenvolvimento sustentável proposto
no nosso relatório", diz Barata. "A
solução apontada conseguiu barrar
as manifestações programadas."
Mas até hoje eles continuam a comprar o extrato
obtido das árvores cortadas inteiras no meio
da floresta. A pressão internacional provocou
uma retomada das possibilidades de manejo sustentável
do pau-rosa e, após uma série de discussões
com a participação dos produtores,
o Ibama lançou em 1998 uma portaria com diretrizes
que regulamentam a extração da árvore.
Extração
experimental
A partir do estudo
encomendado pela Chanel e com o projeto financiado
pelo Basa, Barata fez várias viagens à
região amazônica, que resultaram em
um trabalho de cultivo do pau-rosa em parceria com
o produtor Raul Alencar. Uma área de capoeira
- mata que surge depois do desmatamento da floresta
original - no município de Nova Aripuanã,
no Estado do Amazonas, foi escolhida para abrigar
as mudas da planta. Hoje a área tem 10 mil
árvores com três anos e meio que já
estão no ponto de serem podadas para dar
início à extração experimental
do óleo. Para a exploração
comercial, as podas podem ser iniciadas aos cinco
anos para a extração do linalol e
no 25° ano a árvore pode ser cortada
e extraído o óleo da madeira, desta
vez de modo sustentável. O óleo puro
da madeira tem um tom amarelo-dourado. No início
possui um aroma forte, meio cítrico, que
se sobrepõe aos outros aromas. Com o passar
do tempo, outros cheiros agregam-se ao primeiro,
compondo uma mescla harmônica, doce e amadeirada.
Já o óleo obtido das folhas é
de um amarelo quase transparente, com um cheiro
bastante suave, sem muitas gradações.
Para testar a qualidade do óleo, folhas de
diferentes idades, entre cinco e 35 anos, foram
coletadas tanto na floresta como em campos de cultivo
durante seis meses. A primeira plantação
experimental avaliada foi estabelecida em 11000
por pesquisadores da Universidade Federal Rural
da Amazônia (Ufra), no município de
Benfica, a 27 quilômetros de Belém,
no Pará, em colaboração com
as pesquisadoras Selma Ohashi e Leonilde Rosa. Outra
plantação estudada fica em Curuá
Una, no Pará, onde existem 300 árvores
plantadas desde 1973. O óleo extraído
das folhas apresentou rendimento e qualidade similares
aos da madeira. No item quantidade de óleo
obtido das folhas, a variação foi
de 0,9% a 1,1%, em média, ou seja, cerca
de 10 quilos de óleo por tonelada de folhas,
um rendimento semelhante ao extraído da madeira.
Em relação ao aroma, o óleo
das folhas perde o toque amadeirado. Isso pode ser
corrigido em laboratório. "Basta um
tratamento físico-químico para que
não se note a diferença entre eles",
diz Barata.
Sem revelar o conteúdo do tratamento feito
em laboratório, e que pode ser reproduzido
industrialmente, ele enviou amostras dos óleos
das folhas e da madeira para serem avaliadas por
dois representantes no Brasil de casas perfumistas
internacionais. Eles disseram que as diferenças
entre as duas amostras eram mínimas, e um
deles assegurou que a fragrância do óleo
das folhas era superior à da madeira. Hoje
a extração é feita apenas das
árvores que se encontram na floresta, não
em campos de cultivo, que são poucos e experimentais.
Para a árvore na floresta chegar ao ponto
de corte demora em média de 30 a 35 anos.
E para se obter uma tonelada do linalol é
necessário derrubar de 25 a 50 árvores.
Se o manejo e cultivo forem bem feitos, com a escolha
de melhores matrizes, esse prazo cai para 25 anos.
Atualmente, a produção anual do óleo
de pau-rosa fica em torno de 40 toneladas, o que
representa uma pequena fração das
450 toneladas produzidas nos anos de 1950. O declínio
na demanda deve-se principalmente à introdução
do linalol sintético no mercado nos anos
de 1980. Mas mesmo que isso não tivesse ocorrido
os produtores, hoje reduzidos a apenas seis, não
teriam como dar conta da demanda porque a árvore,
que antes se encontrava distribuída por toda
a Amazônia, agora se concentra nos municípios
de Parintins, Maués, Presidente Figueiredo
e Nova Aripuanã, todos no Estado do Amazonas,
em um círculo de 500 quilômetros. A
espécie já foi extinta na Guiana Francesa,
onde começou a ser retirada no início
da década de 1920, e logo depois no Amapá
e no Pará. O linalol sintético não
substitui o natural, porque a fragrância é
de qualidade inferior. Mas serve como base para
sabonetes e outros produtos de higiene e beleza.
A facilidade em produzir o óleo essencial
era tanta que quando o sabonete Phebo foi lançado,
em 1930, no Brasil, levava em sua fórmula
o óleo de pau-rosa, algo impensável
nos dias de hoje pelo preço elevado da matéria-prima.
