Geologia - 17/12/2007 -
10:34
Estudo do MPEG comprova a real dimensão
do fenômeno natural na baía que
banha a Grande Belém. Sem intervenções,
ele pode em breve prejudicar a navegação
e as operações de portos vitais
para o Pará
Está comprovado. A baía de Guajará,
que banha a Grande Belém (PA), vem
há décadas passando por um processo
irreversível de assoreamento, o que
para breve pode implicar em impactos para
o transporte hidroviário na região.
Caso não sejam efetuados investimentos
em medidas necessárias, o fenômeno
persistirá e podendo prejudicar a navegação
de grandes embarcações e o próprio
funcionamento de portos tradicionais e importantes
para o estado, como o de Belém e o
terminal da Sotave - que hoje é visto
como estratégico para o desafogamento
do tráfego portuário no Pará.
Esses são alguns
dos resultados da pesquisa "Dinâmica
batimétrica da Baía de Guajará",
concluída recentemente pelo oceanógrafo
Arthur Gustavo Miranda, da Universidade Federal
do Pará (UFPA), e o geólogo
Amílcar Carvalho Mendes, pesquisador
do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG/MCT).
O trabalho foi apresentado no início
de novembro em Belém (PA), no 11º
Congresso da Associação Brasileira
de Estudos do Quaternário (Abequa),
que apresentou dados de estudos realizados
nos últimos dois anos em todo o Brasil
por geólogos, arqueólogos, oceanógrafos
e pesquisadores de diversas outras áreas
de conhecimento.
A dinâmica batimétrica
e morfológica de fundo da baía
do Guajará tem sido acompanhada mais
de perto desde a década de 80. No entanto,
agora pela primeira vez um estudo faz uma
análise multi-temporal sobre o fenômeno
natural do assoreamento da área, conseguindo
aferir com precisão suas reais dimensões.
A pesquisa mostra a evolução
do assoreamento ao longo dos últimos
40 anos. Para isso , Amilcar Mendes e Arthur
Miranda tiveram a ajuda de mapas batimétricos,
programas para digitalização
e processamento de dados e imagens de satélite.
Pontos críticos
Com quase 142 Km² de área, a baía
do Guajará recebe influência
direta das águas dos rios Guamá,
Acará e Pará e conta com intenso
tráfego de embarcações,
além de atividades portuárias
que incluem até o armazenamento e transporte
de derivados de petróleo, como ocorre
no Terminal Petrolífero de Miramar.
O seu assoreamento - fenômeno que diminui
progressivamente as profundidades das águas
- é causado por forças naturais.
O principal motivo apontado
é a grande quantidade de sedimentos
em suspensão nos rios que deságuam
na baía, associada a uma perda histórica
de capacidade de transporte desses sedimentos
por parte da sua massa d´água.
Essa combinação só acentua
o fenômeno - e, em alguns pontos da
Guajará, a presença de obstáculos
naturais que funcionam como amortecedores
das correntes de maré acelera ainda
mais os processos de sedimentação.
Esse é o caso da Ilha da Barra, que
cria uma espécie de ''cone de sombra''
no fundo da baía.
"A desembocadura do
Furo do Maguari é a que apresentou
os resultados mais alarmantes entre os pontos
críticos, se levarmos em consideração
que o porto da Sotave está instalado
nas suas proximidades", alerta Mendes,
que foi orientador do estudo de Miranda para
o curso de Oceanografia da UFPA.
Geólogo da Coordenação
de Ciências da Terra e Ecologia (CCTE)
do Museu Goeldi, Mendes é pesquisador
do Programa de Estudos Costeiros (PEC/MPEG)
e do projeto Piatam Mar (Potenciais Impactos
Ambientais no Transporte de Petróleo
e Derivados na Zona Costeira Amazônica),
nos quais dedica-se à geomorfologia,
à sedimentologia e à geologia
ambiental.
Hoje, Miranda é oceanógrafo
e bolsista do projeto Amasis (Integração
de dados Geofísicos, Geológicos
e Geoquímicos na Reconstrução
da Paleogeografia da Costa Amazônica
do Terciário ao Recente), coordenado
pela doutora Odete Silveira, do curso de Oceanografia
da UFPA, e financiado pelo Centro de Pesquisa
e desenvolvimento da Petrobras, Cenpes).
