Publicação
alerta para impactos sócio-ambientais
de treze projetos prioritários, previstos
na IIRSA e no PAC, em possíveis zonas
de conflito
Brasília, 02 de maio
de 2007 — Quase metade da área das
unidades de conservação do país
será afetada diretamente por projetos
de infra-estrutura nacionais e intercontinentais,
a maior parte na Amazônia brasileira.
Essa é uma das conclusões de
análise inédita da Ong Conservação
Internacional (CI-Brasil), lançada
nesta quarta-feira, dia 2, na terceira edição
de sua revista eletrônica, Política
Ambiental. A publicação, que
estará disponível para download
no site da CI-Brasil, oferece um panorama
das implicações sócio-ambientais
dos grandes projetos previstos e em andamento
na Iniciativa de Integração
Regional Sul-americana (IIRSA) e de obras
relacionadas que fazem parte do Plano Plurianual
(PPA) e do Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC) do Governo Federal.
O estudo deteve-se sobre
13 projetos, em desenvolvimento ou já
concluídos, que se inserem em áreas
fundamentais para a proteção
da diversidade biológica no país.
Também identifica as zonas de possíveis
conflitos nas quais os projetos provocam intensas
mudanças no cenário futuro por
atuarem sobre regiões relativamente
intactas e estarem sobrepostos em várias
obras e em locais estratégicos para
o escoamento da produção. As
áreas afetadas são incipientes
em termos de organização social
e marcadas pela ausência de governança,
sendo precárias a presença efetiva
do Estado e a participação das
comunidades nos processos decisórios.
“Além de alertar para os impactos,
o estudo objetiva apontar caminhos para o
desenvolvimento regional com sustentabilidade”,
explica o diretor de Política Ambiental
da CI-Brasil, Paulo Gustavo Prado.
Para avaliar o impacto dos
projetos, foi desenvolvida uma análise
de território levando em conta as áreas
de influência das obras, as unidades
de conservação e as chamadas
áreas prioritárias para a conservação,
recentemente revisadas pelo Ministério
do Meio Ambiente. Conforme o estudo, a área
total de influência das obras será
de 2,5 milhões de quilômetros
quadrados, atingindo 137 unidades de conservação,
107 terras indígenas e 484 áreas
prioritárias para a conservação
da biodiversidade brasileira. Entre os biomas,
o mais afetado será a Amazônia.
Somente neste domínio, 322 áreas
entre as mais ricas em espécies amazônicas
estarão expostas a pressões
antrópicas.
Dois pesos, duas medidas
- Prado ressalta que apesar de os projetos
serem planejados em conjunto para a ligação
regional e intercontinental, o mesmo não
acontece em relação aos impactos,
que são vistos sob a ótica pontual
de cada obra, como se não tivessem
relações entre si na escala
regional. Essa fragmentação
ocorre ainda no âmbito de cada projeto,
dificultando o reconhecimento das implicações
ambientais e sociais. Um exemplo foi o parcelamento
do EIA/RIMA do Complexo Hidrelétrico
do Rio do Madeira, no qual foram omitidas
as linhas de transmissão, o que gerou
recente ação do Ministério
Público com pedido de anulação
do licenciamento.
O resultado é outra
grave deficiência dos projetos: a falta
de estudos e medidas mitigadoras mais amplas.
“Não há um plano para conter
o desmatamento facilitado pelas rodovias ou
para o desenvolvimento das comunidades”, frisa
a especialista em Política Ambiental
da CI-Brasil, Isabella Freire. No caso do
Complexo do Madeira, estima-se que o aumento
previsto na produção de soja,
decorrente das novas vias de transporte, exija
uma área maior do que a região
em sua totalidade, pelo menos 400 mil quilômetros
quadrados, uma dimensão superior aos
estados de São Paulo, Rio de Janeiro
e Espírito Santo juntos, aumentando
a pressão sobre a floresta amazônica.
Prado aponta que isso indica a ocorrência
de super-dimensionamentos nos benefícios
econômicos de alguns projetos setoriais
que justificam as obras.
“É preciso reverter
esse quadro, no qual os governos sul-americanos
pressionam os financiadores por um tratamento
preferencial aos projetos pertencentes à
IIRSA, sob a ótica da menor rigidez
nas salvaguardas exigidas para sua implementação,
sem maiores preocupações com
impactos sócio-ambientais ou sustentabilidade
regional”, reforça.
