Panorama
 
 
 

DE VOLTA AO PARÁ

Panorama Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Julho de 2008

30/07/2008 - Em artigo publicado no Jornal Pessoal da primeira quinzena de agosto, o jornalista Lúcio Flavio Pinto fala sobre o anúncio da Vale em construir uma grande aciaria e que o governo federal afirma que desta vez sairá a hidrelétrica de Belo Monte. Investimentos de muitos bilhões no Pará.

Há uma nova onda de grandes investimentos desabando simultaneamente no Pará. Um deles foi anunciado com todas as letras na quinzena passada: a Companhia Vale do Rio Doce garante que, desta vez, dará um passo a mais na transformação do minério de ferro, que extrai há um quarto de século das minas de Carajás, em escala crescente (o que fez o horizonte da exploração cair de 400 para menos de 150 anos). A empresa disse que investirá seis bilhões de dólares numa fábrica que produzirá 2,6 milhões de toneladas de placas de aço em Marabá, no Pará.

É negócio de causar impacto em qualquer parte do mundo, mas sobretudo no Pará, que há seis anos vem disputando essa obra com o Maranhão. A Vale ainda juntará no pacote algumas outras iniciativas para ajudar o Estado a sair do mero extrativismo mineral, para cuja manutenção a ex-estatal tem dado sua decisiva colaboração. Mas o governo terá que fazer a sua parte, que não será pequena. Uma das contrapartidas poderá ser o licenciamento ambiental da usina de energia que a Vale planeja construir em Barcarena, com capacidade para 600 mil kW (o equivalente a quase duas das 21 turbinas que funcionam na hidrelétrica de Tucuruí), uma das maiores do programa de termelétricas no país.

A usina será à base de carvão mineral importado, um dos processos mais poluidores que há. Além de anunciar o uso da tecnologia mais limpa que existe, a Vale argumenta em defesa do seu projeto que não há alternativa no prazo que lhe interessa para permitir a ampliação da capacidade de produção da Albrás, a 8ª maior fábrica de alumínio do mundo, instalada em Barcarena. A Albrás estagnou, por causa de sua intensa demanda de energia não suprida, enquanto a vizinha Alunorte, que produz alumina, o insumo para o metal, cresceu tanto que se tornou a maior do mundo, por exigir muito menos energia.

De fato, não há nenhuma outra possibilidade de curto prazo para adicionar a quantidade de energia exigida por uma fundição de alumínio como a da Albrás. Por isso mesmo, o governo federal tomou providências para colocar o projeto da hidrelétrica de Belo Monte na prancheta de execução. Numa ofensiva orquestrada, o Conselho Nacional de Política Energética decretou que haverá um único aproveitamento na bacia do Xingu, o de Belo Monte. O governo renunciou a construir mais três barragens que estavam incluídas no programa de obras da Eletronorte para não causar maior impacto ecológico nem efeitos nocivos aos índios e ao restante da população da área. Com tal compromisso, o complicado e acidentado licenciamento ambiental poderá finalmente sair.

Em sã consciência, ninguém poderia se opor a uma obra que produzirá um terço de energia a mais do que Tucuruí, a quarta do mundo, inundando uma área sete vezes menor, o que proporcionaria o menor custo por kW instalado do mercado. A facilidade com que os dados são manipulados, conforme as diferentes configurações dos projetos apresentados pela Eletronorte, porém, não cria nenhuma segurança entre os que analisam a partir de fora o plano energético para o Xingu.

O próprio diretor-geral da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), Jerson Kelman, foi claro: a decisão do governo de se limitar a uma hidrelétrica no Xingu foi política e não técnica. Do ponto de vista técnico, ele não tem dúvida de que seria viável implantar os outros três aproveitamentos, que resultariam em mais 3,5 mil megawatts adicionados aos 11,8 mil MW de Belo Monte. Se, no futuro, com outro governo, a vontade política mudar, o curso do planejamento inicial poderá ser retomado. Nada há que o impeça.

Continua a predominar entre os técnicos independentes a convicção de que, sozinha, a usina de Belo Monte não tem viabilidade econômica, independentemente da avaliação dos seus impactos socioambientais. O compromisso com uma única barragem seria apenas uma manobra tática para criar o fato consumado do primeiro aproveitamento e assim possibilitar os demais, que acumularão água a montante do rio para usá-la nos períodos de estiagem (quando a vazão pode cair até 30 vezes), incrementando a potência de geração.

Há, contudo, uma saída, há muitos anos defendida por este jornal: modificar a concepção sobre o desenvolvimento na Amazônia. O planejamento seria feito a partir das bacias hidrográficas, que são a mais sólida referência física na região. Antes de definir qualquer uso para o Xingu, por exemplo, o governo federal teria que remeter ao congresso um projeto de lei sobre o plano de desenvolvimento para o vale por longo período (15 ou 20 anos), no qual um dos itens seria o uso energético.

Se for sincera e convicta a decisão de só erguer uma única barragem no Xingu, a lei sobre o desenvolvimento do vale estabelecerá esse compromisso, conferindo-lhe valor legal. O descumprimento caracterizaria a prática de um delito, punível na forma da legislação penal e cível. A palavra do agente do governo deixaria de ser apenas palavra, que o vento das conveniências leva.

Talvez a partir daí seja possível um debate sério e maduro sobre a possibilidade e a conveniência de o país prosseguir no uso dos rios para fins energéticos. É claro que há certa pressa na tomada de decisões, em função das grandes transformações que ocorrem neste momento em todo mundo. Essas mudanças atingem a Amazônia, mas não podem se refletir na região apenas como eco. A Amazônia precisa ter voz própria, algum poder de iniciativa, de criação. O efeito reverso dos tremores, que têm seu epicentro fora da região, não pode ser sempre de acordo com os interesses dos que criam esses efeitos e estão armados das melhores informações.

