03/04/2007
- O movimento contra a impunidade em São
Gabriel da Cachoeira, no Alto Rio Negro, entrega
hoje ao ministro Paulo Vannuchi e outras autoridades
documento com 3.300 assinaturas reivindicando
mais segurança pública na região,
com a execução urgente de medidas
que garantam o fortalecimento da polícia
civil e militar, a atuação efetiva
do Poder Judiciário e a presença
da Defensoria Pública no município.
O movimento contra a impunidade
em São Gabriel da Cachoeira (AM) celebra
hoje, 3 de abril, três meses de campanha
com um evento que contará com a presença
de importantes autoridades federais, entra
elas a do ministro Paulo Vannuchi da Secretaria
Especial de Direitos Humanos (SEDH). O evento,
chamado “Direitos Humanos e Impunidade”, tem
como objetivo a entrega, nas mãos do
ministro, do abaixo-assinado com as mais de
3.300 assinaturas recolhidas em todo o município
exigindo melhorias para a segurança
pública da região.
A idéia é
que o ministro possa ouvir todas as reivindicações
e assim contribuir em mobilizar órgãos
competentes da segurança do Estado
e União. Também está
prevista para hoje uma passeata pelas principais
vias da cidade, reivindicando Justiça
para os casos de violência contra povos
indígenas. Além do ministro
Vannuchi, estão em São Gabriel
da Cachoeira a Dra. Ela Wiecko, da Procuradoria
Geral da República (PGR), Dr. Oscar
Argollo, do Conselho Nacional de Justiça
(CNJ), Dr. Márcio Meira, presidente
da Fundação Nacional do Índio,
e o Dr. Luiz Varese, do Alto Comissariado
das Nações Unidas para Refugiados
(ACNUR). Todas as autoridades receberão
um dossiê contendo o relato sobre os
crimes e os números da violência
praticada no município.
O movimento contra a impunidade
nasceu em janeiro de 2007, quando uma jovem
indígena da etnia Baniwa chamada Marina
Macedo, de 22 anos, foi brutalmente assassinada
e jogada em frente à sede da Federação
das Organizações Indígenas
do Rio Negro (Foirn). A garota foi encontrada
com vários hematomas pelo corpo, marcas
de estrangulamento no pescoço e indícios
de estupro. Mas até hoje o caso permanece
sem comprovação, pois São
Gabriel não conta com profissionais
gabaritados para realizar uma perícia
técnica ou laudo cadavérico.
O mais grave: até agora o responsável
pelo crime não foi encontrado.
A impunidade deste e em
outros casos de violência causaram grande
revolta na população da cidade,
e os representantes da Foirn e a da Funai
iniciaram uma campanha de abaixo-assinado
no intuito de reivindicar melhorias para a
segurança pública do município.
A campanha envolveu também as comunidades
indígenas, grêmios estudantis
dos colégios e associações
de bairros da cidade, além das organizações
não-governamentais que atuam em São
Gabriel, como a Saúde Sem Limites e
o Instituto Socioambiental (ISA).
Situação de
insegurança pública em São
Gabriel da Cachoeira
Desde que foi inaugurada,
em 2002, a Delegacia da Polícia Civil
em São Gabriel deveria ter no mínimo
uma equipe de 18 policiais civis. No entanto
o órgão começou a funcionar
com 9 policiais. A polícia militar
também tinha um quadro razoável
de contingente, mas com o passar dos anos,
esse número foi diminuindo gradativamente.
De acordo com informações da
Delegacia da Polícia Civil, essa redução
de efetivos deve-se a transferências
de alguns dos policiais para outros municípios
do estado do Amazonas. Muitos desses municípios,
contudo, têm população
menor que São Gabriel da Cachoeira,
cuja população atual é
de 35 mil habitantes.
A situação
piorou com o passar dos anos, com viaturas
sucateadas, falta de recursos humanos, ausência
de equipamentos básicos para escritório,
como computadores, dentre outras carências.
Já houve épocas nas quais a
delegacia permanecia abandonada, sob os cuidados
dos presos que lá estavam. Os próprios
detentos atendiam aos telefonemas da população,
informando que não havia nenhum policial
na repartição. A precariedade
era tanta que o mesmo policial que saía
para fazer a ronda, e atendimento aos chamados
nos bairros da cidade, era quem redigia boletins
de ocorrência e demais documentos. Ou
seja, trata-se de uma situação
insustentável de colapso da segurança
pública na cidade. O resultado é
uma cidade sem lei nem ordem.
Em relação
à Promotoria Pública e ao Poder
Judiciário local, a ausência
na cidade dos titulares desses cargos prejudica
bastante o andamento de vários processos,
deixando mães solteiras sem pensão
alimentícia e presos cujas penas expiraram
ainda encarcerados, dentre outras conseqüências.
São Gabriel da Cachoeira também
não dispõe de Defensor Público,
o que faz com que, para iniciar um processo,
pessoas de baixa renda precisem se endividar
para pagar os altos encargos cobrados por
advogados particulares. Às vezes, os
moradores preferem não processar seus
algozes por falta de condições
financeiras para custear um processo. Em 2005,
quando foi aberta vaga para este cargo, um
Defensor Público chegou a São
Gabriel mas, por alguma razão que a
população desconhece, o servidor
não aceitou trabalhar em São
Gabriel da Cachoeira e voltou para Manaus.
