04/06/2007 - A Reserva Extrativista
do Médio Xingu, cujo decreto de criação
pode ser assinado amanhã, abriga cerca
de 50 famílias ribeirinhas e é
cobiçada por grileiros na Terra do
Meio, no Pará. Sua implementação
consolida um corredor de áreas protegidas
em uma das regiões mais estratégicas
para a conservação da Amazônia.
Amanhã, Dia Mundial
do Meio Ambiente, cinqüenta famílias
que vivem às margens do rio Xingu,
na região paraense da Terra do Meio,
podem receber uma boa notícia. Isso
porque o governo federal deve anunciar a criação
da Reserva Extrativista do Médio Xingu,
a última peça do mosaico de
áreas protegidas desenhado sobre o
mapa da bacia hidrográfica do rio Xingu
(veja mapa ao lado). O decreto de criação
da reserva extrativista (resex) está
na Casa Civil da Presidência da República
desde fevereiro e, segundo informação
fornecida pela assessoria de imprensa do órgão,
deve ser assinado pelo presidente em exercício
José Alencar nesta terça-feira
5 de junho, aproveitando o simbolismo da data.
Não era sem tempo.
A previsão inicial do Ministério
do Meio Ambiente (MMA) e do Ibama era de que
a Resex do Médio Xingu seria criada
ainda no ano passado, finalizando um processo
iniciado em 2002, quando o ISA apresentou,
sob encomenda do MMA, um estudo propondo a
criação do mosaico de áreas
protegidas na região da Terra do Meio.
A transição de mandato no governo
federal, inclusive com a incerteza da permanência
da ministra Marina Silva à frente do
MMA, somada às mudanças no Ibama
realizadas em abril passado - com a criação
do Instituto Chico Mendes por meio da Medida
Provisória 366 -, teria retardado o
processo. “A demora foi uma questão
processual, mas agora tenho certeza de que
a resex sai”, diz Maurício Mercadante,
diretor do departamento de Áreas Protegidas
do Ministério do Meio Ambiente (MMA).
A Resex do Médio
Xingu ocupa uma faixa de 100 quilômetros
ao longo do rio e totaliza uma área
de 303 mil hectares. O mosaico de áreas
protegidas, do qual ela faz parte é
formado por terras indígenas e unidades
de conservação estaduais e federais
e começa no norte do Mato Grosso, com
o Parque Indígena do Xingu, e vai até
o centro do Pará, na região
de Altamira, principal centro urbano da Terra
do Meio. O conjunto de TIs e UCs contíguas,
ao longo da bacia do Xingu, soma um total
de 28 milhões de hectares de floresta
protegidos - o equivalente ao território
do Equador - e uma população
de mais de 12 mil pessoas, entre não-indígenas
e 25 etnias indígenas. Saiba mais sobre
a Terra do Meio
O mosaico de áreas
protegidas na Terra do Meio é um dos
maiores corredores de biodiversidade do mundo
e estratégico para a conservação
da floresta amazônica brasileira por
se tratar de uma ligação entre
os dois maiores biomas nacionais – a Amazônia
e o Cerrado – e fazer limite com a fronteira
agrícola nacional. “O mosaico é
fundamental para conter o desmatamento, ordenar
a região do ponto de vista fundiário
e combater a ação de grileiros”,
afirma Mercadante, do MMA. “E ele vai sair
do papel. Com a criação do Instituto
Chico Mendes, vamos ter mais recursos humanos
e financeiros para aumentar nossa capacidade
de gestão dos territórios, inclusive
para as reservas extrativistas, cujas populações
contarão com recursos inclusive do
Incra destinados aos assentamentos.”
Sobre a demora na criação
da reserva, Maurício Mercadante nega
que a disputa política entre Marina
Silva e a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma
Roussef, em torno do licenciamento das usinas
hidrelétricas no rio Madeira e que
resultou na divisão do Ibama, tenha
contribuído para o atraso. O sentimento
dentro do próprio Ibama parece ser
outro. Dois funcionários do órgão
ouvidos pelo ISA especulam que a demora na
assinatura do decreto de criação
da resex do Médio Xingu – e de outras
quatro reservas extrativistas propostas pelo
MMA - seria uma forma de retaliação
da Casa Civil, insatisfeita com os pareceres
do Ibama quanto à viabilidade ambiental
das usinas no Madeira. “Só a ministra
Dilma sabe dizer por que a reserva no Xingu
não sai”, disparou um diretor do órgão.
