Audiência pública
discute alteração no Código
Florestal para reduzir a 50% a área
de reserva legal das propriedades da Amazônia
alegando promoção do desenvolvimento
na região
Brasília, 09 de outubro de 2007 — A
Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável da Câmara dos Deputados
realiza nesta terça-feira, às
14 horas, uma audiência pública
sobre o sistema de reservas legais no território
nacional. O debate "O instrumento da
reserva legal, sua aplicação
e as conseqüências sobre a produção
rural" contará com a participação
de representantes de ONGs ambientalistas –
Conservação Internacional (CI-Brasil),
Instituto Socioambiental e The Nature Conservancy
-, Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA),
Ministério do Meio Ambiente, Confederação
da Agricultura e Pecuária do Brasil
(CNA), Confederação Nacional
da Indústria (CNI) e Superior Tribunal
de Justiça (STJ).
Uma iniciativa dos deputados
Jorge Khoury (DEM-BA) e Wandenkolk Gonçalves
(PSDB-PA), da subcomissão permanente
que avalia a eficácia da reserva legal
(RL) e os resultados do zoneamento ecológico-econômico,
a audiência objetiva discutir a proposta
de redução do percentual de
RL estabelecido pelo Código Florestal
para a Amazônia brasileira, dos atuais
80% para 50%. Reserva legal é um instrumento
incluído na legislação
ambiental brasileira que diz que parte da
propriedade rural não pode ser desmatada
e dever ser mantida para proteção
da vegetação nativa e, consequentemente,
da biodiversidade. O Código Florestal
(Lei 4.771/65) define o tamanho da área
de reserva legal conforme a região
onde a propriedade se situa.
Desde agosto de 2001, quando
a Medida Provisória 2.166 promoveu
a alteração do Código
Florestal, o espaço a ser preservado
como RL por proprietários rurais na
Amazônia Legal passou a ser de 80% das
propriedades. A decisão do Congresso
Nacional gerou muita polêmica, mas passou
uma clara mensagem sobre o tipo de desenvolvimento
socioeconômico que deveria ser implementado
na região. Ao invés da simples
derrubada da floresta para dar lugar a pastagens
e monoculturas, o desenvolvimento deveria
ser obtido a partir da manutenção
dos ecossistemas florestais nativos da Amazônia.
O argumento de que para
aumentar a renda e promover o desenvolvimento
regional é preciso derrubar a floresta
não encontra respaldos na prática.
Um estudo denominado “O avanço da fronteira
na Amazônia: do boom ao colapso”, realizado
por pesquisadores do Instituto do Homem e
Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) indica
que somente nos primeiros anos é que
se observa um aumento no PIB local, níveis
de emprego e no IDH (Índice de Desenvolvimento
Humano). A experiência mostra que, ao
longo do tempo, estes índices caem
e passam a ficar inferiores àqueles
das áreas não desmatadas. De
acordo com o estudo do Imazon, 43 municípios
que tiveram mais de 90% de sua cobertura removida
possuem um PIB médio 60% inferior à
média da Amazônia. Cerca de 30%
desses municípios apresentaram uma
queda no PIB entre 2000 e 2004.
Um estudo similar realizado
pela Conservação Internacional
a pedido da Secretaria de Meio Ambiente de
Goiás e apresentado ao Conselho Municipal
do estado em 2004 indica que há uma
concentração de renda nos municípios
com maior renda per capita e IDH. De acordo
com o coordenador do estudo, o Diretor do
Programa Cerrado-Pantanal da CI-Brasil, Ricardo
B. Machado, os dados revelam que as camadas
mais pobres da população - com
renda até um salário mínimo
- não estão sendo beneficiadas
pela troca dos ecossistemas naturais por monoculturas
desenvolvidas em grandes propriedades. “Apenas
uma parte da população sai ganhando
com os desmatamentos”, afirma o diretor.
Centros de endemismo ameaçados
- Os efeitos de uma maior ocupação
na Amazônia brasileira podem ser bastante
danosos para a biodiversidade local. Em geral,
imagina-se que a maior floresta tropical do
planeta é um conjunto homogêneo,
composto pelas mesmas espécies ao longo
de seu território. Contudo, análises
mais acuradas indicam a existência de
vários centros de endemismo, ou seja,
regiões que historicamente produziram
espécies que só são encontradas
em determinadas regiões da Amazônia.
