Iniciativa
é resultante de curso realizado em Abrolhos
(BA); aliando conhecimento científico e tradicional,
na teoria e na prática, capacitação
contou com alunos de diferentes regiões do
país e enfocou a gestão participativa
dos recursos marinhos
Caravelas, Bahia - Brasil, 22
de fevereiro de 2010 — Qual o papel das áreas
protegidas no Brasil do século XXI? Que fatores
ambientais, sociais, econômicos e culturais
devem ser incorporados ao planejamento e à
gestão de áreas protegidas no ambiente
marinho? Como articular o conhecimento científico
ao conhecimento tradicional para o estabelecimento
de novos paradigmas de gestão e pesquisa?
É possível conciliar exploração
pesqueira com conservação da biodiversidade
marinha? Sob que circunstâncias? Essas e muitas
outras questões fundamentais para o enfrentamento
da crise global no uso dos recursos marinhos foram
abordadas no curso “Monitoramento da Biodiversidade
e Pescarias para o Manejo de Unidades de Conservação
Marinhas: Teoria, Delineamento, Prática e
Extensão Comunitária”, realizado entre
31 de janeiro e 13 de fevereiro, no município
de Caravelas, extremo sul da Bahia. Após
intensa troca de experiências, professores
e alunos redigiram um manifesto pela proteção
das áreas marinhas, direcionado ao Ministro
do Meio Ambiente.
Promovido pela Aliança
para a Conservação Marinha (parceria
entre as ONGs Conservação Internacional
e Fundação SOS Mata Atlântica)
- em parceria com o Instituto Chico Mendes de Conservação
da Biodiversidade (ICMBio), Instituto Baleia Jubarte,
Universidade Estadual da Paraíba, Universidade
Federal da Paraíba, Universidade Estadual
de Maringá e Universidade Estadual de Santa
Cruz -, o curso buscou conciliar conhecimentos teóricos
com vivências práticas nas Unidades
de Conservação (UCs) marinhas do Banco
dos Abrolhos, região onde ocorrem os maiores
recifes coralíneos do Atlântico Sul
e extensos manguezais ainda bem preservados. Parte
dessa região é protegida por Unidades
de Conservação em diversas categorias,
desde Parques Nacionais até Reservas Extrativistas.
Guiados por uma equipe multidisciplinar de professores
universitários, profissionais da área
de conservação marinha e pescadores
locais, um grupo de 25 alunos de dez estados brasileiros
(RS, SC, PR, SP, RJ, ES, BA, PE, PB e PA) passou
duas semanas na região de Abrolhos avaliando
aspectos teóricos e práticos relacionados
a essas áreas marinhas e costeiras protegidas
por UCs.
A capacitação de
profissionais para atuar em conservação
marinha é complexa, uma vez que os oceanos
possuem características particulares que
demandam abordagens e ferramentas diferentes daquelas
tradicionalmente usadas em terra. Além disso,
o Brasil ainda possui menos de 1% de sua Zona Econômica
Exclusiva protegida por Unidades de Conservação,
havendo demanda crescente de profissionais com a
formação multidisciplinar requerida
para atuar na área. “Procuramos envolver
os alunos na aquisição e no processamento
de dados nos recifes coralíneos do Parque
Nacional Marinho dos Abrolhos e nos pontos de desembarque
pesqueiro da Reserva Extrativista (Resex) do Cassurubá”,
informa Rodrigo Moura, professor do curso e também
da Universidade Estadual de Santa Cruz e coordenador
de Serviços Ambientais da ONG Conservação
Internacional. “A maior parte das atividades do
curso são desenvolvidas em contato direto
com os atores locais, sejam associações
de pescadores, pesquisadores ou unidades do ICMBio”,
complementa Moura. Além do Parque e da Resex
Cassurubá, o curso também contou com
atividades na Resex do Corumbau.
Pesquisas realizadas em Abrolhos
têm mostrado o potencial das áreas
marinhas protegidas (AMPs) para recuperar estoques
de peixes comerciais já exauridos, mas ainda
há inúmeros desafios em termos de
implementação, monitoramento e envolvimento
comunitário. “Esperamos contribuir com a
formação de massa crítica bem
informada e em contato com os desafios correntes,
a partir das experiências acumuladas em Abrolhos”,
declara Fábio Motta, coordenador do Programa
Costa Atlântica da Fundação
SOS Mata Atlântica. “As áreas marinhas
protegidas são um começo para uma
mudança de comportamento e de percepção
da sociedade em relação ao ambiente
marinho”, afirma João Batista Teixeira, mestrando
em Oceanografia Ambiental na Universidade Federal
do Espírito Santo, um dos 25 participantes
do curso. Uma nova edição do curso
já está sendo planejada para 2011.
Mais informações sobre o trabalho
da Aliança para a Conservação
Marinha podem ser obtidas em http://www.conservacao.org/onde/ecossistemas/.
