13/02/2006 - Os negociadores
brasileiros querem aproveitar a 8ª Conferência
das Partes da Convenção sobre
Diversidade Biológica da ONU (COP-8),
que acontece em março, em Curitiba,
para acelerar a negociação de
um documento com as linhas mestras do chamado
Regime Internacional para Acesso e Repartição
de Benefícios. "Existe disposição
para avanços", afirmou nesta segunda-feira
(13) o gerente de Recursos Genéticos
do Ministério do Meio Ambiente (MMA),
Rubens Nodari. Ele é um dos palestrantes
do curso de capacitação para
profissionais de imprensa que cobrirão
a COP-8. O evento, que termina nesta terça-feira
(14), é promovido por MMA, prefeitura
de Curitiba e governo do Paraná.
O estabelecimento de um documento para a negociação
do regime foi objeto de intensos debates em
Granada (Espanha), no final de janeiro, durante
a última reunião preparatória
para a COP-8. A Convenção sobre
a Diversidade Biológica (CDB), aprovada
na Rio-92, aponta a necessidade de regras
para o acesso aos recursos genéticos
provenientes dos conhecimentos tradicionais
e indígenas e prevê a repartição
dos benefícios econômicos e sociais
derivados da utilização desses
recursos. Mas ainda não há consenso
sobre o tema. Países em desenvolvimento
e desenvolvidos estão divididos em
torno da proposta. "É uma negociação
difícil e polarizada", destaca
Cristina Azevedo, coordenadora técnica
do Departamento de Patrimônio Genético
do Ministério do Meio Ambiente.
De um lado, estão a maioria dos países
em desenvolvimento e o grupo dos megadiversos,
onde se inclui o Brasil. Estas nações
querem acelerar a negociação
e defendem a adoção de um texto
concreto, em forma de protocolo vinculante,
com as obrigações para os países
signatários da CDB e também
as sanções aplicáveis
àqueles que não cumprirem essas
obrigações. De outro lado, no
entanto, a maioria dos países ricos
prefere uma negociação mais
lenta, um texto mais abrangente e um regime
voluntário.
No final do encontro de Granada, segundo Cristina,
os negociadores saíram com um texto
de referência com oito páginas,
mas cheio de colchetes (pontos em que não
há acordo). Este documento será
recomendado à COP-8 como a base para
a continuidade das negociações
sobre a natureza do regime (se vinculante
ou não), seus objetivos, escopo e elementos.
Um dos principais pontos, defendido pelo Brasil,
é a necessidade da criação
de um certificado internacional que comprove
a procedência legal do recurso e dos
conhecimentos tradicionais utilizados.
Os negociadores acreditam que há disposição
de vários países para avançar
a negociação do regime. O fato
de o país sede da Conferência
das Partes, no caso o Brasil, assumir a presidência
da CDB por dois anos, é um sinal alentador.
"O que está em jogo são
questões complexas e delicadas, que
envolvem diversos setores e temas, como propriedade
intelectual. Talvez o regime internacional
não saia este ano, mas vamos trabalhar
para avançar nesta direção
durante a COP-8", destaca Cristina.
Importância para o Brasil
O estabelecimento de regras para o acesso
e repartição de benefícios
é de vital importância para um
país megadiverso como o Brasil, detentor
de cerca de 15% a 20% de todas as espécies
existentes no Planeta. Segundo apresentado
nesta segunda-feira pela coordenadora técnica
do Departamento de Patrimônio Genético
do Ministério do Meio Ambiente, Cristina
Azevedo, das 150 drogas mais indicadas nos
Estados Unidos, 57% contêm ao menos
um componente derivado de recursos genéticos,
sem que nenhum retorno significativo tenha
sido observado aos países provedores.
O uso de conhecimentos tradicionais, segundo
Cristina, é visado não apenas
por suas propriedades, mas por acelerar o
desenvolvimento de produtos e reduzir o volume
de investimentos em pesquisas por parte das
empresas. Ela aponta que de cada 10 mil amostras
de substâncias analisadas, apenas uma
demonstra utilidade, o que faz com que uma
pesquisa para lançamento de um novo
produto possa levar até 15 anos, com
custos entre US$ 230 milhões e US$
500 milhões. "Quando a indústria
parte de um conhecimento tradicional, esse
processo é encurtado", destaca.
Pesquisas apontam que 75% dos 120 compostos
ativos amplamente utilizados pela medicina
apresentam correlação positiva
com o uso tradicional das plantas das quais
derivam.