26 Setembro 2012 - Michael
Becker, superintendente
de Conservação do WWF-Brasil
- Principal fronteira onde avança a
agropecuária desde os anos 1960, o
Cerrado tem poucas chances de seguir existindo
nas próximas décadas sem ações
emergenciais que ampliem sua área protegida
e que levem à adoção
em larga escala de práticas produtivas
menos danosas ao meio ambiente.
Consolidar as áreas
já protegidas é fundamental,
inclusive porque menos de 3% do Cerrado estão
hoje efetivamente resguardados pelo poder
público. A última unidade de
conservação federal criada na
região foi a Reserva Extrativista da
Chapada Limpa (MA), em 2007. Novas metas internacionais
chanceladas pelo Brasil recomendam a conservação
de pelo menos 17% de cada bioma, até
2020.
Enquanto isso, projeções
mostram que a área plantada com soja
pode saltar de 21 para 30 milhões de
hectares na próxima década,
sempre com foco nas “terras baratas” do Cerrado.
E o alvo pode ser justamente os maiores remanescentes
da savana brasileira, no Maranhão,
Piauí e Tocantins. Além disso,
a demanda interna e global por carnes cresce
junto com as necessárias melhorias
socioeconômicas.
Como soja e pecuária
são os principais motores da destruição
do Cerrado, respeitar a legislação
e melhorar a eficiência da produção
são atitudes indispensáveis.
A integração de lavouras, pecuária
e florestas plantadas, por exemplo, ajudaria
a evitar a abertura e novas áreas e
seria um sinal de que o país realmente
quer fornecer itens produzidos com mais sustentabilidade
aos mercados globalizados de commodities.
Afinal, se antecipar a possíveis
barreiras comerciais é sempre estratégico.
Inclusive porque mais de 40% dos grãos,
metade do farelo e um terço do óleo
de soja produzidos no Brasil são exportados.
Sete em cada dez países do mundo já
compraram esses itens na última década.
Estimativas oficiais apontam
que até 140 milhões de hectares
degradados no país, principalmente
no Cerrado e na transição deste
para a Amazônia.
A área é duas
vezes maior que a da França. Na maioria
dos casos, são terras que foram desmatadas
para lavouras e acabaram abandonadas pela
baixa produtividade. Em seguida, viraram pastos
para rebanhos até o solo se tornar
imprestável economicamente pela falta
de manejo adequado.
Tornar essa imensidão
de terras novamente produtivas ajudaria no
combate ao aquecimento do planeta, aliviaria
a pressão para o desmatamento de florestas
nativas e serviria à produção
de commodities e alimentos.
Outra preocupação
recai sobre as mudanças na legislação
florestal brasileira. A destruição
do Cerrado já pesa tanto quanto a da
Amazônia nas emissões nacionais
de gases de efeito estufa. E o bioma pode
ser um dos maiores prejudicados com as mudanças
que setores atrasados do ruralismo tentam
impor ao Código Florestal, como admitiu
o Ministério do Meio Ambiente.
Se a margem para desmatamento
for ampliada, a caixa d´água
do país ficará seriamente comprometida.
No Cerrado nascem águas que abastecem
aqüíferos subterrâneos e
as bacias hidrográficas Amazônica,
do Tocantins, do Atlântico Norte/Nordeste,
do São Francisco, do Atlântico
Leste e do Paraná/Paraguai. Dessa última
depende a sobrevivência do Pantanal,
a maior planície inundável do
planeta.
Além de insumo econômico,
a água que escorre por rios, córregos
e veredas de beleza incomum alimenta culturas
regionais muitas vezes fundadas no extrativismo
sustentável, uma atividade que perpetua
e valoriza a vegetação e outros
recursos nativos pelas mãos de valorosos
e inúmeros povos tradicionais do Cerrado.
Os índices atuais
de degradação e planos desenvolvimentistas
carentes de sustentabilidade ambiental projetam
um futuro nada animador para um bioma que
já perdeu metade da vegetação
nativa, ainda não é reconhecido
como patrimônio nacional pela Constituição
e que sofre desnecessariamente com incêndios
e queimadas cada vez mais intensos.
Mas com majestosa
resistência, o Cerrado ainda segue encantando
quem se atreve a conhecer esse abrigo de vida
e de paisagens únicas no mundo. Manter
esse patrimônio inigualável é
o desafio que se impõe ao Brasil.