Monitoramento pesqueiro – O monitoramento
é um dos principais pilares para garantir
a conservação e o uso sustentável
dos recursos pesqueiros. “Com o monitoramento pesqueiro
é possível não só obter
dados sobre quais espécies são capturadas
e em que quantidade , mas também aproximar
pesquisadores de usuários dos recursos”,
afirma Carolina Minte-Vera, professora da Universidade
Estadual de Maringá e integrante do corpo
docente do curso. O trabalho de monitoramento em
Unidades de Conservação contribui
tanto para o conhecimento ecológico aplicado,
quanto para aproximar a realidade da conservação
do cotidiano das comunidades costeiras. “Além
da geração de informação,
o monitoramento da pesca pode se tornar um instrumento
de comunicação e educação”,
finaliza Minte-Vera.
Durante o curso os alunos puderam
vivenciar a realidade das AMPs em diversas dimensões,
por meio do contato com os gestores das UCs da região
e principalmente pelo convívio com a comunidade
extrativista local. “Nosso objetivo foi proporcionar
a eles o conhecimento sobre a importância
sócio-cultural das áreas marinhas
protegidas e seu confronto com as ameaças
enfrentadas pelas Unidades de Conservação,
como pesca ilegal, operações de dragagem
nas proximidades de recifes, turismo desordenado,
especulação imobiliária, restrição
do acesso das comunidades ao mar além dos
grandes projetos de carcinicultura e exploração
petrolífera na região”, esclarece
Fábio Motta.
Manifesto - Motivados pela realidade
preocupante das AMPs, alunos e professores se reuniram
para elaborar um Manifesto pelas Áreas Marinhas
Protegidas do Brasil direcionado ao Ministro do
Meio Ambiente, Carlos Minc, ao presidente do ICMBio,
Rômulo Mello, e aos dirigentes das Unidades
de Conservação Marinha do país,
onde reivindicam maior atenção por
parte desses órgãos para as necessidades
urgentes das Áreas Marinhas Protegidas. Além
de maior urgência na implantação
de um modelo de fiscalização que possibilite
a efetiva proteção da região,
o manifesto também defende a expansão
da rede de AMPsna Bahia e Espírito Santo
onde ainda há grandes lacunas de proteção.
O manifesto completo está disponível
em: http://downloads.conservation.org.br/aoliveira/manifesto_curso.zip
Fizeram parte do corpo docente
do curso:
Rodrigo Leão de Moura –
Biólogo, Doutor em Zoologia pela Universidade
de São Paulo e Especialista em Áreas
Protegidas do Programa Marinho da Conservação
Internacional. Já participou e coordenou
diversos projetos de pesquisa e conservação
de ambientes recifais da costa brasileira.
Ronaldo Bastos Francini Filho
– Biólogo, Doutor em Zoologia pela Universidade
de São Paulo. É professor da Universidade
Estadual da Paraíba. Já trabalhou
em diversos projetos de pesquisa e conservação
de ambientes recifais da costa brasileira.
Carolina Viviana Minte-Vera –
Ecóloga, Ph.D. em Ciências Aquáticas
e Pesqueiras pela Universidade de Washington. É
professora adjunta da Universidade Estadual de Maringá.
Tem experiência em avaliação
de estoques pesqueiros, pesca artesanal e métodos
quantitativos aplicados à ecologia e pesca.
Diego Corrêa Alves – Zootecnista
formado pela Universidade Estadual de Maringá.
Tem experiência em monitoramento pesqueiro
participativo e extensão rural pesqueira.
Foi agraciado com o XXIII Prêmio Jovem Cientista
por sua monografia sobre o monitoramento pesqueiro
participativo na Resex Marinha do Corumbau.
Leonardo Liberali Wedekin – Biólogo,
doutorando em Zoologia pela Universidade Federal
do Paraná. Pesquisador do Instituto Baleia
Jubarte, participou de vários projetos de
pesquisa focando a ecologia e conservação
de pequenos e grandes cetáceos. Atualmente
trabalha com monitoramento populacional em longo
prazo da baleia jubarte através de saídas
embarcadas e sobrevôos no Banco dos Abrolhos,
e do boto-cinza no Estuário do Rio Caravelas.
Matheus Oliveira Freitas – Biólogo,
Mestre em Ecologia pela Universidade Estadual de
Santa Cruz. Tem experiência com projetos de
conservação de peixes marinhos recifais
e estuarinos em parceria com ONGs em diversos pontos
da costa brasileira. Atua principalmente nas áreas
de Ictiologia e Pesca, com ênfase em biologia
reprodutiva de peixes, desembarques pesqueiros artesanais,
conhecimento ecológico de pescadores sobre
peixes recifais ameaçados e/ou comercialmente
importantes, manejo e gestão de recursos
naturais marinhos.
Fabio dos Santos Motta – Biólogo,
Doutor em Zoologia pela Universidade Estadual Paulista.
Coordenador do Programa para a Conservação
das zonas costeira e marinha sob influência
do bioma Mata Atlântica da Fundação
SOS Mata Atlântica e pesquisador (um dos idealizadores)
do Projeto Cação, iniciativa que desde
1996 vem estudando a biologia e a pesca artesanal
de tubarões e raias do litoral centro-sul
de São Paulo.