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CIMI: INDÍGENA ASSASSINADO
NO ACRE
Panorama
Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Outubro de 2005
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05/10/2005 - O indígena
Alberto da Silva Katukina foi assassinado na tarde
de domingo, 2 de outubro. O professor e liderança
do povo Katukina que vive na terra indígena
Katukina do Campinas, próxima à BR
364, no Acre, foi degolado.O conflito causou também
o falecimento de um não-índio e mais
cinco pessoas ficaram feridas.
Os conflitos nesta região do Acre, próxima
à cidade de Cruzeiro do Sul, passaram a ser
mais freqüentes depois da construção
da BR 364, que corta a terra indígena, e
depois da instalação de um assentamento.
Segundo explica a equipe local do Cimi, as divergências
entre indígenas, assentados e fazendeiros
da região não são novas, pois
os não índios costumeiramente invadem
a terra dos índios para a prática
de caça. O problema já foi diversas
vezes denunciado, mas nunca os órgãos
federais tomara providências.
O Cimi chama atenção a respeito das
indenizações pelas obras da BR 364,
que foram anunciadas mas não têm sido
concretizadas, e assinala o total abandono da terra
indígena do Campinas no que se refere às
fiscalizações e o combate às
invasões. “Salientamos aqui que nas equipes
de governo responsáveis pela execução
das obras não há um único antropólogo
ou alguém que tenha alguma formação
específica para desempenhar o trabalho relacionado
ao componente indígena”, afirma a equipe
local do Cimi no texto que segue abaixo.
Na noite de ontem, dia 4, os Katukina reuniram-se,
em sua aldeia, o Secretário Especial Indígena,
Administração regional da Funai e
o advogado do órgão, Dr. Levi. Os
índios ameaçam retroceder no acordo
firmado para a execução das obras
por considerarem que o governo não vem cumprindo
adequadamente com o que ficou estabelecido em audiência
pública. A comunidade se encontra fragilizada
e perseguida, agora de forma mais explícita,
pelos antiindígenas
Há ainda um aspecto mais grave que está
relacionado ao sentimento de vingança. A
situação é tão grave
que os indígenas preferiram sepultar o Alberto
Katikina no cemitério público para
não leva-lo à aldeia para que não
fossem acirrados ainda mais os ânimos dos
parentes mais próximos, pois o sentimento
de perda é muito forte.
Segue o texto da equipe do Cimi com detalhes dos
conflitos:
Dos fatos que culminaram no assassinato do índio
Alberto Rosa da Silva Katukina
1) Antecedentes:
O assentamento do Incra conhecido como Santa Luzia
faz divisa com a terra indígena dos Katukina.
Como os lotes ocupados pelos assentados tiveram
como prioridade de investimento a formação
de pastagem para a criação de gado,
em toda a área não há animais
que possam ser caçados, exceto na terra dos
índios. Além do assentamento, toda
a área em torno da terra indígena
é formada por fazendas que têm como
prioridade a criação de gado para
o abate e comercialização na sede
do município de Cruzeiro do Sul. O conflito
com os parceleiros do Incra e com fazendeiros da
região não é novo, pois estes
costumeiramente invadem a terra dos índios
para a prática de caça, o que sempre
resulta em desentendimentos e, apesar das denúncias,
providência nenhuma é tomada.
Com a pavimentação da BR 364, que
corta a terra indígena dos Katukina do Campinas
ao longo de seus 18 km de extensão, algumas
medidas mitigadoras, emergenciais e indenizatórias
foram estabelecidas a partir dos estudos de impacto
ambiental elaborados na ocasião do licenciamento
para as obras.Apenas algumas dessas medidas “emergenciais”
foram realizadas, entre elas a construção
de escolas, abertura de três açudes
para a criação de peixes e um veículo
Toyota Bandeirante. O auxílio real aos indígenas
ainda é pequeno e está longe de representar
uma indenização. Mesmo assim, para
os não-índios da região, os
pobres e igualmente abandonados, a propaganda tem
sido muito grande no sentido de dizer que o Governo
tem prestado toda sorte de assistência aos
índios. Essa falsa assistência tem
gerado grande ciúme entre os não-índios,
que sempre tratara os indígenas com muito
preconceito.
A situação piorou muito em razão
de a BR ser uma porta de entrada à terra
indígena e meio fácil de fuga dos
diversos tipos de invasores. Por essas razões,
os conflitos passaram a ser mais freqüentes
e mais violentos.
