18 de
Janeiro de 2009 - Ivan Richard* - Repórter
da Agência Brasil - Brasília - Ainda
abalada com a tragédia causada pelas cheias,
a população de Santa Catarina convive
agora com uma polêmica proposta de mudanças
da legislação ambiental. O Executivo
estadual pretende unificar todas as leis que tratam
do assunto em um código ambiental. No entanto,
ambientalistas catarinenses criticam vários
pontos do projeto e o consideram inconstitucional.
A secretária executiva
do Comitê de Bacias do Rio Itajaí,
Beate Frank, disse que a idéia de criação
do código ambiental é positiva, mas
ressaltou que vários itens da proposta ferem
a legislação nacional. Um exemplo
citado pela ambientalista é a proposta de
redução de 30 para 10 metros da distância
mínima de mata ciliar para cursos d'água
para rios com largura inferior ou igual a 10 metros.
“A intenção da criação
do código é positiva, porque a legislação
ambiental é muito fragmentada e dispersa.
Existem muitas leis tratando de muitas coisas. A
reunião disso tudo em um único instrumento
legal facilita tanto a gestão quanto o ensino
e a orientação. A idéia é
muito boa, mas é muito difícil de
ser praticada”, argumentou Beate.
Segundo ela, o impacto da redução
das áreas de preservação permanentes
e da mata ciliar é muito sério. “Talvez
a melhor forma de explicar o impacto que isso significa
seja mostrar as recentes imagens da catástrofe
ocorrida aqui em Santa Catarina. Muitos dos deslizamentos
– as estradas caindo, as margens de rios cedendo,
as enxurradas que arrastaram casas, automóveis
e animais – são mostras de que a não-observância
dessas áreas de preservação
permanentes gera impactos econômicos e sociais
altíssimos.”
Para o presidente da Fundação
de Meio Ambiente de Santa Catarina, Carlos Leomar
Kreuz, é uma injustiça atrelar o problema
das enchentes às ações do estado
em termos ambientais. Segundo ele, a discussão
do código ambiental é anterior ao
fenômeno.
“Santa Catarina tem 41% de cobertura
com mata nativa. Qual é o estado no Brasil,
além dos amazônicos, com essa situação?
Santa Catarina é um exemplo de preservação.
O que aconteceu é uma conseqüência
dos fenômenos climáticos globais”,
afirmou.
Beate Frank criticou também
a forma como o projeto foi elaborado. “Existem tentativas
semelhantes em âmbito nacional há muito
tempo e não se consegue avançar. E
aqui em Santa Catarina se fez isso de forma bastante
rápida, sob pressão, e depois que
o órgão ambiental, por meio de consultorias,
conseguiu chegar a um documento, não discutido
publicamente, a proposta foi encaminha ao governo
do estado em março do ano passado”.
No entanto, Kreuz sustenta que
o projeto foi discutido em várias ocasiões
com a sociedade civil e já conta com 300
emendas. “Só na Assembléia [Legislativa]
foram cerca de 10 audiências públicas.
Algumas questões têm que ser discutidas,
mas lá é o espaço democrático
para isso, e as coisas estão sendo discutidas”.
De acordo com Beate, o Executivo
demorou cinco meses para enviar a proposta ao Legislativo.
E, quando foi enviado à assembléia,
o projeto chegou com mudanças, muitas delas
inconstitucionais. “Nesse conjunto de alterações,
constatou-se que elas não eram de forma,
mas também de conteúdo, incluindo
uma lista de aspectos inconstitucionais.”
Kreuz admitiu que o projeto realmente
sofreu alguns "ajustes polítcos",
após ser entregue ao governo para atender
"demandas do setor produtivo", mas não
acredita que as mudanças possam colocar em
risco a preservação da região.
"Santa Catarina é
um estado diferente, quase 90% do território
é ocupado por pequenas propriedades. Se nós
cobrarmos o cumprimento do código federal,
inviabilizamos essas propriedades. Em cima disso
é que foram feitos os ajustes – o estado
precisa de um tratamento diferenciado no que diz
respeito ao tratamento do solo", justificou.
Além da diminuição
das áreas de mata ciliar, Beate Frank diz
que o novo código ambiental proposto pelo
governo de Santa Catarina prevê uma compensação
ambiental e a imposição de um prazo
mínimo para expedição das licenças
ambientais.
No caso da compensação,
a falha, segundo a ambientalista, está no
fato de o projeto prever que os recursos serão
destinados a outros setores, e não ao ambiental.
“Outro assunto muito sério é que o
órgão ambiental de Santa Catarina
vem sendo sucateado, com um número muito
pequeno de servidores. Para contornar isso, [o projeto]
diz que, se o pedido de licença não
for respondido em dois meses, automaticamente a
licença será concedida.”
Para ela, isso significa praticamente
a instalação de um regime de ditadura.
“Significa eliminar o órgão ambiental,
partindo do pressuposto de que tudo pode funcionar
sem ele.”
Beate Franck informou que, para
evitar que o projeto seja aprovado e implementado
da forma com está, o Comitê de Bacias
do Rio Itajaí, ao lado das ambientalistas
do estado, lançou o Movimento por um Código
Ambiental Legal. A iniciativa apóia a implantação
do código, desde que esteja de acordo com
a legislação nacional e promova a
justiça social.