23/10/2006
- Em nove anos, 9,5 milhões de hectares
de floresta poderão desaparecer na
Bacia do Xingu – o equivalente ao território
de Santa Catarina. A previsão consta
de um levantamento produzido pelo ISA e apresentado
em um seminário técnico promovido
pelo governo federal, no dia 18 de outubro.
Entretanto, se multiplicarem iniciativas como
as que estão acontecendo no âmbito
da Campanha Y Ikatu Xingu, pela preservação
e recuperação das matas ciliares
do rio Xingu, tais previsões podem
se alterar.
Sem contar Unidades de Conservação
(UCs) e Terras Indígenas (TIs), dentro
de nove anos, a Bacia do rio Xingu poderá
ter proporcionalmente menos floresta do que
a região metropolitana de São
Paulo hoje, ou seja, menos de 30% de remanescentes
florestais. Em 2015, a Bacia do Xingu no Pará
poderá contar com apenas 28% de sua
cobertura vegetal original se o ritmo do desmatamento
na região continuar na velocidade registrada
nos últimos anos. Os remanescentes
podem chegar a 29,2% em território
mato-grossense da bacia. Isto pode significar
uma perda de 9,5 milhões de hectares
de florestas, o equivalente ao território
de Santa Catarina.
O cálculo foi feito
projetando para 10 anos a média estimada
dos desmatamentos para as duas sub-regiões
entre 2003 e 2005. Neste período, foram
desmatados, em média, 228,4 mil hectares
na parte mato-grossense da Bacia e 147,7 mil
hectares na parte paraense. As estimativas
são de levantamento realizado pelo
Instituto Socioambiental (ISA) com base em
números do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe).
O rio Xingu nasce no nordeste
do Mato Grosso e atravessa o Pará até
desembocar no Amazonas, na altura do município
de Porto de Moz, depois de 2,7 mil quilômetros.
Sua Bacia tem 51,1 milhões de hectares,
sendo que 28 milhões de hectares (54,7%)
estão protegidos por um conjunto de
TIs e UCs contíguas. Trata-se de um
dos maiores corredores de biodiversidade do
mundo e o segundo maior do Brasil, muito importante
para a conservação, por se tratar
de uma ligação entre os dois
maiores biomas nacionais (a Amazônia
e o Cerrado), e fundamental para a manutenção
das populações de inúmeras
espécies, várias endêmicas.
Dos 17,7 milhões de hectares da parte
mato-grossense da bacia, cerca de 5,5 milhões
de hectares (quase um terço) foram
desmatados até 2005.
Eficácia
O levantamento do ISA analisou
o impacto das UCs, das TIs e de algumas obras
de infra-estrutura no desflorestamento na
Amazônia. Foi apresentado na quarta-feira,
dia 18 de outubro, durante o 4º Seminário
Técnico-científico sobre os
dados referentes ao Desmatamento na Amazônia
promovido pelo governo federal, em Brasília.
O evento teve o objetivo de discutir os números
sobre o desmatamento para o período
entre 2004 e 2005 e contou com a presença
de 36 organizações não-governamentais,
ministérios, órgãos governamentais
federais e estaduais, e da ministra do Meio
Ambiente, Marina Silva. Representantes do
museu paraense Emílio Goeldi, do WWF
e do Instituto do Meio Ambiente e do Homem
da Amazônia (Imazon), entre outros,
apresentaram dados e informações
sobre as tendências do desflorestamento,
seus pontos críticos, áreas
prioritárias para conservação
e recomendações às políticas
ambientais do governo.
O trabalho do ISA reafirma
a eficácia de TIs e UCs na contenção
do desflorestamento, apesar das invasões
e saques de madeira sofridos nas principais
regiões de expansão da fronteira
agropecuária. Entre 2000 e 2005, o
percentual anual de desmatamento fora das
áreas protegidas foi em média
sete vezes superior aos desmatamentos dentro
delas. Já em territórios indígenas
foi 2,5 vezes menor do que nas unidades de
conservação de proteção
integral (Estações Ecológicas,
Parques Nacionais e Reservas Biológicas)
no mesmo período. Nas áreas
não-protegidas, o percentual médio
anual da derrubada da mata foi de 1,12%, entre
2000 e 2005. Nas UCs federais de proteção
integral, o índice foi de 0,19% e nas
TIs de 0,07%.
O estudo do ISA inclui recomendações
para aprimorar o plano de combate aos desmatamentos
na Amazônia, do Ministério do
Meio Ambiente. Entre elas a realização
de avaliações públicas
e periódicas do plano, contando com
a participação das organizações
da sociedade civil. Para isso, seria necessário,
de acordo com André Lima, advogado
do ISA e um dos autores do levantamento, "elaborar
indicadores consistentes para avaliar as ações
de fiscalização do Ibama (Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis) e dos órgãos
ambientais estaduais."
Pela recuperação
das matas ciliares do Xingu
A análise reforça
a relevância de iniciativas como as
que vêm sendo promovidas pela Campanha
Y Ikatu Xingu, organizada pelo ISA, vários
parceiros e organizações locais.
Estudos sobre a situação de
saneamento, sobre os assentamentos rurais,
a implantação de viveiros de
mudas para a reflorestação,
a formação de agentes multiplicadores
socioambientais, ações de reordenamento
territorial são algumas das experiências
que estão se disseminando pelos municípios
da bacia e mobilizando centenas de pessoas.
Iniciativa inédita
Em uma iniciativa inédita,
representantes de 13 empresas, institutos
de pesquisa e organizações não-governamentais
reuniram-se em São Paulo, na quinta-feira,
dia 19 de outubro, justamente para discutir
alternativas ao desmatamento na Amazônia.
O evento teve o objetivo de promover um diálogo
entre atores e organizações
que tradicionalmente estão em lados
opostos na questão ambiental para identificar
possíveis propostas comuns para o aperfeiçoamento
das políticas públicas voltadas
ao problema. A intenção é
realizar novas reuniões, entre o fim
deste ano e o início do próximo,
convidando outras organizações
e movimentos sociais da região.
Os participantes do encontro
destacaram a necessidade de aprofundar o debate
sobre o modelo de desenvolvimento vigente
na Amazônia hoje, levando em conta não
apenas as demandas do setor produtivo, mas
principalmente das populações
locais, tradicionalmente excluídas
no processo de distribuição
da riqueza. Também foi considerado
urgente produzir estudos e indicadores para
valorar a floresta em pé, seu patrimônio
genético e seus serviços ambientais,
entre outros temas.
O encontro foi promovido
pelo ISA, pela SBPC (Sociedade Brasileira
para o Progresso da Ciência) e pelo
Instituo Ethos. Estiveram presentes representantes
dos grupos empresariais Bunge, Orsa e Nokia,
da Federação de Agricultura
e Pecuária do Estado de Mato Grosso
(Famato), da Associação dos
Produtores de Soja do Estado de Mato Grosso
(Aprosoja), do Instituto de Pesquisa Ambiental
da Amazônia (Ipam), do Instituto Centro
de Vida (ICV), do Amigos da Terra, Greenpeace
e do Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS).
ISA, Oswaldo Braga de Souza.