As conseqüências
de toda a carência na segurança
pública no município são
os crimes constantes cujas vítimas
costumazes são os povos indígenas.
Em uma região onde mais de 90% da população
é indígena e há terras
indígenas demarcadas, índios
vem sofrendo com a violência e com a
omissão do Estado frente a esta situação.
“Mesmo que São Gabriel da Cachoeira
esteja longe do sudeste do País, e
possua população menor que a
cidade do Rio de Janeiro, a criminalidade,
em termos relativos, está tão
alta quanto”, alerta André Fernando
Baniwa, diretor da Foirn e um dos líderes
do movimento pelo fim da impunidade.
As reivindicações
No evento desta terça-feira
haverá um ato de entrega do abaixo-assinado
anexado a uma carta de reivindicações.
São elas:
• Garantia da presença
permanente de Juiz de Direito na cidade, visando
manter condições mínimas
para a prestação adequada da
tutela jurisdicional, especialmente em caso
de demandas judiciais de urgência;
• Ampliação dos quadros das
polícias civil e militar, visando garantir
maior segurança nas ruas, maior fiscalização
sobre o abuso de bebidas alcoólicas
nos bares, bem como maior capacidade de investigação
dos delitos, contribuindo para a instrução
processual e para a coibição
da impunidade;
• Aparelhamento da delegacia da mulher, para
que as vítimas de violência sexual
possam ser adequadamente atendidas;
• Instalação de recursos materiais
e pessoais para realização de
perícias técnicas e médico-legais;
• Instalação de uma Delegacia
da Polícia Federal na cidade, de forma
a exercer de maneira eficaz o poder de polícia
sobre as terras indígenas e para controlar
o narcotráfico na região;
• Lotação de um Defensor Público
permanente na cidade, visando atender demandas
relacionadas à orientação
jurídica e à defesa dos direitos
dos cidadãos, especialmente aqueles
que não têm condições
de arcar com honorários advocatícios.
O cargo chegou a ser criado em 2005, mas até
o momento não há defensor designado;
• Realização de mutirão
de defensores públicos na cidade, visando
desafogar a demanda atualmente existente relacionada
à prestação de orientação
jurídica à população;
• Lotação de um Procurador Federal
permanente para exercer jurisdição
sobre a Administração Executiva
Regional da Funai em São Gabriel da
Cachoeira, visando atender demandas relacionadas
à orientação jurídica
e à defesa dos direitos dos povos e
cidadãos indígenas. O cargo
chegou a ser criado em 2006, mas até
o momento não há procurador
designado.
Estas reivindicações
serão entregue ao:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DO ESTADO DO AMAZONAS
Exmo. Desembargador Hosannah Florêncio
de Menezes – Presidente
CORREGEDORIA GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO
DO AMAZONAS,
Exmo. Desembargador Manuel Glacimar Mello
Damasceno – Corregedor Geral de Justiça,
SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA
DO ESTADO DO AMAZONAS,
Ilmo. Dr. Francisco Sá Cavalcante –
Secretário,
POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DO AMAZONAS,
Ilmo. Dr. Vinícius Diniz Souza dos
Santos – Delegado Geral,
POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO AMAZONAS,
Ilmo. Cel. PM José Saraiva – Comandante
Geral,
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA,
Exmo. Ministro Tarso Genro, DEPARTAMENTO DE
POLÍCIA FEDERAL
Ilmo. Dr. Paulo Fernando da Costa Lacerda
– Diretor-Geral,
DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO AMAZONAS
Ilma. Sra. Maria de Lourdes Lobo da Costa
– Defensora Pública Geral,
ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO – AGU
Exmo. Dr. José Antonio Dias Toffoli
– Advogado-Geral da União
FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO
– FUNAI,
Ilmo. Sr. Márcio Meira – Presidente.
Todos com cópia para o Governador do
Estado do Amazonas – Carlos Eduardo Braga.
Com informações da Foirn.
+ Mais
Vannuchi se compromete a
tomar medidas efetivas contra a impunidade
em São Gabriel da Cachoeira
05/04/2007 - Paulo Vannuchi,
secretário de Direitos Humanos da Presidência
da Répública, recebeu na última
terça-feira em São Gabriel da
Cachoeira, por parte de lideranças
indígenas do Alto Rio Negro, abaixo-assinado
com mais de 3 mil assinaturas e cartas para
diversas autoridades com reivindicações
para combater a violência e o desrespeito
à população civil da
região. Jovens e mulheres, as principais
vítimas da situação crônica
de impunidade, foram os protagonistas do encontro.
O movimento contra a impunidade
em São Gabriel da Cachoeira (AM) conseguiu
chamar a atenção do governo
federal para a situação crônica
de violência, insegurança pública
e desrespeito aos direitos humanos que assola
o município, localizado na região
do Alto Rio Negro, no extremo noroeste brasileiro.
