28 Fevereiro 2012 - Publicada
pelas mais de 160 entidades brasileiras ligadas
ao Comitê Brasil em Defesa das Florestas
e do Desenvolvimento Sustentável, a
publicação Código Florestal
e a Ciência: o que nossos legisladores
ainda precisam saber reúne de forma
inédita três anos de argumentação
contrária a absurdos inseridos no projeto
de reforma em pauta no Congresso.
Ela traz resumos de estudos técnicos
e científicos feitos por mais de 50
pesquisadores de alto nível. Os sumários-executivos
assinados por alguns dos principais nomes
da ciência aplicada brasileira reforçam
o alerta sobre os perigos de se aprovar uma
reforma da legislação feita
para atender setores específicos e
não o que espera a maioria da sociedade.
A publicação
(atalho para download ao lado) evidencia que
o destino das florestas nacionais não
se resume a uma “disputa entre ambientalistas
e ruralistas”, mas que o assunto é
de interesse e abrangência nacionais,
merecedor de tratamento mais democrático
e com olhar estratégico no futuro do
país. Afinal, o projeto de cunho ruralista
pode privar o Brasil de sua principal vantagem
comparativa global: a possibilidade de aliar
produção e sustentabilidade.
A publicação tem mais de cem
páginas e está dividida em seções
dedicadas a Áreas Úmidas, Zonas
de Risco e Biodiversidade e Constitucionalidade,
Legislação e Economia.
No primeiro trecho, fica evidente que o projeto
em tramitação (aguardando nova
votação na Câmara) colocará
em risco a manutenção de áreas
especialmente importantes para o equilíbrio
ecológico, bem como à segurança
e sobrevivência de populações.
Alterando a lógica
da preservação de espaços
no entorno de pantanais, charcos, rios e córregos,
bem como em regiões inclinadas como
encostas e morros, além de manguezais
e cursos d´água intermitentes,
o texto abre espaço para mais desmatamento,
reduz a proteção da biodiversidade,
a oferta de serviços ambientais e aumenta
as ameaças de tragédias para
quem vive em áreas de risco.
Os eventos catastróficos
que, mais uma vez, provocaram perdas materiais
e humanas em regiões do Brasil no início
deste ano, evidenciaram novamente a importância
de serem preservadas as áreas vegetadas
de encostas e margens de rios, dadas suas
propriedades na retenção de
água e contenção de erosão,
por exemplo.
Do ponto de vista dos recursos
hídricos, a própria Agência
Nacional de Águas deixou claro que
“o Código Florestal Brasileiro não
necessita de alterações”, precisando,
na verdade, de mais proteção
efetiva a áreas de recarga de aqüíferos.
Detentor da terceira maior área (7%)
de manguezais do mundo, representando metade
dos manguezais da América Latina, o
Brasil pode assistir à destruição
em massa desses berçários naturais
de vida marinha e fonte de renda de populações
extrativistas com a aprovação
da proposta em voga de reforma do Código
Florestal. O texto traz uma coletânea
de equívocos e pegadinhas que, na prática,
deixam essas regiões desprotegidas.
O país perdeu 50 mil hectares de mangues
nos últimos 25 anos.
A publicação também reforça
que usos agrícolas por comunidades
tradicionais merecem tratamento diferente
na legislação para não
inviabilizar seu modo de vida e sobrevivência,
que áreas de preservação
permanente não podem ser somadas no
cálculo de reservas legais, que propriedades
rurais não podem compensar desmate
de reserva legal em qualquer região
de um mesmo bioma, e que sua “recuperação”
não pode ocorrer em definitivo com
plantas exóticas.
Na seção seguinte, especialistas
jogam por terra uma das principais inverdades
alardeadas por quem defende o “código
do desmatamento”: de que o Brasil estaria
isolado em nível global com sua legislação
protetora das florestas ao longo de rios e
outros cursos d´água, no entorno
de lagoas, lagos, reservatórios e nascentes,
topos e encostas de morros, nas restingas
e mangues.
Países como Paraguai, Chile, Panamá,
Venezuela, Bolívia, Costa Rica, Equador,
México, República Dominicana,
Alemanha, Belize, Austrália e alguns
estados norte-americanos tem legislação
restritiva ao desmatamento. Em alguns casos,
numa proporção maior que a fixada
na legislação brasileira.
Além disso, outro
sinal de que “terra arrasada não é
sinal de desenvolvimento” a revista aponta
que China, França, Alemanha, Japão,
Reino Unido, Índia, Holanda, Polônia,
Suécia e Estados Unidos têm áreas
estáveis ou crescentes de cobertura
florestal, com base em amplos programas de
preservação e reflorestamento.
Na Rússia, país com maior cobertura
florestal do mundo, as florestas representavam
34% do território em 1950 e em 2010
alcançaram 49%. Outro país com
relevante área florestal é o
Canadá, que manteve estável
a cobertura florestal entre 1900 e 2010: 34%
da área total. As florestas tropicais
da Malásia somavam 62%12 em 2010 (era
73% em 1963) e 63% em Papua Nova Guiné
em 2010 (era 67% em 1958). Já as florestas
da Noruega passaram de 24% em 1950 para 33%
em 2010.
O Brasil, assim como outros países
tropicais, perdeu florestas. Em 1954, a área
de florestas era de 76%, caindo para 56% de
seu total em 2010.
Conciliar os pontos de vista de cientistas,
empresários, ruralistas, industriais,
ambientalistas e de outros setores envolvidos
na questão central do uso da terra
e da manutenção da cobertura
vegetal não é um exercício
fácil.
Por isso, a discussão
sobre o Código Florestal Brasileiro
mostra claramente as diferenças de
interesses em jogo, bem como os caminhos para
se construir uma legislação
florestal moderna e justa, que impeça
mais degradação ambiental e
propicie qualidade de vida às populações,
especialmente aos pequenos produtores rurais.