09 Junho 2010
Para ONGs, o relatório
de Aldo Rebelo gera desmatamento.
Deputado do PC do B apresenta documento pouco discutido
na sociedade, que prevê flexibilização
da legislação ambiental de acordo
com cada estado
Bruno Taitson, de Brasília
Organizações não-governamentais
e deputados ambientalistas classificaram como negativo
o parecer sobre a reforma do Código Florestal,
lido parcialmente pelo deputado federal Aldo Rebelo
(PC do B-SP) na terça-feira 8 de junho, na
Câmara dos Deputados. Dentre outros aspectos,
o documento prevê flexibilização
da legislação ambiental, delegando
mais poderes aos estados e dispensando pequenos
produtores de manter uma área de reserva
legal em suas propriedades.
Segundo Carlos Alberto de Mattos
Scaramuzza, superintendente de conservação
do WWF-Brasil, o documento é um retrocesso
que, se aprovado, resultará em mais desmatamento.
“Colocar nas mãos dos estados decisões
como extensão de áreas de preservação
permanente e percentual de reserva legal é
uma temeridade, pois ignora o fato de que processos
biológicos ultrapassam fronteiras políticas.
Além disso, submete uma importante questão
a interesses de assembleias legislativas e governos
estaduais, nem sempre comprometidos com o interesse
coletivo”, avaliou.
Para Rafael Cruz, representante
do Greenpeace, o parecer deixa de reconhecer as
florestas como um bem público. “O texto transfere
a responsabilidade da conservação,
que é de toda a sociedade, apenas para o
poder público. Na verdade, todos que têm
propriedades com florestas deveriam conservá-la,
pelo simples fato de que as florestas são
um bem da sociedade. Infelizmente, o relatório
de Aldo Rebelo gera desmatamento.”, analisou.
O deputado Édson Duarte
(PV-BA) também criticou o parecer apresentado.
Para ele, um dos mais graves problemas é
a tentativa de transferir importantes aspectos da
legislação para a esfera estadual.
“Isso abre brechas para conveniências locais,
que obedeçam a interesses políticos
e econômicos em detrimento do meio ambiente”,
resumiu.
Outra crítica feita ao
documento se baseia no fato de o conteúdo
não ter sido amplamente debatido. Aldo Rebelo
protocolou o parecer minutos antes da leitura em
plenário, o que impediu que outros deputados
e a sociedade civil organizada fizessem uma análise
adequada do documento.
O deputado Sarney Filho (PV-MA)
disse que não participou da elaboração
do relatório e que diversos pedidos para
ver o documento foram negados. “Recebi neste minuto
o relatório. A quantidade de audiências
não significa que houve, no texto, equidade
das posições apresentadas”, questionou
o deputado, que coordena a Frente Parlamentar Ambientalista
na Câmara.
O deputado Aldo Rebelo, durante
a sessão, afirmou que o documento foi feito
com participação da sociedade: “O
relatório é produto de minhas convicções,
ouvindo atentamente todas as instituições
envolvidas”, disse.
Édson Duarte, do PV, também
afirmou que, apesar de ter feito muitas solicitações,
o Partido Verde não teve acesso ao relatório,
que teria sido repassado com antecedência
a deputados da bancada ruralista. “Não é
possível que um tema de tamanha seriedade,
como a revisão da legislação
ambiental brasileira, seja tratado dessa maneira”,
analisa.
A continuação da leitura do relatório
está prevista para esta quarta-feira, 9 de
junho, na Câmara dos Deputados.
+ Mais
O que o Brasil vai levar à
conferência sobre biodiversidade?
10 Junho 2010
Ligia Paes de Barros, de Brasília
Conhecer a posição política
do governo brasileiro para a 10º Conferência
das Partes da Convenção sobre Diversidade
Biológica (COP-10/CDB), que ocorrerá
em outubro no Japão, foi o objetivo da audiência
pública convocada pela Comissão de
Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
da Câmara dos Deputados na quarta-feira (9/6).
A concorrida audiência contou
com a participação da ministra do
Meio Ambiente, Izabella Teixeira, o chefe da Divisão
de Meio Ambiente do Ministério das Relações
Exteriores, Paulino de Carvalho Neto e o coordenador-geral
substituto de Biodiversidade e Ecossistemas do Ministério
da Ciência e Tecnologia, Ricardo Melamed.
Entre os três objetivos
da CDB – conservação da biodiversidade,
o uso sustentável de seus componentes e a
distribuição equitativa e justa dos
benefícios da biodiversidade, este último
foi o mais citado pelos representantes do governo
federal durante a audiência.
