Panorama
 
 
 

SOCIEDADE CIVIL ENTREGA AO MMA SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A POLÍTICA NACIONAL DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Panorama Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Dezembro de 2008

Em evento realizado na última quarta-feria (26/11), o Observatório do Clima entregou à Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso Nacional e ao ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, o documento Contribuições da Sociedade Civil para a Construção da Política Nacional de Mudanças Climáticas.

O texto entregue na última quarta-feira, 26/11, pelo Observatório do Clima, em Brasília, à Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso Nacional e ao ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, foi construído em forma de projeto de lei durante o segundo semestre de 2008, com a participação de especialistas reunidos pelo Observatório do Clima e de representantes da sociedade em geral, que se engajaram no processo de consulta pública realizado por meio de audiências em capitais brasileirsa e de uma ferramenta eletrônica que pode ser acessada aqui.

O ministro Minc afirmou em seu discurso que “avanços paulatinos” estão em andamento, mas concordou que é preciso mudar a atitude do governo em relação às mudanças climáticas. “É uma posição muito conservadora.” Minc, que completou no dia 26 seis meses à frente do Ministério do Meio Ambiente (MMA), citou como avanços no contexto das mudanças climáticas o estímulo à produção e distribuição mundial do etanol, a apresentação do Plano Nacional de Mudanças Climáticas em outubro e a redução do desmatamento na Amazônia pelo segundo mês consecutivo.

As três iniciativas, no entanto, não estão livres de críticas de especialistas da área. Entre os argumentos estão a ausência de salvaguardas de sustentabilidade socioambiental ao etanol, a timidez e falta de inovação no Plano Nacional de Mudanças Climáticas – que motivou um manifesto liderado pelo Observatório do Clima –, e medidas políticas ainda frágeis para garantir a continuidade da queda do desmatamento no Brasil.

Após processo de consulta pública, o plano do governo será reapresentado no dia 1º de dezembro com avanços a partir de críticas da sociedade civil, conforme relatou o ministro: “Teremos metas de desmatamento para a Amazônia, metas para a matriz energética brasileira, propostas para o setor de transporte e estímulo à pesquisa e tecnologia.”

Ênfase na Caatinga

Carlos Minc afirmou ainda que o MMA dará ênfase a ações na caatinga e no semi-árido do Nordeste, regiões de alta vulnerabilidade às mudanças climáticas. Os participantes do evento lembraram ao ministro a importância da preservação do Cerrado, que tem um ritmo de desmatamento similar ao da Amazônia e está perdendo sua rica biodiversidade.

Em relação à posição do governo no plano internacional, o ministro disse que o MMA defende que o País assuma responsabilidades diferenciadas de modo prioritário em lugar do discurso sobre responsabilidades históricas dos países quanto às emissões de gases-estufa. Também ressaltou a importância de se intensificar a transferência de recursos e tecnologia aos emergentes e a necessidade de redução de desmatamento.

“Hoje recebemos um reforço significativo com a proposta do Observatório do Clima”, afirmou o deputado federal Antônio Carlos de Mendes Thame (PSDB-SP), autor de projeto de lei 261/07 que institui a Política Nacional de Mudanças Climáticas. Ele defendeu que a legislação não deve se concentrar em diretrizes proibitivas. “É preciso promover estímulos fiscais e econômicos”, disse. E acrescentou que existem opções eficientes que aliam desenvolvimento e mitigação, como o investimento dos estados em energia eólica e programas de difusão do uso de aquecimento solar.

O deputado José Sarney Filho (PV-MA), presidente da Frente Parlamentar defendeu a inserção de condicionantes no combate à crise econômica. “Por que não colocar parâmetros de sustentabilidade para iniciativas como a ajuda ao setor automobilístico.?” Na opinião do deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), autor do substitutivo ao PL 261/07, um panorama mais favorável à ação do Congresso contra as mudanças climáticas está se desenhando com a intensificação das discussões mundiais para o acordo que entrará no lugar do Protocolo de Kyoto e a eleição de Barack Obama com uma proposta de inclusão dos Estados Unidos nas ações globais pelo clima. Loures elogiou a proposta do Observatório do Clima e garantiu que será incorporada no substitutivo ao PL da Política Nacional de Mudanças Climáticas.

Alertas

“A sociedade brasileira é a mais preparada do mundo para preservar o meio ambiente com ganhos econômicos”, afirmou Paulo Moutinho, pesquisador do IPAM – instituição integrante do Observatório do Clima -, em alerta à negligência do governo na ação contra as mudanças climáticas e à nova realidade econômica que se desenha no mundo. “O Brasil tem hoje um total de sete bilhões de toneladas de carbono em emissões evitadas nas Unidades de Conservação. É possível fazer muito mais.”

