Manaus
(06/11/06) - Mãos calejadas. Pele curtida
pelo sol. Vida dura de trabalho do interior
da Amazônia. Alma livre e sonhadora.
Este perfil se revelou um terreno fértil,
que esperava apenas a semente artística
ser plantada, para brotar dezenas de obras
de arte belíssimas. A semente foi plantada
na semana passada durante a oficina “Arte
& Floresta”, na Reserva Extrativista (Resex)
do Baixo Juruá, quando 25 comunitários
puderam deixar de lado seus afazeres diários
para se dedicar às atividades artísticas.
A oficina foi financiada
pelo Programa Áreas Protegidas da Amazônia
(Arpa) e promovida pelo Instituto do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama) e pelo artista plástico Marcius
Lima, que estimulou os comunitários
a soltarem a imaginação para
vivenciar uma experiência nunca antes
imaginada por eles, a de virar artista por
alguns dias.
De acordo com a chefe da
Reserva Extrativista, Maria Gorete Pinto,
o objetivo da oficina foi promover a integração
das comunidades que compõem a reserva,
além de oferecer mais uma boa alternativa
de geração de renda ecologicamente
correta aos comunitários. “Essa foi
uma lição de educação
ambiental para eles, que descobriram como
transformar os materiais mortos da floresta
em obras de arte, valorizando a floresta e
se sensibilizando para a importância
da conservação”, enfatiza Gorete.
Durante quase dez dias,
os participantes da oficina transformaram
um velho galpão cedido pela Prefeitura
de Juruá em uma linda escola de sonhos
e descobertas. Nesse ambiente, eles aprenderam
como transformar sementes, fibras, cipós,
cascas de árvore e pedaços de
madeira em quadros e esculturas, retratando
o próprio ambiente em vivem.
O resultado, muito além
das peças produzidas por eles, foi
uma mudança de mentalidade dos próprios
comunitários, que se sentiram um pouco
mais orgulhosos de si mesmos e do que são
capazes de fazer. “A gente descobre que tem
muitas coisas aqui na natureza que podem ser
aproveitadas, e a gente não tinha noção
disso. É um aprendizado para gente
descobrir que pode fazer um trabalho muito
importante com a natureza e que ela se envolve
com a gente. Depende só do homem descobrir
por onde começar”, diz o pescador da
comunidade de Cumaru, Cleuter Soares de Lima.
A professora de arte do
município, Marinete Israel de Araújo,
também teve a oportunidade de participar
e descobrir nossas possibilidades de trabalho
com seus alunos. “Eu não sabia que
a gente podia fazer esse tipo de trabalho,
aproveitando os produtos da floresta sem danificar
a natureza. A oficina mudou até a minha
maneira de pensar, eu não acreditava
que isso era possível”, relata ela.
Marinete diz que, como professora, gostaria
que todos os alunos se interessassem mais
pela arte. “Gostaria de mostrar para a população
que arte é uma coisa fundamental na
nossa vida, e que a gente não pode
viver sem arte”, garante.
Honorato cobra-grande -
Um dos principais trabalhos desenvolvidos
durante a oficina foi uma grande escultura
de Honorato cobra-grande, uma das lendas mais
conhecidas da Amazônia, que conta a
história de um homem encantado, metade
homem metade cobra. A escultura foi produzida
coletivamente, sob a orientação
de Marcius Lima e, depois de pronta, foi doada
à Prefeitura de Juruá.
Na opinião dos organizadores
do evento, a oficina foi um aprendizado não
só para os comunitários, mas
também para todos os que participaram,
que puderam descobrir um universo diferente
e encantador no interior da Amazônia.
“Quando eu vim para cá minha curiosidade
era saber o tamanho dos rios, o tamanho das
árvores. Isso eu descobrir. Mas, além
disso, descobrir pessoas, que trabalham muito,
e que possuem uma paz de espírito enorme
e também muito talento. Elas têm
uma coisa que em arte a gente valoriza muito
que a calma, a capacidade de observar e de
transformar pontos de vista”, diz o fotógrafo
Daniel Campadello, de Itatiaia, Rio de Janeiro.
Flávia Mendonça