O vice-presidente de Ciência da CI-Brasil,
José Maria Cardoso Silva, ressalta
que existem várias Amazônias
e que a destruição de um pedaço
jamais será compensada pela conservação
de outro. Silva lembra que o Centro de Endemismo
de Belém, por exemplo, é uma
das áreas mais ameaçadas da
Amazônia, onde os desmatamentos já
alcançam quase 70% da área original.
“Boa parte das espécies ameaçadas
de extinção da Amazônia
está concentrada nessa região
e uma alteração no Código
Florestal poderá impactar os poucos
remanescentes não protegidos existentes”.
Contramão – A proposta
de redução da área de
reserva legal na Amazônia vem na contramão
de uma iniciativa pioneira lançada
em Brasília há uma semana por
oito entidades ambientalistas atuantes na
região: o Pacto Nacional pela Valorização
da Floresta e pelo Fim do Desmatamento na
Amazônia. O pacto é amparado
em um estudo que prevê compensação
financeira para quem conserva a floresta em
pé e propõe metas anuais para
zerar o desmatamento na região em sete
anos. A alteração do Código
Florestal para a redução da
RL na Amazônia para 50% poderá
provocar um desmatamento imediato de 47 milhões
de hectares e uma perda de divisas da ordem
de 23.6 bilhões de dólares somente
em crédito de carbono (considerando
o preço do mercado informal para o
desmatamento evitado, onde se calcula que
cada tonelada de CO2 custe US$ 5).
Sociedade é contra
- Em 2001, uma pesquisa realizada pelo Instituto
Vox Populi em 140 municípios do país,
a pedido do Greenpeace, WWF, ISA, Rede Mata
Atlântica e jornal O Estado de São
Paulo, revelou que 94% dos entrevistados eram
contra a redução dos percentuais
da reserva legal na Amazônia. Além
disso, 88% das 503 pessoas ouvidas indicaram
que não votariam nos deputados e senadores
que propusessem o aumento dos desmatamentos
nas florestas brasileiras.
As soluções
para a região devem passar necessariamente
por uma discussão mais ampla dos possíveis
usos econômicos do solo sem que a biodiversidade
seja comprometida. Abordagens mais modernas
de exploração da floresta em
pé ou mesmo o pagamento por serviços
ambientais - como seqüestro de carbono,
desmatamento evitado, fornecimento de água
com qualidade e outros - devem permear as
discussões. Definitivamente modelos
incompatíveis com a realidade ambiental
da região devem ser profundamente repensados.
José Maria Cardoso Silva – Vice-Presidente
de Ciência da CI-Brasil
+ Mais
IIRSA pode colocar em risco
floresta amazônica
Novo estudo apresenta soluções
para conciliar desenvolvimento e necessidades
de conservação
Bariloche, Argentina, 01 de outubro de 2007
— Um plano de desenvolvimento sem precedentes
para ligar as economias da América
do Sul através de novos projetos de
transporte, energia e telecomunicações
poderia destruir grande parte da floresta
tropical amazônica nas próximas
décadas, de acordo com um estudo realizado
pelo cientista Tim Killeen, da Conservação
Internacional (CI).
Contudo, Killeen informa
que este resultado desastroso poderá
ser evitado caso sejam tomadas algumas medidas
para conciliar as expectativas legítimas
de desenvolvimento com a necessidade de conservar
o ecossistema amazônico, de relevância
mundial.
Killeen produziu um relatório
de 98 páginas, intitulado “A Perfect
Storm in the Amazon Wilderness: Development
and Conservation in the Context of the Initiative
for the Integration of the Regional Infrastructure
of South America (IIRSA) [Uma Tempestade Perfeita
na Selva Amazônica: Desenvolvimento
e Conservação no Contexto da
Iniciativa para a Integração
da Infra-estrutura Regional Sul-americana
(IIRSA)]”. O estudo traz abordagens pragmáticas
para a resolução do eterno paradoxo
entre o desenvolvimento econômico e
a proteção ambiental.
O cientista, que trabalhou
na região amazônica por 25 anos,
apóia plenamente o plano da IIRSA,
que compreende 12 nações e busca
a meta histórica de superação
dos obstáculos geográficos da
selva amazônica para conectar as economias
isoladas da região. Os investimentos
da IIRSA integrarão malhas rodoviárias
melhoradas, hidrovias, represas de hidrelétricas
e redes de telecomunicações
por todo o continente – especialmente nas
regiões mais remotas e isoladas – para
permitir o aumento do comércio e a
criação de uma comunidade sul-americana
de nações.