O esgotamento das fontes de energia na Amazônia para incrementos significativos da produção é um fato, em boa parte resultante da imprevidência dos que monopolizam o poder decisório. Esse fato pode ser atenuado e, em alguns casos, resolvido por outras fontes de energia, inclusive as não propriamente alternativas, como o gás, cujas pesquisas no litoral amazônico são mantidas num banho-maria inexplicado (e inaceitável). Quando a demanda é urgente, essas respostas deixam de ser satisfatórias porque as pesquisas, mesmo que venham a ter o apoio merecido, que hoje não têm, não darão resultados imediatos. Mas a equação da solução não pode ser montada apenas pelos agentes produtivos.

É realmente do interesse do Pará que a Albrás produza mais lingote de alumínio, produto de baixo valor agregado, à custa de muita energia, com tarifa favorecida, e sem gerar o principal imposto, o ICMS, porque a exportação de semi-elaborados não é taxada? Na ponta do lápis, não. Pode o governo fornecer a energia no volume requerido e por preço atrativo se a Vale do Rio Doce instalar unidades de transformação do metal básico, que criarão melhores empregos, irão gerar mais renda e pagarão imposto? Por que não colocar essa exigência na mesa de negociação?

A Vale não está sozinha nem é a dona do mercado. Apesar de toda a sua propaganda e relações públicas, a Vale ainda não conseguiu criar uma imagem de companhia sustentável porque seu discurso está sempre colidindo com os fatos. Apesar do enorme dinheiro que gastou para lançar a sua nova marca, a novidade não se estendeu ao conceito de responsabilidade social de tal maneira a convencer os auditórios mais exigentes no mercado mundial, justamente o seu alvo. Esse desempenho resulta da dificuldade que a empresa tem para praticar jogos que não sejam aqueles nos quais põe sua marca, os quais quer sempre ganhar.

Diga-se também que esse jogo é viciado porque do outro lado não há contendores sérios e conseqüentes. No momento em que essa onda de novos “grandes projetos” vem bater no território paraense, empurrada pelo mercado mundial, constatar que a interlocução não é séria dá uma sensação de desalento que nenhum marketing é capaz de retocar. Mesmo porque a maquilagem dura pouco, como estamos vendo. Se outros grandes projetos do passado mão desenvolveram de fato o Pará, estes novos projetos mudarão essa história?
Lúcio Flavio Pinto

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Assembléia da Oibi elabora propostas para o manejo pesqueiro na Bacia do Içana

30/07/2008 - Baniwa debatem as informações que vêm obtendo com o monitoramento de pescarias e sugerem medidas para compor um acordo de sustentabilidade da pesca nessa região do noroeste amazônico.

Todo ano tem muito peixe nascendo nas águas que formam as cabeceiras do Rio Negro. E eles irão se somar aos que estão crescendo na extensa malha de igarapés, lagos, igapós e canais de afluentes principais do Rio Negro como o Içana, Ayari, Xié, Tiquié e Waupés. Dieta preferida das mais de 30 mil pessoas que vivem na região - sejam frescos ou moqueados; assados ou em forma de mojecas, caldeiradas e kiñampiras quase sempre acompanhadas de deliciosos beijus e farinhas - todo ano também tem muito peixe sendo retirado dessas águas. Dos diversos e complexos processos que contribuem para o resultado dessa equação depende grande parte da manutenção de um dos mais ricos conjuntos da fauna aquática do País, além da segurança e cultura alimentar da população altorionegrina. Esta por sua vez, é composta em sua maioria por membros de 22 etnias que ocupam cerca de 11 milhões de hectares de Terras Indígenas homologadas de forma contínua desde 1998, no noroeste amazônico, ao longo da megadiversa faixa transfronteiriça de Brasil, Colômbia e Venezuela.

Preocupados com a crescente escassez de peixes, os índios Baniwa, representados pela Organização Indígena da Bacia do Içana (Oibi) e com apoio da Foirn (Federação das organizações Indígenas do Rio Negro), do ISA e do Instituto Leônidas e Maria Deane (ILMD)/Fiocruz Amazônia vêm empreendendo, desde meados de 2006, uma série de encontros e conversas. O objetivo principal é implementar um plano de manejo que fortaleça as condições de sustentabilidade da pesca na bacia do Içana, onde vivem aproximadamente 6 000 pessoas. A partir daí foi elaborado o projeto Kophé Koyaanale, que em Baniwa significa “casa/fonte/mãe de peixe”, coordenado pela Oibi e financiado pelo PDPI/MMA.

Os resultados foram debatidos durante a assembléia da Oibi entre os dias 17-19 de julho, na comunidade de Tukumã-rupitá, no Médio Rio Içana. Cerca de 250 pessoas, representantes de 30 comunidades, coordenadores e alunos de seis escolas e de dez associações indígenas do Baixo, Médio e Alto Içana, e dos afluentes Ayari e Cuiari. Os participantes discutiram as informações reunidas em dois anos de auto-monitoramento da pesca exercido ao longo de 200km da calha do rio, o estabelecimento de um consenso para se chegar a uma régua de tamanho mínimo de captura dos peixes e aprovaram uma série de recomendações para compor um acordo de pesca a ser implementado de agora em diante na região. (veja mais adiante)

Água-Peixe-Floresta-Gente

Entender como os peixes nascem, crescem e morrem na Bacia do Içana, associados aos ciclos de vida dos próprios Baniwa, e como estas sociedades interagem criando novas ordens a partir daí, tem sido um dos caminhos trilhados pela equipe do projeto Kophé, no sentido de identificar e estabelecer etiquetas de regulação dessas relações que favoreçam ambas as partes. Uma rica tradição mítica já foi documentada pelos próprios Baniwa por meio de um esforço que constituiu a mitoteca baniwa associada aos peixes. (Saiba mais). Eles narram como diversos heróis míticos, ancestrais dos Baniwa atuais empreenderam várias negociações, trocas matrimoniais e relações de guerra, vingança e domesticação com os ancestrais dos peixes. Retratam uma época em que a condição destes últimos era muito mais de uma humanidade-peixe do que a condição atual, em que é crescente a animalização dessa “sociedade”, fomentada sobretudo pelo poder e influência do pensamento ocidental.

