Recursos Hídricos
A ÁGUA E A FUNÇÃO DEMANDA
 
 

Neste capítulo realizar-se-á uma análise da escassez da água potável no Brasil, no contexto econômico, demonstrando as diversas opiniões dos autores quanto a este tema, bem como exemplos das alternativas encontradas por outros países. Far-se-á, também, uma análise da elevação do consumo de água potável ocasionada pela elevação da produção industrial e crescimento populacional.

Segundo ROSSETTI (1997), bens econômicos são bens que necessitam o emprego de recursos para sua utilização:

"Até mesmo o ar que respiramos, aos poucos, vai se transformando em um bem econômico. O emprego de recursos para a despoluição do ar ou para evitar que a poluição ocorra está transformando o ar num bem econômico como qualquer um outro: um bem cuja existência exige o emprego de recursos".(ROSSETTI, 1997, p.45) O exemplo usado pelo autor pode ser perfeitamente adequado tratando-se de água potável, pois da mesma forma que o ar, a água necessita do emprego de recursos para a manutenção de sua qualidade de potabilidade ou sua despoluição.

"O serviço de abastecimento de água exige a aplicação de capital e trabalho permanente de pessoal, o consumo de energia, o gasto de materiais, a manutenção de equipamentos, etc., e como são benefícios prestados, eles devem ser retribuídos com o pagamento de importância suficiente para a amortização, operação, manutenção e desenvolvimento. Essa retribuição devida pelos beneficiários geralmente é feita pelo pagamento de taxa ou tarifa, estabelecidos com base nas características e extensão do próprio benefício. É importante ressaltar desde logo que o valor da própria água, via de regra, é nulo, não se cobrando pela água, e sim apenas pelos serviços de captação, bombeamento, adução, purificação, reservação, distribuição, etc. Qualquer pessoa poderá ir ao rio, se for o caso, e retirar a água necessária ao seu consumo, sem nada pagar. Porém se essa pessoa desejar receber água à sua vontade, em seu domicílio, com melhor qualidade, deverá pagar as despesas feitas para esse conforto e segurança." (NETTO, 1967, p. 65).

A água é considerada um bem econômico porque é finita e essencial para a conservação da vida e do meio ambiente e, consequentemente, sua escassez impede o desenvolvimento de diversas regiões, na medida em que, além da necessidade humana a água é essencial no processo produtivo de muitas empresas.

"Por outro lado, é tida também como um recurso ambiental, pois sua alteração adversa desse recurso pode contribuir para a degradação da qualidade ambiental. Já a degradação ambiental afeta, direta ou indiretamente, a saúde, a segurança e o bem-estar da população; as atividades sociais e econômicas; a fauna e a flora; as condições estéticas e sanitárias do meio; e a qualidade dos recursos ambientais." (BORSOI, 1997, p.144).

Dentre os inúmeros recursos que o sistema econômico utiliza em seus processos produtivos, as reservas naturais, são os de maior importância, devido a sua escassez.

"As reservas naturais são constituídas pelo conjunto dos elementos da natureza utilizados no processo da produção. O assim denominado, fator terra, não inclui apenas a disponibilidade total de terras potencialmente apropriadas para a agricultura e a produção animal, mas também o conjunto dos elementos naturais que se encontram no solo e no subsolo; os lençóis de água subterrâneos, os mananciais, riachos, ribeirões, rios e quedas de água; os lagos, os mares e os oceanos, a vegetação e os recursos da flora; a fauna, o clima a pluviosidade e recursos extraplanetários, como o sol e o próprio espaço sideral. O fator terra, em concepção abrangente, engloba assim, todos os recursos e condições existentes na natureza. É do complexo conjunto de elementos que o constitui que o homem extrai os bens econômicos com os quais procura saciar suas ilimitáveis necessidades individuais e sociais".(ROSSETTI, 1997, p. 274).

Conforme MANKIW (1999), embora o fator terra seja constituído por um conjunto determinado e finito de macrodisponibilidades, sua significação econômica tem variado, de um lado, sob a ação de condições expansivas e, de outro lado, sob a ação de condições restritivas. Entre as expansivas, o estágio do conhecimento humano e o desenvolvimento de mais avançadas tecnologias de extração, renovação, reposição e reciclagem têm sido destacadas como as de maior relevância. Entre as restritivas, a crescente consciência sobre o equilíbrio global homem-natureza.

Segundo MOTTA (1998), embora o uso de recursos ambientais não tenha seu preço reconhecido no mercado, seu valor econômico existe na medida que seu uso altera o nível de produção e consumo (bem-estar) da sociedade.

"Em nível mundial, a agricultura é, de longe, o maior usuário de água - 65%, em comparação aos 24% na indústria e 8% no uso doméstico. Nos países em desenvolvimento, no entanto, o percentual utilizado na agricultura é até mesmo o mais alto - 80%." (RODRIGUES, 1998, p.25).

