25/10/2007 - Em encontro
promovido pelo Ministério Público
Federal (MPF) no Pará, o especialista
Glenn Switkes, diretor da International Rivers
Network, revelou os planos da Eletrobrás
para barragens no rio Xingu. A informação,
contida na revisão do inventário
energético do rio, é de que
pelo menos seis barramentos foram considerados
possíveis e importantes pela estatal.
Se todas virarem realidade, o alagamento total
poderia chegar a 12 mil km2.
O especialista Glenn Switkes,
diretor na América Latina da International
Rivers Network revelou nesta quarta-feira
(24) para uma platéia de jornalistas
os planos da Eletrobrás para barragens
no rio Xingu. A informação,
contida na revisão do inventário
energético do rio, é de que
pelo menos seis barramentos foram considerados
possíveis e importantes pela estatal.
A hidrelétrica de
Belo Monte seria a primeira barragem, seguida
das usinas Altamira, Carajás, Pombal,
São Félix e Montante Jarina,
de acordo com a denominação
apresentada no mapa extra-oficial. Dependendo
das opções feitas pelo Governo
Federal, o alagamento total poderia ser de
8 mil a 12 mil quilômetros quadrados.
A revelação
veio a público em encontro promovido
pelo Ministério Público Federal
no Pará, que reuniu especialistas na
questão energética e representantes
de comunidades do rio Xingu para discutir
os empreendimentos hidrelétricos na
Amazônia. A divulgação
oficial do novo inventário do potencial
energético do rio Xingu está
prevista para 31 de outubro de 2007 e pode
confirmar ou não essa informação.
Para o MPF, a suspeita de
que outras barragens no Xingu estão
nos planos da Eletrobrás se fortalece
quando se analisa isoladamente as deficiências
do projeto de Belo Monte, considerado economicamente
inviável por vários especialistas
independentes. Sozinha, a usina não
garantiria energia firme e acabaria por provocar
a construção das outras.
"É muito cara
e vai passar pelo menos seis meses paradas,
por causa da seca do rio. Sendo assim, a quem
interessa construir Belo Monte?", perguntou
o procurador da República Felício
Pontes Jr. O procurador em Altamira Marco
Antonio Delfino de Almeida, que veio a Belém
especialmente para participar do debate, cobrou
mais participação da sociedade
nas decisões estratégicas. "Talvez,
o principal fator para que continuem planejando
hidrelétricas na Amazônia é
porque aqui, ninguém reclama",
disse.
De acordo com Lúcio
Flávio Pinto, jornalista, que também
palestrou durante a reunião, quaisquer
projetos energéticos no Pará
são controversos. "A energia não
será fator de desenvolvimento no Estado",
afirmou. O fato de ser o 6º maior produtor
de energia do país e o 3º exportador
de energia bruta, para o jornalista, indicam
que a riqueza energética tem sido escoada
sem geração de renda ou desenvolvimento
na região.
A líder comunitária
Antônia Martins, da região da
Transamazônica e do Xingu também
se dirigiu à platéia e afirmou
que antes de pensar em aproveitar o potencial
energético das bacias hidrográficas
amazônicas, os moradores exigem ser
atendidos em suas necessidades mais básicas.
"Como pode uma sociedade que não
nos dá o mínimo necessário
para sobreviver querer levar nossa riqueza
maior, que é o rio?", perguntou.
Além dela, também veio de Altamira
o embaixador dos índios Kayapó,
Bokaere Kayapó, que tem a responsabilidade
de levar informações sobre os
projetos da civilização não-índia
para o rio, considerado sagrado por 18 povos
indígenas diferentes.
Por Helena Palmquist, da Assessoria de Comunicação
da Procuradoria da República no Pará.