Portas abertas à
ilegalidade – “O poder público abre
caminho via infra-estrutura, abrindo também
para a economia da ilegalidade”, alerta Freire,
lembrando as conseqüências negativas
de fatores como a intensa migração
de populações sem atendimento
e apoio por parte do Estado, o despreparo
de infra-estrutura rural e urbana de saúde,
educação e saneamento, a perda
de qualidade da água e o desequilíbrio
de serviços ambientais. A essa lista,
somam-se outros graves impactos sócio-ambientais,
como a redução de recursos pesqueiros,
aumento indiscriminado de esforço de
coleta e caça para a sobrevivência,
incremento de áreas desmatadas, prática
da grilagem, violência, desemprego,
prostituição e incidência
de doenças contagiosas. “A governança
precisa chegar junto, e até mesmo antes,
porque a infra-estrutura sozinha só
degrada”, compara.
Exemplos que mostram a rápida
perda de recursos naturais e de qualidade
de vida numa região sem governança
e sob efeito de grandes obras de infra-estrutura
são abundantes. Com a fiscalização
ainda inoperante, em 2001, o anúncio
de asfaltamento da BR 163 atraiu sojicultores
de outras regiões. Em 2003, o desmatamento
ao longo da rodovia aumentou mais de 150%.
A área perdida nesse ano foi equivalente
a 76 campos de futebol por dia.
Cenários de sustentabilidade
– Pesquisas comprovam como a governança
é essencial para garantir a sustentabilidade.
Na comparação de cenários
com e sem governança na Amazônia,
pesquisadores mostram que as perdas florestais
caem no primeiro caso, enquanto sobem no segundo.
Outros estudos também demonstram a
relação direta entre a geração
de emprego e renda e manutenção
dos estoques de recursos naturais com resultados
positivos ou negativos conforme a situação
de governança regional.
Na opinião de Prado,
a solução passa pelo reconhecimento
de experiências de vanguarda, como o
Plano BR 163 Sustentável, cuja base
do planejamento regional é a participação
da sociedade e a prevenção dos
impactos sociais e ambientais. “Pelas lições
aprendidas, o Brasil está em condições
de aprimorar o desenvolvimento pretendido,
revertendo o modelo convencional, que coloca
a biodiversidade e as populações
tradicionais como empecilhos ao desenvolvimento
econômico”, frisa. Na prática,
a metodologia segue ignorada. Todas as pavimentações
na região Amazônica, anunciadas
depois da BR 163, ainda desconsideram esses
princípios e não possuem um
plano de desenvolvimento sustentável.
O conteúdo da revista
na íntegra pode ser acessado em:
http://www.conservation.org.br/publicacoes/files/politica_ambiental_3_maio_2007.pdf
Fontes
Paulo Gustavo do Prado Pereira – Diretor de
Política Ambiental
Isabella Freire – Especialista em Política
Ambiental
Projetos avaliados em áreas
prioritárias
Transporte Rodoviário
Duplicação do trecho Palhoça-Osório
(Rodovia Mercosul) – Eixo Mercosul-Chile da
IIRSA
Ponto sobre o Rio Acre – Eixo Peru-Brasil-Bolívia
da IIRSA
Estrada Boa Vista-Bonfim-Lethem-Linden-Georgetown
– Eixo do escudo das Guianas da IIRSA
Ponte sobre o Rio Itacutú – Eixo do
Escudo das Guianas da IIRSA
Trechos rodoviários na BR-010 no Tocantins
– Ação do PPA
Trechos rodoviários na BR-135 na Bahia
– Ação do PPA
Trechos rodoviários na BR-163 no Pará
e Mato Grosso – Ação do PPA
Trechos rodoviários na BR-230 no Pará
– Ação do PPA
Transporte Ferroviário
Construção da Ferrovia Norte-Sul
– Ação do PPA
Transporte Marítimo e Hidroviário
Contrução das eclusas de Tucuruí
no Pará – Ação do PPA
Ampliação e recuperação
do Porto de Itaqui – Ação do
PPA
Energia
Estudo de viabilidade da Usina Hidrelétrica
de Belo Monte – Ação do PPA
Implantação do Gasoduto Urucu-Coari-Manaus
– Ação do PPA
Possíveis Zonas de Conflito Sócio-Ambiental
Complexo Hidrelétrico do Rio Madeira
Região de Santarém
Escudo das Guianas
Pantanal Boliviano