Há cerca de três meses um grupo de
caçadores não-indígenas, moradores
do assentamento Santa Luzia, tiveram seus instrumentos
de caça retidos pelos índios dentro
da terra indígena. Foram liberados posteriormente,
mas os Katukina disseram que não mais tolerariam
a invasão de suas terras. Diante do fato
de os Katukina reprimirem a caça, foram ameaçados
no sentido de que quando fossem pegos fora da terra
indígena pagariam por isso.
2) Do ocorrido no dia 02, domingo:
No domingo, 2 de outubro, pela manhã, os
Katukina se reuniram na aldeia para uma partida
de futebol. Após o futebol, por volta das
10h30 da manhã, foram à casa do senhor
Claudio Fidelis da Silva, proprietário de
uma pequena localidade distante uns três quilômetros
da terra indígena. Dirigiram-se a essa propriedade
por que lá há um igarapé que
forma uma pequena represa utilizada para banhos,
conhecido como balneário.
Percebendo a chegada dos índios, alguns não-índios
se dirigiram também ao mesmo balneário
e se postaram em uma mesa próxima a dos índios
sem no entanto, manterem contatos físicos
e nem verbais. Segundo depoimento do próprio
proprietário, os não-índios
já chegaram ao local visivelmente embriagados,
o mesmo não se dizia dos índios que
vieram na Toyota da comunidade em total sobriedade.
Durante a permanência no local os índios
teriam bebido algumas cervejas compradas no próprio
balneário.
Próximo às 18h00, Adriano Katukina,
que dirigia a Toyota, percebendo o adiantado da
hora, convidou os demais companheiros para retornarem
à aldeia. A esse movimento de convite ao
retorno, os não-índios que estavam
observando a movimentação, saíram
do balneário e se dirigiram à BR a
cerca de 100m, onde ficaram à espreita dos
índios que passariam por ali para voltarem
à aldeia.
Assim, quando o veículo dos indígenas
passava pelo local onde estavam, foi atingido por
pedras e por uma garrafada que terminou por quebrar
o vidro do lado do motorista atingindo Adriano que
alguns metros à frente teve que parar o veículo.
Assim que o veículo parou, os não
índios vieram correndo em direção
ao carro munidos de facas, facões, paus e
outros. Todos os índios desceram e começou
uma briga generalizada. Em depoimento à polícia,
Sr. Cláudio, dono do comércio onde
os grupos estavam, disse que ouviu um não-índio
gritar: “já degolei um”, mas que não
dava para ver pois já estava escuro. Reconheceu
que não era índio pela forma de falar,
pois os Katukina não são bons falantes
do português. Alberto Katukina fora degolado
e constam ainda duas perfurações por
faca na altura da virilha e escoriações
pelo corpo. Não há precisão
na causa da morte do não-índio Francisco
Jesus da Silva. Não se sabe se faleceu ao
ser atingido pelo veículo ou por algum golpe
de pau desferido contra sua cabeça. O fato
é que os índios não estavam
armados. Entraram novamente no carro e se dirigiram,
no sentido contrário à aldeia, até
um posto de saúde, já no município
de Rodrigues Alves, onde os feridos foram atendidos.
Ao retornarem foram presos e conduzidos à
delegacia de Cruzeiro do Sul onde prestaram depoimento.
Cinco indígenas e três não índios
foram presos.
3) Conseqüências:
Ontem, os Katukina estão reuniram-se com
o Secretário Especial Indígena, com
a administração regional da Funai
e o advogado da Funai, Dr. Levi. Os índios
ameaçam retroceder no acordo firmado para
a execução das obras por considerarem
que o governo não vem cumprindo adequadamente
com o que ficou estabelecido em audiência
pública. A comunidade se encontra fragilizada
e perseguida, agora de forma mais explícita,
pelos antiindígenas. Há uma emissora
de rádio FM local, de propriedade de um grande
comerciante, que tem dado muita ênfase ao
discurso antiindígena. Pregam que a estrada
é progresso e que os índios são
um empecilho a tal progresso.
Os índios afirmam que podem voltar a fechar
a estrada por ser esta a única arma que dispõem
no momento. Há ainda um aspecto mais grave
que está relacionado ao sentimento de vingança.
A situação é tão grave
que preferiram sepultar o Alberto no cemitério
público para não leva-lo à
aldeia para que não fossem acirrados ainda
mais os ânimos dos parentes mais próximos,
pois o sentimento de perda é muito forte.
A situação que já não
era boa piorou e pode piorar ainda mais se nada
for feito para retirar a população
que vive às margens da BR, índios
e não-indios, do abandono em que se encontram.
Cimi Regional Amazônia Ocidental
Equipe de Cruzeiro do Sul
Fonte: CIMI – Conselho Indigenista
Missionário (www.cimi.org.br)
Assessoria de imprensa