28/03/2006 - Realizado desde
a 6a Conferências das Partes (COP-6),
em 2002, por uma coalizão formada por
dez organizações de diferentes
partes do mundo para denunciar o fracasso
da Convenção sobre Diversidade
Biológica (CDB) em criar e adotar mecanismos
para brecar a biopirataria, o Prêmio
Capitão Gancho costuma dar um tom divertido
ao dia-a-dia normalmente sisudo das COPs da
CDB.
Por Cristiane Fontes.
Foram anunciados, na sexta-feira
(24/3), os vencedores da premiação
da Coalizão contra a Biopirataria,
um grupo informal da sociedade civil voltado
a denunciar de forma bem-humorada e provocativa
indivíduos, corporações
e governos que se apropriam e manipulam indevidamente
recusos genéticos, conhecimentos e
culturas tradicionais. A premiação
também exalta aqueles que trabalham
para barrar a biopirataria. A premiação
ocorreu na tenda do Fórum Global da
Sociedade Civil, que acontece durante a 8a
Conferência das Partes (COP 8) da Convenção
da Diversidade Biológica (CDB), em
Curitiba (PR). Entre os agraciados nesta última
edição estão o governo
dos Estados Unidos, o Google, o cientista-empresário
J.Craig Venter e a empresa suíça
Syngenta. Esta última por suas ameaças
à soberania alimentar, a mesma que
foi multada em R$ 1 milhão, na semana
passada, pelo Ibama por manter um cultivo
experimental de soja transgênica na
área de amortecimento do Parque Nacional
do Iguaçu (PR), o que é proibido
pela legislação brasileira.
Realizado desde a 6a Conferências
das Partes (COP-6), em 2002, por uma coalizão
formada por dez organizações
de diferentes partes do mundo, entre elas
o Grupo de Ação contra a Erosão,
Tecnologia e Concentração (ETC
Group), para denunciar o fracasso da Convenção
sobre Diversidade Biológica (CDB) em
criar e adotar mecanismos para brecar a biopirataria,
o Prêmio Capitão Gancho costuma
dar um tom divertido ao dia-a-dia normalmente
sisudo das COPs da CDB. É anunciado
por um homem vestido de Capitão Gancho,
geralmente em um lugar movimentado do evento,
em uma cerimônia da qual os premiados
- inusitadamente, mas, obviamente - não
costumam participar. Alguns dos presentes
ficam responsáveis por, quando possível,
entregar os prêmios aos biopiratas ao
longo da conferência.
Neste ano, na categoria
"pior ameaça à soberania
alimentar", pela patente de uma batata
Terminator, modificada geneticamente para
brotar apenas a partir da aplicação
de um indutor químico, e pela solicitação
de patente sobre sequências genéticas
vitais para o cultivo de arroz, foi premiada
a Syngenta. Já o prêmio pelo
"ato biopirata mais vergonhoso"
foi dado ao governo dos Estados Unidos, por
ter imposto ao Iraque leis de propriedade
intelectual sobre cultivos, o que abre porta
ao comércio de sementes pelas multinacionais
e ameaça a soberania alimentar do povo
iraquiano. O cientista-empresário norte-americano
J.Craig Venter, criador, entre outros, do
Instituto para Pesquisa Genômica, foi
eleito o "biopirata mais ganancioso do
mundo" pela expedição global
de biopirataria, realizada para coletar e
sequenciar a diversidade de microorganismos
de oceanos e solos. O prêmio "Eixo
do Mal" foi concedido ao Canadá,
Austrália e Nova Zelândia pela
tentativa de minar a moratória à
Tecnologia Genética de Restrição
do Uso (GURTs, na sigla em inglês),
também conhecida como Terminator, durante
a reunião do Grupo de Trabalho da CDB
sobre o Artigo 8J (de protecão aos
conhecimentos tradicionais), realizada em
janeiro, na Espanha. Na categoria "maior
ameaça à pirivacidade genética",
o prêmio foi para o portal da Internet
Google, que se juntou a J.Craig Venter para
criar uma base de dados para pesquisa de todos
os genes do planeta, que deverá disponibilizar
online uma ferramenta de biopirataria.
