04/03/2006
– A possibilidade de grupos estrangeiros entrarem
no Brasil para produzir álcool é
bem vista pela União da Agroindústria
Canavieira de São Paulo (Unica). De
acordo com o diretor técnico da entidade,
Antonio de Pádua Rodrigues, se há
interesse dos mercados estrangeiros em produzir
no país é porque o produto já
atingiu um nível de excelência
e por isso vem sendo valorizado, principalmente
por grupos privados. Em entrevista à
Agência Brasil, Pádua falou ainda
sobre os estoques reguladores que, para ele,
devem ser estimulados, não apenas para
garantir estabilidade nos preços, mas
também volume de oferta em momentos
críticos.
Agência Brasil:
Qual é a avaliação da
Unica sobre o interesse de mercados estrangeiros
em entrar no Brasil para produzir álcool?
Antonio de Pádua Rodrigues:
Nós achamos positivo, porque se existe
alguém de fora querendo produzir álcool
no Brasil é sinal de que nosso produto
é bom, que o nosso negocio é
bom. Não temos que nos preocupar, é
sinal de que nosso negócio está
sendo valorizado. Toda essa expansão
que está acontecendo hoje não
é de grupo estrangeiro, é de
grupo privado. Existem alguns financiamentos
estrangeiros, mas o nível de gerência
e unidade produtora de capital estrangeiro
hoje não chega a cinco unidades num
universo de 350 unidades. Então prevalece
o capital nacional. Esse interesse do capital
estrangeiro em vir produzir álcool
no Brasil é positivo porque mostra
que nosso negócio vale dinheiro.
ABr: Como se seria
a formação de estoques de álcool
no Brasil? Quem arcaria com as despesas?
Pádua Rodrigues: Nós
entendemos que isso é uma responsabilidade
do setor privado. Na verdade nós já
fazemos isso, nós já carregamos
estoque. Nós produzimos em seis meses
para comercializar esse produto em 12 meses.
Então todo produto que é comercializado
na entressafra já é carregado
pelo próprio produtor com custo ou
de capital próprio do produtor ou custo
do setor privado com taxas de juros normais.
O que nós estamos pleiteando desde
2000 é que o setor privado permita
a ele fazer uma concentração
desses estoques. Na verdade esses estoques
existem, eles são diluídos em
cada unidade produtora e em cada unidade produtora
você acaba não tendo o controle.
Então nosso pleito é que se
permita que se faça uma concentração
dos estoques e esse estoque regulador teria
a função de não deixar
que o preço caísse tanto no
início da safra e que também
não se tornasse tão alto no
período da entressafra.
ABr: Seria interessante
criar um mecanismo de financiamento para isso?
Pádua Rodrigues: O financiamento
já existe. Na verdade o que aconteceu
nesses últimos anos é que existe,
dentro da legislação brasileira,
uma possibilidade do uso do recurso da Cide
(Contribuição de Intervenção
no Domínio Econômico) para financiar
estoque e para uma série de atividades
relacionadas à questão do meio
ambiente e da produção de álcool.
O governo de anos anteriores acabou disponibilizando
um financiamento de R$ 500 milhões
aos produtores com uma taxa de juros subsidiada.
O governo subsidiou uma taxa de juros entre
12% a 13 % que é o que o produtor pagava.
Já a taxa de juros do sistema bancário
quitado em 20% e com isso ele financiava a
produção na safra, o setor vendia
na entressafra e pagava o recurso ao governo,
aos bancos que financiaram, de tal forma que
o dispêndio que houve para o tesouro
não passou de R$ 35 milhões
por ano.
Agora isso é muito
pouco perante o nível de estoque que
existe já nas unidades. O fato de nós
produzirmos em seis meses, vendendo em 12
meses no meio da safra, quando termina a safra
que é o pico da estocagem, nós
temos 50% da produção estocada,
nós temos sete, oito bilhões
de litros que nós já carregamos.
Então não é isso que
vai resolver. Nós precisos resolver
e permitir que se faça esse estoque
regulador, que se entende que não é
uma concentração de oferta.
O entendimento do Cade (Conselho
Administrativo de Defesa Econômica)
é que essa concentração
de oferta destrói o mecanismo de mercado,
ou seja, o mercado não flui livremente.
Eles entendem que o preço tem que cair
quando o mercado é ofertado e tem que
subir quando o mercado não é
ofertado. Isso é muito ruim para um
produto que, apesar de ser agrícola,
é um produto com fins energéticos.É
difícil que o consumidor entenda essa
volatilidade de preços. Hoje, muito
baixo ao produtor e muito competitivo ao consumidor
e depois muito bom ao produtor e pouco competitivo
ao consumidor. Então precisa desse
mecanismo para o álcool competir com
a gasolina, para que haja regulação
desse mercado. Além disso, precisa
também ter um outro volume em estoque
que não é o estoque regulador.
E também o volume que tem que ter para
tentar equilibrar desequilíbrios que
possam ocorrer ou por uma quebra agrícola
por condições climáticas
ou por um excesso de demanda não esperado.
Então não é só
a questão do regulador, mas é
também um volume para que haja garantia
de abastecimento em momentos críticos.
ABr: No início
do Pró-álcool houve estoques
reguladores?
Pádua Rodrigues: Nuca houve.
O álcool foi até 1998 um produto
com uma intervenção total pelo
governo. O governo dava o preço ao
produtor e dava o preço ao consumidor,
então era um produto totalmente administrado.
Existiam cotas de produção,
mas nunca houve estoque regulador nem no período
de intervenção nem no período
de livre mercado. O preço era estável
porque era preço administrado. No momento
em que o preço foi liberado porque
foi para o mercado se tornou essa gangorra
de um nível de preço na safra
e outro na entressafra.