20 Outubro 2012 | Por Andréa
de Lima, em Hyderabad, Índia - Depois
de duas semanas de intensas e exaustivas negociações,
chegou ao fim apenas na madrugada do sábado
a 11ª edição da Conferência
das Partes da Convenção de Diversidade
Biológica (CDB), em Hyderabad (Índia).
A última plenária foi aberta
pela ministra do Ambiente e Florestas da Índia
e presidente da COP até 2014, Jayanthi
Natarajan, às 17h de sexta (19/10).
A conclusão da sessão ocorreu
apenas às 2h30 do sábado (20/10).
O texto final trouxe avanços em questões
como oceanos, mas poucos em relação
a recursos financeiros para o cumprimento
das Metas de Aichi, acordadas há dois
anos em Nagoia (Japão), durante a COP
10.
Recursos financeiros
Desde o início, o principal debate
na mesa de negociações era quanto
ao financiamento para cumprir as 20 metas
de Aichi até 2020. Entre elas, está
a intenção de alcançar
a proteção legal de 17% das
áreas terrestres e de águas
continentais e 10% das águas marinhas
e costeiras. "O WWF veio para Hyderabad
pedir aos governos que se comprometam com
a interrupção das ameaças
à biodiversidade, um dos recursos mais
valiosos do mundo, o capital natural das nações",
disse Lasse Gustavsson, diretor executivo
do WWF Internacional de Conservação.
"Mas o acordo alcançado sobre
financiamento nesta COP de Hyderabad é
decepcionante, porque não garante recurso
suficiente para alcançar as metas ambiciosas
de proteção da biodiversidade
no mundo”.
O acordo para dobrar os
investimentos em biodiversidade dos países
desenvolvidos para as nações
em desenvolvimento significa um adicional
de US$ 5 bilhões até 2015, o
que representa um total de US$ 10 bilhões
por ano. A partir daí, os investimentos
serão congelados até 2020, ano
definido para a conclusão das Metas
de Aichi. O WWF estima um investimento necessário
em biodiversidade de cerca de 200 bilhões
de dólares a cada ano, se os governos
de fato se comprometessem com tais metas.
O que foi acordado em Hyderabad representa
menos de metade deste número.
De acordo com a secretária-geral
do WWF-Brasil, Maria Cecília Wey de
Brito, os custos para implementar o plano
estratégico para atingir as Metas de
Aichi podem variar de US$ 150 a US$ 430 bilhões
por ano. “Esses são valores altos,
mas que nem se comparam aos US$ 1000 bilhões
ao ano que os governos têm gasto em
subsídios com a indústria dos
combustíveis fósseis”, disse
Maria Cecília.
Sistemas marinhos
Considerando que os ambientes costeiros e
marinhos ocupam 1,6% das áreas protegidas
no mundo e que não vamos de fato conseguir
garantir uma cobertura adequada dessas áreas,
mas apenas daquelas sob jurisdição
nacional, o reconhecimento das EBSAs (da sigla
em inglês para Áreas marinhas
ecologicamente ou biologicamente significativas)
em alto mar pela CDB foi um ponto importante
no documento final. O Brasil, por exemplo,
apoiava o endosso de proteção
das EBSAs enquanto outras nações
anunciaram, ao final, apenas uma recomendação
para esse tema.
Se as agências da
ONU tomarem medidas para garantir a navegação
e que outras atividades nocivas não
prejudiquem essas importantes áreas,
isso poderá levar a uma melhor gestão
dos sistemas marinhos para além das
fronteiras nacionais. Outro ponto importante
de progresso veio com o anúncio do
primeiro-ministro indiano, Manmohan Singh,
de destinar US$ 50 milhões à
conservação da biodiversidade.
Notabilizado como a "Promessa de Hyderabad",
esse compromisso vai canalizar investimentos
em biodiversidade tão necessários
à Índia e a outras nações
em desenvolvimento que estão com dificuldades
para cobrir os recursos urgentemente necessários
ao capital natural. "O fato de Índia
ter assumido um compromisso financeiro em
nível nacional e internacional estabelece
um precedente para outras economias emergentes
oferecerem mais apoio à conservação
da biodiversidade global", afirmou a
secretária geral do WWF-Brasil.
Plano Estratégico
da CDB
Alguns resultados importantes merecem destaque:
as decisões acordadas sobre apoio à
capacitação. Alguns países,
no entanto, ainda precisam estabelecer seus
NBSAPs (da sigla em inglês para Estratégias
nacionais de biodiversidade e planos de ação),
inclusive com a definição de
indicadores. Nesse sentido, algumas estratégias
bem-sucedidas em andamento devem ser referência
para a implementação das Metas
de Aichi, entre elas o Programa de Áreas
Protegidas da Amazônia (Arpa), as iniciativas
regionais, tal como a Visão Amazônica,
e os processos dos Diálogos pela Biodiversidade,
como plataforma multissetorial.
REDD
Alvo de intensos debates, o documento acordado
trata especificamente das salvaguardas de
biodiversidade e Redução de
Emissões por Desmatamento e Degradação
florestal (REDD). Para superar a oposição
do Brasil à definição
de indicadores de salvaguardas de biodiversidade
nesta convenção, foi estabelecido
um consenso por meio da utilização
das Metas de Aichi como referência de
indicadores.
