29 de
Junho de 2008 - Luana Lourenço - Repórter
da Agência Brasil - Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr
Brasília - O líder indígena
Hiparidi Top' tiro diz que não faz parte
da cultura xavante matar pessoas com deficiência
física
Brasília - A hipótese de que o assassinato
da índia Jaiya Xavante tenha sido cometido
por uma tia da adolescente, levantada por uma fonte
da Fundação Nacional de Saúde
(Funasa), “não tem nenhum cabimento” e é
uma tentativa da fundação de desviar
a atenção das deficiências no
atendimento à saúde indígena.
A avaliação é do líder
xavante Hiparidi Top'tiro, feita hoje (29), em entrevista
à Agência Brasil.
“Não faz parte da nossa
cultura matar pessoas com deficiência física,
estão dizendo que isso é um ritual
nosso. Isso seria impossível na nossa cultura.
Essa hipótese não tem nenhum cabimento
na nossa estrutura social. Não tem nenhum
respaldo antropológico”, afirmou Top'tiro.
De acordo com Top'tiro, a criação
das crianças xavante não é
restrita aos pais, mas compartilhada com avós
e membros da tribo. Por esse motivo, o assassinato
de um xavante por alguém da família
“causaria uma instabilidade social na aldeia, uma
guerra”.
“Isso é tentativa de desviar
foco sem ter conhecimento da nossa cultura. Se a
Funasa encontrar um antropólogo que confirme
isso, ele vai ter que nos re-ensinar nossa própria
cultura”, argumentou.
“A mídia já está
condenando a família. Estão tentando
associar com o caso dos brancos que mataram a filha”,
acrescentou, em referência à morte
da menina Isabella Nardoni em São Paulo,
que, segundo investigações da Polícia
Civil, foi planejada pelo pai e pela madrasta.
O líder indígena
informou que organizações xavante
pretendem questionar a Funasa, inclusive judicialmente,
pelas acusações repassadas à
imprensa. Integrantes da Mobilização
dos Povos Indígenas do Cerrado deverão
percorrer aldeias xavante nesta semana para articular
a defesa.
Top'tiro acredita que a investigação
da Polícia Civil deverá apontar a
família da adolescente xavante como responsável
pela morte, porque, segundo ele, “é comum
a polícia não ir a fundo em casos
como esses, em crimes que envolvem indígenas”.
Na avaliação de
líder xavante, o crime foi cometido por algum
integrante da segurança da Casa de Apoio
à Saúde Indígena (Casai) ou
mesmo por algum servidor da Funasa, para alegar
insegurança do local e apressar o fechamento
da instituição. “Eles querem fechar
a casa há tempos. A Funasa reclama dos custos,
questiona a vinda de parentes para acompanhar os
indígenas em tratamento; não entende
nossa cultura”, afirma.
“Se for preciso, vamos acampar
em frente ao Ministério da Saúde para
exigir solução, não só
para esse caso, mas para cobrar respostas sobre
a questão da saúde indígena”,
adiantou Top'tiro.
Segundo ele, os agentes encaminhados
pela Funasa para atendimento de grupos indígenas
têm preconceito contra os costumes das comunidades.
“Saúde indígena não é
uma questão que dependa só de técnica,
é preciso ter conhecimento sobre as culturas”,
defende.
+ Mais
Relatório do Cimi mostra
que nove indígenas sofreram violência
sexual em 2007
27 de Junho de 2008 - Paula Laboissière
- Repórter da Agência Brasil - Brasília
- No ano passado, nove indígenas foram vítimas
de violência sexual no Brasil – quatro deles
menores de 18 anos. Foram oito casos de estupro
e um de tentativa. Em três ocorrências,
os acusados também eram indígenas.
Os dados fazem parte do relatório A violência
contra os povos indígenas no Brasil, publicado
pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
De acordo com o levantamento,
os números registrados em 2006 foram ainda
piores. A instituição chegou a constatar
12 ocorrências de violência sexual contra
indígenas. Casos de aliciamento, estupro
e de tentativa levaram a um total de dez vítimas
em todo o país.
Dentre os casos de mais destaque
no ano passado está o de um índio
de 22 anos da etnia Guarani Kaiowá. No mês
de setembro, ele foi espancado e violentado por
outros cinco jovens – quatro deles menores de idade
– na aldeia Bororo, no Mato Grosso do Sul.
O estado liderou a lista de localidade
com maior número de casos de violência
sexual contra indígenas, no ano passado,
com quatro ocorrências, no total. Mato Grosso,
Pará, Rio Grande do Sul e Roraima registraram
uma vítima cada. Em 2006, o Mato Grosso do
Sul também ficou com o primeiro lugar em
número absoluto de casos de violência
sexual contra indígenas.
Em 2008, um dos casos já
registrados pelo Cimi ocorreu no município
de Nova Olinda do Norte, no Amazonas. Em março
deste ano, uma adolescente da etnia Munduruku sofreu
uma tentativa de estupro. O acusado pela agressão,
segundo a ficha do caso, é um dos vereadores
da cidade, José Reginaldo Pereira da Silva,
conhecido como “o Gordo”.
A índia relatou que, no
dia do crime, aceitou carona na motocicleta do agressor
e explicou que, como Silva era vereador, confiou
nele. Quando viu que ele havia pego a estrada com
a intenção de violentá-la,
pulou da moto e torceu o pé. Uma amiga da
adolescente tentou socorrê-la e também
foi agredida pelo acusado.
As adolescentes denunciaram o
caso na Delegacia Especializada em Crimes Contra
a Criança e o Adolescente e na Fundação
Nacional do Índio (Funai). Foi Instaurado
inquérito policial mas não houve prisão
em flagrante ou mesmo prisão preventiva.
A ficha do caso indica que “nenhuma providência
foi tomada quanto à denúncia”, segundo
o Cimi.
O último episódio
de violência sexual contra indígenas
registrado em 2008 foi o da adolescente de etnia
xavante que a morreu na última quarta-feira
(25) durante uma cirurgia no Hospital Universitário
de Brasília (HUB). O delegado-chefe da 2ª
delegacia de polícia do Distrito Federal,
Antônio José Romeiro, responsável
pelas investigações, confirmou que
a índia sofreu perfuração no
órgão genital.
Ele garante ainda que o crime
aconteceu dentro da Casa de Apoio à Saúde
Indígena (Casai) do Distrito Federal, que
pertence à Fundação Nacional
de Saúde (Funasa). A menina tinha lesão
neurológica – não falava e se locomovia
por meio de cadeira de rodas – e estava em Brasília
para tratamento médico desde o dia 28 de
maio. De acordo com o delegado, a Casai também
será investigada.
A assessoria do Cimi informou
que o órgão aguarda maiores esclarecimentos
sobre o caso da índia xavante para se manifestar
sobre o assunto.