07/02/2006
- Queridos Amigos,
Há mais de 30 anos,
venho me dedicando ao estudo dos povos indígenas,
de suas culturas, suas histórias e
seu relacionamento com o mundo exterior. Sempre
defendi os índios e sua luta pela terra.
Foi por essas razões, pelos livros
que já escrevi sobre os povos indígenas
e pelos trabalhos que realizei com os índios
e a Funai, que o presidente da República,
Luiz Inácio Lula da Silva, me honrou
com o convite para assumir a direção
da Funai.
Nesse trabalho, que realizo
há quase dois anos e meio, conversei
com centenas de representantes indígenas,
em Brasília, e com milhares de índios,
crianças e adultos, em suas aldeias.
Já visitei mais de 50 povos indígenas
em suas terras. Também participei de
conquistas importantes para os índios
e o futuro do país, como a homologação
da Raposa Serra do Sol, o retorno dos Xavante
a Maraiwatsede, a demarcação
e homologação de mais de 70
terras indígenas e a recuperação
da terra dos povos Tupiniquim e Guarani, no
Espírito Santo, para citar apenas alguns
casos.
Nossa luta, porém,
não é fácil; e as críticas
são muitas. Todos devem se lembrar
que fui muito atacado na imprensa quando defendi
o povo Cinta Larga. Não é possível
agradar a todos, mas sempre me mantive ao
lado dos índios.
Algumas semanas atrás
saíram notícias inverídicas
em jornais sobre supostas declarações
que eu teria dado. Por isso é preciso
dar explicações. No início
deste ano, dei uma entrevista a uma agência
de notícias estrangeira. Essa entrevista
foi traduzida de maneira errada, pois o texto
original era em inglês. O que eu disse
é que o Brasil tem muitas terras indígenas
e isso deve sim ser motivo de orgulho para
todos os brasileiros -jamais disse que os
índios teriam terras demais, porque
isto é contra tudo o que eu penso e
venho fazendo como presidente da Funai. As
críticas vêm de pessoas que sempre
foram contra a Funai e agora estão
se aproveitando para diminuir ainda mais a
capacidade da Funai agir em benefício
dos povos indígenas.
Ainda temos muito trabalho
pela frente. Quando assumi a presidência
da Funai, determinei aos servidores o máximo
empenho para a regularização
e a fiscalização das terras
indígenas. Até agora, cerca
de 50 terras indígenas foram homologadas
e temos dezenas de processos de delimitação
e demarcação em curso.
Também venho lutando
desde o começo pelo fortalecimento
da Funai, para que ela possa melhor atender
às necessidades das comunidades indígenas.
Para isso, estamos em negociações
avançadas com o governo federal para
conseguir três coisas importantes: plano
de carreira dos servidores, concurso público
para aumentar o quadro da Funai e a criação
de uma escola de indigenismo. Tudo isso vai
melhorar a qualidade do atendimento aos índios.
Outro projeto extremamente importante que
está em andamento é a realização
do primeiro Censo Indígena, instrumento
vital para garantir os benefícios sociais
do Estado aos povos indígenas. A partir
desse censo, cada índio terá
uma carteira de identidade válida em
todo território nacional.
É preciso ressaltar
ainda o trabalho da Funai no exterior, em
negociações nas Nações
Unidas e na Organização dos
Estados Americanos, para a elaboração
de documentos que assegurem os direitos dos
índios em nível internacional.
Nos dois fóruns, o Brasil tem uma posição
de liderança, passando à frente
dos países ricos, como Estados Unidos
e Austrália, na defesa dos direitos
indígenas.
Espero que esta carta ajude
a esclarecer às comunidades indígenas
e aos servidores da Funai todo o valor da
política indigenista brasileira. Acho
importante mantermos sempre aberta a comunicação
entre os índios e a direção
da Funai, ideal que nos motiva a realizar
importantes projetos como as Conferências
Regionais dos Povos Indígenas, que
prepararam o terreno para a grande Conferência
Nacional, onde os índios participarão
diretamente da construção de
uma nova política.
Mércio Pereira Gomes
Presidente da Funai