30/01/2021
– A vida das espécies nas cidades é repleta
de desafios, além dos naturais decorrentes das necessidades
fisiológicas, pois precisam encontrar alimentos, parceiros
ou se protegerem de predadores precisam também enfrentar
os problemas que as pessoas causam a elas. E são muitos,
em alguns locais ainda sofrem com armadilhas de captura colocadas
por pessoas mal-intencionadas, supressão indevida e desnecessária
de árvores que servem como parada de descanso, alimento
e nidificação, fiação elétrica
que por não ser subterrânea e sim aérea fere
e mata várias espécies, também tem a linha
de pipa chilena e o cerol.
As aves em particular são
um grupo que sentem muito as consequências desta prática.
Inúmeras espécies já foram resgatadas feridas
por linha chilena ou cerol. Durante a quarentena da Covid-19,
inclusive aumentou os casos na região da Baía de
Guanabara. Entre abril e maio do ano passado foram socorridas
na região da Ilha do Governador, Zona Norte do Rio, 29
fragatas com lesões, inclusive nas asas e enroladas em
linhas de pipa com cerol ou em linha chilena, cujo poder de corte
é 10 vezes maior que o cerol.
Reprodução/Luana Campachi
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Em 2018, um Centro de
Reabilitação de Animais Silvestres, em Jundiaí,
interior de São Paulo, recebeu 23 animais acidentados por
linha de cerol, em 2017 foram 22 casos. Segundo o coordenador
de comunicação da Associação, Samuel
de Oliveira Nunes, os acidentes com linhas de pipa com cerol ocupam
o terceiro lugar nas ocorrências que chegam ao CRAS, ficando
atrás dos atropelamentos e ataques por animais domésticos,
porém o assunto merece ser tratado com seriedade, pois
a maioria das aves que sofrem lesões ocasionadas por linhas
de pipa com cerol não conseguem retornar à natureza.
De acordo com o coordenador, as vítimas mais comuns são
espécies como periquitão-maracanã, periquito-rico,
bem-te-vi, pardal, andorinha, gavião-carijó, corujinha-do-mato,
carcará e gavião-de-rabo-branco, espécies
habituadas a viverem em cidades.
Em Pernambuco, segundo Dados da
Agência do Meio Ambiente (CPRH), a cada ano 40 aves ficam
feridas ou sofrem mutilações graves. Ao sofrerem
estes acidentes, as aves são levadas para o Centro de Animais
Silvestres de Pernambuco (Cetas-Tangara), na Zona Norte do Recife.
Segundo o veterinário Yuri Valença, chefe do centro
de animais, aves de diferentes espécies e tamanhos são
atingidas pelas linhas cortantes, porém quanto maior o
animal, maior o dano. De acordo com ele, o local recebe sabiás
e bem-te-vis, mas na maioria das vezes recebem carcarás
e corujas que ficam enroladas nas linhas e sofrem graves prejuízos.
Reprodução/Luana Campachi
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Ao contrário do que ocorreu
na Baía de Guanabara no Rio de Janeiro, onde a incidência
destes acidentes aumentou, em Pernambuco por causa da pandemia,
a quantidade de acidentes em 2020, até o mês de setembro
foi menor, afirma Valença.
Em Campo Grande, Mato Grosso do
Sul, a ave símbolo da cidade também sofre muito
com as linhas de pipa com cerol, a quantidade de araras-canindé
que ficaram presas aumentou nos primeiros meses de 2020 na capital
do estado, mesmo com a proibição de aglomerações
por conta da pandemia. Indivíduos que são monitorados
desde o ovo por pesquisadores acabam sofrendo com as inconsequências
desta prática tão nociva. Um indivíduo jovem
perdeu inclusive a capacidade de voar apenas 5 meses depois de
ter saído do ninho pela primeira vez, deixando os pesquisadores
revoltados. Segundo as biólogas que fizeram o resgate,
esse indivíduo de arara-canindé sofreu lesões
severas, a linha cortou os músculos, vasos sanguíneos
e atingiu até o osso.
