06 Jul 2009
Por Bruno Taitson, de Rondônia
Operação de
fiscalização, apoiada pelo WWF-Brasil,
flagra roubo de madeira, grilagem e garimpo dentro
da Terra Indígena Uru-eu-wau-wau.Visita à
Floresta Nacional do Bom Futuro constata desmatamento,
pecuarização e atividade madeireira
ilegal na unidade de conservação
As áreas protegidas no
estado de Rondônia vivem uma situação
crítica, ameaçadas por invasões
e atividades ilegais como exploração
madeireira, garimpo e pecuária. Uma equipe
do WWF-Brasil esteve na Terra Indígena Uru-eu-wau-wau
e na Floresta Nacional do Bom Futuro e presenciou
a ação de desmatadores que não
respeitam sequer as fronteiras das áreas
protegidas, cuja conservação está
prevista em legislação federal.
Acompanhamos uma ação de fiscalização
na Terra Indígena Uru-eu-wau-wau, que resultou
em prisões de infratores e apreensões
de veículos e equipamentos. Também
visitamos a Floresta Nacional do Bom Futuro, que
tem cerca de um terço de sua área
desmatada e é habitada por milhares de pessoas.
A fiscalização na
Terra Indígena Uru-eu-wau-wau, coordenada
por Associação Etnoambiental Kanindé,
Fundação Nacional do Índio
(Funai), Associação do Povo Indigena
Uru-eu-wau-wau, Associação do Povo
Indígena Amondawa, Sistema de Proteção
da Amazônia (Sipam) e Polícia Ambiental
de Rondônia, teve um saldo impressionante:
em 15 dias de operação foram efetuadas
29 prisões, por roubo de madeira, garimpo,
invasão e grilagem de terras.
Foram apreendidos com infratores,
durante a ação, um caminhão
com 52 ripas de castanheira (árvore que,
quando nativa, tem corte, transporte e venda proibidos
em todo o território nacional), quatro motocicletas,
três motosserras, três espingardas e
um revólver calibre 38.
Israel Vale, representante da
ONG Kanindé, avaliou a ação
como positiva, por ter demonstrado que a situação
da Terra Indígena Uru-eu-wau-wau continua
preocupante. “Desarticulamos em tempo recorde os
grileiros, além de marcarmos presença
naquela região, desencorajando os infratores
a cometer novas invasões”, disse. Dentre
os invasores da Terra Indígena encontram-se
grandes proprietários de terra, que extraem
madeira e criam gado, dentre outras atividades.
O lado negativo da ação
de fiscalização ficou por conta da
impunidade. Na primeira prisão, efetuada
no dia 16 de junho, o infrator ficou menos de 24
horas detido, recebendo de volta a motocicleta que
utilizava. Dos 26 invasores presos dia 23 de junho,
apenas dois permaneceram na cadeia.
Israel Vale destaca que a situação
crítica constatada pela fiscalização
é apenas mais um exemplo do descaso do poder
público em relação às
áreas protegidas de Rondônia. “O dia
a dia na Terra Indígena Uru-eu-wau-wau é
marcado por grilagem, invasões, roubo de
madeira e ameaças aos indígenas, que
são os verdadeiros donos dali. Os crimes
ambientais são uma realidade recorrente em
diversas regiões do estado”, afirmou.
Em abril de 2007, o WWF-Brasil,
em matéria publicada na internet, alertou
para ameaças a unidades de conservação
em Rondônia, citando como um dos exemplos
a Terra Indígena Uru-eu-wau-wau.
Floresta Nacional do Bom Futuro
Já nos arredores da Floresta
Nacional do Bom Futuro, percebe-se a presença
de dezenas de madeireiras. Nas estradas, os veículos
que predominam são os chamados jericos, montados
a partir de peças de carros, tratores e caminhões.
São sem licenciamento, que normalmente não
possuem faróis, luzes ou qualquer outro equipamento
de segurança. Transportam madeira de forma
precária e clandestina, colocando em risco
a vida de pedestres e motoristas.
De acordo com o Grupo de Trabalho
Amazônico (GTA), mais de um terço da
área da Flona do Bom Futuro, criada em 1988,
já foi devastada. Na entrada, uma placa do
ministério do Meio Ambiente demarca o início
da unidade de conservação. Logo atrás
da placa, já dentro da Flona, uma fazenda,
com cercas de arame e algumas cabeças de
gado, numa flagrante violação à
lei.
De acordo com Ivaneide Bandeira,
diretora da ONG Kanindé, a omissão
das autoridades diante das invasões na Bom
Futuro é “muito grave”, uma vez que sinaliza
para a sociedade que não há punição
para aqueles que desmatam áreas protegidas.
“O pior é que há grandes propriedades,
com centenas de cabeças de gado”, relatou.
Desde maio o Exército Brasileiro,
a Força Nacional e o ICMBio organizam uma
operação na Flona do Bom Futuro, com
objetivo de impedir a extração e o
transporte de madeira ilegal, retirar o gado, cadastrar
moradores, impedir novas invasões e recuperar
áreas degradadas. Já foram feitas
diversas apreensões, especialmente de madeira
extraída dentro da unidade de conservação.
Entretanto, no dia 2 de junho
foi assinado um acordo pelo governador de Rondônia,
Ivo Cassol, o presidente do Instituto Chico Mendes
de Conservação da Biodiversidade (ICMBio),
Rômulo Barreto Mello, e o ministro do Meio
Ambiente, Carlos Minc, passando a administração
de cerca de 140 mil hectares da Flona, que tem área
total de 272 mil hectares, para as mãos do
Estado de Rondônia. Assim, os moradores que
ocupam a unidade de conservação teriam
sua situação regularizada.