A análise de Killeen
indica que os projetos de desenvolvimento
da IIRSA coincidirão com o crescimento
das pressões sobre o ecossistema amazônico
e suas comunidades tradicionais. Dentre estas
pressões encontram-se a mudança
climática, a exploração
madeireira, o desflorestamento para a agricultura
e a exploração mineral, bem
como o iminente boom dos cultivos para biocombustíveis,
tais como a cana-de-açúcar.
“A falta de percepção
do pleno impacto dos investimentos da IIRSA,
especialmente no contexto da mudança
climática e de mercados globais, poderá
produzir uma tempestade perfeita de destruição
ambiental”, diz Killeen. “A maior área
de floresta tropical do planeta e os múltiplos
benefícios que ela proporciona estão
em cheque”.
O estudo aponta três
cenários possíveis para o futuro
da região amazônica, e alerta
que os projetos de infra-estrutura que forem
desenvolvidos sem análises oportunas
e minuciosas dos impactos ambientais provocarão
os piores cenários – desmatamento generalizado
e o eventual desaparecimento da floresta amazônica
dentro de três ou quatro décadas.
“Nossa esperança
é a de que este documento estimule
a IIRSA a tornar-se uma iniciativa ainda mais
importante e relevante, uma iniciativa que
incorpore a visão de uma Amazônia
ecológica e culturalmente intacta”,
escreve Gustavo Fonseca, líder da área
de recursos naturais do Fundo Global do Meio
Ambiente (GEF - Global Environment Facility),
no prefácio da publicação.
“A América do Sul tem um enorme incentivo
econômico para conservar os serviços
dos ecossistemas proporcionados pela Amazônia,
juntamente com a consecução
da real e efetiva integração
regional. Estas metas não são
mutuamente exclusivas.”
De acordo com Killeen, a
destruição da Amazônia
em conseqüência dos atuais projetos
planejados pela IIRSA teria um impacto profundo
e de longo alcance. A bacia do rio Amazonas
é a maior reserva mundial de água
doce, sendo que a vasta selva amazônica
regula o clima continental, produzindo a precipitação
anual que irriga a multibilionária
indústria agrícola da bacia
do rio da Prata até o sul. O corte
e a queimada da floresta amazônica poderão
prejudicar seriamente esta indústria,
e também destruir os vastos ecossistemas
que abrigam os povos indígenas. Poderão
também aniquilar as mais ricas reservas
planetárias de vida terrestre e aquática
doce, e poderá exacerbar o aquecimento
global através da liberação
na atmosfera de enormes quantidades de carbono
contidas na biomassa da floresta tropical
– estimadas em cerca de vinte vezes as emissões
mundiais totais de gases do efeito estufa.
Killeen argumenta que isso
não é inevitável. Ele
observa que a floresta amazônica intacta
poderá gerar bilhões de dólares
em créditos de carbono no sistema de
mercado que está sendo negociado em
sucessão ao Protocolo de Kyoto. Os
cultivos para biocombustíveis, tais
como a cana-de-açúcar, poderão
ser plantados nos 65 milhões de hectares
de terras já desflorestadas, ao invés
de abater mais florestas para novas plantações.
Ele também defende outras soluções
ambientalmente amistosas, como por exemplo
a piscicultura, que utilizaria os abundantes
recursos hídricos da Amazônia
para criar oportunidades econômicas
aos pequenos produtores e gerar uma receita
de milhões de dólares.
“Uma iniciativa visionária
como a IIRSA deveria ser visionária
em todas as suas dimensões, e deveria
incorporar medidas visando garantir que os
recursos naturais renováveis da região
sejam conservados e que suas comunidades tradicionais
sejam fortalecidas,” escreveu Killeen.
O estudo na íntegra,
fotos e vídeos da região amazônica
estão disponíveis mediante solicitação,
juntamente com depoimentos do autor Tim Killeen
gravados em vídeo.
Tim Killeen: Pesquisador Sênior
Isabela Santos: Diretora de Comunicação,
(em Bariloche, no Hotel Panamericano
Susan Bruce: Diretora de Mídia Internacional,
A Conservação
Internacional (CI) aplica inovações
da ciência, economia, política
e participação comunitária
à proteção das regiões
de diversidade vegetal e animal mais ricas
da terra e visa demonstrar que as sociedades
humanas podem conviver harmonicamente com
a natureza. Fundada em 1987, a CI atua em
mais de 40 países de quatro continentes
para ajudar as pessoas a encontrarem alternativas
econômicas sem prejuízo de seus
ambientes naturais. Veja mais informações
sobre a CI no site www.conservation.org.
