Brasília (27/6/2007)
- Mais um conflito provocado por pescadores
e empresários que insistem em desrespeitar
as novas regras da pesca da lagosta. Hoje
de manhã, cerca de 300 pessoas invadiram
a sede da Superintendência do Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (Ibama), em Vitória,
no Espírito Santo. Elas chegaram em
oito ônibus fretados, desceram na porta
da superintendência, no centro da cidade,
imobilizaram os guardas que faziam a segurança
e ocuparam rapidamente os três andares
do prédio.
Houve tumulto e muita correria.
Surpreendidos no momento em que iniciavam
o expediente, os funcionários entraram
em pânico. Alguns deles passaram mal
e precisaram de socorro médico. A polícia
foi chamada e, em poucos minutos, o prédio
foi cercado por PMs e agentes federais. Depois
de mais de quatro horas de tensas negociações,
intermediadas pelo superintendente regional
do Ibama, Guanadir Sobrinho, os invasores
aceitaram desocupar o prédio.
Antes, o grupo, formado
por pescadores das comunidades de Pontal e
Itapemirim, no Sul do Estado, entregou ao
superintendente uma pauta de reivindicações
com nove itens. Eles querem, principalmente,
a suspensão por 120 dias da portaria
que regulamenta a pesca da lagosta e a devolução
dos equipamentos apreendidos durante a fiscalização,
intensificada desde o dia 16, quando entraram
em vigor as novas regras. Ficou acertado que
amanhã um representante da direção
nacional do Ibama estará em Vitória
para avaliar a situação.
Manipulação - Os protestos contra
as novas regras da pesca da lagosta começaram
no dia 16. Em cidades litorâneas do
Rio Grande do Norte, Paraíba, Bahia
e Espírito Santo, carros e embarcações
do Ibama foram incendiados, prédios
da fiscalização depredados e
fiscais hostilizados e ameaçados de
morte. Toda essa balbúrdia é
patrocinada por empresários insatisfeitos
com a regulamentação da pesca.
Eles insuflam os pescadores, em reuniões
nas colônias e por meio de carro de
som, a inviabilizar o trabalho das equipes
do Ibama.
Essa manipulação
ficou mais uma vez evidenciada na invasão
do prédio do Ibama em Vitória.
Os pescadores, que diziam não ter dinheiro
nem para pagar a conta da luz por causa da
regulamentação da pesca, chegaram
à capital em luxuosos ônibus.
Entenda o caso - As novas
regras foram criadas para garantir a sustentabilidade
da pesca da lagosta, que tem importante papel
na economia do país. A lagosta é
o segundo item na pauta de exportação
brasileira de pescado. Perde apenas para o
camarão. Sua produção
gera emprego e renda para 150 mil trabalhadores
em todo o país.
Estudo constatou que houve
uma sensível queda da produção
do crustáceo nos últimos 20
anos. A produção, que chegara
a quase 11 mil toneladas nos anos 80, caiu
para quatro mil toneladas em meados dos anos
90. De acordo com os pesquisadores, o principal
motivo da queda é a pesca predatória.
Com a intenção de retomar a
pesca em bases sustentáveis, o governo
decidiu ordenar a atividade. Criou, para isso,
o Comitê Gestor da Pesca a Lagosta,
formado por dirigentes do Ministério
do Meio Ambiente, Secretaria de Aqüicultura
e Pesca, Ibama e representantes das comunidades
de pescadores, armadores e empresários
do setor.
Depois de dois anos de muito
debate, o comitê aprovou, no início
de 2007, por consenso, as novas regras, que
entraram em vigor no dia 16. As regras prevêem,
entre outras coisas, a substituição
do uso da caçoeira (rede altamente
predatória) pelos manzuás (armadilhas
de madeira, menos agressivas à vida
marinha); a prática da pesca só
a partir de quatro milhas náuticas
da costa, para preservar as lagostas jovens;
e a exigência de tamanhos mínimos
de captura e comercialização
de lagostas vermelhas e verdes, de 13 cm e
11 cm de cauda, respectivamente. Paralelamente
a isso, o Ibama regularizou três mil
embarcações (1.300 a mais que
no ano passado) que antes faziam a pesca clandestinamente.
Apesar de todo esse acerto,
empresários, que querem a volta da
pesca indiscriminada, decidiram inviabilizar
as novas regras. Em reuniões nas colônias
de pescadores e até em carros de som
no meio da rua, eles pregam abertamente o
desrespeito às normas e incentivam
as comunidades a atacar os fiscais do governo.
Nos primeiros dias de entrada
em vigor do novo ordenamento da pesca, carros
e embarcações do Ibama foram
depredados e incendiados, fiscais foram cercados
por vândalos e por pouco não
foram linchados. Os fatos ocorreram nos municípios
de Rio do Fogo (RN), Acaú/Pitimbu (PB)
e Alcobaça (BA). Em Alcobaça,
foi preciso a intervenção do
Batalhão de Choque da PM para conter
a turba que cercou o local onde a força-tarefa
se encontrava.
O clima ainda é de muita tensão
em todo o litoral que vai do Rio Grande do
Norte ao Espírito Santo (os pescadores
dos demais estados aderiram às novas
regras). Os fiscais do Ibama estão
muito apreensivos. Com o apoio da PF e da
Marinha, eles continuam fechando o cerco à
pesca ilegal, mas temem por sua segurança.
A cada apreensão de lagosta capturada
ilegalmente, os fiscais são hostilizados
e ameaçados de morte pelos pescadores.
Elmano Augusto