27 Jun 2007 - Projetos de
transposição de rios, cada vez
mais comuns no mundo, representam um sério
risco aos recursos hídricos do planeta.
A conclusão faz parte do estudo Transposição
de Água entre Bacias e a Escassez,
feito pela Rede WWF, que também abordou
a questão da transposição
do rio São Francisco, projeto do governo
federal cujas obras começaram este
mês. “Entendemos que projetos de transposição
deveriam ser vistos como última alternativa,
depois de esgotadas todas as opções
de uso racional da água”, avalia Denise
Hamú, secretária-geral do WWF-Brasil.
O estudo mostrou que obras
de transposição são sempre
muito caras, trazem impactos negativos ao
meio ambiente, comprometem fluxos naturais
de rios e a capacidade dos cursos d’água
de promover os usos múltiplos dos recursos
hídricos nas bacias doadoras de água,
como abastecimento, navegação
e irrigação, entre outros.
Juntamente com barragens,
transposições exigem a construção
de sistemas de canais, dutos e dragas de longo
alcance. Atualmente, menos de 40% dos rios
mundiais com extensão superior a 1000
quilômetros fluem livremente, sem intervenção
de esquemas de transposição
ou desvios, fato que tem relação
direta com a atual crise de abastecimento
de água em várias partes do
mundo.
No caso específico
da transposição do Rio São
Francisco, uma série de perguntas ainda
está sem resposta, especialmente no
que diz respeito aos impactos sociais, econômicos
e ambientais do projeto. O Comitê de
Bacia do Rio São Francisco, instância
legítima de gestão hídrica
de acordo com a legislação nacional
de água, posicionou-se contra a transposição,
por vislumbrar outras soluções
para o problema da escassez de água
no semi-árido nordestino.
Samuel Barrêto, coordenador
do Programa Água para a Vida do WWF-Brasil,
lembra que, antes de partir para uma obra
do porte da transposição seria
preciso esgotar alternativas mais baratas,
eficientes e adequadas sob a ótica
socioambiental. “Há no semi-árido
brasileiro uma série de obras inacabadas,
como a construção de açudes,
que já consumiram dinheiro público
e deveriam ser finalizadas”, diz.
Além disso, ele defende
a ampliação de outras ações
importantes, como o projeto Um Milhão
de Cisternas e o Programa Nacional de Combate
à Desertificação. “Também
é preciso acelerar as ações
de revitalização do rio, investir
na qualificação e capacitação
das instituições que atuam na
gestão dos recursos hídricos
dos estados do Nordeste e rever as licenças
de uso de água na bacia do rio São
Francisco”, salienta.
De acordo com o Tribunal
de Contas da União, a transposição
do São Francisco tem custos subestimados
e resultados superestimados, deixando claro
que o projeto não vai garantir o abastecimento
para 12 milhões de pessoas, conforme
prometido pelo governo federal.
Para Barrêto, as despesas
que serão geradas pelo funcionamento
da obra de transposição são
outro ponto obscuro do projeto. “O transporte
de toda essa água vai demandar muita
energia e elevados custos operacionais. Para
pagar essa conta, serão necessários
altos subsídios, que não aparecem
nos atuais cálculos do governo”, avalia.
Outro questionamento do
WWF-Brasil diz respeito à real destinação
da água a ser transposta. “Existe o
temor, justificado, de que apenas uma pequena
porção será dirigida
a comunidades sem acesso ao recurso. Há
indícios de que a maior parte da água
seria destinada ao abastecimento da cidade
de Fortaleza ou a projetos de irrigação
na agricultura”, avalia o coordenador.
De acordo com Barreto, atender
às necessidades hídricas da
capital cearense é uma meta legítima,
mas a transposição do rio não
seria o meio mais adequado para se atingir
esse objetivo. “No caso da irrigação
para a agricultura de grande porte, questiono
se é uma política sensata estimular
uma atividade econômica que demanda
grandes volumes de água, em uma área
em que os recursos hídricos são
extremamente escassos”, critica.
Segundo Jamie Pittock, diretor
do Programa de Água Doce do WWF Internacional,
enfatizar de forma exagerada as intervenções
de engenharia para solucionar a crescente
escassez de água é uma maneira
artificial de solucionar a crise de abastecimento.