Para Márcio Santilli, do Instituto Socioambiental, que também faz parte do OC, o pró-ativismo do Brasil é que irá determinar o grau de intercâmbio do país com a comunidade internacional. “A nossa situação não compete pelos primeiros lugares no ranking da vulnerabilidade planetária às mudanças climáticas. Mas pelo tamanho da população e pela importância ecológica temos um papel fundamental.” Outro representante do Observatório, Marcelo Furtado, do Greenpeace, destacou que não é só do Poder Executivo que ações de impacto devem surgir e citou como exemplo investimento do Banco do Nordeste num grande projeto eólico na região, que classificou como “Itaipu do vento.”

Rachel Biderman, da Fundação Getulio Vargas, instituição facilitadora do Observatório do Clima, ressaltou que as ações de caráter econômico ou em políticas públicas no Brasil serão beneficiadas pela adoção de metas oficiais de redução de emissões. Para André Ferreti, da Fundação O Boticário, a ação do OC contribui de forma contundente para uma nova atitude do governo. "A iniciativa mobilizou a sociedade civil brasileira e ainda teve o mérito de estimular o governo a se posicionar em relação ao clima".

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Assembléia histórica discute defesa de TI Yanomami e o fortalecimento da Hutukara

02/12/2008 - A 3ª Assembléia da Hutukara Associação Yanomami (HAY) reuniu cerca de 200 yanomami e yekuana, na comunidade do Ajarani,em Caracaraí (RR), para discutir fiscalização, gestão territorial, saúde e educação. Os indígenas representam 75 aldeias dispersas em 30 regiões, que compõem a Terra Indígena (TI) Yanomami, localizada nos estados de Amazonas e de Roraima.

Considerada histórica, a assembléia da Hutukara foi realizada na comunidade do Ajarani, município de Caracaraí, em Roraima e, além de representantes vindos de diferentes locais da TI Yanomami, contou com a participação de oito yanomami da Venezuela e de representantes da Ayrca (Associação Yanomami do Rio Cauburis e Afluentes), que reúne seis aldeias da região de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas.

O grupo se reuniu durante 15 dias para discutir fiscalização, gestão territorial, saúde e educação, entre outras questões. Estavam presentes diversas lideranças tradicionais, xamãs e também professores e agentes de saúde, que ficaram responsáveis pelo registro da assembléia em quatro línguas yanomami e na língua yekuana.

A 3ª Assembléia a Hutukara Associação Yanomami (HAY) teve início na noite de 22 de novembro, com a realização do wayamou, diálogo cerimonial elaborado por uma dupla de yanomami de regiões diferentes, cujos participantes se revezaram ao longo da noite. Na grande maloca, recém-construída, os índios falavam exaltando as relações de amizade, troca, respeito mútuo e de aliança para a proteção do território comum. O wayamou começou tarde da noite e se prolongou por toda a madrugada.

O foco principal da assembléia foi a proteção da terra indígena e os participantes buscaram, como estratégia, o fortalecimento institucional da HAY, com articulação entre as aldeias em Roraima e no Amazonas, para a defesa do território yanomami.

O presidente da Hutukara, Davi Kopenawa, fez um discurso histórico de como começou o seu trabalho em defesa do povo Yanomami e de criação da Hutukara. Dario Vitório, tesoureiro da HAY e filho de Davi, conduziu dois dias de discussões voltadas para o fortalecimento da associação como um instrumento de defesa do território.

Os desafios do povo yanomami

A região do Ajarani – onde aconteceu a Assembléia - é cortada pela BR-210, a Perimetral Norte, uma estrada construída nos anos 1970 que, apesar de interrompida, deixou marcas da invasão - como desestruturação social, assentamentos de não-índios e invasão de pessoas para pescar e caçar. O Ajarani foi escolhido para discutir as soluções para esses problemas e fortalecer as comunidades indígenas locais. (Leia notícia relacionada).

Os representantes da Ayrca ajudaram a discutir os desafios que estão colocados ao povo yanomami e ressaltaram a importância do fortalecimento de sua representação por meio da Hutukara e da articulação política entre os yanomami de Roraima e os do Amazonas. Falaram ainda dos problemas que os yanomami no Amazonas enfrentam com a falta de consulta prévia para a realização de obras dentro de suas terras, como a construção de abrigos para turistas na região do Pico da Neblina. Os yanomami da Venezuela levaram quatro dias para chegar ao Ajarani e estavam felizes em poder compartilhar experiências.