Em contrapartida, a União
passaria a administrar as unidades de conservação
estaduais denominadas Floresta Estadual Rio Vermelho
(A e B), Estação Ecológica
Serra dos Três Irmãos e Estação
Ecológica Mujica Nava, que somadas ocupam
cerca de 180 mil hectares.
Segundo Ivaneide Bandeira, o acordo
é um retrocesso. “Unidades de conservação
não podem virar moeda de troca. Legalizando
as invasões que já aconteceram, o
poder público sinaliza que não há
problema em invadir, já que depois acontece
a regularização. Estão rasgando
a Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação
(Snuc)”, criticou.
Apesar das placas que demarcam
a Flona e de visitas de autoridades ambientais à
área, os produtores que moram no interior
da Floresta Nacional do Bom Futuro alegam que pagaram
pelos terrenos a terceiros e ignoravam o fato de
a área ser uma unidade de conservação.
+ Mais
Estado do Acre tem nova unidade
de conservação ambiental
10 Jul 2009 O governador do Estado
do Acre, Binho Marques, assinou, no último
sábado, dia 4, o decreto de criação
da Área de Relevante Interesse Ecológico
Japiim-Pentecoste.
A recém-criada unidade
de conservação (UC) está localizada
no município de Mâncio Lima e possui
mais de 25 mil hectares que abrangem uma expressiva
extensão de várzea na bacia dos rios
Moa e Japiim, afluentes do rio Juruá.
O longo processo de criação
da UC contou com o apoio técnico e financeiro
do WWF-Brasil e é resultado da demanda da
própria população local que
indicou a proteção da área
como essencial.
A partir dos dados gerados pelo
Zoneamento Ecológico Econômico do Acre
(ZEE/AC), finalizado em 2000, foi identificada a
importância da região do rio Juruá
e exaltada a diversidade da fauna e flora no local.
Após quase cinco anos,
a própria população reafirmou
a necessidade de proteção dessa área
por meio da construção da Agenda 21
Local do município de Mâncio Lima e
passou a reivindicar a criação da
Unidade de Conservação Ambiental Estadual
Japiim-Pentecoste, na modalidade de Área
de Relevante Interesse Ecológico Estadual
do Acre (ARIE).
O WWF-Brasil está envolvido
com esse processo desde 2006, quando firmou uma
parceria de cooperação técnica
e financeira com a Secretaria de Estado de Meio
Ambiente e Recursos Naturais do Acre (Sema/AC).
Foram muitas as ações
em conjunto nesse período, entre expedições
para reconhecimento ecológico da área,
estudos para levantamento fundiário e oficinas
e reuniões de sensibilização
com associações de moradores e colônia
de pescadores.
A nova área natural protegida
acreana consolida o corredor ecológico formado
pelo Parque Nacional da Serra do Divisor, Reserva
de Desenvolvimento Sustentável São
Salvador e terras indígenas Nukini, Naua
e Poyanawa. Também vai proteger cerca de
40% do território de Mâncio Lima.
Segundo Aparecida Lopes, coordenadora
de Áreas Protegidas da Sema/AC, após
a publicação do decreto no Diário
Oficial do Estado do Acre, os próximos passos,
que também contarão com o apoio do
WWF-Brasil, são a criação do
Conselho Gestor e do Plano de Manejo, que vão
definir a forma de utilização dos
recursos naturais da unidade de conservação.
Importância ecológica
e socioeconômica
Além de abrigo para atributos naturais e
cênicos muito característicos e para
várias espécies da fauna e flora amazônica,
a ARIE Japiim-Pentecoste é região
estratégica de recarga de aqüíferos
nas bacias dos rio Moa, Japiim e Juruá.
Estudos botânicos identificaram
três espécies de orquídeas desconhecidas
para a ciência. Também foram encontradas
41 espécies de peixes pertencentes a 33 gêneros
e 17 famílias.
Na ARIE foram identificadas várais
de espécies de mamíferos que estão
na lista das espécies da fauna brasileira
ameaçadas de extinção, como
o macaco-aranha (Ateles chamek); onça (Pantera
onca), a ariranha (Pteronura brasiliensis), o tatu-canastra
(Priodontes maximus) e a lontra (Lontra longicaudis).
O tracajá (Podocnemis unifilis) e o jabuti
(Geochelone denticulata e Geochelone carbonaria)
também habitam este cenário a correm
risco de serem extintos.
Além disso, a partir de
dados de um estudo socioeconômico realizado
pelo Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac),
foi possível identificar que a área
possui forte potencial para manejo de produtos florestais
não-madeireiros como sementes, óleos
e frutos.
O estudo identificou ainda baixa
ocupação humana e apontou a promoção
de atividades turísticas e pesqueiras como
alternativas econômicas sustentáveis
para a região.
O que é uma Área
de Relevante Interesse Ecológico (ARIE)?
Segundo Sistema Nacional de Unidades
de Conservação (SNUC), uma Área
de Relevante Interesse Ecológico constitui
o grupo das unidades de conservação
de uso sustentável definida como uma área
de pequena extensão, com pouca ou nenhuma
ocupação humana, com características
naturais extraordinárias ou que abriga exemplares
raros da biota regional. Os objetivos de uma ARIE
são manter os ecossistemas naturais de importância
regional ou local e regular o uso admissível
dessas áreas, de modo a compatibilizá-la
com os objetivos de conservação da
Natureza.