Já entre os premiados
por fazerem oposição à
biopirataria, apelidados de "cogs"
(nome em inglês para os navios que repeliam
os ataques de piratas), estão: a Via
Campesina, como a "melhor defensora da
soberania alimentar", por sua Campanha
Global de Sementes, na qual vem fortalecendo
desde 2003 os direitos dos pequenos agricultores
de selecionar, escolher, trocar e plantar
suas sementes, e assim resistindo ao controle
das indústrias multinacionais de sementes
e de biotecnologia; o Edmonds Institute e
o African Centre for Biosafety, na categoria
de "melhor denunciante" pelo estudo
"Out of Africa" lançado neste
ano e no qual denunciam e documentam 34 casos
recentes de biopirataria envolvendo plantas,
animas e micróbios africanos; e Rede
de Defesa do Milho e o povo Wixarika (Huichol),
do México, como a melhor defesa dos
povos, por ter envolvido no protesto contra
a contaminação do milho transgênico
a luta pelo território, pelo autogoverno,
pela educação diferenciada,
entre outros. Leia abaixo a lista completa
dos vencedores Prêmio Capitão
Gancho Contra a Biopirataria 2006.
Prêmio Capitão
Gancho contra a Biopirataria
Os biopiratas de
2006
Categoria A Pior Ameaça
à Soberania Alimentar. Motivo: Syngenta,
por sua patente tipo Terminator, desenhada
para impedir que as batatas brotem, apesar
da promessa da companhia de não comercializar
tecnologias envolvendo sementes estéreis.
A patente US 6,700,039 descreve um metodo
de modificação genética
que impede a brotaçãoo, a menos
que seja aplicado um indutor químico.
E também por sua solicitação
de patente multigenômica sobre milhares
de sequências genéticas vitais
para o cultivo de arroz e que se estendem
a dezenas de outras espécies vegetais.
Categoria O Biopirata mais
Ganancioso: J.Craig Venter, por realizar uma
expedição global de biopirataria,
para coletar e sequenciar a diversidade microbiológica
de oceanos e solos do planeta. Este material
genético terá papel crucial
em seu mais ambicioso projeto: construir um
organismo artificial completamente novo.
Categoria A Maior Ameaça
à Privacidade Genética: Google
Inc., por se juntar a J.Craig Venter para
criar uma base de dados de todos os genes
do planeta para pesquisa online.
Categoria Prêmio de
Maquiagem Extrema: Delta & Pine Land Co.,
por prometer, desde 1998, comercializar tecnologia
Terminator. Inicialmente, a D&PL promoveu
a esterilização genética
de sementes para que agricultores não
voltassem a replantar suas sementes. Agora,
depois de protestos massivos, a companhia
dá uma fachada verde ao Terminator,
promovendo-o como uma ferramenta de biosseguranca
para conter o fluxo genético.
Categoria O Ato de Biopirataria
Mais Vergonhoso: Governo dos Estados Unidos,
por impôr leis de propriedade intectual
sobre cultivos no Iraque. Quando os Estados
Unidos invadiram o Iraque, tornaram ilegal
aos agricultores locais utilizarem sementes
colhidas de novas variedades. A nova lei de
patentes do Iraque abre portas para o comércio
de sementes de multinacionais e ameaça
a soberania alimentar.
Categoria O Pior Dejá Vu: Projeto Genográfico
Humano, por ressuscitar o velho (e muito desprestigiado)
Projeto Genoma Humano com dinheiro novo das
corporações. A IBM e a National
Geographic Society investiram US$ 40 milhões
e estabeleceram 10 centros de pesquisa ao
redor do globo para coletar e analisar mais
de 100 mil amostras de DNA de povos indígenas,
argumentando que, com isso, vão poder
auxiliá-los a compreender seu passado.
Categoria O Prêmio
Eixo do Mal: Canadá, Austrália
e Nova Zelândia, por suas reiteradas
tentativas para minar a moratória relativas
a tecnologia Terminator na CDB.
Categoria A Pior Traição:
Genencor e outros, por patentear, clonar e
vender microorganismos coletados no Quênia
sem permissão das autoridades ou do
pesquisador queniano que pesquisava com eles.
Os microorganismos produzem enzimas importantes,
que servem, por exemplo, para dar ao jeans
a aparencia de desbotado, e renderam milhões
para a indústria.
Categoria O Mais Hipócrita
dos Ganhadores Conjuntos: Universidade da
Califórnia – Davis, por patentear um
gene de resistência a ferrugem, extraído
de uma variedade de arroz desenvolvida pelo
povo Bela, em Mali, e por não entregá-lo
ao Genetic Resources Recognition Fund, em
benefício das comunidades locais do
Mali. O International Rice Research Institute
(IRRI), um instituto público para o
melhoramento de plantas nas Filipinas, entregou
uma amostra do arroz aos pesquisadores da
Universidade da Califórnia em 11000.