O investimento em estudos sobre
a biodiversidade brasileira, a proteção
dos oceanos e zonas costeiras e a aprovação
de uma lei brasileira sobre acesso a recursos genéticos
e repartição de benefícios,
foram apontados como pontos mais sensíveis
e que precisam ser trabalhados para a COP.
Por outro lado, a criação
e implementação de áreas protegidas,
a redução do desmatamento na Amazônia,
o início do monitoramento do desmatamento
em outros biomas, o levantamento de espécies
ameaçadas, e a criação do Instituto
Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) foram considerados
avanços obtidos pelo Brasil para o cumprimento
das metas da CDB.
Para a ministra Izabella Teixeira,
“o Brasil deve trabalhar numa convergência
das agendas nacionais e chegar à COP com
um posicionamento forte e com uma delegação
brasileira condizente com o tamanho da nossa biodiversidade”.
Repartição de benefícios
Sobre a expectativa do Brasil em relação
à COP 10, a ministra Izabella Teixeira apontou
que um dos pontos centrais a serem debatidos na
Conferência será a definição,
no Plano Estratégico da Convenção
sobre Diversidade Biológica para 2011 a 2020,
de mecanismos de implementação das
metas de conservação da biodiversidade
que contemplem recursos financeiros.
Segundo Izabella Teixeira, para
se sustar a perda de biodiversidade até 2020,
meta proposta pela CDB, é preciso ter um
grande volume de recursos que permitam realizar
o trabalho, principalmente no que diz respeito aos
países em desenvolvimento, que são
países estratégicos para a conservação.
No entanto, essa alocação de recursos
ainda não está prevista de forma adequada.
“Os recursos financeiros são
um impasse entre os países desenvolvidos
e em desenvolvimento. A Convenção
de Clima já conseguiu definir a alocação
de recursos e a CDB ainda não”, disse a ministra.
Diretamente ligado à alocação
de recursos financeiros está o debate sobre
a repartição justa dos benefícios
fornecidos pela biodiversidade. E este ponto também
foi abordado na apresentação do representante
do Ministério de Relações Exteriores.
Paulino de Carvalho Neto ressaltou a inexistência
de regras que disciplinem o uso dos recursos da
biodiversidade e afirmou que isso representa uma
lacuna no debate internacional.
“A reunião do grupo de
trabalho da CDB sobre repartição de
benefícios no Canadá, em julho, será
a última oportunidade para definir essas
regras internacionalmente antes da COP. É
nessa etapa que a delegação brasileira
deve garantir que o patrimônio do país
seja preservado e os recursos assegurados”, completou
Carvalho Neto.
Para Cláudio Maretti, superintendente
de conservação do WWF-Brasil, “é
preciso reconhecer o valor econômico, social
e cultural da biodiversidade. Os países,
e o Brasil inclusive, precisam começar a
incluir o valor da biodiversidade nas contas nacionais
e cobrar as externalidades das empresas”, diz Maretti.
O superintendente acredita que
“o debate acerca da biodiversidade não deve
ficar restrito à esfera ambiental, mas ser
ampliado para outras esferas da sociedade, como
a econômica, que dependem diretamente dela”.
Código Florestal
Em meio às discussões sobre a reforma
no Código Florestal brasileiro que acontecem
essa semana na Câmara dos Deputados, a ministra
do Meio Ambiente Izabella Teixeira chamou a atenção
para a necessidade de coerência da política
nacional de meio ambiente.
Em sua fala a ministra citou o
estudo do prof. Gerd Sparovek da ESALQ-USP, apoiado
pelo WWF-Brasil, que aponta que as reservas legais
e áreas de proteção permanente
(APP) juntas formam uma área de cobertura
vegetal natural maior que todas as áreas
protegidas brasileiras e, portanto, contribuem diretamente
para a conservação da biodiversidade.
Diante de tal dado, Teixeira completou
que a flexibilização do Código
Florestal em relação às reservas
e APPs influencia diretamente no cumprimento das
metas de biodiversidade assumidas pelo Brasil na
Convenção sobre Diversidade Biológica.
“Isso demonstra a importância
e responsabilidade na discussão sobre o Código
Florestal. Um desafio nessa discussão é
incluir o conceito de conservação
de biodiversidade e possibilitar a reflexão
sobre a perspectiva de desenvolvimento que queremos
para o país. O Brasil precisa modernizar
sua legislação, mas adotando conceitos
relacionados à sustentabilidade e que sejam
coerentes com as metas assumidas internacionalmente.
A reflexão para a mudança na legislação
tem que ter visão global”, disse a ministra.