Amazônia - 03/10/2007
- Oportunidades e desafios de uma atividade
histórica que intensificou disputas
e acirra ânimos de ambientalistas, pesquisadores,
políticos e produtores
Desafio para a ciência, para o setor
produtivo, para o poder público e para
a sociedade civil organizada, o manejo florestal
virou vedete em tempos de exploração
madeireira na floresta amazônica.
O Museu Paraense Emílio
Goeldi (MPEG/MCT) em parceria com a Aimex
– Associação das Indústrias
Exportadoras de Madeira do Estado do Pará
lança, nesta quarta-feira (3), na Feira
Pan-Amazônica do Livro que acontece
no Hangar – Centro de Convenções,
em Belém do Pará, o livro "Manejo
Florestal nas Várzeas: Oportunidades
e Desafios".
O volume, organizado por
dois pesquisadores da Coordenação
de Botânica do Goeldi – Rafael Salomão
e Mário Jardim, e pelo engenheiro florestal,
Evaristo Terezo, apresenta exemplos bem sucedidos
de manejo em áreas alagáveis
da região.
Os vinte autores dos três
capítulos, que compõem o livro,
discutem limites técnicos, legais do
processo de implantação de manejo
florestal na várzea amazônica.
Para Jardim, um dos organizadores,
a importância do trabalho é demonstrar
que "a pesquisa científica, por
meio de métodos experimentais, pode
obter dados que apóiem e fomentem o
potencial madeireiro junto às empresas
de forma sustentável e confiável".
Embora, segundo os autores
que traçam um panorama da trajetória
da atividade na região, a exploração
em larga escala da madeira na Amazônia
tenha iniciado na década de 1950, ela
remonta aos tempos do Brasil Colônia.
A exploração madeireira que
ocorre em diferentes graus de intensidade
se constitui em alvo de disputa fundiária,
comercial e política.
Problema social e ambiental,
a exploração indiscriminada
dos ecossistemas amazônicos tem gerado
inúmeros estudos numa constante busca
para se identificar iniciativas bem sucedidas
que possam gerar políticas públicas
sustentáveis para o setor.
Fruto de cooperação
científica, a publicação
sobre manejo florestal que o Museu lança
é resultado de pesquisas desenvolvidas
desde 2003 envolvendo coleta de dados junto
a atores da exploração de recursos
naturais das várzeas desde o estado
do Amazonas até o Pará.
Envolvendo exemplos de manejo
convencional de alto impacto e de baixo impacto,
a pesquisa abrange desde regiões do
Solimões na área de Tefé,
Fonte Boa e São Paulo de Olivença
(AM) até Breves, Afuá e Portel
(PA) no arquipélago do Manejo na foz
do rio Amazonas, passando pelas calhas dos
rios Juruá na localidade de Carauari
e Purus, em Lábrea.
Obra
São três os estudos apresentados.
O primeiro caracteriza e apresenta as restrições
e oportunidades da adoção do
manejo florestal. O capítulo de oito
autores liderados por Rafael Salomão,
além de apresentar experiências
bem sucedidas de manejo em várzea,
inclui dados sobre a intensidade e a produtividade,
bem como revela medidas de redução
de impactos ecológicos, da manutenção
de estoques e dos tratamentos silviculturais.
Acompanhada de farta revisão
bibliográfica, os autores do capítulo
que discute a caracterização,
as restrições e as oportunidades
que o processo de manejo florestal constitui,
revisam as experiências de duas madeireiras,
uma no Pará – Exportadora de Madeira
do Pará (Emapa), e outra no Amazonas
– Gethal Amazonas S.A.
Outras duas experiências
consideradas de sucesso, tem caráter
comunitário e são desenvolvidas
na Reserva de Desenvolvimento Sustentável
de Mamirauá, no município de
Tefé, e a de associações
da região do município de Gurupá
(PA).
Primeira empresa madeireira
certificada no Brasil a atuar em áreas
de várzea, caso da Emapa, no Pará,
tem, segundo análise dos autores, potencial
para se transformar em referência mundial
de certificação florestal no
ecossistema que atua. Já a Gethal que
realiza manejo de baixo impacto e de forma
tradicional, destaca-se por seu forte vínculo
com a pesquisa continuada em colaboração
com instituições regionais como
a Embrapa.
No segundo capítulo,
os autores tratam diretamente da produção
como atualmente é conhecida, da comercialização
e do potencial de certificação
da madeira extraída na várzea
com destaque para a importância sócio-econômica
da atividade. Os obstáculos e oportunidades
do manejo de produtos não-madeireiros
de floresta de várzea foram incluídos
no terceiro capítulo do livro.
Dentre as atividades relativas
a produtos não-madeireiros, há
ênfase especial a projetos de cunho
comunitário que envolvem desde o reflorestamento
até a proteção de quelônios
como é o caso da Associação
de Mini e Pequenos Pescadores e Agricultores
de Aracampina no Pará, ou ainda, projeto
de Gurupá recipiente do prêmio
de tecnologia social da Fundação
Banco do Brasil, que revelou a resistência
dos moradores da área às grandes
empresas de extração de palmito.
Manejo
Administrar a floresta para obter benefícios
econômicos e sociais observando a sustentabilidade
do ecossistema é o objetivo da atividade
de manejo como originalmente concebida.
Processo laborioso que vai
desde o inventário até o escoamento
da produção, passando por sistema
de corte e arraste que não destrua
a vegetação ao redor da árvores
selecionadas para retirada, o manejo representa
uma alternativa ao desmatamento indiscriminado
que coloca em risco espécies ainda
não conhecidas tanto de flora como
de fauna na medida em que destrói o
habitat natural.
Dificuldades diversas assolam
a atividade desde a ocupação
desordenada da terra em uma região
de intensos conflitos fundiários até
os trâmites legais de obtenção
de autorização para exploração
que, em geral, observam a demorada análise
burocrática e complexos sistemas de
documentação.
Muitas, porém, podem
ser as vantagens de uma atividade ainda vista
com grande desconfiança. Com especial
interesse pela atividade madeireira na várzea,
os estudos apresentados no livro que o Goeldi
lança na Feira Pan-Amazônica
do Livro, revelam vantagens desta sobre a
exploração na Terra Firme.
Enquanto o investimento
em transporte é grande nas terras mais
altas, a produção em áreas
de várzea tem escoamento facilitado
pela proximidade da água e pelas características
de ecossistema alagável tem garantido
o crescimento mais rápido das árvores,
além de apresentar espécies
de grande valor para uso consorciado com outras
como o açaí e o pau-mulato.
Talvez o maior dos desafios
seja de uma intrincada rede de medidas que
vão desde a firme e eficiente aprovação
e fiscalização de planos de
manejo até o atendimento de demandas
de mercado que não causem impacto indelével
aos estoques de madeira da Amazônia.
Para os autores, somente políticas
públicas setoriais, mas inter-relacionadas
nos diversos aspectos da exploração
– ambiental, econômico, social, político,
serão capazes de garantir uma real
ação de exploração
que não se revele mais danosa aos interesses
da região.
Jimena Felipe Beltrão - Agência
Museu Goeldi