Entre as ameaças à integridade territorial e ambiental estão a invasão de quase dois mil garimpeiros e a permanência de fazendeiros na região. O administrador da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Roraima, Gonçalo Teixeira, informou que o órgão convocou recentemente os ocupantes de terras, com o fim de atualizar o levantamento das benfeitorias em 17 ocupações, para proceder às devidas indenizações. O superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no estado informou que o órgão está buscando terras para fazer o reassentamento desses ocupantes.

Mudanças na Saúde Indígena

A Hutukara tem apoiado ações yanomami de controle social e se destacado na concepção de um novo modelo de saúde indígena. Em agosto deste ano lideranças yanomami se reuniram com o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, e fizeram propostas concretas de modificações.

Os representantes das várias regiões relataram a atual precariedade na assistência à saúde yanomami, como o sucateamento dos postos de saúde, falta de medicamentos, descontinuidade dos trabalhos de vacinação, combate a doenças como malária e oncocercose, além da paralisação, desde 2004, na formação dos agentes de saúde yanomami.

Foi enfática a manifestação de revolta de algumas lideranças com os freqüentes escândalos de corrupção na Fundação Nacional de Saúde (Funasa) relacionados ao desvio de verbas destinadas à saúde indígena. Na presença de Marcelo Lopes, coordenador regional da Funasa, mais de 60 lideranças yanomami cobraram mudanças no atendimento de saúde em suas regiões.

A assembléia se posicionou a favor da decisão de retirada da saúde indígena da Funasa e sua transferência para uma secretaria específica a ser criada no Ministério da Saúde. Para os yanomami, a medida deve ser acompanhada de outras, como manter o subsistema de saúde indígena e realizar a transformação dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (Dseis) em unidades gestoras vinculadas diretamente a essa secretaria. Ressaltaram ainda a necessidade da participação permanente indígena no processo de gestão e de implementação do novo modelo de gestão da saúde e da garantia de continuidade na assistência durante o período de transição da Funasa para a nova secretaria.

Reconhecimento de professores e escolas

Em relação à educação, enfatizaram para o secretário de educação do Estado de Roraima, Luciano Moreira, o compromisso com o reconhecimento da formação dos professores yanomami, que será concluída em 2009 e é realizada pelo Programa Intercultural de Educação da Comissão Pro-Yanomami (CCPY).

Diversas lideranças e professores entregaram documentos e pedidos de reconhecimento e criação de novas escolas no interior da Terra Indígena, além de maior suporte, por parte da Secretaria de Educação, às escolas já reconhecidas. Reivindicam também a contratação de mais professores yanomami para atuar em suas comunidades.

O procurador do Ministério Público Estadual, Edson Damas, apoiou integralmente as reivindicações declarando-as justas, necessárias e urgentes.

Eleição da nova diretoria

Os dois últimos dias da Assembléia foram dedicados à escolha da nova diretoria da Hutukara, promovida por meio de um processo amplamente discutido entre os yanomami. Davi Kopenawa foi reeleito para um novo mandato de dois anos. Para os demais cargos da diretoria elegeram-se: Anselmo Xiropino, vice-presidente; Enio Mayanawa e Trento Yanomami, primeiro e segundo secretários; Dário Vitório e Mozarildo Yanomami, tesoureiro e vice; Tino Yanomami e Maurício Yekuana, coordenadores de Terra e Ambiente; Ivan Ninan e Huti Yanomami, coordenadores de Educação e Cultura; e, finalmente, Geraldo Kuesitherë e Paulinho Hesinare, coordenadores de Saúde.

Convidados e participantes

Estiverem na assembléia representantes da Funai, da Funasa, do Incra, do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), do Instituto Chico Mendes (ICMBio), do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia(Inpa), da Embrapa, da Secretaria de Educação do Estado de Roraima, do Ministério Público Estadual, da Prefeitura de Caracaraí, da CAFOD, da Embaixada da Finlândia e da Fundação Rainforest dos Estados Unidos.

A realização do evento contou com o apoio da CESE, da Embaixada da Finlândia, da Diocese de Roraima, da CCPY, do ISA, da Wataniba, da Funai e de integrantes do Dsei Yanomami.
ISA, Ana Paula Caldeira Souto Maior com equipe da CCPY.

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Lideranças e associações indígenas debatem ordenamento territorial do Médio e Baixo Rio Negro (AM)

03/12/2008 - Evento organizado pela Foirn e Asiba em Barcelos contou com representantes de 16 comunidades e sete associações indígenas, além do poder público da cidade para iniciar um diálogo e compartilhar responsabilidades socioambientais em relação ao tema.