Em São Paulo, todos os
dias a Pick-upau recebe inúmeras ligações
de pessoas querendo ajudar espécies que encontram feridas.
Esta semana recebemos ligação de uma moradora da
capital querendo ajudar uma maracanã-pequena que não
conseguia voar e notamos que a ave estava sem um dos pés,
podendo ser uma consequência de lesão por linha de
pipa com cerol, a ave foi encaminhada para o CRAS PET no Parque
Ecológico do Tietê para ser tratada adequadamente,
no entanto, não poderá retornar à natureza,
infelizmente.
Reprodução/Luana Campachi
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A maracanã-pequena
(Diopsittaca nobilis) é da família do psitacídeos
e vive em áreas semi-abertas, cerrados, buritizais, mas
secas, plantações e eucaliptais e mais recentemente
em cidades.
Utiliza cavidades naturais em
ocos para nidificar e nas cidades usa o telhado de beirais de
casas e construções. Pode utilizar também
de maneira eventual, túneis escavados por outras aves em
cupinzeiros em árvores ou em estirpes mortas de palmeiras
quebradas pelo vento. Consome frutos, sementes, grãos e
flores.
No estado de São Paulo,
está em vigor a Lei 17.201, cujo projeto é de autoria
do Deputado Estadual Coronel Telhada (PP) e foi sancionada pelo
governador em novembro de 2019. Esta lei proíbe o uso,
a posse, a fabricação e a comercialização
de linhas cortantes compostas de vidro moído conhecido
como cerol, bem como a importação de linha cortante
e industrializada obtida por meio da combinação
de cola madeira ou cola cianoacrilato com óxido de alumínio
ou carbeto de silício e quartzo moído, ou qualquer
produto ou substância de efeito cortante independente da
aplicação ou não destes produtos nos fios
ou linhas, conhecido como linha chilena/linha indonésia,
utilizadas para soltar pipas.
Todo cidadão pode denunciar
os estabelecimentos que estejam fabricando ou vendendo linhas
de pipa com material cortante e pessoas que estejam utilizando
estes materiais tão nocivos às aves e também
aos seres humanos, sobretudo, motociclistas. O programa Linha
Verde disponibiliza o número 0300 253-1177 para que a sociedade
possa denunciar crimes ambientais. É assegurado o anonimato
do denunciante.
Reprodução/Luana Campachi
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Fonte: Avifauna Brasileira
– Tomas Sigrist. 2014; G1. Número de aves machucadas
por linhas chilena e com cerol no Rio aumenta, dizem biólogos,
maio de 2020; G1. Cerol: um risco que cruza os céus e ameaça
a natureza, março de 2019; G1. Linhas de pipa com cerol
e outras substâncias cortantes provocam ferimentos e mutilações
em aves silvestres, setembro de 2020; Campo Grande News. Linhas
com cerol ferem araras e ameaçam ave que é um dos
símbolos da Capital, maio de 2020; Assembleia Legislativa
do Estado de São Paulo, Uso do cerol é proibido
no Estado, novembro de 2019; JR o Jornal da Região, Lei
do Cerol já está em vigor no Estado de São
Paulo, janeiro de 2020.
Criado em 2015, dentro do setor
de pesquisa da Agência Ambiental Pick-upau, a Plataforma
Darwin, o Projeto Aves realiza atividades voltadas ao estudo e
conservação desses animais. Pesquisas científicas
como levantamentos quantitativos e qualitativos, pesquisas sobre
frugivoria e dispersão de sementes, polinização
de flores, são publicadas na Darwin Society Magazine; produção
e plantio de espécies vegetais, além de atividades
socioambientais com crianças, jovens e adultos, sobre a
importância em atuar na conservação das aves.
Da Redação (Viviane
Rodrigues Reis)
Fotos: Reprodução/Luana Campachi |