Quando o IRRI solicitou acesso ao gene resistente
à ferrugem derivado da amostra, a universidade
exigiu um pagameno de US$ 10 mil; e The Biotehnology
Industry Organization, por escrever regras
de bioprospecção inspiradas
nas Diretrizes de Bonn para as companhias
associadas para, em seguida, pedir que essas
regras fossem ignoradas.
Os defensores de 2006
Categoria A Melhor Defesa
dos Povos: Rede de Defesa do Milho e o Povo
Wixárica (México), por ampliar
o alcance do protesto contra a contaminação
do milho transgênico, que passou a incluir
uma luta por território, autogoverno,
acesso a água, florestas, fauna, espaços
sagrado e léngua e educação
diferenciada. No ano passado, o povo Wixárika
recuperou 10.200 hectares de terra de suas
comunidades; e Deccan Development Society,
da Índia, por organizar, com êxito,
sistemas autônomos de sementes entre
as mulheres e as comunidades Dalit, no distrito
Medak, em Andhra Pradesh. Também por
sua importante pesquisa comunitária
sobre os efeitos do algodão Bt, que
persuadiram o governo de Andhra a chutar a
Monsanto para fora do Estado.
Categoria A Melhor Defesa
da Soberania Alimentar: Via Campesina, por
sua Campanha Global de Sementes, iniciada
em 2003, fortalecendo os direitos dos pequenos
agricultores de selecionar, escolher, trocar
e plantar suas sementes, resistindo ao controle
das indústrias multinacionais de sementes
e biotecnologia. Categoria A Melhor Defensoria:
Grupo da África na CDB, por defender
a biodiversidade e os direitos dos agricultores,
liderando uma forte oposicão a tecnologia
Terminator na CDB desde 1998.
Categoria Reconhecimento
pelo Trabalho Desenvolvido: Programa Comunitário
de Desenvolvimento e Conservação
da Biodiversidade, por pesquisa baseada no
conhecimento de camponeses em todo o mundo,
desenvolvendo e compartilhando metodos de
producao agricola que enriquecem a biodiversidade,
protegem as sementes, as culturas e os meios
de sobrevivencia, afirmando a soberania alimentar.
Categoria O Melhor Denunciante:
Edmonds Institute e o African Centre for Biosafety,
pela pesquisa que resultou no relartório
"Out of Africa", onde estão
documentados 34 casos recentes de biopirataria
envolvendo plantas, animais e micróbios
africanos.
Categoria A Vitória
Mais Agradável. Motivo: Magda Aelvoet
(ex-presidente do Grupo dos Verdes do Parlamento
Europeu), Vandana Shiva (Research Foundation
for Science, Technology and Natural Resource
Policy) e Linda Bullard (da Federacao Internacional
dos Movimentos de Agricultura Orgânica),
por impugnar uma patente da Oficina Européia
de Patentes sobre a preparação
de um fungicida derivado das sementes da árvore
neem. Durante séculos, agricultores
têm utilizado o óleo do neem,
devido as suas propriedades fungicidas. A
patente foi revogada em 2000, mas levou quase
cinco anos para que a EPO finalmente rejeitasse
um recurso contra a revogação
de 2000.
Captain Hook Awards for
Biopiracy 2006
The Biopirates
Worst Threat to Food Sovereignty:
Syngenta, for its Terminator-like patent designed
to prevent potatoes from sprouting, despite
the company’s pledge not to commercialize
technologies involving sterile seed. US patent
6,700,039 describes a genetic modification
method that prevents sprouting unless an external
chemical inducer is applied. And for Syngenta’s
multi-genome patent applications on thousands
of gene sequences vital for rice breeding
and extending to dozens of other plant species.
Greediest Biopirate: J Craig
Venter, for undertaking, with flagrant disregard
for national sovereignty over biodiversity,
a US-funded global biopiracy expedition on
his yacht, Sorcerer II, to collect and sequence
microbial diversity from the world’s oceans
and soils. The genetic material will play
a role in his most ambitious project to date:
building an entirely new artificial organism.
Biggest Threat to Genetic
Privacy: Google Inc., for teaming up with
J. Craig Venter to create a searchable online
database of all the genes on the planet so
that individuals and pharmaceutical companies
alike can ‘google’ our genes – one day bringing
the tools of biopiracy online.
Extreme Makeover Award:
Delta & Pine Land, for vowing, since 1998,
to commercialize Terminator technology. Initially,
D&PL promoted genetic seed sterilization
for use in the South to prevent farmers from
re-using seed. After massive protest, the
company changed its tune and said Terminator
was primarily intended for Northern farmers.