+ Mais
Agricultores familiares
e comunidades tradicionais podem perder direitos
de usos de sementes
25/10/2007 - Debates sobre
Recursos Genéticos e Agricultura, organizados
na semana passada em Curitiba pela Articulação
Nacional de Agroecologia (ANA) e ONG Terra
de Direitos, dissecam pacote de medidas que
visam alterações legislativas
contrárias aos direitos de agricultores,
povos indígenas e comunidades locais.
Quais os impactos das medidas
que estão sendo discutidas pelo governo
federal na área de agricultura para
os recursos genéticos da agrobiodiversidade
e aos direitos de pequenos agricultores, povos
indígenas e comunidades locais? Essa
preocupação comum reuniu entidades
de trabalhadores rurais, organizações
da sociedade civil e pesquisadores durante
o seminário Recursos Genéticos
e Agricultura, realizado em Curitiba nos dias
16 e 17 de outubro. Veja abaixo quais organizações
estiveram presentes.
O alerta coletivo mostrou
que o lobby do setor privado vem buscando
emplacar algumas mudanças na legislação
que regula o desenvolvimento, produção
e uso de sementes que podem afetar a soberania
e liberdade de uso de pequenos agricultores,
povos indígenas e comunidades locais
sobre seus recursos genéticos cultivados
(agrodiversidade) e respectivos conhecimentos
associados. Por outro lado, as mudanças
propostas poderiam criar vantagens para as
indústrias que desenvolvem, comercializam
e usam variedades de sementes melhoradas em
laboratório. As alterações
visam restringir o uso de sementes não
registradas e o acesso ao seguro agrícola
por aqueles que não usam sementes registradas,
e eliminar os direitos de consentimento prévio
informado, e repartição de benefícios,
para o desenvolvimento de novas variedades
protegidas a partir de variedades crioulas
localmente cultivadas.
O seminário de Curitiba
abordou as propostas de alteração
da Lei de Proteção dos Cultivares
(nº 9.456, de 25 de Abril de 1997) e
alguns entraves provocados pela Lei de Sementes
(nº 10.711, de 5 de Agosto de 2003).
Com relação à lei de
cultivares, as propostas visam restringir
o direito do agricultor de guardar parte de
sua colheita para usar como semente na lavoura
do ano seguinte. Isso porque, hoje, o agricultor
que compra uma semente de propriedade de uma
empresa tem o direito de guardar parte de
sua colheita para usá-la como semente
no ano seguinte, sem necessidade de pagar
novamente royalties à empresa detentora
da cultivar protegida. A proposta pretende
eliminar esse direito, obrigando o pequeno
agricultor a comprar semente todos os anos,
garantindo assim a rentabilidade das empresas
através da criação de
dependência dos agricultores a seus
produtos.
Na prática, a tentativa
visa incluir o Brasil no grupo de países
que adotaram a versão 1991 da União
Internacional para Proteção
das Obtenções Vegetais (UPOV),
tratado internacional que rege o sistema de
cultivares e restringe o exercício
dos direitos de agricultores. O Brasil atualmente
é signatário da UPOV/1978, quando
o direito de guardar sementes estava contemplado.
Os principais defensores
dessa proposta são o Ministério
de Agricultura (MAPA) e a Associação
Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem),
que firmaram posição em audiência
pública realizada na Comissão
de Agricultura da Câmara dos Deputados
em agosto passado, argumentando que o uso
próprio de sementes seria um “mau hábito
cultural" dos agricultores, que deveriam
ser “reeducados para passar a usar sementes
registradas”. Saiba mais aqui.
Com relação
à lei de sementes, o seminário
abordou o problema do seguro agrícola
enfrentado pelos pequenos agricultores que
acessam o Programa Nacional de Fortalecimento
da Agricultura Familiar (Pronaf). Até
2003, o acesso a crédito no Pronaf
estava condicionado ao uso de sementes registradas
no Registro Nacional de Cultivares (RNC),
obrigando o agricultor a usar sementes de
empresas em detrimento de sementes desenvolvidas
localmente. Com a aprovação
da lei de sementes, essa distorção
foi corrigida, mas outro problema permaneceu:
o acesso ao seguro da agricultura familiar,
quando ocorrem casos de perda da lavoura por
seca prolongada, por exemplo, permanece condicionado
ao uso de sementes registradas que constem
do Zoneamento Agrícola de Risco Climático
do MAPA. A situação atual, portanto,
faz com que o pequeno agricultor cliente do
Pronaf use sementes crioulas, por sua própria
conta e risco, provocando insegurança
na maioria dos agricultores e impelindo-os
a aderir ao uso de sementes privadas.
