27 de Agosto de 2008 - Ana Luiza
Zenker - Repórter
da Agência Brasil - Brasília - O julgamento
de uma ação sobre a demarcação
da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em
Roraima, é um fato histórico. A afirmação
foi feita hoje (27), pelo presidente da Fundação
Nacional do Índio (Funai), Márcio
Meira, pouco antes do início da sessão
no Supremo Tribunal Federal (STF).
“Vimos no Supremo Tribunal Federal
um momento em que as partes todas colocaram suas
posições de uma forma ampla, democrática,
transparente”, afirmou Meira, ressaltando a participação
da advogada dos índios, Joênia Batista
de Carvalho, da etnia Wapichana. Joênia também
destacou a importância do julgamento e de
sua sustentação oral. “Tinha que ter
a voz indígena”, disse a advogada.
Confirmando o que já tinha
afirmado na tribuna do Supremo, Joênia reafirmou
sua posição favorável à
demarcação contínua da área,
afirmando que não há proposta sobre
a existência de ilhas dentro da reserva. “O
que já é demarcado é de forma
contínua, não existe forma contínua
e ilhas dentro, é totalmente contrário
às garantias constitucionais”, afirmou Joênia
no intervalo da sessão.
Márcio Meira concordou
com a advogada, dizendo que espera ver respeitado
e preservado o direito dos povos indígenas,
"que é consagrado na Constituição
Federal." Segundo ele, assim será possível
continuar o trabalho que o país vem fazendo
há muitos anos, de demarcação,
de homologação de terras indígenas,
que é "reconhecido inclusive internacionalmente”.
O presidente da Funai considera
prematuro dizer o que vai ser feito depois do julgamento,
especialmente na hipótese de a demarcação
contínua ser considerada inconstitucional.
Meira disse, no entanto, que está “confiante
na Justiça, no Supremo Tribunal Federal,
que se pautará pela Constituição”.
Constituição prevê
tratamento diferenciado aos povos indígenas,
diz Ayres Brito
27 de Agosto de 2008 - Marco Antônio
Soalheiro - Repórter da Agência Brasil
- Brasília - Na primeira meia hora de leitura
do seu voto, em ação que contesta
a demarcação contínua da Terra
Indígena Raposa Serra do Sol, o ministro
do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto
não deu sinais claros de seu posicionamento
sobre a questão.
Inicialmente, ele apenas ressaltou
que a Constituição Federal prevê
tratamento diferenciado aos povos indígenas.
“Os índios tem copiosa
e qualificada referência na Constituição
de 1988. As terras [indígenas] destinam-se
a posse permanente, com usufruto exclusivo das riquezas
existentes. São terras inalienáveis,
indisponíveis”, afirmou Britto.
Segundo o ministro, mesmo vivendo
em reservas demarcadas, os índios mantêm
vínculo jurídico com os municípios
e estados em que se encontram.
A demarcação da
Terra Indígena Raposa Serra do Sol foi definida
por Britto como motivadora de divergências
“entre antropólogos, autoridades estaduais,
ministros, pessoas federadas, organizações
não-governamentais e igrejas".
O ministro confirmou que a decisão
do STF sobre a questão poderá afetar
futuras demarcações.
“Devemos buscar na própria
Constituição, com maior objetividade
possível, as normas balizadoras para toda
e qualquer demarcação”, disse Britto.
+ Mais
Líder indígena critica
argumentos de procurador na defesa de demarcação
contínua
27 de Agosto de 2008 - Luana Lourenço
- Enviada Especial - Terra Indígena Raposa
Serra do Sol (RR) - Defensor da permanência
dos grandes produtores de arroz na Terra Indígena
Raposa Serra do Sol, o tuxaua (cacique) José
Brazão criticou a argumentação
do procurador-geral da Republica, Antonio Fernando
Souza, em defesa da manutenção da
demarcação contínua da área,
feita hoje (27) durante julgamento de ação
no Supremo Tribunal Federal (STF).
"A defesa do procurador não
me convenceu, quando ele falou que o laudo antropológico
[que determinou a demarcação contínua]
é legítimo. Não é. Sem
desrespeitar o procurador, posso dizer categoricamente
que ele não tem conhecimento dos fatos. O
laudo é cheio de vícios, tenho certeza
de que o procurador não leu, não tem
conhecimento dos fatos", afirmou.