“Se a CDB não tiver
uma atuação mais imperativa,
com forte influência em questões
de biodiversidade que podem estar relacionadas
com clima, essa convenção acabará
por ter seu mandato reduzido”, afirma o superintendente
de conservação do WWF-Brasil,
Mauro Armelin.
Para Armelin, é importante
aproveitar os espaços abertos à
discussão dos temas relativos a biodiversidade,
para que a CDB possa ter um melhor posicionamento.
“Os países e a secretaria
executiva da CDB saem daqui agora com o desafio
de se apropriarem melhor dos temas de biodiversidade
e chegar à próxima COP (13,
na Coreia do Sul) com mais subsídios
para a tomada de decisão sobre as salvaguardas
a serem recomendadas, com mais segurança,
para a convenção de clima, por
exemplo”, adiantou o superintendente de conservação
do WWF-Brasil.
Iniciativa privada e governo
brasileiros
O WWF-Brasil e a Rede WWF participaram e acompanharam
ativamente as negociações dos
governos durante essas duas semanas da COP
11, em Hyderabad. Vale destacar o estreito
contato mantido com a delegação
brasileira e a promoção de discussões
sobre temas-chave dessa conferência,
e os subsídios para tomada de decisão
a partir de documentos com base científica,
acordado com outras organizações
participantes da cúpula.
Em tempo, é bom lembrar
da mostra dada pelo setor privado nesta COP
de seu engajamento nas questões de
sustentabilidade e conservação
da biodiversidade. É fato que esta
tendência faz parte do gerenciamento
de risco do próprio negócio.
Assim como a transparência das informações
de gestão e investimentos, a preocupação
com a regularidade legal (socioambiental),
inclusive com sua cadeia produtiva e a avaliação
de seus impactos sobre a biodiversidade, tem
aumentado em todos os setores da economia.
“A iniciativa privada no
Brasil também acompanha esta tendência.
Um exemplo deste engajamento é o Movimento
Empresarial pela Biodiversidade – Brasil (MEBB)
e sua participação nos Diálogos
pela Biodiversidade, onde também atuamos
e com os quais mantemos forte articulação”,
ressaltou Maria Cecília Wey de Brito,
secretária geral do WWF-Brasil.
O papel do setor privado,
segundo ela, é essencial para a construção
de novas oportunidades de negócio,
para as parcerias público-privadas
atraentes e para mecanismos inovadores de
financiamento que apoiem a implementação
das políticas de conservação
no Brasil e no mundo.
“As decisões já
acordadas nesta conferência sobre negócios
e biodiversidade reforçam o papel do
setor privado e do governo para a adoção
de práticas e estratégias que
contribuem com o atingimento das Metas de
Aichi. Tais estratégicas e práticas
contribuem ainda à realização
de análises de risco dos segmentos
mais impactantes e à redução
dos incentivos perversos à conservação
da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos”,
finalizou a secretária geral do WWF-Brasil.
+ Mais
Florestas seguem carentes
de mais proteção
19 Outubro 2012 | Brasília
(DF) - O WWF-Brasil acompanha há mais
de três anos a reforma do Código
Florestal no Congresso, dada a importância
da lei para a conservação da
biodiversidade, a economia e a qualidade de
vida dos brasileiros. Durante esse período,
parcela do agronegócio apoiada em parlamentares
de várias siglas realizou trabalho
para enfraquecer a proteção
de ecossistemas.
A legislação
resultante desse movimento, apesar dos vetos
e decretos publicados ontem (18), está
longe do que a Ciência indica como necessário
e do que a Constituição estabelece
para a manutenção de um meio
ambiente equilibrado. Mesmo que tais medidas
tenham melhorado trechos do projeto aprovado
no Congresso, os níveis de proteção
de matas ciliares, reservas legais, topos
de morro, encostas e mangues são inferiores
aos da legislação anterior.
Os vetos da Presidência
melhoram o que não é bom e podem
ajudar o Brasil no cumprimento de metas da
Convenção sobre Diversidade
Biológica das Nações
Unidas para a redução do desmatamento
no país. Apesar disso, sem dedicar
instrumentos e investimentos adequados à
escala do país, pode ficar comprometida
a implantação de mecanismos
positivos previstos na legislação,
como os que obrigam a restauração
de regiões degradadas e o cadastramento
e regularização das propriedades
rurais do país em 5 anos.
Além disso, por ainda
ser muito complexa e conter várias
imprecisões, a lei poderá ser
uma fonte de novos conflitos e ampliar a insegurança
jurídica no campo. Também deixa
um recado contraproducente para a sociedade
brasileira e global, anistiando quem cometeu
crimes e penalizando quem até hoje
respeitou a legislação. Isso
incentivará mais desmatamentos em todo
o Brasil, como vêm ocorrendo.
Por meio de pesquisas de
opinião e de campanhas como a Veta
Tudo, Dilma!, a maioria dos brasileiros se
posicionou contra novos desmatamentos e pediu
a rejeição integral da lei aprovada
no Congresso e sancionada pela Presidência
da República. Todavia, os apelos da
sociedade e da comunidade científica
não foram ouvidos.
De forma proativa, o WWF-Brasil
analisará os efeitos da legislação
em vigor sobre as regiões onde atua
e apontará, em parceria com os setores
governamental, privado e não governamental,
caminhos legais, concretos e economicamente
viáveis para proteger e restaurar ecossistemas
indispensáveis à sustentabilidade
socioambiental e à segurança
da população.