+ Mais
ONGs lançam iniciativa
contra o desmatamento na Amazônia
Proposta prevê compensação
financeira para quem conserva floresta e propõe
metas anuais para zerar o desmatamento. Governos
federal e estaduais participam do evento
Brasília (DF), 03 de outubro de 2007
— Nove organizações não-governamentais
lançaram hoje, em Brasília (DF),
o Pacto Nacional pela Valorização
da Floresta e pelo Fim do Desmatamento na
Amazônia. A proposta, inédita,
é estabelecer um amplo compromisso
entre diversos setores do governo e da sociedade
brasileira, que permita adotar ações
urgentes para garantir a conservação
da floresta Amazônica. A iniciativa
ressalta o papel fundamental da Amazônia
na manutenção do equilíbrio
climático, conservação
da biodiversidade e preservação
do modo de vida de milhões de pessoas
que dependem da floresta para sobreviver.
A ministra do Meio Ambiente,
Marina Silva, os governadores Blairo Maggi
(Mato Grosso), Waldez Góes (Amapá),
o secretário de Meio Ambiente, Virgílio
Viana (Amazonas) e o secretário de
Meio Ambiente Edgar de Deus (Acre) participaram
do evento.
Estiveram presentes também,
o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES), Luciano
Coutinho e o lider da frente parlamentar ambientalista,
deputado Sarney Filho entre outras autoridades.
O Pacto pressupõe
o estabelecimento de um regime de metas anuais
de redução progressiva da taxa
de desmatamento da Amazônia (1), que
seria zerada em 2015. Para isso, as ONGs estimam
ser necessários investimentos da ordem
de R$ 1 bilhão por ano, vindos de fontes
nacionais e internacionais. A proposta prevê
a criação de um fundo para gerir
os recursos, que se destinará a compensar
financeiramente aqueles que promoverem a redução
efetiva do desmatamento e também ao
pagamento de serviços ambientais prestados
pela floresta.
Segundo as ONGs, os incentivos
econômicos serão voltados para
o fortalecimento da governança florestal
(monitoramento, controle e fiscalização;
promoção do licenciamento rural
e ambiental para propriedades rurais; criação
e implementação das unidades
de conservação e terras indígenas),
para otimizar o uso de áreas já
desmatadas e compensar financeiramente os
atores sociais responsáveis pela manutenção
das florestas (povos indígenas, comunidades
locais, populações tradicionais,
agricultores familiares e produtores rurais).
De acordo com o documento,
"um dos principais desafios que se coloca
é assegurar políticas públicas
que incorporem o fim do desmatamento como
benefício social, ambiental e econômico.
É necessário ir além
dos instrumentos de comando e controle, promovendo
a revisão e re-orientação
dos incentivos financeiros historicamente
canalizados para atividades predatórias".
Até 2006, cerca de
17% da floresta Amazônica já
haviam sido destruídos. Além
de provocar o empobrecimento acelerado da
biodiversidade, com impactos diretos no modo
de vida de milhões de pessoas que dependem
da floresta para sobreviver, o desmatamento
é também uma importante fonte
de emissão de gases do efeito estufa,
que contribui para acelerar o aquecimento
global. Os desmatamentos e queimadas, principalmente
na Amazônia, tornam o Brasil o 4o maior
poluidor mundial do clima.
Para Alexandre Prado da
Conservação Internacional, “o
pacto é um importante passo, pois é
apresentado por diversas organizações
que atuam na região Amazônica
em várias ações, desde
projetos de preservação e conservação
até parcerias com o setor privado.
A adesão dos Governos Estaduais, de
outras instituições sociais,
do setor privado e do Governo Federal ao Pacto
é condição para seu sucesso”.
“Agora, o próximo passo é integrar
mais parceiros com responsabilidades frente
ao grande desafio”, afirma Alexandre.
As ONGs participantes são:
Instituto Socioambiental, Greenpeace, Instituto
Centro de Vida, Instituto de Pesquisa Ambiental
da Amazônia, The Nature Conservancy,
Conservação Internacional, Amigos
da Terra-Amazônia Brasileira, Imazon
e WWF-Brasil.