Compartilhar responsabilidades socioambientais e iniciar uma conversa articulada para alcançar melhores resultados, contemplando os direitos territoriais dos povos indígenas da região - cujas terras encontram-se em processo de identificação – foi o objetivo do seminário de ordenamento territorial que a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) e a Associação Indígena de Barcelos (Asiba) organizaram em Barcelos, em 17 e 18 de novembro último, com apoio do ISA. Entre os convidados estavam representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai) de Brasília, São Gabriel da Cachoeira e Barcelos, da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do Amazonas (SDS), da Prefeitura Municipal de Barcelos, da Fundação Vitória Amazônica (FVA), da WWF – Brasil e lideranças das comunidades indígenas da região.

Devido à sua diversidade socioambiental, o Médio Rio Negro é uma região considerada de alta prioridade para conservação ambiental pela sociedade civil e organizações não-governamentais a partir da realização do seminário de Macapá em 1999, cujos resultados foram publicados em 2001, no livro Biodiversidade na Amazônia Brasileira. Em 2007, o Ministério do Meio Ambiente atualizou as áreas prioritárias. Essa prioridade tem orientado, nos últimos anos, algumas iniciativas de fomento, criação e redefinição de Unidades de Conservação (UCs) por parte dos municípios de Santa Isabel (APA Tapuruquara) e Barcelos (APA Mariuá), do governo do Estado do Amazonas e de organizações não-governamentais.

Parcela considerável da extensão territorial de Santa Isabel e Barcelos foi incorporada ao Corredor Ecológico Central da Amazônia e, a partir daí, a Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do Amazonas tem sinalizado, por meio de consultas públicas, sua intenção de proceder a um Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) na região. Além disso, no início de 2009, o Parque Estadual da Serra do Aracá, receberá, depois de 18 anos de criação, um gestor responsável pela unidade. Atualmente, o parque se sobrepõe à TI Yanomami (incidindo em 79,30%) e as propostas de redefinição dos seus limites, transpondo-o para baixo, concorrem em parte com a área de uso e ocupação tradicional, reivindicadas em demarcação pelas comunidades dos rios Aracá e Demeni. (veja o mapa acima)

Desde 1998, o movimento indígena da região, com apoio da Foirn, está lutando pelo reconhecimento de seus territórios de ocupação e uso tradicional. No início de 2007, a Funai criou dois Grupos Técnicos (GTs) de Identificação de Terras Indígenas (TIs) para a região, sendo que o GT responsável pelos estudos no município de Barcelos produziu, segundo parecer da Funai, relatórios insatisfatórios em termos de conteúdo e aporte técnico. Em outubro deste ano, uma assembléia da Associação Indígena de Floresta e Padauiri(AIFP) teve como tema principal a demarcação das terras das comunidades indígenas de Barcelos e Santa Isabel do Rio Negro. Saiba mais.

A programação do evento teve como perspectiva a colaboração dos cerca de 70 participantes no ordenamento territorial. Para isso, foi relatada a história do movimento indígena no Médio Rio Negro, fez-se a atualização dos trabalhos de identificação das TIs na região, e promoveu-se intenso debate acerca do processo de demarcação de TIs e tipos de UCs. No caso da Unidades de Conservação destacou-se a região do Rio Caurés, onde parte da área encontra-se em processo de identificação para demarcação de TI, e ao mesmo tempo existe proposta de criação de uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS). Para avaliar melhor a situação, o WWF Brasil anunciou que fará uma pesquisa com os moradores das comunidades do rio, no primeiro semestre de 2009. (veja no final do texto quem participou do seminário)

Histórias dos antepassados e medo da escassez

Durante o seminário, relatos de lideranças expressaram a importância de conservar a floresta e os recursos naturais e sua ligação intrínseca com a história de seus antepassados e de influenciar questões de identidade étnica e sentimentos de pertencimento.

A Foirn vem protagonizando um processo de retomada da identidade étnica desde 1987. Na região de Santa Isabel e Barcelos o processo é mais recente e o movimento pelo reconhecimento dos direitos indígenas necessários para a continuidade e atualização de seus modos de vida está intimamente ligado à luta pela demarcação de TIs. O ordenamento territorial, ou seja, a definição de limites entre unidades espaciais de uso e proteção vai influenciar e ser influenciado pelas recomposições identitárias também em curso.

A preocupação das comunidades com a preservação de seus recursos naturais como as plantas e os peixes e o medo da escassez foi constante nos depoimentos. “Se não houver o reconhecimento e a demarcação de nossos territórios, nossa história vai ficar nos livros e só. Mas nossos filhos e netos não vão comer os peixes de desenho e palavras”, disse o tariano Clarindo Chagas.