Brazão acompanha o julgamento
ao vivo em uma televisão com serviço
pago de captação por satélite,
instalada em uma pequena tenda montada no Distrito
de Surumu, no interior da Raposa Serra do Sol. Ao
lado, cerca de 700 índios ligados ao Conselho
Indígena de Roraima (CIR) – que defende a
saída dos produtores de arroz – rezam orações
católicas e apresentam danças indígenas
típicas enquanto aguardam a decisão
do tribunal, que deve ficar para amanhã (28).
Segundo Brazão, a Sociedade
de Defesa dos Indígenas Unidos de Roraima
(Sodiu-RR) e outras entidades contrárias
ao CIR fizeram um "estudo aprofundado"
que aponta a divisão em ilhas como demarcação
ideal para os 1,7 milhão de hectares da Raposa.
"Defendemos a soberania e
a convivência com todos os brasileiros. O
pessoal do CIR não sabe o que diz, eles estão
fazendo mal para eles mesmos preferindo o isolamento",
acrescentou a presidente da Aliança de Integração
de Desenvolvimento dos Povos Indígenas de
Roraima, favorável à permanência
dos rizicultores, Deise Maria Rodrigues.
O tuxaua Brazão disse que,
caso o STF mantenha a demarcação contínua,
os índios ligados à Sodiu e aos arrozeiros
não vão resistir com violência
ou partir para o enfrentamento com os indígenas
representados pelo CIR.
"Não temos intenção
de gerar conflito aqui e sim de aguardar pacificamente
o resultado e acatar a decisão do STF. Eles
[CIR] estão trazendo pessoas para gerar um
conflito", apontou. Ontem (26), o presidente
da Sodiu, Sílvio da Silva, negociava com
arrozeiros um ônibus para transportar apoiadores
da entidade de Boa Vista até o Distrito de
Surumu.
Cento e cinqüenta homens
da Polícia Federal e pelo menos 40 da Força
Nacional de Segurança estão na área
para conter possíveis episódios de
violência entre os grupos.
+ Mais
Indígenas rezam e assistem
julgamento pela TV dentro da Raposa
27 de Agosto de 2008 - Luana Lourenço
- Enviada Especial - Terra Indígena Raposa
Serra do Sol (RR) - Em clima de aparente tranqüilidade,
os moradores do distrito de Surumu, área
de maior tensão entre os indígenas
favoráveis e contrários à demarcação
contínua da Terra Indígena Raposa
Serra do Sol, acompanham o julgamento da questão
pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
De um lado, cerca de 700 índios
ligados ao Conselho Indígena de Roraima (CIR),
que defendem a reserva em área contínua,
organizaram uma missa e, desde o início da
manhã, realizam apresentações
de dança e música típicas das
etnias que vivem na Raposa. A expectativa do CIR
é reunir mil índios, vindos de Boa
Vista, do município de Pacaraima e de outras
aldeias do estado.
Do outro lado da rua, um grupo
menor, de cerca de 50 pessoas, assiste o julgamento
ao vivo em uma televisão que, por serviço
pago, capta o sinal da transmissão por satélite.
Ligado à Sociedade de Defesa dos Indígenas
Unidos de Roraima (Sodiu-RR), o grupo defende a
demarcação da Terra Indígena
em ilhas para permitir a permanência dos grandes
produtores de arroz dentro da reserva.
Homens da Polícia Federal
e da Força Nacional de Segurança observam
a movimentação dos dois lados. Nenhum
dos grupos assume que irá partir para o conflito
em caso de decisão do STF contrária
aos interesses de cada um dos lados, mas dizem que
se forem atacados, reagirão.
De acordo com a PF, pelo menos
150 agentes estão espalhados na área
da reserva, alguns à paisana. Em caso de
conflito, outros 250 policiais, que estão
em cidades próximas, poderão reforçar
o contingente na Raposa. O efetivo da Força
Nacional em todo o estado é de cerca de 400
homens, concentrados principalmente da região
da reserva.
A entrada de jornalistas na área
está sendo controlada por agentes da Fundação
Nacional do Índio (Funai) e as entrevistas
com indígenas do grupo ligado ao CIR só
são autorizadas após uma triagem feita
por outros índios com crachás de "organização".