Instrução
Normativa do órgão considera a criação
de camarões uma ameaça constante aos
ecossistemas de manguezais
Salvador, 23 de abril de 2008
— Em Instrução Normativa publicada
no Diário Oficial da União da última
quinta-feira (17), o Ministério do Meio Ambiente
(MMA) suspendeu as concessões de anuências
e de autorizações para instalação
de novos empreendimentos ou atividades de carcinicultura
(criação de camarões) nas unidades
de conservação (UCs) federais e em
suas zonas de amortecimento, salvo empreendimentos
previstos nos planos de manejo das unidades.
Segundo a instrução,
“a carcinicultura desenvolvida no País vem
ameaçando constantemente os ecossistemas
de manguezais”. Dentre outras fundamentações,
a medida se baseia na fragilidade e importância
dos ecossistemas de manguezal, considerados Área
de Preservação Permanente (APP) e
zonas úmidas de importância internacional;
e nas deliberações das Conferências
Nacionais do Meio Ambiente, que solicitam a proibição
dos empreendimentos ou atividades de carcinicultura
nas unidades de conservação costeiras
e marinhas.
Ao limitar a carcinicultura nas
UCs federais, o MMA reconhece o caráter não
sustentável da atividade. “A iniciativa merece
aplausos”, afirma Fábio Motta, coordenador
do Programa Costa Atlântica da Fundação
SOS Mata Atlântica. “A posição
do Ministério é coerente com a defesa
do ecossistema que é berçário
das espécies marinhas e, em consequência,
com a proteção daqueles que vivem
da pesca”, complementa. Erika de Almeida, da secretaria
da Rede Mangue-Mar, explica que os governos estaduais
também deveriam adotar medidas equivalentes
para proteção de suas UCs: “esse instrumento
pode servir de base para que os estados também
tomem um posicionamento de precaução
em relação aos impactos da carcinicultura,
seguindo o exemplo do Ministério”, defende.
As experiências com a carcinicultura
no Brasil revelam que a atividade não é
sustentável do ponto de vista social e ambiental.
De acordo com relatório do Grupo de Trabalho
sobre Carcinicultura, da comissão de impacto
de meio ambiente e desenvolvimento sustentável
da Câmara dos Deputados, de 2005, os impactos
gerados pela atividade incluem danos aos ecossistemas
e prejuízos sociais. A modificação
do fluxo das marés, a extinção
de habitats de numerosas espécies, a disseminação
de doenças entre crustáceos e a contaminação
da água estão entre os efeitos ambientais
identificados. O relatório também
revela que, com o estabelecimento das fazendas de
camarão, o desaparecimento de espécies,
a proibição de acesso às áreas
de coleta de mariscos e a expulsão de pescadores
acarretam conflitos de terra e empobrecimento das
populações tradicionais.
Exemplos dessa situação
podem ser encontrados na Bahia. Um mapeamento recém-lançado
pela Rede Mangue-Mar aponta os conflitos socioambientais
gerados pela atividade de carcinicultura em seis
municípios do estado. Segundo a publicação
- que conjugou informações coletadas
junto a comunidades, entidades de base, órgãos
ambientais e ao Ministério Público
- as fazendas de camarão vêm sendo
instaladas sem observância das normas ambientais,
gerando impactos negativos sobre os ambientes utilizados
pelas comunidades costeiras para geração
de emprego e renda. Muitos empreendimentos são
instalados em Áreas de Preservação
Permanente, e alguns deles até mesmo dentro
de UCs. Em Canavieiras, por exemplo, um laboratório
de produção de pós-larvas sofreu
embargo por funcionar dentro da Reserva Extrativista
(uma unidade federal). Ainda segundo informações
do mapeamento, os conflitos entre produtores e comunidades
culminaram em uma tentativa de assassinato, em julho
de 2004, e um homícidio, em março
de 2005, ambos contra pescadores do munícipio
de Salinas da Margarida.
A instrução normativa
do MMA prevê que as fazendas de carcinicultura
já licenciadas em unidades de conservação
federais, e que tenham ocupado áreas de manguezais
- incluindo mangue, apicum, salgado e demais APPS
- terão prazo, a ser definido pelo Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio), para a retirada das instalações
e a recuperação das áreas.
O texto da instrução afirma ainda
que o ICMBio realizará mapeamento dos empreendimentos
de carcinicultura instalados nas UCs, para identificar
os casos de ocupação irregular de
APPs, aplicar as sanções cabíveis
e levantar as áreas que precisarão
ser recuperadas pelos empreendedores.
Fontes:
- Érika de Almeida: Oceanógrafa, Rede
Mangue-Mar Bahia / Rede Mangue-Mar Brasil
- Fábio Motta: Biólogo, Coordenador
do Programa Costa Atlântica da Fundação
SOS Mata Atlântica
A Coalizão SOS Abrolhos
é uma rede de organizações
do Terceiro Setor mobilizadas para proteger a região
com a maior biodiversidade marinha registrada no
Atlântico Sul. A Coalizão SOS Abrolhos
surgiu em 2003, ano em que conquistou uma vitória
inédita para a conservação,
ao impedir a exploração de petróleo
e gás natural naquela área. A Coalizão
é atualmente formada pela Rede de ONGs da
Mata Atlântica; Fundação SOS
Mata Atlântica; Conservação
Internacional (CI-Brasil); Instituto Terramar; Grupo
Ambientalista da Bahia – Gambá; Instituto
Baleia Jubarte; Environmental Justice Foundation
– EJF; Patrulha Ecológica; Associação
de Estudos Costeiros e Marinhos de Abrolhos - ECOMAR;
Núcleo de Estudos em Manguezais da UERJ;
Movimento Cultural Arte Manha; Centro de Defesa
dos Direitos Humanos de Teixeira de Freitas; Mangrove
Action Project – MAP; Coalizão Internacional
da Vida Silvestre - IWC/BRASIL; Aquasis – Associação
de Pesquisa e Preservação de Ecossistemas
Aquáticos; Agência Brasileira de Gerenciamento
Costeiro; Centro de Estudos e Pesquisas para o Desenvolvimento
do Extremo Sul da Bahia – CEPEDES; PANGEA - Centro
de Estudos Sócio Ambientais; Instituto BiomaBrasil;
Associação Flora Brasil e Greenpeace.