"Por aqui os peixes nascem de várias formas e em vários lugares", conta Juvêncio Cardoso (Dzoodzo em Baniwa), coordenador da Escola Indígena Baniwa-Coripaco (EIBC-Pamáali), e um dos maiores interessados no projeto Kophé. Nascem das piracemas que ocorrem no subir do nível do rio, entre os meses de março e maio – e o projeto Kophé Koyaanale já mapeou cerca de 120 delas -; nascem dos ninhais sob vigília, que traíras, acarás, tucunarés e jacundás estabelecem nas "samambaias" e na raizama dos igapós, cuja porção mais extensa na bacia se encontra no Médio Içana. Nascem também quando, a cada inverno, a cada enchente, Koyaanale, a entidade que é casa/pai/mãe/fonte dos peixes, os vomitam nos locais sagrados de diversos lagos; ou por meio de magníficas metamorfoses percebidas desde tempos imemoriais pelos Baniwa.

Da mesma forma que as andorinhas Olíuda, quando ao léu das pesadas chuvas de piracema, caem nas águas do Içana para se transformar nos peixes Toloya (veja ilustração abaixo); ou quando as larvas das palmeiras Jauari, extensamente distribuídas nas margens alagadas do rio, se transformam nos peixes Kawiri. E existem ainda tantas outras dessas metamorfoses, proporcionais mesmo à diversidade da vegetação que acompanha os cursos dos rios, lagos e igarapés. Assim, Ponamanawi, bicho de Patauá, se transforma em Ooro. Kadaapali, bicho de Koodama, se transforma em Maanapi. Muito se alegram os Baniwa, quando açaizais e jauarizais inteiros resolvem transformar seus coquinhos em saborosos peixes, dando provas incontestes das interdependências e dos fluxos de matéria e energia do sistema água-peixe-floresta-gente.

Recentemente, muito peixe também tem nascido de reproduções assistidas em modernas estações de piscicultura construídas através da parceria ISA/Foirn. Dzoodzo ou Juvêncio, por exemplo, é um dos maiores especialistas Baniwa em reprodução assistida de peixes e sabe de cor e salteado quantos alevinos já nasceram na estação de piscicultura EIBC-Pamáali. Inaugurada em dezembro de 2003 a estação atingiu em 2008, a marca de 1 milhão de alevinos, que vêm sendo distribuídos para uma crescente rede de viveiros de piscicultura amenizando um pouco a situação das comunidades nos períodos de extrema escassez de peixes no Içana. (Saiba mais). Em contraste à grande diversidade de sua ictiofauna, as águas da Bacia do Rio Negro são das mais pobres em produtividade pesqueira na Amazônia. Devido a isso a pesca na Bacia do Içana não é uma atividade comercial.

Diariamente, a maioria dos homens no Alto Rio Negro ou está caçando ou está pescando. E essa rotina começa bem cedo na vida dos Baniwa. Caso do pequeno Edmilson Lopes da Silva, de 13 anos, do clã Hohoodene da comunidade de Tarumã, que entre 16 de março de 2006 e 30 de março de 2008 realizou pelo menos 218 pescarias que resultaram no abate de 2675 peixes pertencentes a 61 espécies, incluídos ai, por exemplo, 113 Tucunarés, sete Surubins, 198 Traíras, 268 Aracus, 328 Sarapós e 75 Acarás. A garantia de precisão com que informações como estas a partir de agora estarão disponíveis aos Baniwa se deve, neste caso, ao pai do próprio Edmilson, Jaime Lopes, que é um dos 17 Agentes Indígenas de Manejo formados pela Oibi e que vêm monitorando a pesca no Içana com o intuito de alimentar de informações as discussões do Plano de Manejo da Pesca na bacia.

1000 dias de monitoramento

Ao todo os agentes de manejo já monitoraram 4 500 pescarias em dois anos de atividade. Minuciosamente registrados na Ficha de Acompanhamento da Pesca no Médio Içana, agora os dados estão sendo convertidos em relatórios de pesquisas e vêm fomentando as discussões como as que ocorreram na assembléia. Mário Farias, vice-presidente da Oibi e coordenador do projeto, apresentou as informações já sistematizadas para uma platéia atenta de homens, mulheres e crianças Baniwa e Coripaco. O monitoramento da pesca se estendeu por 1000 dias seguidos. Foram registradas pescarias de 22 mulheres com idades entre 8 e 85 anos e de 271 homens com idades entre 5 e 91 anos. Nas fichas de registro foram anotadas a identidade clânica da pessoa, o local de pesca, o horário de início e término da pescaria, as espécies capturadas, a quantidade e o tamanho de cada peixe, as artes de pesca utilizadas e, por último, o pescador era convidado a dar sua opinião se a pescaria foi boa, ótima ou fraca. Clique aqui para ver o modelo da Ficha de Acompanhamento da Pesca.

Tais informações passarão a vigorar como indicadores da situação da pesca no Içana, uma vez que a equipe pretende seguir adiante e acumular uma série com novas rodadas de monitoramento. Atualmente, por exemplo, a opinião sobre o resultado das pescarias registra que 57% das acompanhadas foram consideradas boas, 13% ótimas e 30% fracas. O resultado varia com a faixa etária, sendo o maior índice de pescarias fracas registrado entre os mais jovens, com idades entre 5 e 15 anos, e diminuindo com o aumento da idade dos pescadores.

Mário Farias alerta que os resultados das pescarias que os Baniwa realizam afetam em muito as relações sociais entre as pessoas e comunidades, pois a ética Baniwa orienta que uma parte dos peixes pescados deve se consumida pela família do pescador, e a outra parte deve ser partilhada por todos durante as refeições comunais que se realizam duas vezes por dia nos centros comunitários. Ele afirma que como as pessoas não conseguem peixes em quantidade maior, preparam os poucos que conseguem em mojeca. “Na maioria das vezes não levam a comida para o centro comunitário, diferente dos períodos de boas pescarias, porque dá apenas para sustentar os filhos, a família.” O pescador considera pescaria boa quando pega cinco a seis peixes, que atingem cerca de 1kg a 2kg. "Com esses peixes, dá para fazer uma mojeca para alimentar a família, e levar um pouco para o centro comunitário", diz.