O presidente da Cooperativa Mista Agroextrativista dos Povos Tradicionais do Médio Rio Negro (Comagept), Manoel Chaul, que nasceu na comunidade Carvoeiro e atualmente mora na cidade, afirmou que em sua terra de origem não tem mais a fartura que tinha antes. “Hoje conhecemos muitas coisas pelos livros, mas a gente vê que os novos [a juventude] não querem falar com os antigos. É preciso saber sobre o passado.”

Falta fiscalização

Os moradores das comunidades relataram e solicitaram apoio à fiscalização das atividades predatórias e invasões que continuam ocorrendo em seus territórios de uso tradicional. Os depoimentos, partilhados por quase todos os representantes das comunidades e rios, descreveram a intensidade da ação dos barcos “geleiros” - embarcações com refrigeradores para fins comerciais da pesca - , o aumento do número de barcos e operadoras de turismo de pesca esportiva nos rios e a extração ilegal de madeira, novidade na região. A extração de seixo também é contínua e é uma atividade de mineração proibida em Terras Indígenas e que não poderia continuar já que está em andamento um processo de identificação de TIs. "Nós temos sido atacados mais [...] Eu sou filha de lá daquele rio [Quiuini] e minha preocupação é essa: criei meus filhos com fartura, mas para os meus netos já está difícil”, disse dona Jarda, da Comunidade Ponta da Terra no Rio Quiuni). “Dona Jarda mora no Quiuni, eu no Aracá e nós enfrentamos os mesmos problemas, nos preocupamos com as mesmas coisas. Os parentes querem pescar, mas não tem peixe porque o pessoal invade lá, com armas.”, disse o sr. Gilberto, da Comunidade Elesbão no Rio Aracá.

Um exercício cartográfico preliminar foi realizado no segundo dia do seminário contribuindo para organizar as demandas das comunidades em relação ao mapeamento dos pontos de invasão e práticas de atividades predatórias, bem como levantar as áreas de uso tradicional e as de importância para a conservação, de acordo com a perspectiva dos moradores das comunidades.

Moradores do Quiuini em exercício cartográfico

Ao final, o evento reforçou a certeza de que existem muitos conflitos referentes ao acesso e usos de recursos e, sobretudo, à ausência de regulamentação de atividades comerciais. Indicou-se, então, a possibilidade de realizar acordos de uso como medida provisória para garantir proteção ao modo de vida dos moradores das comunidades e o fortalecimento de suas associações.

Os povos indígenas de Santa Isabel e Barcelos reforçaram seus compromissos com o diálogo institucional e a preocupação em fortalecer as associações de base que podem atuar conjunta e diretamente para fazer frente às invasões e mantendo-se mobilizadas para garantir a conservação ambiental da região e o reconhecimento de seus direitos territoriais.

A Foirn e a Asiba indicaram à Funai de Brasília, por meio de seu representante Severo Gamenha, o antropólogo Sidnei Peres para reiniciar os trabalhos de identificação considerando seu conhecimento prévio da região, a boa relação com o movimento indígena e o compromisso com a seriedade e urgência do trabalho a ser realizado.

Entre os participantes do seminário estavam: o administrador regional da Funai em Barcelos, Severo Gamenha; o secretário do Meio Ambiente de Barcelos, Sandomar Furtado; o secretário de Terras de Barcelos, Jair Gomes Pereira; diretores da Comagept; Samuel Tararan, da WWF-Brasil; os antropólogos Sidnei Peres (Universidade Federal Fluminense - UFF), Luciene Pohnl (Consultora do WWF-Brasil), Camila Barra e Carla Dias (ambas do ISA); lideranças da Foirn, da Asiba, da Acimrn (Associação das Comunidades Indígenas do Médio Rio Negro), da Acir (Associação das Comunidades Indígenas e Ribeirinhas), da Acirp (Associação das Comunidades Indígenas do Rio Preto), da Aifp (Associação Indígena de Floresta e Padauiri) e da Aibad (Associação Indígena da Bacia do Aracá e Demeni), assim como lideranças das comunidades de Cauboris, Tapera do Caurés, São Roque, Baturité, Canafé, Floresta, Ponta da Terra, São Francisco, Campina, Acariquara, Tapera do Padauiri, Acuacú, Nova Jerusalém, Bacabal, Samaúma e Elesbão, além de alunos da Escola Municipal Angelina, a convite do professor Martinho (vice presidente da Comagept).
ISA, Carla Dias e Camila Barra.

 
 

Fonte: ISA – Instituto Socioambiental
Assessoria de imprensa

 
 
 
 

 

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