“Em muitos casos, transposições
são uma utopia, resultante do pensamento
simplista de que transferir água de
rios resolverá o problema da escassez
sem causar danos”, acrescenta Pittock.
Existem centenas de outros
projetos de transposição no
mundo, já implantados, em implantação
ou em discussão. O estudo do WWF analisou
experiências adotadas na Austrália,
África do Sul e Espanha, além
de China, Grécia e Peru e da transposição
do São Francisco.
Em quase todos os casos
percebem-se falhas como superação
dos custos estimados, falta de transparência,
danos irreversíveis a rios, processos
frágeis de consulta às partes
afetadas, desalojamento de comunidades, benefícios
não concretizados e rejeição
de alternativas mais adequadas do ponto de
vista da sustentabilidade. Ações
voltadas para conservação e
gestão de recursos hídricos
e para a reutilização de água
mostraram-se mais eficientes.
Para o coordenador do Programa
Água para a Vida do WWF-Brasil, é
fundamental que exista o compromisso de, primeiro,
garantir a saúde dos rios. “Trata-se
de uma condição fundamental
para viabilizar um dos fundamentos da Política
Nacional de Águas, que é promover
os usos múltiplos dos recursos hídricos
com prioridade para o abastecimento humano,
inclusive para garantir o acesso à
água para 40 milhões de brasileiros
atualmente excluídos desse direito
universal. Parte dessa população
vive no semi-árido brasileiro”, conclui
Barrêto.
+ Mais
Comitê da Bacia do
Rio Miranda realiza planejamento estratégico
26 Jun 2007 - Comitê
da Bacia Hidrográfica do Rio Miranda
irá realizar encontro para planejar
as atividades para o período 2007/2008.
Esse é o primeiro comitê de Bacia
do Mato Grosso do Sul. O evento será
no Conselho Regional de Arquitetura e Engenharia
do Mato Grosso do Sul (CREA/MS), em Campo
Grande, nos dias 28 (quinta-feira, de 8h às
19h) e 29 de junho (sexta-feira, de 8h às
17h). A agenda envolve temas como o estado
do Aqüífero Guarani, que abrange
uma parte da bacia, e a qualidade da água
do rio Miranda, por exemplo.
Participam os membros titulares
e suplentes que representam os segmentos:
órgãos governamentais federal,
estadual e prefeituras municipais; usuários
(pecuaristas, irrigantes, empresas de saneamento,
indústria e outros) e sociedade civil
(universidades, ongs ambientalistas, sindicatos
de trabalhadores, associações
profissionais).
O planejamento estratégico
tem como objetivos facilitar o conhecimento
entre os membros do Comitê, procurando
identificar nível de representatividade,
trabalhos desenvolvidos, envolvimento e compromisso
com o comitê; socializar conhecimentos
sobre a situação da bacia e
o papel do Comitê diante dos problemas
apresentados; informar aos membros sobre os
principais projetos e programas que estão
sendo desenvolvidos na bacia, possibilitar
a discussão sobre a relação
do Comitê com esses projetos e identificar
os principais desafios e estratégias
para o funcionamento e para agenda do comitê
em 2007-2008.
O presidente do Comitê
e Prefeito de Bonito, José Arthur Soares
de Figueiredo, destaca a importância
do planejamento. “O planejamento para a bacia
hidrográfica visa garantir a qualidade
das águas, inclusive para a questão
do turismo ambientalmente responsável”.
Já o vice-presidente, José Aparecido
Fernandes Gonçalves, que representa
a categoria dos usuários, afirma que
o planejamento “pode colaborar para garantir
a continuidade do oferecimento de água
de qualidade para todos os usos que existem
na bacia". O secretário-executivo
do Comitê, Felipe Dias, que representa
a sociedade civil organizada, lembra a importância
da participação de todos os
membros do Comitê, “pois estarão
sendo definidos rumos e de que forma acontecerá
o desenvolvimento na Bacia".
O planejamento estratégico
do Comitê tem o apoio da Secretaria
de Estado do Meio Ambiente, das Cidades, do
Planejamento, da Ciência e Tecnologia
(SEMAC/MS), do Conselho Regional de Arquitetura
e Engenharia do Mato Grosso do Sul (CREA/MS),
da Fundação Cândido Rondon
(FCR), da Universidade Católica Dom
Bosco (UCDB), da Agência Nacional de
Águas (ANA) e do WWF-Brasil.