Now the company is greenwashing Terminator
by promoting it as a biosafety tool to contain
gene flow – for farmers everywhere!
Most Shameful Act of Biopiracy:
US Government, for imposing plant intellectual
property laws on war-torn Iraq in June 2004.
When US occupying forces “transferred sovereignty”
to Iraq, they imposed Order no. 84, which
makes it illegal for Iraqi farmers to re-use
seeds harvested from new varieties registered
under the law. Iraq’s new patent law opens
the door to the multinational seed trade,
and threatens food sovereignty.
Worst Déjà
Vu: Human Genographic Project, for resurrecting
the old (much discredited) Human Genome Diversity
project with new corporate money. IBM and
the National Geographic Society are spending
$40 million dollars and establishing ten research
centers around the globe to collect and analyse
more than 100,000 DNA samples from indigenous
people, claiming this will help them understand
their ancestry.
Access of Evil Award: Canada,
Australia, New Zealand, for repeated attempts
to undermine the de facto moratorium on Terminator
technology at the Convention on Biological
Diversity (CBD). And for their betrayal of
Indigenous Peoples at the CBD’s Working Group
on 8(j) in Spain.
Biggest Tiny Claim On Nature:
Nanosys, Inc., for securing a US patent on
‘metal-oxide nanorods’ covering more than
a third of the chemical elements of the periodic
table.
Worst Betrayal: Genencor
et al., for patenting, cloning and selling
“extremophile” microorganisms that were collected
from lakes in Kenya without the permission
of Kenyan authorities or the collaborating
Kenyan researcher. The microorganisms produce
industrially-important enzymes (used to fade
blue jeans) that reap millions for industry
but nothing for Kenya.
Most Hypocritical - Joint
Winners: University of California-Davis, for
patenting a blight-resistant gene extracted
from a rice variety developed by the Bela
peoples of Mali, and for failing to deliver
on the Genetic Resources Recognition Fund
to benefit Mali’s farmers. The Philippines-based
public plant breeding institute – the International
Rice Research Institute – handed over the
blight resistant rice sample to UC-Davis researchers
in 11000. But when IRRI requested access to
the blight resistant gene derived from the
sample, UC-Davis demanded a $10,000 fee; and
The Biotechnology Industry Organization (BIO),
for writing Bonn-inspired bioprospecting guidelines
for use by BIO member companies and then inviting
the companies to ignore them.
The Cogs - For those Resisting
Biopiracy
Best Peoples Defense - Joint
winners: In Defense of Maize Network and the
Wixárika (Huichol) People, México,
for widening the scope of their fight – from
a protest against GM contamination of native
maize to an integrated territorial struggle
that holistically encompasses self-government,
water, forests, fauna, paths, sacred land,
language and teaching. Last year, the Wixárika
People got back 10,200 hectares of land for
their communities; and Deccan Development
Society (India), for two decades of organizing
successful seed sovereignty systems among
Dalit women’s communities in Medak District
of Andhra Pradesh. Also for their groundbreaking
grassroots research into the effects of Bt
cotton that persuaded the government of Andhra
Pradesh to kick Monsanto out of the state.
Best Defense of Food Sovereignty:
Via Campesina, for their global Seeds Campaign
begun in 2003, asserting the rights of small
farmers to select, sort, exchange and re-sow
their seeds and resisting control by the multinational
seed and biotech industry. Best Advocate:
The African Group, for defending biodiversity
and Farmers’ Rights by leading strong opposition
to Terminator technology at the UN Convention
on Biological Diversity since 1998.
Lifetime Achievement Award:
Community Biodiversity Development and Conservation
Programme, for ten years of farmer-led research
around the world, developing and sharing farming
methods to enhance agricultural biodiversity,
protect seeds, cultures and livelihoods and
affirming food sovereignty. Best Exposé:
Edmonds Institute and African Centre for Biosafety,
for their research resulting in the Out of
Africa report (2006), which documents 34 recent
cases of biopiracy involving African plants,
animals and microbes.
Most Satisfying Victory,
Finally: Magda Aelvoet, former president of
the Green Group in the European Parliament,
Dr. Vandana Shiva, of the Research Foundation
for Science, Technology and Natural Resource
Policy and Linda Bullard, of the International
Federation of Organic Agriculture Movements,
for challenging a patent at the European Patent
Office (EPO) on the preparation of a fungicide
derived from the seeds of the neem tree. For
centuries, farmers have used neem oil for
its fungicidal properties. The patent was
revoked in 2000, but it took almost five more
years for the EPO to finally dismiss an appeal
of the 2000 revocation.