04/10/2010
Em Serra Talhada, município que
detém o maior índice de desmatamento
da Caatinga em Pernambuco, assentados da reforma
agrária dão o exemplo de como conservar
o bioma com o apoio do Serviço Florestal
Brasileiro.
Agricultores de nove assentamentos
já produziram 8.514 sacos de carvão
e 2.392 metros de lenha de forma sustentável
desde que começou a assistência técnica
florestal. A madeira vem de áreas da propriedade
destinadas ao manejo florestal. No início
do mês, o contrato para a assistência
foi renovado e ampliado para atender a um total
de 32 assentamentos em Pernambuco e na Paraíba.
"Essa iniciativa permite
que os assentados usem os recursos da Caatinga racionalmente
e tenham uma fonte a mais de renda. É fundamental
realizar ações desse tipo na região,
pois o número de assentamentos tem aumentado",
afirma o chefe da Unidade Regional Nordeste do Serviço
Florestal, Newton Barcellos.
A atividade é desenvolvida
durante a seca, época em que normalmente
os trabalhadores precisam procurar alternativas
à agricultura feita nos meses de chuva para
manter a família. O manejo dá a eles
a oportunidade de continuar no assentamento na estiagem,
sem que eles precisem sair para trabalhar para outras
pessoas, diz Barcellos.
Mercado - A produção
dos agricultores familiares ajuda a atender à
demanda por biomassa dentro e fora da região
Nordeste, onde esse recurso chega a corresponder
a 30% da energia utilizada nas indústrias
e estabelecimentos comerciais da região.
"Existe uma alta participação
de lenha na matriz energética do Nordeste.
Esta demanda está sendo atendida pela vegetação
nativa da Caatinga e a melhor maneira de supri-la
é pelo manejo florestal", diz Newton
Barcellos.
No Projeto de Assentamento (PA)
São Lourenço, que registra a maior
produção de carvão entre os
nove assentamentos de Serra Talhada - quase 6 mil
sacos - o principal consumidor são siderúrgicas
de Minas Gerais, outro forte mercado. Para garantir
uma relação de venda vantajosa, os
agricultores estão formando uma cooperativa
que comercializará o produto sem atravessadores.
"Já demos entrada
no CNPJ da cooperativa, que vai comprar a produção
e vender direto para a siderúrgica. No final
do ano, o lucro vai ser dividido para os associados",
diz o presidente do PA, Severino Lima Filho, 32
anos.
Natureza - Em outro assentamento,
o Vila Bela, o manejo tem ajudado a manter a comunidade
em um ano em que a falta de chuvas levou à
perda de 95% da agricultura. As famílias
já usaram todo o talhão - área
autorizada para manejo deste ano.
Com a assistência técnica,
o sertanejo fez do manejo uma forma até de
cuidar dos animais. "A gente aprendeu a deixar
algumas árvores nativas da região
que, nesse ano sequeiro, vai ser a sobrevivência
para alguns animais", diz a presidente da Associação
dos Trabalhadores Rurais do Assentamento Vila Bela,
Sandra Souza, 35 anos. A quixabeira vai oferecer
sombra e alimento para os bodes, que comem frutos
e folhas da árvore.
Apesar dos desafios envolvidos
na atividade econômica do assentamento em
2010, a presidente está otimista. "O
homem nordestino é bicho valente, a gente
sobrevive".
Para aumentar as opções
de renda com o manejo, Sandra quer trazer uma atividade
nova, a confecção de cosméticos
com plantas da Caatinga pelas mulheres, enquanto
os homens trabalham com a lenha. "Com o manejo
temos a possibilidade de criar produtos que saiam
da própria Caatinga que vão estar
nos ajudando na nossa renda. Vejo como uma perspectiva
para o nosso futuro", afirma.
Conservação - Ao
lado da geração de renda, Newton Barcellos
destaca a proteção da Caatinga como
um dos maiores ganhos do manejo. A área destinada
à atividade é dividida em pelo menos
15 talhões e só um é usado
por ano. Ou seja, o agricultor só volta ao
primeiro lote após 15 anos.
Esse período de pouso permite
que a vegetação se regenere e volte
ao volume que tinha. Com poucos meses, as árvores
já rebrotam e os galhos, mesmo finos, mas
com folhagens, ajudam proteger o solo. "Se
chover, não haverá erosão",
diz o chefe da Unidade Regional.
Somadas a área de manejo
- onde não é feita agricultura - mais
a Reserva Legal e as Áreas de Preservação
Permanente, a Caatinga chega a ser preservada em
mais da metade dos assentamentos. "É
um número muito bom, considerando que a Caatinga
já perdeu quase 50% da sua cobertura",
afirma Barcellos.
Além dos nove assentamentos
em Serra Talhada, outros quatro municípios
de Pernambuco - São José do Belmonte,
Ingazeira, Floresta e Betânia - receberam
apoio do Serviço Florestal, por meio da instituição
Associação Plantas do Nordeste, para
iniciar a atividade. Os resultados levaram à
ampliação da assistência técnica
florestal por mais dois anos, a partir do segundo
semestre de 2010, com a adição de
outros cinco assentamentos nos municípios
de Floresta, Orocó, Belém de São
Francisco e Parnamirim.
Na Paraíba, outros 14 assentamentos
já vêm recebendo assistência
técnica pela SOS Sertão, também
contratada pelo Serviço Florestal. Os municípios
abrangidos são São José de
Espinharas, Sumé, Barra de Santa Rosa, Desterro,
Boqueirão, Monteiro, São Sebastião
do Umbuzeiro, Cacimba da Areia, Cuité e Santana
dos Garrotes. Somando os dois estados, o potencial
de famílias que podem ser beneficiadas com
o manejo via Serviço Florestal chega a quase
1.000.
Por Fabiana Vasconcelos (Serviço Florestal)