Proposta de acordo de pesca

A assembléia fez várias sugestões para a elaboração do acordo de pesca. Uma das etapas que mais animou os participantes foi chegar a um consenso sobre o tamanho mínimo de captura dos peixes da Bacia do Içana. O princípio do tamanho mínimo de captura como prática de manejo tem dado bons resultados nos lugares onde vem sendo aplicado. Na assembléia, foi amplamente lembrado o caso do manejo de Pirarucu na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (AM). Ao capturar os peixes cujo tamanho indique que ele já teve oportunidade de se reproduzir por pelo menos uma vez no rio, têm-se a garantia de repovoamento natural com novos indivíduos que crescerão nas áreas que alimentarão futuras pescarias.

A legislação nacional sobre a pesca já define vários tamanhos mínimos de captura para diferentes tipos de bacias hidrográficas, mas a lista de espécies estudadas pelos órgãos oficiais ainda é muito pequena em comparação com a lista de espécies consumidas pelos Baniwa. Como a região representa um vácuo de pesquisa científica, a equipe do projeto também suspeitou que muitas das recomendações das listagens oficiais para a Amazônia ampla não eram adequadas às condições de desenvolvimento das espécies nos ambientes oligotróficos do Alto Rio Negro. Para superar isso os 17 agentes de manejo pediram aos sabedores e velhos de suas comunidades que dessem suas opiniões sobre o tamanho mínimo reprodutivo de cerca de 118 espécies que são mais pescadas nas comunidades do Içana. Como muitas respostas variaram de uma comunidade para outra, a assembléia foi escolhida como a ocasião ideal para o estabelecimento de um consenso.

Tamanho decidido no voto

Com a ajuda dos alunos da Escola EIBC-Pamáali, todas as opções de tamanhos indicadas pelas comunidades foram desenhadas e levadas para votação na assembléia. Após a decisão de que apenas os maiores de 15 anos poderiam votar, o centro comunitário de Tukumã-rupitá transformou-se num grande palanque onde todos tiveram a oportunidade de comparar e indicar calmamente o tamanho mínimo a partir do qual os peixes já teriam realizado a primeira reprodução. Os mais jovens trabalharam como "mesários", anotando os votos dos mais velhos que percorreram todo o salão numa longa fila. No dia seguinte, Mário Farias e a equipe de agentes de manejo apresentaram o resultado final, que a partir de agora será amplamente divulgado, permitindo que cada pescador possa identificar se está pescando abaixo do tamanho mínimo e corrigir com vistas à sustentabilidade da pesca.

Mário Farias aproveitou a oportunidade para mostrar a régua de tamanho mínimo de captura divulgada pelo Programa Nacional para o Desenvolvimento da Pesca Amadora, que inspirou a equipe, e a partir de agora ganhará sua primeira versão adaptada ao Alto Rio Negro. Os Baniwa também manifestaram interesse, sobretudo das escolas presentes, em avançar nas pesquisas de registro direto das condições de reprodução dos peixes para paulatinamente irem adaptando, caso seja necessário, os tamanhos mínimos de captura mais apropriados para o manejo pesqueiro na bacia.

Reunidos em grupos os Baniwa também organizaram uma série de recomendações que depois foram lidas e discutidas uma a uma com o intuito de formar a base de consenso para o acordo de pesca. Como resultado, uma carta da assembléia escrita em Baniwa retornou para as comunidades e funcionará como uma carta-consulta, uma pré-proposta de acordo a ser retomada para que seja oficialmente formalizada na próxima assembléia, prevista para novembro de 2008.

Entre as recomendações, destacaram-se: a reafirmação da opção Baniwa pela prática não-comercial de pesca, conselhos sobre o uso de artes de pesca que não prejudiquem a reprodução e crescimento dos peixes até o tamanho mínimo de captura, conselhos para a garantia do respeito ao direito de auto-gestão das áreas de uso de cada comunidade e a criação de zonas de preservação do recurso pesqueiro onde a pesca será interrompida até segunda ordem da Assembléia. Dois dos maiores lagos do Médio Içana, Koetane e Hiwaroana, foram indicados para cumprir essa função. As comunidades de Tapira Ponta e Juivitera situadas nas “entradas” abaixo e acima da região dos lagos do Médio Içana, deverão ser informadas e orientarão os pescadores de outras regiões que forem pescar nos lagos. Os Baniwa também manifestaram o interesse de que autoridades competentes, como a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama), sempre que sejam chamadas também participem do monitoramento ao cumprimento das decisões que serão tomadas nas assembléias. Em novembro os debates em assembléia serão retomados e os Baniwa esperam finalmente formalizar o primeiro acordo de pesca da Bacia do Içana.

Abaixo seguem a versão em Baniwa da carta escrita pela assembléia e enviada a todas as comunidades da região e em seguida a tradução para o Português.

Assembléia anual da Organização Indígena da Bacia do Içana

Komalhipani, 17ka julho hámoli 2008

Hia Wakitsienaape iemakape idzakaleperiko ikoami: Waakoenai, Koripaakonai nheete Ñeekatonai.

Whaa ikitsienaape iwakeetaakakapewa lirikoda lhiehe dzamawalixoopa OIBI iprojetoni Kophe Koyaanale iwakeetaka whaa inialiitta nheette likepe yaapidza. 118 wamanopeka whaa iwakeetaakakape kakopedakaro whaa “koamekaro wamatsiataka lhiehe waitsaletakaa ayaha Inialiriko likepe riko tsakhaa”.

OIBI ikeñoa ideenhika liprojetoni marçonako hamoli 2006, lideenhika pesquisa 17 dzakaleeriko OIBI idzarhipadaliko peri. Pandza março nako tseenakhaa hamoli 2008, lioka lhinaana liñhaataka pakapa koameka lhie waitsaletakaa ayaaha iniariko. Linakhittekaro wawapiñeeta koameka wamatsiataka waitsaletakaa ayaaha wadzakaleperiko nheette waoniiteriko tsakhaa. Wawapiñeetakaro wapeedzaalhewa wenipepe ikoawale nheete wadakeenai ikoawale tsakhaa.

