20/10/2005
- Ativistas do Greenpeace escalaram hoje a
fachada do Museu Nacional Reina Sofia, em
Madri, na Espanha, para abrir um banner denunciando
o uso de 6 mil m2 da madeira amazônica
jatobá nas obras de ampliação
do Museu. A madeira – que agora decora pisos,
divisórias, forro e prateleiras do
prédio, projetado pelo badalado arquiteto
francês Jean Nouvel – foi extraída
na região de Altamira, no Pará,
por madeireiras envolvidas em ilegalidades
e desmatamento. A empresa Dragados, responsável
pela obra, pertence ao grupo ACS (Actividades
de Construción y Servicios) e tem como
presidente Florentino Perez, também
presidente do time de futebol Real Madrid.
Várias faixas foram abertas dentro
e fora do museu por 41 ativistas.
O
Greenpeace entregou o relatório
‘Crime no Museu’ (veja íntegra
em espanhol) às autoridades e
empresas espanholas. O texto descreve
a fragilidade dos documentos oficiais
apresentados por empresas de países
produtores e a necessidade de normas
mais rígidas para evitar a entrada
de madeira predatória e ilegal
na Europa. O Reina Sofia, de 84 mil
m2 , é o mais importante museu
de arte contemporânea da Espanha
e abriga obras famosas
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como o ‘Guernica’ de
Picasso. As obras da expansão, concluídas
no último dia 26 de setembro, duraram
três anos. O jatobá foi utilizado
nas salas de acervo, nos salões de exibição
e até mesmo nos escritórios do
novo prédio. O relatório revela
toda a cadeia de comercialização
da madeira utilizada no Museu e mostra que compromissos
ambientais assumidos por grandes grupos corporativos
e governos não são verdadeiros.
A empresa Dragados comprou a madeira da Maderas
Besteiros, tradicional importadora de madeira
da Amazônia brasileira. Três indústrias
do Pará forneceram a madeira que decora
o Museu na Espanha: Madeireira São Marcos
Ltda de Uruará, Hélio Lorenzoni
ME (com o nome fantasia de Serraria São
José) e Madeireira Santa Clara Ltda Todas
são de Altamira e de membros da família
Lorenzoni. Mesmo com a falta de estrutura do
Ibama e da polícia ambiental do Pará,
as empresas que venderam a madeira chegaram
a ser flagradas várias vezes com madeira
ilegal, nas poucas operações que
aconteceram na região no período.
Estudo recente do Imazon
(Instituto do Meio Ambiente e do Homem da
Amazônia), aponta que o volume de toras
destinada a serrarias e laminadoras em 2004
na região foi de 24,6 milhões
de metros cúbicos. Comparando com o
autorizado para exploração pelo
Ibama e os órgãos estaduais
concluímos que 59% foi ilegal. “Se
considerarmos que muitos planos de manejo
autorizados também não cumprem
todas as normas, a estimativa de madeira ilegal
gira entre 60% a 80%”, disse Marcelo Marquesini,
engenheiro florestal da Campanha da Amazônia
do Greenpeace, que participou da ação
em Madri. “Com estes números, o histórico
das empresas fornecedoras e a fragilidade
do sistema de controle da produção
de madeira adotado pelo governo brasileiro,
não há como garantir que a madeira
utilizada no Museu seja legal, que não
tenha sido esquentada”, complementou.
A Madeireira São
Marcos situada em Uruará, na rodovia
Transamazônica, está em nome
de Valber Falqueto e foi multada quatro vezes
entre 2002 e 2004 por beneficiar madeira sem
documentação e manter em seu
pátio produto ilegal. Uma multa de
agosto de 2004 está relacionada a 441
m3 de jatobá ilegal em seu pátio,
a mesma espécie exportada para a Europa
para uso no Museu. Hélcio Lorenzoni
ME e a Madeireira Santa Clara Ltda estão
situadas no mesmo endereço em Altamira
e pertencem ao mesmo proprietário,
Paulo Lorenzoni. Estas empresas também
foram multadas entre 1998 e 2004 por obter,
processar e transportar madeira sem documentação.
O Greenpeace exige dos países
da União Européia a adoção
de medidas mais sérias contra a importação
de madeira ilegal facilmente esquentada nos
países produtores. Para as empresas
exportadoras e importadoras somente a comercialização
de madeira certificada pelo FSC – um mecanismo
não-governamental e independente -
pode garantir a origem não predatória
e legal da madeira. No Brasil, o Greenpeace
quer a presença permanente do governo
para garantir governança e cumprimento
da legislação ambiental na Amazônia,
o que não acontece hoje.