"Esses são problemas
que exigem ações da gestão
portuária. Sem investimentos do estado
em medidas como a dragagem de áreas,
a tendência é a acentuação
do assoreamento. O Porto de Belém já
apresenta dificuldades para operações
e pequenos encalhes já são verificados
a meia maré de vazante. O porto de
Belém e o da Sotave podem ser prejudicados",
aponta Mendes. Outros dados do estudo mostram
que o fenômeno pode ainda tornar mais
aguda a ação das águas
em algumas áreas críticas que
sofrem com erosão de margens, como
o campus da Universidade Federal do Pará,
localizado à beira do rio Guamá,
ao sul da baía.
Dados
Para chegar às conclusões atuais
sobre a dinâmica do assoreamento da
baía do Guajará, o trabalho
do Museu Goeldi comparou cartas batiméricas
de 1962 e 2003, publicadas pela Diretoria
de Hidrografia e Navegação da
Marinha do Brasil (DHN). Assim, avaliou as
mudanças nas formas de fundo nesse
intervalo de 41 anos. Foram observadas as
alterações de dimensões
e formas de bancos de areia e canais. Suas
taxas de crescimento e migração
também foram estimadas. Assim, o estudo
identificou as principais áreas críticas
da Baía de Guajará que sofrem
com a diminuição progressiva
de profundidades.
Além de levantamento
de cartas náuticas, os estudos levaram
em consideração também
informações levantadas por outros
estudiosos e pela Portobras na década
de 1980. Primeiro as duas cartas da DHN foram
digitalizadas e depois as suas informações
comparadas, com a ajuda de softwares especiais.
Foram cruzados os dados de 387 pontos de cotas
batimétricas registradas em 1962 e
de outros 412 pontos de medição
de profundidades presentes na carta de 2003.
A elaboração
do mapeamento digital do fundo da baía
também utilizou imagens do satélite
Landsat para digitalização das
suas margens. Ao todo, também cerca
de 11 perfis do fundo foram elaborados com
a ajuda dos dados batimétricos, resultando
em "cortes" que expõem visualmente
as condições de 1962 e 2003
das profundidades de canais e bancos de areia
ao longo de toda a extensão da baía,
de Sul a Norte.
Mudanças
Os resultados levantados pelo estudo mostram
que no setor norte da baía de Guajará,
no período de 1962 a 2003, o banco
da Ilha da Barra apresentou uma migração
de 49 metros ao ano rumo ao Norte, além
de expansão lateral de 28 metros ao
ano. Em 1962, o banco tinha 7,5 KM² de
área. Em 2003, sua área chegou
a 9,47 por 2,12 quilômetros de tamanho.
Outro dado alarmante apresentado pelo estudo
é a redução pela metade
das profundidades próximas ao Distrito
de Icoaraci. Em 1962, a média era de
25 metros. Em 2003, as cotas atingiram 12
metros.
Nas últimas quatro
décadas, o chamado Banco Sul da Cidade
também se expandiu para Sudoeste, enquanto
a chamada Barra de Guajará-Açú
sofreu uma retração. Já
o canal da Ilha das Onças migrou para
Oeste e os bancos do Meio e da Cidade fundiram-se
em decorrência do forte processo de
assoreamento. Com exceção do
canal da Ilha das Onças, única
área do estudo que apresentou aumento
de profundidades (de 11 para 19 metros entre
1962 e 2003), todos os locais estudados na
baía do Guajará sofreram agudas
diminuições de cotas nos últimos
40 anos (veja box).
Baía de Guajará
Confira a variação das profundidades
causada pelo assoreamento registrado nos últimos
40 anos:
1962-2003
*Distrito de Icoaraci - 25m ¬ 12m
*Banco Sul da Cidade - 5m ¬ 3m
*Ponta de Porto Alegre - 19m ¬ 16m
*Barra de Guajará-Açú
- 8m ¬ 4m
*Canal da Ilha das Onças - 11m ¬
19m
*Bancos do Meio e da Cidade - 4m ¬ 3m
Lázaro Magalhães – Serviço
de Comunicação Social do Museu
Goeldi