Em um encontro com o ministro Paulo Vannuchi,
da Secretaria Especial dos Direitos Humanos
da Presidência da República,
realizado em São Gabriel nesta teça-feira
3 de abril, as lideranças do movimento
e demais moradores da cidade, em especial
jovens e mulheres, puderam reivindicar ações
efetivas e investimentos para garantir a segurança
da população local e a implementação
do Estado de Direito em toda a região.
Clique aqui para saber mais sobre o movimento
contra a impunidade em São Gabriel.
O evento encerrou a campanha
que, por três meses, recolheu assinaturas
para o abaixo-assinado contra a impunidade
em São Gabriel da Cachoeira. A Federação
das Organizações Indígenas
do Rio Negro (Foirn) e a administração
regional da Funai lideraram a ação.
O ministro Vannuchi, que foi a São
Gabriel acompanhado por Ela Wiecko, da Procuradoria
Geral da República (PGR), Oscar Argollo,
do Conselho Nacional de Justiça (CNJ),
Márcio Meira, presidente da Fundação
Nacional do Índio, e Luiz Varese, do
Alto Comissariado das Nações
Unidas para Refugiados (ACNUR), recebeu o
abaixo-assinado com mais de 3.300 assinaturas
e cartas com demandas específicas para
o Ministério da Justiça, Advogacia-Geral
da União, Secretaria de Segurança
Pública, Defensoria Pública
e Tribunal de Justiça do estado do
Amazonas, com cópias para Fundação
Nacional do Índio, Polícia Federal,
entre outros órgãos.
Após ouvir representantes
da população da cidade, Vannuchi
firmou o compromisso de buscar medidas concretas
e integradas com todas as esferas de poder
com as quais a secretaria possui convênio,
dentre elas o governo do Amazonas, para resolver
o impasse. Como primeira ação,
o ministro disse que irá entregar nas
mãos dos responsáveis todas
as cartas de reivindicações
que os líderes do movimento lhe entregaram.
Vannuchi completou dizendo que sua pasta deve
estar presente nos lugares onde acontecem
casos de violação dos direitos
humanos e que, de agora em diante, a secretaria
estará à disposição
de qualquer cidadão gabrielense que
se sentir ameaçado em seus direitos.
A platéia que ouviu
os discursos da cerimônia, realizada
na Maloca da Foirn, era composta por jovens
estudantes indígenas, professores e
moradores dos bairros da cidade. O primeiro
tomar a palavra foi André Fernando
Baniwa, diretor da Foirn, que ressaltou a
luta dos povos indígenas contra a violência
nas suas terras. “Nós nunca seremos
coniventes com falta de apoio do Estado em
manter a ordem e a justiça em cidades
como São Gabriel da Cachoeira, cidade
com cerca de 90% da população
indígena”.
A juventude indígena
foi representada pelo estudante Luís
Arthur da Silva, do Colégio Irmã
Inês Penha, que apontou no seu discurso
quais as conseqüências da impunidade
para os jovens indígenas na cidade.
“A falta de policiamento e fiscalização
permite que as drogas circulem com muita facilidade
nas escolas e nos bairros, envolvendo os jovens
no tráfico e no vício”, alertou
o jovem. Outro ponto lembrado por ele foi
a ausência de ambientes de lazer educativos
e oportunidades de emprego. “O jovem ocioso
torna-se alvo fácil dos problemas sociais
que atingem as cidades”, concluiu.
A violência contra
mulher foi ressaltada pela coordenadora do
departamento de mulheres indígenas
da Foirn, Cecília Albuquerque. A coordenadora
citou diversos casos de estupros praticados
geralmente por motoristas de táxi-lotação
e que acabam sem punição. Cecília
disse que muitas vezes as mulheres vitimadas
ficam receosas em denunciar seus agressores
por medo de represálias, pois os criminosos
possuem influência entre os poderes
públicos da cidade e podem fazer com
que as denúncias sejam abafadas.
Um outro problema citado
por Cecília é a falta de resposta
por parte do Estado na solução
dos casos de suicídios entre os jovens
indígenas. A representante da Foirn
alega que essa omissão demonstra que
São Gabriel está abandonada
por parte dos poderes públicos. Já
Henrique Velozo Vaz, administrador regional
da Funai, por sua vez, reforçou que
a falta de um defensor público faz
com que muitos casos de violência sejam
engavetados. “A maioria da população
não tem condições financeiras
para pagar advogados locais, que cobram altos
preços”, afirmou. Vaz entregou um dossiê
a Vannuchi com documentos que comprovam e
retratam o cenário de impunidade crônica
em São Gabriel da Cachoeira.
O administrador ainda fez
um apelo ao presidente da Funai, Marcio Meira,
para que a Funai envie com máxima urgência
um procurador permanente do órgão
para São Gabriel da Cachoeira. A bacia
do Rio Negro abriga mais de 40 mil pessoas
de 23 povos indígenas distintos em
cerca de 430 comunidades e sítios isolados.
Este mosaico étnico representa algo
em torno de 10% da população
indígena brasileira.
ISA, Andreza Andrade.