08-11-2006
- Belém (PA) - Derrotado nas urnas,
governo Jatene destina a madeireiros área
que comunidades tradicionais querem proteger
para uso sustentável
O governo estadual do Pará
anunciou hoje que pretende criar uma Floresta
Estadual (Flota) e uma Área de Preservação
Ambiental (APA) nos municípios de Prainha,
Uruará e Medicilândia, entre
a Transamazônica e o rio Amazonas .
As duas áreas vão beneficiar
madeireiros que se instalaram irregularmente
na região, prejudicando as comunidades
locais que há tempos vêm reivindicando
a criação de duas reservas extrativistas
na região. Tanto Flotas quanto APAs
permitem a exploração em escala
industrial de madeira. Entre as madeireiras
beneficiadas está a Madenorte, denunciada
no relatório do Greenpeace O Estado
de Conflito por envolvimento com grilagem
e madeira ilegal (veja aqui o mapa dos planos
de manejo na região).
O Greenpeace, Conselho Nacional
dos Seringueiros (CNS) e a Comissão
Pastoral da Terra (CPT) enviaram uma carta
ao governador Simão Jatene para protestar
contra a decisão – “precipitada e unilateral”
- que põe em risco a floresta e a população
que dela depende para sobreviver.
“Consideramos que a decisão
do governo Simão Jatene, no apagar
das luzes de seu mandato, caracteriza uma
agressão ao direito das comunidades
tradicionais que vivem na região e
que há anos vêm lutando pela
criação das reservas extrativistas
Renascer, no município de Prainha,
e Curuatinga”, diz a carta.
A criação
da reserva extrativista Renascer está
prevista no Plano de Ação
para Prevenção e Controle do
Desmatamento do governo federal e deveria
ter sido criada entre 2005-2006. Nas últimas
semanas, as comunidades de Prainha reagiram
à exploração ilegal de
madeira na área, bloqueando o rio Uruará
para impedir o transporte de toras. No conflito,
uma balsa de madeira ilegal foi queimada.
Duas outras balsas foram retidas pelas comunidades.
Segundo o Conselho Popular da região
do Uruará, mais de 12 madeireiras exploram
a floresta ilegalmente e usam o rio Uruará
para transportar as toras até o rio
Amazonas sem que as autoridades tenham feito,
até agora, algo de efetivo para conter
o saque aos recursos florestais.
O estopim do confronto na
região da Renascer foi a morte de um
jovem da vila de Santa Maria do Uruará,
há um mês, atropelado por uma
carreta de uma das empresas madeireiras. Como
resposta, os comunitários bloquearam
o rio Uruará e detiveram cinco balsas
com madeira ilegal, que foram depois apreendidas
pelo Ibama. A madeireira Tigre Timber chegou
a apresentar documentos (DOFs), que segundo
o Ibama não comprovavam a legalidade
da madeira.
De acordo com o Conselho
Popular de Uruará, autoridades locais,
como o prefeito da cidade, Joaquim Vieira
Nunes (PSDB), são contra a criação
da reserva Renascer, em Prainha, ou qualquer
medida conservacionista e não escondem
seu apoio aos madeireiros. Comunitários
denunciam que a polícia local tem dado
cobertura aos madeireiros nos últimos
meses. Eles relataram que, mesmo sendo madeira
ilegal, policiais militares acompanham o transporte
das cargas nos barcos-empurradores ou liberam
as balsas apreendidas pelos comunitários
durante os protestos. Os comunitários
temem retaliações, já
que várias lideranças já
foram ameaçadas de terem suas casas
incendiadas.
O Greenpeace esteve na região
e documentou a intensa retirada de madeira
e desmatamentos ilegais em áreas planas
– aptas para o plantio de soja – vindos da
Gleba Pacoval, na região de Santarém.
Mais de mil quilômetros de estradas
ilegais construídas por madeireiros
já interligam os municípios
de Uruará, Placas, Medicilândia,
Santarém e Prainha.
“É lamentável
que, nos últimos dias de mandato, o
governador Simão Jatene faça
um arrastão no maior patrimônio
ambiental do país para beneficiar madeireiras
em nome de um suposto progresso que nunca
beneficia a população local”,
disse Paulo Adário, coordenador da
campanha da Amazônia, do Greenpeace.
“É preciso dar oportunidade para que
o próximo governo estadual possa analisar,
junto com o governo federal e as comunidades
locais, a proposta de criação
das reservas extrativistas Renascer e Curuatinga,
há tanto tempo reivindicadas pelos
habitantes da região”, disse Tarcísio
Feitosa, da CPT.