A demanda de um bem escasso, como a água, é influenciado, segundo BYRNS (1996, p.58), por preços diferentes. "As pessoas usam água cuidadosamente quando ela é escassa e cara, restringindo o uso apenas para as maiores necessidades. Conforme o preço cai, mais e mais usos são considerados econômicos". O autor faz uma relação das utilidades da água conforme o seu preço, sendo a mesma utilizada para regar o jardim, quando o preço é baixo, e usada somente para beber, quando o preço for muito elevado, "a água corre nas ruas das cidades quando as pessoas regam seus jardins e gramados apenas se o seu preço é inacreditavelmente baixo".

Segundo RODRIGUES (1998), a tarifação da água bem abaixo do seu valor econômico é normal em muitos países, a expansão do suprimento de água é, politicamente, mais conveniente e, devido a isso, o gerenciamento de preços e de demanda tem recebido muito menor atenção. A preferência pela expansão do suprimento levou a investimentos na infra-estrutura que poderiam ter sido evitados ou adiados. O resultado disso tem sido o aumento da pressão sobre os ecossistemas dependentes de água. Os agricultores, tanto dos países desenvolvidos quanto dos países em desenvolvimento, comumente pagam pouco pelo fornecimento público de sua água de irrigação. Eles recebem poucos incentivos para abandonar a produção de culturas que utilizam grande quantidade de água ou para conservar água.

O caráter limitador do fator terra tem sido historicamente destacado, conforme ROSSETTI (1997) no século XVIII, os economistas fisiocratas atribuíam preponderante importância a esse fator, evidenciando a alta dependência da produção agregada em relação às atividades diretamente relacionadas ao cultivo da terra. Entre os clássicos, o pastor Thomas Malthus e o financista David Ricardo procuraram evidenciar que a escassez de reservas naturais poderia impor limites ao crescimento econômico. É bastante conhecida a teoria malthusiana da população, segundo a qual, pela limitação de recursos, a produção de meios de subsistência crescia segundo as taxas de uma progressão aritmética, conflitando com o crescimento demográfico que deveria ocorrer segundo os termos de uma progressão geométrica.

A modernização do crescimento populacional e a racional exploração de reservas naturais, especialmente as não renováveis, são responsabilidades universais, no sentido de que abrangem todas as economias, independentemente de seu estágio de desenvolvimento. As já desenvolvidas, em vista do consumo destrutivo que contribui para a exaustão acelerada das reservas não renováveis; as emergentes, pela expansão populacional geométrica e pelo caráter predatório com que avançam sobre suas próprias reservas naturais.

"Os usos da água dentro de uma bacia hidrográfica ou aqüífero são interdependentes. As retiradas de água em uma parte da bacia reduzem a disponibilidade para outros usuários; o bombeamento da água subterrânea feito por um usuário pode rebaixar o lençol freático e aumentar os custos de bombeamento para todos os usuários; a poluição causada por um usuário afeta outros na bacia - na maioria das vezes, os que se encontram a jusante. Tais interdependências sugerem que algumas regras acordadas por todos os usuários - ou, na falta delas, regulamentações do governo e/ou tarifas - poderão aumentar o valor social dos recursos hídricos." (RODRIGUES, 1998, p.28).

Entre contestações e incertezas, o princípio da gratuidade da água é freqüentemente contestado por economistas e técnicos em saneamento, para estes a água tornou-se uma mercadoria, que pode ser vendida e comprada.

"Cada vez mais, em todo o mundo, a água é encarada sob o ponto de vista estratégico, ao mesmo tempo em que adquire certo status de commodity, podendo futuramente ser negociada com tanta facilidade quanto o petróleo. O quadro mundial apresenta números que projetam um futuro dramático para o abastecimento". (TEIXEIRA, 2000, p. 37).

De acordo com RODRIGUES (1998), a importância da tarifação e de outros incentivos visando encorajar os consumidores a adotarem práticas eficientes de uso da água depende do valor relativo da água. Quando há abundância de água de boa qualidade - e barata - não compensa investir em planos de monitoramento e em sistemas de tarifação de alto custo. No entanto, devido ao fato de a demanda responder ao preço, torna-se compensador medir, monitorar e tarifar cuidadosamente a água, à medida em que esta se torna escassa. Em muitas áreas do mundo, a subtarifação tem causados sérios abusos no uso da água.

Contudo, se a água é encarada como um bem gratuito, sua degradação, ocasionada pelo mau uso, aparentemente também é gratuita, gerando um consumo ineficiente. A partir do momento em que esta é vista como possuidora de valor econômico, torna-se um custo real sendo imprescindível a otimização de seu uso.


Fonte: Inpa
Ibama
MMA – Ministério do Meio Ambiente
Secretarias Estaduais de Meio Ambiente
Pick-upau – 2003 – São Paulo – Brasil

 
 
 
 

 

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