“Os decretos estão parados na Casa
Civil há meses sem motivo técnico
algum. Será que as pressões
de madeireiros estão surtindo algum
efeito?”, questiona outro servidor do Ibama
que trabalha na região da Terra do
Meio.
Queijo suíço
A preocupação
com a ação de madeireiros e
grileiros na região é correta.
Os moradores daquela faixa de terra às
margens no Xingu sofrem historicamente com
a pressão exercida por supostos proprietários
de fazendas na região para que abandonem
suas casas e sítios. Os casos de ameaças,
agressões e violências são
inúmeros e parecem repetir-se agora
que o mosaico de áreas protegidas está
quase todo desenhado, pelo menos no papel.
Ou até mesmo por isso, segundo o procurador
Marco Antônio Delfino, do Ministério
Público Federal em Altamira. “Esse
mosaico fica bonito visto num mapa, mas na
realidade está parecendo mais um queijo
suíço, cheio de fazendas no
meio”, diz Delfino.
O procurador afirma que,
se as fraudes nos cartórios – berços
do processo tradicional de grilagem na região
- diminuíram nos últimos anos,
“a grilagem bruta continua avançando
na Terra do Meio”. Para ele, a situação
não vai mudar enquanto as unidades
de conservação criadas não
forem equipadas e contarem com recursos de
forma consistente. “O atual momento é
delicado, pois ao mesmo tempo em que a população
local vive a expectativa de melhores condições
de vida com a criação das reservas,
os grileiros vindos de São Félix
do Xingu continuam a desmatar e a colocar
gado onde antes havia floresta, inviabilizando
boa parte das áreas”.
Para agravar o quadro, a
resex do Médio Xingu também
está integralmente incluída
em uma área de 1.12 milhão de
hectares cuja posse é reclamada pelo
grupo empresarial CR Almeida. No ano passado,
a Justiça Federal chegou a determinar
a saída dos funcionários da
Amazônia Projetos Ecológicos,
subsidiária do grupo, de toda a região,
mas notícias recentes dão conta
de que estes funcionários resistem
em deixar a região. Saiba mais sobre
o conflito fundiário na Terra do Meio.
Enquanto isso, o clima na
região segue tenso. O procurador Delfino
relata inclusive que há poucas semanas
pediu a abertura de inquérito na Polícia
Federal por conta de ameaças sofridas
por lideranças comunitárias
e membros da Comissão da Pastoral da
Terra, que trabalham junto às comunidades
ribeirinhas. “Uma pesquisadora americana nos
contou que lhe disseram que ela iria morrer
igual à Irmã Dorothy”, em uma
referência macabra ao assassinato, em
fevereiro de 2005, da freira americana Dorothy
Stang, episódio que se transformou
num marco na história dos conflitos
sociais na Amazônia brasileira.
ISA, Bruno Weis.
+ Mais
Contrariando expectativas,
governo federal não cria reserva extrativista
na Terra do Meio
05/06/2007 - A demora na
assinatura do decreto de criação
da Reserva Extrativista do Médio Xingu,
no Pará, impede a consolidação
do mosaico de áreas protegidas na Terra
do Meio e enfraquece o combate à grilagem
de terras na região. Enquanto o governo
federal não age, as ameaças
de fazendeiros e madeireiros contra as comunidades
ribeirinhas continuam frequentes na região.
Ao contrário do que
esperava o Ministério do Meio Ambiente
(MMA), o decreto de criação
da Reserva Extrativista do Médio Xingu,
na Terra do Meio, no Pará, não
será assinado hoje, Dia Mundial do
Meio Ambiente. De acordo com a assessoria
de imprensa do MMA "o assunto foi retirado
da pauta pois ainda faltam alguns ajustes
no processo de criação das UCs".
A criação
da reserva extrativista (resex) vem sendo
esperada com ansiedade há pelo menos
seis meses pelas mais de 50 famílias
que vivem naquele trecho do rio Xingu e por
entidades que atuam na defesa das comunidades
e proteção da floresta na Terra
do Meio, região marcada por conflitos
fundiários e ações de
grilagem de terras. A resex é a última
peça que falta para a consolidação
do mosaico de áreas protegidas na região,
que inclui terras indígenas e unidades
de conservação estaduais e federais
(ver mapa). ISA, Bruno Weis.