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OFICINA INTERNACIONAL DISCUTE
BIOPIRATARIA NA AMÉRICA LATINA
Panorama
Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Setembro de 2005
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09/09/2005 - Evento
debate novas formas de biopirataria, como a chamada
“bioespeculação”, espécie de
reserva de mercado sobre informações
genéticas e novas moléculas. A responsabilidade
do setor acadêmico na prevenção
da biopirataria também foi alvo das discussões.
A oficina internacional
Situação da Biopirataria na América
Latina: algumas perguntas e respostas, realizada
em Bogotá, Colômbia, nos dias 1°
e 2 de setembro, reuniu especialistas, representantes
de organizações governamentais e não-governamentais
para discutir o próprio conceito de biopirataria,
suas implicações, casos emblemáticos
e a relação da sua prática
com o sistema de propriedade internacional hoje
vigente.
O evento foi promovido
pela “Iniciativa Andino Amazônica para a Prevenção
da Biopirataria”, articulação regional
que combate a biopirataria por meio de pesquisas,
criação de redes e campanhas de conscientização.
A organização pretende prevenir o
uso ilegal de recursos genéticos e conhecimentos
tradicionais, além de tentar garantir que
os procedimentos de concessão de patentes
respeitem os direitos dos povos tradicionais e as
legislações dos países provedores
desses recursos e conhecimentos. Formada também
por representantes de países como a Colômbia
e o Equador, a Iniciativa é coordenada pela
Sociedade Peruana de Direito Ambiental (SPDA) e
tem o ISA como representante no Brasil. O advogado
Fernando Mathias Baptista e o biólogo Henry
de Novion, ambos do ISA, participaram da oficina.
Durante os dois dias
do evento, foram analisados o alcance e os impactos
da biopirataria na América Latina a partir
de aspectos econômicos, culturais, políticos,
éticos e sociais. Os debates também
giraram em torno de alternativas e estratégias
para enfrentar o fenômeno nos campos jurídico
e político. Além disso, foram relatados
alguns casos conhecidos de biopirataria, como, por
exemplo, o da Ayahuasca, do Cupuaçu brasileiro,
da Maca peruana e do feijão amarelo mexicano,
entre outros - todos vegetais conhecidos e utilizados
por populações tradicionais e patenteados
sem a sua autorização.
A biopirataria é
considerada a apropriação ilegal de
recursos genéticos ou conhecimentos de populações
tradicionais (índios, quilombolas, caiçaras,
ribeirinhos, sertanejos etc.) associados à
biodiversidade para uso comercial e obtenção
de direitos de propriedade intelectual. Os conhecimentos
tradicionais são saberes seculares acerca
das propriedades medicinais de plantas e raízes,
por exemplo.
Bioespeculação
Henry de Novion conta
que um dos principais pontos discutidos pelos participantes
da oficina foi a chamada bioespeculação,
prática pela qual indústrias e pesquisadores
têm se apropriado de recursos naturais e conhecimentos
de povos tradicionais, registrando patentes sobre
essas informações, sem qualquer tipo
de inovação ou perspectiva de uso
comercial e industrial concreto, mas apenas para
criar uma espécie de reserva de mercado.
“Este tipo de procedimento é motivado por
uma expectativa de lucros futuros, quando as informações
patenteadas tiverem alguma aplicação
comercial identificada. A partir daí, o uso
e o licenciamento serão exclusividade dos
detentores das patentes, que já terão
o monopólio garantido e as informações
privatizadas. Trata-se de uma distorção
do sistema de propriedade industrial no campo da
biotecnologia”.
A patente é
um título de propriedade temporária
sobre uma invenção ou projeto de invenção
concedido pelo Estado aos inventores, pessoas ou
empresas detentoras de direitos sobre a criação.
Quando um inventor registra uma patente, ele se
obriga a revelar detalhadamente todo o conteúdo
técnico da invenção patenteada.
Uma das características principais da patente
é justamente a inovação técnica.
Novion informa ainda
que, nos fóruns internacionais sobre o assunto,
como a oficina de Bogotá, formas de se evitar
a biopirataria e a bioespeculação
têm sido discutidas. Entre elas, destacam-se,
por exemplo, as de se exigir do interessado na patente
a declaração de origem do acesso aos
recursos genéticos ou conhecimentos tradicionais
associados (país, povos e comunidades acessadas),
além da obrigação de identificar
as espécies utilizadas no acesso. “Outro
mecanismo em discussão é o de se criar
um sistema de certificação usando
códigos e sistemas de rastreamento digital,
possibilitando confirmar se o acesso foi feito de
forma legal ou não”, completa Novion. Ele
lembra ainda que estes mecanismos de rastreamento
estão atualmente no cerne da discussão
sobre a criação de um regime internacional
de acesso e repartição de benefícios
da biodiversidade, no âmbito da Convenção
da Diversidade Biológica (CDB), cuja próxima
Conferência das Partes será no Brasil,
em março de 2006.
As organizações
que fazem parte da “Iniciativa Andino Amazônica
para a Prevenção da Biopirataria”
pretendem continuar um trabalho sistemático
de desenvolvimento de metodologias de busca de patentes
e identificação de casos de biopirataria
em cada país. A intenção é
acumular o maior número possível de
casos concretos para elaborar propostas sobre o
tema em fóruns internacionais.
O papel do
setor acadêmico
Outro ponto discutido
em Bogotá foi a responsabilidade das universidades
e dos cientistas frente ao tema, especialmente em
razão da excessiva aproximação
das instituições públicas de
pesquisa com o setor privado. Para muitos dos participantes
da oficina, essa aproximação vem comprometendo
o processo de tomada de decisões sobre as
prioridades de investimento em pesquisa de interesse
público. A responsabilidade dos cientistas
para com povos indígenas e comunidades locais
foi ressaltada como condição para
estabelecimento de relações pautadas
em princípios éticos entre os dois
segmentos.
Diante da falta de
informação do setor acadêmico,
surgiram propostas de cursos e disciplinas de política
e legislação sobre acesso a recursos
biológicos e conhecimentos tradicionais para
pesquisadores e sociedades científicas em
geral. Sugeriu-se também fazer um levantamento
sobre a cadeia de financiadores de pesquisas para
conscientizá-los da necessidade de se exigir
que as pesquisas declarem as espécies, a
origem dos recursos genéticos e dos conhecimentos
tradicionais acessados, como condição
para obter financiamento.
Fonte: Instituto Socioambiental
(www.isa.org.br)
Assessoria de imprensa