"O linalol também é encontrado
em outras fontes vegetais, como o manjericão,
mas nenhuma fonte apresenta a qualidade superior
do pau-rosa. Enquanto no pau-rosa o linalol representa
80% da composição do óleo essencial,
no manjericão essa porcentagem fica em 30%",
explica Barata. Para extrair o óleo essencial
é necessário andar bastante dentro
da mata porque as árvores acham-se espalhadas
na natureza. Em cada 6 hectares, encontra-se apenas
uma. Para localizá-las, cada mateiro embrenha-se
solitariamente nas florestas. Quando eles avistam
o pau-rosa, a árvore é marcada com
um facão com as iniciais do produtor. As
que não devem ser derrubadas também
são identificadas, uma exigência do
Ibama para preservar as matrizes que estão
produzindo sementes.
Medida do corte
No verão,
outra equipe adentra novamente a floresta para cortar
as árvores marcadas. "Só são
derrubadas árvores que medem acima de quatro
palmos de roda", conta Barata. A medida de
um palmo de roda é feita esticando as mãos
abertas, unidas pelos polegares. Os quatro palmos
correspondem a cerca de 30 centímetros de
diâmetro. Depois que a árvore é
derrubada, as toras são cortadas com serrote
e carregadas nas costas, amarradas a uma mochila
de cipó, até a beira do rio. Lá,
elas permanecem até que estejam em quantidade
suficiente para serem transportadas de barco até
a usina de extração do óleo,
o que só ocorre no inverno, quando os igarapés
se tornam navegáveis. A extração
é feita pelo método de arraste a vapor,
com um equipamento semelhante a uma panela de pressão
gigantesca de 1.500 litros de capacidade. Por esse
processo, o vapor d'água passa pela planta
aromática extraindo, condensando e separando
suas essências. Todo o processo, que tem início
com a marcação da árvore e
termina com a madeira dentro da usina, leva em média
um ano. E tem um alto custo, que os donos das usinas,
na verdade ribeirinhos que sempre viveram por lá,
não têm dinheiro para bancar. Por isso
eles vendem a produção antecipadamente
para os intermediários, que a revendem para
a Europa e os Estados Unidos. Cerca de 90% da produção
é exportada. Eles vendem o extrato em tambores
de 200 litros para as casas perfumistas ao preço
de US$ 300 o litro. Aqui o produtor vende seu produto
para o intermediário por US$ 20 o litro.
Poucos conseguem exportar direto para as indústrias,
sem intermediários. Quando isso acontece,
o produtor recebe US$ 60 por litro do óleo.
As casas perfumistas do Brasil compram diretamente
da matriz, porque as compras são centralizadas.
"É uma cadeia enorme e complexa, e quem
sai perdendo é o produtor", diz Barata.
A parceria do pesquisador com os produtores resultou
num plano de manejo e extração do
óleo das folhas que começa com o cultivo
do pau-rosa consorciado com outras culturas. Como
a planta precisa ser protegida do sol no início
do seu ciclo de vida, uma das soluções
é cultivar uma árvore a cada 5 metros,
intercaladas com bananeiras. Quando as bananeiras
estão no ponto de corte, aos dois anos, o
pau-rosa está na fase em que precisa receber
sol direto. As bananas já podem ser vendidas
e outra leva de bananeiras pode ser plantada e retirada
dali a dois anos. E no quinto ano o pau-rosa já
começa a dar lucro, com a extração
do óleo das folhas. O projeto também
testa o plantio consorciado do pau-rosa com plantas
aromáticas da Amazônia, como a raiz
do vetiver, o cumaru, a copaíba e outras
como a andiroba. No início, antes de as mudas
do pau-rosa serem transplantadas para o solo, elas
são aclimatadas em viveiros protegidas por
uma cobertura de folhas de palmeiras de açaí.
Quando a palha dessa árvore se decompõe,
as plantas estão mais estruturadas e preparadas
para receber a luz solar.
Novos caminhos
Para que o projeto
dê retorno financeiro, é necessário
plantar pelo menos 10 mil mudas de pau-rosa em 30
hectares. O mesmo número de mudas que foi
plantado na área cultivada no município
de Nova Aripuanã. Outras 10 mil mudas estão
no viveiro, esperando o momento de serem transferidas
para o campo. Essa quantidade é quase 30
vezes mais do que seria necessário plantar
segundo a portaria do Ibama. Para cada tambor de
200 litros exportado o produtor é obrigado
a plantar 80 unidades de pau-rosa. Como Raul Alencar
exporta, em média, dez tambores por ano,
ele teria de plantar apenas 800 mudas. O projeto
de desenvolvimento sustentável do pau-rosa
já foi apresentado em vários congressos
internacionais e despertou o interesse de empresários
brasileiros que não querem, por enquanto,
a divulgação de seus nomes. Muitos
daqueles que plantam outras culturas também
poderiam lucrar com a produção do
óleo do pau-rosa. E, se as árvores
forem extintas, o próprio mercado consumidor
será afetado. Antes que isso aconteça,
produtores que sempre viveram dos recursos da floresta
procuram novas maneiras de extrair o que dela precisam.
O desenvolvimento sustentável foi o caminho
escolhido por comunidades amazônicas que vivem
dos recursos da extração da andiroba
e do açaí, por exemplo, que antes
corriam o risco de serem extintos. Hoje o açaí
é importante pelo fruto, e não pelo
palmito. E o óleo de andiroba é a
base de velas repelentes de insetos e de muitos
produtos cosméticos. O mesmo caminho que
pode ser seguido para a produção do
óleo das folhas do pau-rosa.
Fonte: Agência Fapesp (www.agencia.fapesp.br)
Assessoria de imprensa