Kadzoxoopa, dzamadaa heekoapi kaakoka whaa nanako nhaaha projeto ideenhikale, nhaa iñhaatali wakapa koameka lhie waitsaletakaa dzamada hamoli nako nerikoda nhaanha 17 dzakaleenai. Neeni liñhaataka wakapa nhaa waitsatakaa Matsiaperi nheette Maatshiperi tsakhaa. Nanakhitte wakaakota koamekaroka “wamatsiataka lhiehe waitsaletakaa ayaaha wadzakalepe ikoami ayaaha Inialiriko nheette likeperiko tsakhaa”.

Kadzo, weroita koadzoitepekaro namakaitepeka wattaiteena wainoaka nhaa kophenai nakoamitsa. Nheette wakaakota nanako tsakhaa nhaa Matsiaperi Padzeetkata nheette Maatshiperi Padzeekataka ayaaha paitsaleta kadanako. Ikapa koaka nhaaha weroitali:

MAATSHIPERI PADZEEKATAKA

Ñeewita (careta); lhiehe ñeewita maatshitsa pawinitaka liyo ima liwhietaka kophenai iawa pamodzoalhe, paaphoakadaa liyo deepi nheette heekoapitsakha, ima kadzo pawhieta naawa nhaahã kophenai oo ñamekeetsakha naiñha paitsaletaka, nheette phaa ikanakaita kamarhaiko iyo ñameetsa koaka pakapali linomapiriko. Metsa matsiakatsa paaphoaka liyo pakakole oo hiwakape paadza ooniriko.
Koona, wepiri, hiiwa, waakoraita, cimento kaali iyo: nhaahã pamaxoopape ñame matsia pamaka nayo ima nainoaka phiome kophenai neenipenai iapidza.
Motooronai kalitta liko, ñawapo liko: ñame matsiaka paanhikawa motoronainako kalittaliko nheette ñawapoliko ima liwhietaka nhaaha kophenai. Metsa matsiakatsa paanhika nayo makapekirikotsa.
Óleonai motoro ikoawalepe: ñame matsia paaroka oleonai oo papeekoka liaronapemi ooniriko, ima nhaaha kophenai nheraaka nakaalewa ooninakhitte. Kadzoxoopa walhiotsa whetaka kanheekhaatsa lhiehe imakadamiwa pamhaitakaroni.
Molokopi: lhiehe molokopi ñame matsiakani, painoakadaa liyo iiniri keewheperi. Metsa matsiakatsa painoaka liyo koliri, heema, daapa, yamaro nheette katshiri tsakha.
Padietaka maawi iyo: ñame matsiaka padietaka kalitta oo ñawapo maawi iyo. Ima liwhietaka nhaaha kophenai, ñame keetsa naiñha paitsaletaka.
Toodamaka madalhiwi pakaaphiwi yaapirhe: ñame matsiaka nhaaha toodamakape tsoodalipetsa ithi, ima liinoaka phiome nhaaha kophieni itaoñakapettoawa.
Pakamaaka toodamaka iyo koamekaawakatsa: ñame matsiakani ima liwhietaka nhaaha kophe oo liwadzaka tsakha nhaa.
Patakhaaka oodawi pamakaro oo pamolokopitakaro: ñame matsiaka patakhaaka oodawi, ima kophe iipanakani. Ima patakhakadaani ñameetsa lirhio liipana liemakarodawa.
Pamaka iiñakapewa: ñame matsiaka pamaka nhaaha kophe iñakapewa. Ima pamakadaani ñameetsa napieta neeñakawa neeni.
Paitaka iiñakapewa: ñame matsiaka paitaka nhaaha kophe iiñakapewa. Ima painoaka nhaaha keewheperi.
Painoaka kophe tsoitepettoa: ñame pattaita painoaka nhaaha kophe kadowapettoa itawiñakapettoawa. Metsa, painoaka nhaaha kophe tsoitepe nadakiperitsa, kadzo: ookara, koowhi dzo.
Painoaka iiniri keewheeperi: ñame matsiaka painoaka iiniri keewheeperi. Ima painoakadaana, ñameetsa koaka inatawiñali nenipe naphomitte.
hiwiatti: lhiehe yanhekaita hiwiaka ñamekaro limatshika kophenai iaroaphipe.
Pakanaka Bateria iyo: ñame matsiaka pakanaka bateria iyo. Ima likanaka thewakaphaa kamarhaiko iodza.
Papeekoka piila ooniriko: ñame matsia papeekoka nhaaha piila iwadzakakapemi oonirikolhe. Ima kapoakani, limatshika ooni, nheette kophenai tsakha. Wadee tsakha waakeetaka irenaatti linakhitte lhiehe kophe iiñhakaita piila ipoa.
MATSIAPERI PADZEEKATAKA

