09/06/2018
– Um grande companheiro nas expedições do
Projeto Aves: Mata Atlântica, o urubu-de-cabeça-preta,
quase sempre desconsiderado pela maioria das pessoas e associado
a lixo e carniças, tem grande relevância para o mundo
e para as pesquisas. Conheça um pouco sobre a espécie
que alimenta muitas manifestações literárias,
tanto acusações severas como homenagens populares.
O urubu "exerce verdadeira atração sobre a
curiosidade humana, pela sua pacífica convivência
com a morte, dela extraindo sua própria vida" (Compositor
Luiz Gonzaga, 1981).
Os urubus pertencem à família
Cathartidae, cujas características são narinas perfuradas,
dedo traseiro mais elevado do que os outros, cabeça ou
cabeça e pescoço nus e que se alimentam de cadáveres
em decomposição.
|
|
Urubu-de-cabeça-preta (Coragyps
atratus) registrado no Belvedere, Ubatuba, São
Paulo.
|
O gênero Coragyps possui
apenas uma espécie, o urubu-de-cabeça-preta (Coragyps
atratus), com 62 centímetros, 145 centímetros
de envergadura de asa (a menor entre os urubus) e 1,6 kg. Não
possui penas na cabeça e em parte do pescoço, desta
maneira evita se sujar durante a alimentação. O
bico e as narinas são estreitos, quase como fendas, a plumagem
do adulto é preta com o lado inferior das rêmiges
primárias (penas localizadas na ponta da asa) brancas.
Apresenta distribuição
ampla, expandindo-se acompanhando a ocupação humana.
Não ocorre em alguns lugares como nos sertões de
Parecis (Mato Grosso), nos campos da Serra do Caparaó (Minas
Gerais), em certas partes do Rio Grande do Sul e em regiões
densamente florestada da Amazônia.
|
|
Urubu-de-cabeça-preta (Coragyps
atratus) em praia de Bertioga, Baixada Santista,
São Paulo.
|
A ausência local
no Rio Grande do Sul pode ser devido à falta de correntes
aéreas ascendentes em regiões planas. Ocorre também
na Argentina, Bolívia, Venezuela, Chile, Colômbia,
Paraguai, Peru, Uruguai, Equador, Guiana, Guiana Francesa; Costa
Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua, Trindade
e Tobago, Belize, Suriname, Panamá; México, Estados
e Canadá. No Brasil é a espécie de urubu
mais comum encontrada em cidades e áreas abertas. Habita
campos, pastos, áreas agrícolas e restingas, até
2400 m de altitude.
Possui asas largas e voa pesadamente,
alternando algumas rápidas batidas de asa com o planeio.
Aproveitam-se das correntes ascendentes de ar quente para elevar-se,
evitando gasto energético, quando a temperatura é
alta planam por horas. Apresentam o hábito de esticar as
asas ao descansar.
Pernoita em grandes grupos, pousado
em árvores, principalmente próximo a lixões,
matadouros e acúmulos de detritos.
|
|
Urubu-de-cabeça-preta (Coragyps
atratus) na praia do Camaroeiro, Caraguatatuba, litoral
norte de São Paulo.
|
Não possui o órgão
vocal das aves, a siringe. Porém sabem bufar fortemente
e produzem um ruído forte ao bater ativamente as asas.
Também produz outro som, quando cai a grande altura, e
freia devagar nas proximidades do solo ou da vegetação,
causado pelo ar que passa rapidamente pelas penas das asas.
O macho pode ser maior do que
a fêmea e se locomovem no solo através de longos
pulos e de uma maneira um pouco desajeitada, por causa do dedo
traseiro que é mais elevado do que os outros.
Para regular a temperatura corporal,
abrem as asas e urinam e defecam sobre as pernas, resfriando o
corpo. Pesquisas revelaram que as partes nuas na cabeça
e no pescoço têm também papel importante na
termorregulação. Também tem o hábito
de pousar nas margens de rios e lagoas em dias muito quentes,
para beber água e resfriar as pernas. Pode inclusive, entrar
e molhar as pernas completamente.
Além
do urubu-de-cabeça-preta, o Brasil possui mais 4
espécies da família Cathartidae, urubu-de-cabeça-vermelha
(Cathartes aura), urubu-de-cabeça-amarela
(Cathartes burrovianus), urubu-da-mata (Cathartes
melambrotus) e urubu-rei (Sarcoramphus papa).
|
O urubu-de-cabeça-preta
apresenta um comportamento denominado Allopreening. Comportamento
social onde membros de determinada espécie executam a limpeza
em outro individuo pertencente ao seu grupo social.
Já foi observado em Corumbá,
Mato Grosso do Sul, alisando as penas da cabeça de uma
espécie da família Falconidae. Parente distante
dos falcões, o carcará (Caracara plancus)
retribuía fazendo o mesmo no peito do urubu.
Este comportamento também
já foi observado em outros locais. Em 2010, em Itupeva,
São Paulo o urubu-de-cabeça-preta foi registrado
arrumando as penas do carcará. No município de Campinas,
também em São Paulo, em 2016 e em Conceição
dos Ouros, Minas Gerais, 2017.
Constam algumas hipóteses
para explicar este comportamento, remoção de ectoparasitos,
posicionamento hierárquico e restabelecimento do bom convívio.