Estrangular para incentivar
o desenvolvimento tecnológico
As ameaças aos direitos
de agricultores, povos indígenas e
comunidades locais sobre sua agrodiversidade
e seus conhecimentos associados não
ficam apenas no campo do uso de sementes e
do acesso a crédito. Também
na fase de desenvolvimento tecnológico
de novas cultivares as propostas em estudo
visam estrangular ou simplesmente eliminar
os direitos desses atores a partir de uma
suposta necessidade de “aquecer” o mercado
biotecnológico.
Essa luta se trava na discussão
da proposta de lei de acesso aos recursos
genéticos e conhecimentos tradicionais,
atualmente discutida a portas fechadas pelo
governo. A atual legislação
criou um órgão colegiado deliberativo,
o Conselho de Gestão do Patrimônio
Genético (CGEN), sob a competência
no Ministério de Meio Ambiente (MMA),
e garante os direitos de consentimento prévio
informado - e repartição de
benefícios - pelo uso de recursos genéticos
ou conhecimentos tradicionais de povos indígenas
e comunidades locais.
O MAPA pretende criar um
sistema paralelo de acesso a recursos genéticos
da agrobiodiversidade, gerido por um órgão
sem mecanismo de controle social, que teria
como competência facilitar o acesso
a recursos fitogenéticos associados
a agricultura para o desenvolvimento tecnológico
de novas cultivares comerciais, dentro do
âmbito de um sistema multilateral internacional
entre bancos de germoplasma regulado pela
Organização para Agricultura
e Alimentação da ONU (FAO).
No sistema proposto pelo
MAPA para gestão da agrobiodiversidade,
os povos e comunidades interessados em receber
benefícios deveriam cadastrar suas
sementes crioulas para ter direito a receber
um eventual percentual sobre royalties pagos
apenas sobre cultivares que vierem a ser protegidas
intelectualmente. Esse cadastro seria condição
para o exercício do direito de agricultores
familiares, povos indígenas e comunidades
locais, e exige informações
como a descrição da variedade,
a conservação em situação
similar a de seu desenvolvimento, indicação
do mantenedor de material reprodutivo representativo
da variedade e depósito de amostra
viva em coleção de caráter
livre. Todas estas condições
são difíceis de serem cumpridas
por agricultores tradicionais ou indígenas.
Na prática, o procedimento
inviabilizaria a concretização
do direito, seja porque os bancos de germoplasma
poderiam intercambiar cultivares sem identificar
se sua origem advém de comunidade local
ou indígena, ou porque existem outras
formas de proteger a cultivar sem necessidade
de repartir benefícios (por segredo
industrial, por exemplo), ou, ainda, porque
os agricultores tradicionais e indígenas
teriam que liberar seus recursos e conhecimentos
para fins comerciais para receber benefícios,
renunciando a seus direitos plenos.
Quem participou
O seminário contou
com a participação de representantes
do Movimento de Pequenos Agricultores (MPA),
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra
(MST), Movimento de Mulheres Camponesas (MMC),
Federação de Órgãos
para a Assistência Social e Educacional
(FASE), Assessoria e Serviços a Projetos
em Agricultura Alternativa (ASPTA), Terra
de Direitos, Instituto Socioambiental, GT
Biodiversidade da Articulação
Nacional de Agroecologia (ANA), Articulação
PACARI, além de pesquisadores.
ISA, Henry Novion.