tooda (puçá): matsia paaphoaka liyo kákoli, pakamaaka dzaaka, phepaka pamanhitta iname iyo. Nheette matsiatsakhaa phepaka liyo ñawapo inomanaa, híipaliko tsakhaa.
toodamaka (malhadeira) “madalhiwidali” pakaaphiwi: matsiatsa lhiehe madalhiwi pakaaphiwida iikaanaamirhedali ithi ima lhipaka nhaaha kophe makaitepetsa.
iitsa koatshiwikatsa: matsiatsa paitsaletaka nayo phiome koakatsa kophenai. Ikametsa pheraakadanako nhaaha tsoitepettoa (ñame perittoa keenipe) pakadaakatsa naawa, metsa painoaka kophe nadakiperitsa kadzo nakadzodzo nhaaha kowhi,tewa,ookara tsakhaa.
kaapawi: matsiadalitsa lhiehe kaapawi, ima painoaka liyo nhaahã makaitepetsa.
molokopi: Lhiehe molokopi matsiatsani, painoakaro nhaatsa nhaaha maikaipetetsa kophe ñame peritsa keewhe kadzo nakadzodzo nhaaha (koliri, heemali, mhookoli, iiniri) . Nheette painoakaro tsakhaa pawiniwa iitsirinai liyo (heema, daapa, katshiri neniphaa apanaa).
iitsaakhaa: matsiatsa paitsaletaka itsaakhaa iyo koamekhaikatsa. Metsa plhiotsa pheepaka koaka nhaaka wakaiteri 3 nheette 18 nako.
oopitsi: matsiatsa pawinitaka liyo, ima ñameka liwhieta nhaa kophenai iiñakapewa. Nheette peroita kadanakoni alaperiko, ñawapoliko tsakhaa ikametsa hiewalika neeni nhaaha idzeenakapetsa neeni.
tshioli: matsiatsa lhiehe tshioli, ima kamekatsa painoalika liyo nhaaha makaitepetsa kophe.
mawipoko: matsiatsa lhiehe mawikopo, ima kamekatsa painoalika lirikopoko nhaaha kophenai hiewakapetsa neeni oo keenakadaatsa pañhanaa.
kaadza híipaliko: matsiatsa padeenhika lhiehe kaadza peroitakaroni híipaliko, metsa aatsa ayaahã tteephe hirakaaniritsa.
kakoli: matsiadalitsa lhiehe kakoli, pattaita padeenhikani koamekaawakatsa ooni inomapiriko.
paitsaletaka: matsiatsa paitsaletaka phiome koamekatsa, metsa palhiotsa pheepaka nhaaha wakaiteri 3 nheette 18 nako.
pakanaka: matsiatsa pakanaka kamarhaiko piila iyodali. Metsa karoka pattaita painoaka nhaaha kophenai tsoitepettoa (ñameperittoa keenipe).
pakadaaka neeñawa: ikatsa matsiadalika padeenhika lhiehe pakadaaka neeñawa, ima ikakatsa nawekakarodakani hamoli ikoami.
iitsaapo: matsiatsa paitsaletaka phiome koakatsa iitsaapo iyo, metsa palhiotsa pheepaka nhaaha wakaiteri 3 nheette 18 nako.
pakoetaka: matsiatsa padeenhika lhiehe ima nhaakatsa painoali nhaaha kophe maikaitepetsa. Pakoetaka ttiiri, tsiipa, kaattama tsakha.
pakadaaka kophe tsoite yaawa: lhiehe kanakaidali padeenhika, ima nhaaha kophe tsoitpettoa ñaperittoa keenipe kanakaittoa pakadaaka naawa naakarottoa natawiñawa. Littaitakaro watsa neeniminikatsa kophe makaitepe waitsaletawa waoníiteriko.
inameda: matsiadalitsa padeenhika, ima kamekatsa painoalika liyo nhaa kophe makaitepetsa. Palhiotsa padeenhikani matsia, pawapaka pakapa pakoawada matsia pakapakeena phetaka nakoatsa nhaa pañhanaa ikameena paakawa.
padowiretaka: matsiadalitsa padeenhika, metsa palhiotsa pheepaka nhaaha wakaiteri 3 nheette 17 nako.
kottiiphe, iname tsakha: nhaaha pattaitheni watsa pamaka iyo tsoopetsa ñawapo tsookhaipetsa, oodawidape ñawapoliko peri makakhaiperiko oo Kalittaliko.
Kakoli kophe iiñakaroaphiriko: Matsiadalitsa padeenhika, ima ñameka liwhietakaro nhaaha liiñakhe. Nheete kophe hiewhenitsawa manopakadaatsani.
Iñapakaatti, ittathakhetti: matsiaperitsa padeenhika. Metsa pañapaka nheette pattathaka kaanheeka likotsa. Wadee pattathaka oo pañapaka papañeetakaadzawatsa nhaaha kophenai.
Paaphoetanikhaa kadowaape yetsha: matsiatsa padzeekatakani, ima ñameka painoakaro oo pawhietakaro nhaaha kophe liyo, metsa padeenhini padzakale idalipatsa.
Pamawataka: matsiatsa padzeekatakani, ima ñameka painoa manope kophe liyo, ikametsa Dowiriita neeni kadaa.
WAAPIÑEETANIDA WEEMA XOOPAWA MATSIADALITSA NAAPIDZA NHAAHA WAKITSIENAAPE PADEENIRI INIALIRIKO LIKEPE IAPIDZA TSAKHA

Resumo dos Trabalhos de Grupo de 18 de Julho de 2008.

– PESCA PARA VENDA: ONDE?

paitsaletaka pavenderiwa peemaxoopawa Lhia watseehe paitsaletakaapani hanipadali ñame wadeenhikarokani ima meeñenikatsa wadzakale ima padeenhikaro pesca comercial palhiotsa paamaka tonelada kilo kophe metsa wavenderi watsa tsoopetsa wakitsienaape irhio koakatsa iomakade wainai kadzotsaa pandzadzo.
– LOCAL DE PRESERVAÇÃO: QUAL?

Koetani nheette Hiwaroanaa. ikatsa nhaaha kalittanai wakadaawape wawadanipe iwekaka kophenai nakoawale nhaaha apaana kalittanai, phiome inaili iyapikaliko. nheette nanakhitte tsakhaa wakapa watsa kaphaaka nadiaka kathinaa nhaaha kophenai, wanhee xoopa watsa ñameka nawadzakadzokawa oo whaakatsani inoakanheriitsana kadzokaro wakaiteka nawadzakakawa.

OBS: ayali, kanakaittoa nakaakotaka nainaiwaaka nakapakaro watsa kalheaphika kalittaka nhaaha naamali nakadaaka nakapawa natañeetawape phiome nhaaha ayaliita. *nhaaha koripakonai ñamettoa nakaiteka neenika watsa kalitta nakadaawape (natañeetawa).

– DEFINIÇÃO DE ÁREA DE USO DAS COMUNIDADES:

• lhiawatsa lhiehe waanhikaawa wawinita oo wadeenhikaawa tsakha heekoapialitsa walhionitsa lhiehe liokakaawa , metsa ñameka wakaitexoopa ñameka pattaita padzeenaka apaana ianhikaawaliko. Likheette waakadanakowa wawinita apadawa comunidade iwinitakaawaliko hekoapiali palhiotsa pakaiteka nhema paakattoa paanhiwa nadalhipa naanhikaawaliko kadzo kaakopedakapidzo whaa assembleialiko.