E também para os carcarás, um comportamento de estratégia
de submissão para serem aceitos entre os urubus e procurarem
alimentos juntos.
|
|
Ovos de Urubu-de-cabeça-preta
(Coragyps atratus) no Parque Estadual das Fontes
do Ipiranga, em São Paulo.
|
Alimentação
O urubu-de-cabeça-preta
não possuem olfato como os urubus do gênero Cathartes,
(urubu-de-cabeça-amarela) mas possui visão aguçada.
Observa nas alturas já de madrugada e no crepúsculo,
localizando a grande distância animais mortos grandes. Utilizam
os pés para pisar no alimento, já que não
conseguem segurá-lo. A potência do bico e das unhas
é menor que das aves de rapina, mas possui o bico forte
ao ponto de rasgar a pele de animais mortos maiores.
A "carne vermelha" é
a comida obrigatória de Coragyps. Inicialmente, arrancam
os olhos e a língua, depois atacam as vísceras.
Alimenta-se em aterros sanitários, aproveita restos de
ovos de tartarugas escavados por cães e quatis na areia
das praias, peixes moribundos em lagoas que secam durante estiagem
no Pantanal e no Centro Oeste. Atacam ocasionalmente animais vivos
impedidos de fugir como filhotes de tartarugas.
O suco gástrico (solução
rica em ácido clorídrico e em enzimas) do estômago
dos urubus neutraliza toxinas e bactérias, eliminando perigos
de infecção durante a alimentação.
Reprodução e cuidado
parental
O casal executa manobras aéreas
barulhentas durante a corte. O macho corteja a fêmea no
solo, pulando com as asas abertas e no ar realiza voos nupciais,
mostrando-se muito ágil, descendo em altas velocidades.
Realiza a postura dos ovos em
ocos de árvores mortas, entre pedras e outros locais abrigados,
geralmente com incidência de árvores. Em extensas
áreas planas, cobertas de mata, como na Amazônia,
Coragyps (urubu-de-cabeça-preta) deposita seus ovos em
buracos abertos entre as raízes de uma grande árvore
tombada. Na cidade de São Paulo, entre outras, Coragyps
reproduz regularmente sobre edifícios altos.
|
|
Urubu-de-cabeça-preta (Coragyps
atratus) e seu companheiro Carcará (Caracara
plancus).
|
Põem de um a
três ovos, branco azulado ou esverdeado, pintados de marrom,
diretamente sobre o solo e até em sacadas de prédios.
Os períodos de incubação e de permanência
dos filhotes no ninho são longos, 49 dias. O filhote possui
penugem bege-marrom, quando recém-nascidos, em seguida
ficam brancos até adquirirem a plumagem definitiva que
é preta. Ambos cuidam dos filhotes durante meses.
Ameaças
Apesar de ter ampla distribuição
e a espécie não estar em nenhuma categoria de ameaça,
o urubu-de-cabeça-preta não deixa de sofrer algumas
ameaças, como morte por choques elétricos em torres
de alta tensão, colisões em aeronaves e também
podem se tornar vítimas ao consumirem animais contaminados
com agrotóxicos.
Seus parentes
Além do urubu-de-cabeça-preta,
o Brasil possui mais 4 espécies da família Cathartidae,
urubu-de-cabeça-vermelha (Cathartes aura), urubu-de-cabeça-amarela
(Cathartes burrovianus), urubu-da-mata (Cathartes
melambrotus) e urubu-rei (Sarcoramphus papa).
O condor-da-califórnia
(Gymnogyps californianus), catartídeo nativo da América
do Norte, chegou a ser extinto na natureza, em 1981 havia apenas
22 indivíduos da espécie, dois anos depois, os ovos
foram retirados da natureza para iniciar um programa de reprodução
em cativeiro e em 1987 a espécie foi considerada extinta
na natureza. Foi reintroduzido no México e Estados Unidos
e sua população vêm crescendo, mas ainda está
criticamente ameaçado.
|
|
Urubu-de-cabeça-preta (Coragyps
atratus).
|
O condor-dos-andes (Vultur
gryphus) nativo da Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia,
Equador e Peru sofre algumas ameaças como perseguição
por supostos ataques a gado, consumo de carcaças envenenadas
de onça-parda e raposas e competição interespecífica
por carcaças com o urubu-de-cabeça-preta, que tem
ocupado recentemente as mesmas áreas. Estes fatores têm
afetado a população do condor-dos-andes colocando-o
na categoria quase ameaçado na lista vermelha de espécies
ameaçadas da União Internacional para a Conservação
da Natureza (IUCN, na sigla em inglês).
A Agência Ambiental Pick-upau,
através do Projeto Aves, patrocinado pela Petrobras, realiza
diversas atividades voltadas ao estudo e conservação
das aves. Pesquisas científicas são publicadas na
Darwin Society Magazine, como levantamentos quantitativos e qualitativos,
pesquisas sobre frugivoria e dispersão de sementes, polinização
de flores, produção e plantio de espécies
vegetais, além de atividades socioambientais com crianças,
jovens e adultos, sobre a importância de sua conservação.
O Projeto Aves é patrocinado
pela Petrobras, por meio do Programa Petrobras Socioambiental,
desde 2015.
Por Viviane Rodrigues Reis
Fotos: Reprodução/Pick-upau |