– FISCALIZAÇÃO DA ÁREA PRESERVADA:

• nhaawatsa nhaaha ikapali nanako nhaaha kalittanai wakadaanipettoa wakapawa, nhaawatsa ikapali nanako phiometsa watsa nhaaha comunidade, metsa nanakhitte watsa nhaaha manopedali comunidadenai inialirikoperi wakadaa watsa nhaaha tsoomeperiitsa naadza nhaaha wakadaanipe. kadzokadzodzo nhaaha; Paitsipe poawhetteperi irhio nheette Tapira Ponta pokhoetteperi irhio metsa nhaametakadaani, lioma watsa lhidzaakowa funai rikhitte oo matshinaadali ibamanai iinai.

• nanomanaape watsa nhaaha kalittanai wakadaanhi ttoa wakapawa weroita watsa tsipalaitapee lhinaanawa wakaiteri watsa inako ñamekattoa wattaita waitsaletaka neeni.

Assembléia Anual da Organização Indígena da Bacia do Içana (Oibi)

(Tradução de Raimundo Benjamim e Juvêncio Cardoso (EIBC-Pamáali)

Tucumã, 17 de julho de 2008.

A vocês parentes de todas as comunidades: Baniwa, Coripaco e Nhengatú

Nós, 118 pessoas de toda bacia do Içana e afluentes reunidos nesta segunda assembléia da OIBI sobre o Projeto Kophe Koyanaale, para discutir como podemos melhorar a situação de pesca na região do Içana e afluentes.

A OIBI iniciou a execução das atividades do projeto nas 17 comunidades de sua abrangência política em março de 2006. E hoje novamente no mês março de 2008, o projeto chega na fase de apresentar os resultados das pesquisas de acompanhamento das pescarias e indicar como estamos pescando na região do Içana. Para que através desses resultados pensemos como melhorar as nossas formas de pesca na nossa região e no nosso rio. Para pensarmos o futuro desses recursos para os nossos filhos e netos.

Por isso, nesses dois dias de assembléia discutimos e trabalhamos sobre os resultados das pesquisas que mostram os dados das pescarias acompanhadas nestes dois anos nas 17 comunidades. E os resultados nos mostram as formas de pesca boas e também as não-boas, que ajudam acabar com os peixes. Através destes, discutimos como “melhorar as nossas formas de pesca na nossa região, afluentes e comunidades”. Discutimos e decidimos sobre o tamanho mínimo de captura de cada uma das espécies de peixes existentes na nossa região. Discutimos também sobre as boas e más formas de pesca. E colocamos a seguir as definições sobre os temas:

Práticas ruins para os peixes e a sustentabilidade da pesca

Careta (máscara) de Mergulho: a careta não é boa para fazer pescaria, pois a pesca com esse material de dia e noite faz com que os peixes vão cada vez mais para fundo do rio, e não comem mais isca e as pessoas que pescam a noite com lanterna de zagaia não conseguem mais pegar peixe na beira do rio. Mas, esse instrumento é bom para mergulhar cacurí e para resgate de objetos que deixamos cair no rio, caso seja fundo.
Timbó, Wepiri, hiwa, waakoraita, cimento: esses materiais para tinguijar não são bons, pois matam os peixes de todos os tamanhos, grandes e pequemos, filhotes e ovos.
Pescadores usando os motores nos lagos e igarapés: não é bom entrar de motor nos lagos e igarapés, pois assim assustamos os peixes. Mas, podemos usar os motores no rio principal (Içana).
Óleos para Motores: Não é bom jogar óleo e vasilhame de óleos para motores na água dos rios. Pois os peixes respiram oxigênio na água, e assim, ficam contaminados. Se comermos os peixes contaminados, nós podemos ficar doentes também.
Molokopi: Essa arte de pesca não é boa, pois com esse instrumento matamos peixes com ovos e estragamos os ninhais. Mas, pode ser usado para matar surubim, anta, paca, arraia e jacaré.
Arrastão: usamos esse nome para designar, a forma de pesca quando se usa pari para cercar um igarapé ou lago para pegar os peixes. Essa forma de pesca assusta os peixes, e assim não se consegue mais pegar os peixes com anzol e linha de pesca nestas áreas.
Malhadeira com malha abaixo de três dedos: Não é bom usar as malhadeiras com malhas abaixo de três dedos, pois acaba com os peixes menores que ainda estão crescendo, que ainda não se reproduziram.
Pescar com malhadeiras em qualquer lugar: Não é bom fazer pescaria ou colocar malhadeira em qualquer lugar, pois assusta e acaba também com os peixes.
Cortar samambaia para tinguijar ou usar Molokopi: Não é bom cortar samambaias, pois são as casas de muitos peixes. Se forem cortadas esses peixes não vão ter mais onde ficar.
Tinguijar peixes em piracema: não é bom tinguijar os peixes em piracema, pois se for tinguijado, os peixes não vão fazer mais piracema no local onde foi tinguijado.
Cercar os peixes em piracema: Não é bom cercar os peixes em piracema, pois assim acabamos com os peixes com ovos para reprodução.
Matar os peixes menores: não é bom matar os peixes menores que ainda estão crescendo e que ainda não atingiram o tamanho mínimo reprodutivo. Mas, podemos pescar os peixes pequenos como Okara, koowhi, porque são peixes de tamanho pequeno mesmo.
Matar traíra na época de reprodução: não é bom matar traíra na época de reprodução. Pois se esses peixes forem capturados nessa época, não vai ter mais quem continuar reproduzindo e garantindo a continuidade da espécie.
Benzimento: Para a pessoa que sabe benzer, não benzer os locais-estoque de peixe.
Faxiar com lanterna a bateria: não é bom faxiar com lanterna a bateria, pois, a luz é muito forte e chega a iluminar a uma profundidade muito maior do que a lanterna comum. Essa forma também, assusta os peixes.
Jogar pilha na água: Não é bom jogar pilhas usadas na água. Pois a pilha é um produto que contém produtos químicos que contaminam a água e os peixes. Pois se comermos os peixes contaminados com os produtos químicos da pilha, podemos ficar doentes.
Práticas boas para os peixes e a sustentabilidade da pesca

Puçá: podemos usar puçá para pegar peixes no cacurí, pegar camarão, pegar peixes tinguijados por iname. Podemos usar para pegar peixes na saída de igarapés e cachoeiras.
Malhadeira: podemos usar malhadeiras com malhas acima de três dedos, pois assim somente os peixes grandes são pescados.
Anzol de qualquer tamanho: podemos usar qualquer tamanho de anzol para pescar os peixes. Mas temos que soltar os peixes menores que ainda não se reproduziram nenhuma vez. Podemos matar os peixes menores se forem piabas.
Arco e Flecha: consideramos que esse instrumento não prejudica os peixes ao ser usado, pois, com ele podemos pegar somente os peixes grandes.
Molokopi: esse instrumento não prejudica os peixes, e pode ser usado para matar os peixes grandes como surubim, tucunaré-grande, piraíba e traíra. Mas, não pode ser usado para matar os peixes que estão na época de reprodução. E pode ser usado para pegar caça, animais como anta, paca, jacaré e outros animais.
Linha de pesca: pode ser usado qualquer número de linha de pesca, mas, devem ser obedecidas as regras descritas nos ítens 3 e 16 de práticas boas.
Matapí: podemos pescar com esse instrumento, pois não assusta os peixes em piracema. E se for colocada nos igarapés e igapó só vai pegar os peixes que passarem no local onde é colocado, que é uma área pequena.
Tsiole: esse instrumento pode ser usado, pois usando este só vamos pegar os peixes grandes.
Mawipoko: pode ser usado este instrumento, pois só pegamos os peixes que entrarem ou só os peixes que gostarem da isca, que vai depender de quem colocou a isca dentro do instrumento.
Kaadza na Cachoeira: podemos usar esse instrumento nas cachoeiras, mas somente na época quando passam as piabas.
Cacuri : o cacuri pode ser usado, e colocado em qualquer parte do rio.
Faxiar: podemos faxiar usando lanterna a pilha. Mas, não podemos matar os peixes que ainda não se reproduziram (peixes menores).
Deixar a piracema acontecer: deixar a piracema acontecer é uma prática que podemos fazer, pois é nesse momento que os peixes se reproduzem a cada ano.
Caniço: Podemos usar caniço para pescar qualquer tipo de peixe. Mas, temos que considerar os itens 3 e 16 das praticas não boas.
Puladinho: podemos pescar usando essa técnica, pois só matamos os peixes grandes como mandubé, pacu e outros.
Soltar os peixes menores: é uma prática boa, pois os peixes menores que ainda não se reproduziram precisam ainda crescer, para poder reproduzir. Assim, sempre teremos peixes para pescar.
Inameda (iname) colocado dentro de uma isca: Pode ser usado como técnica de pesca, pois com esse material somente pegamos os peixes grandes. Temos que esperar até quando termina o número de isca jogado na água. E terminando o número de isca jogado podemos ir para outro lugar.
Amarrar Anzol: pode ser praticado, mas devem ser considerados os itens 3 e 16, buscando não prejudicar outros peixes.
Kottiphe, iname: podemos usar essas plantas-timbó para tinguijar igarapés pequenos, samambaias dos igarapés e lagos.
Cacuri na piracema: pode ser feito, pois não assusta os peixes que estão fazendo piracema. Pois os peixes só entram quando é bem preparado, dentro das regras tradicionais (linopa).
Benzimento, oração: podem ser feitas, para o bem. Isso deve ser feito com cuidado. Para não benzer e acabar com os peixes.
Espinhel com anzóis pequenos: podemos usar essa forma de pesca, pois, não matamos e assustamos os peixes com esse instrumento. Mas, devemos praticar isso somente próxima da nossa comunidade.
Linha com vários anzóis (pamawataka): pode ser usada essa forma de pesca, pois só são pescados peixes da espécie peixe-espada (dowiriita).
Trabalho em grupo de 18 de julho de 2008

Propostas de Manejo dos Recuros Pesqueiros para a subsistência dos Povos Baniwa e Coripaco na Região do Içana e Afluentes

– PESCA PARA VENDA: ONDE?

:: Pesca como fonte de renda: a pesca em grandes quantidades ou em toneladas, não vai poder ser realizada na nossa região, porque não existe mais grande quantidade peixes para essa forma de pesca. Mas, podemos pescar e vender em pequenas quantidades somente para os nossos parentes das comunidades da região, como já viemos fazendo.

– LOCAL DE PRESERVAÇÃO: QUAL?

:: Koetani e Hiwaroana: São estes lagos que escolhemos como locais para preservação e onde os peixes vão se reproduzir. Esses lagos vão distribuir peixes para outros lagos e como também para toda região do Içana. Através desses lagos preservados será possível ver se os peixes vão voltar aparecer e isso vai nos indicar que não estão desaparecendo ou se somos nós mesmos que estamos acabando com os peixes das nossas pescarias.

Obs: -As comunidades da Região do Ayarí ainda vão se reunir para decidir quais lagos da região deles vão ser escolhidos para serem locais de preservação. - Os Coripaco também ainda vão escolher qual será o lago para preservação na região deles.

– DEFINIÇÃO DE ÁREA DE USO DAS COMUNIDADES:

Nas nossas comunidades já temos os nossos limites, a área onde ou até onde podemos pescar. Mas, não estamos querendo dizer que não podemos pescar na área de pescaria das outras comunidades. Se quisermos pescar na área de outra comunidade devemos avisar os responsáveis ou as pessoas da comunidade para onde vamos pescar, como tratamos aqui na assembléia.

– FISCALIZAÇÃO DA ÁREA PRESERVADA.

Os responsáveis pela fiscalização dos lagos preservados serão as comunidades próximas dos lagos. Comunidade Juivitera para as pessoas do alto e comunidade de Tapira Ponta para as pessoas do baixo. Se as pessoas não respeitarem os responsáveis, os mesmos pedirão reforço da Funai (Posto de Tunui) e, em casos mais graves, para o IBAMA.

Na entrada dos lagos preservados serão colocadas placas indicando que as pessoas não poderão entrar para pescar nesses lagos.
ISA, Adeilson Lopes da Silva.

 
 

Fonte: ISA – Instituto Socioambiental
Assessoria de imprensa

 
 
 
 

 

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