28/03/2008
- Apesar de a Constituição de 1988
garantir aos remanescentes de quilombo o direito
à terra em que vivem, até fevereiro
deste ano, quase 20 anos depois, apenas 82 territórios
quilombolas encontram-se titulados em todo País.
O governo Lula entregou só sete títulos
desde 2003. Por isso, várias associações
de quilombos, movimentos sociais e ecumênicos,
e organizações da sociedade civil
divulgaram carta em que defendem os direitos dos
quilombolas, garantidos não só pela
Constituição, mas também pela
Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho e denunciam as tentativas
de setores da sociedade da para derrubar o Decreto
nº 4.887/2003, que regulamenta o procedimento
para a titulação de suas terras. O
texto reafirma ainda a disposição
para continuar a combater a discriminação.
Em outubro de 2008, completam-se
20 anos do reconhecimento dos direitos das comunidades
quilombolas à propriedade de suas terras.
Uma reparação tardia da sociedade
brasileira pela barbárie da escravidão.
Nesses 20 anos, presenciamos a
resistência dos diferentes governos em cumprir
a determinação constitucional. Até
fevereiro de 2008, apenas 82 territórios
quilombolas encontravam-se titulados em todo País.
O governo Lula entregou apenas sete títulos
para comunidades quilombolas desde 2003.
Mesmo esse tímido índice
de titulações gerou protestos e acusações
do setor ruralista, de corporações
transnacionais e de parlamentares da base aliada
do governo amplamente divulgadas pela grande imprensa.
O Decreto 4.887/2003 que regulamenta o procedimento
para titulação das terras quilombolas
é alvo de uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal
ajuizada pelo Partido dos Democratas e de Projeto
de Decreto Legislativo visando sua anulação,
de autoria do deputado federal Valdir Colatto (PMDB/SC).
Nesse cenário adverso,
a posição do governo federal é
de recuo ao invés da firme defesa dos direitos
assegurados na Constituição e do combate
à discriminação que vem sofrendo
o povo quilombola.
O recuo se materializa no novo
texto da Instrução Normativa do Incra
que a Advocacia Geral da União insiste em
aprovar sem uma verdadeira participação
dos quilombolas e da sociedade, conforme prevê
a Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT).
Cumpre ressaltar que as mudanças
da IN 20/2005 do Incra propostas pelo governo no
fim do ano já foram rechaçadas por
diversas associações quilombolas e
a Coordenação Nacional de Articulação
das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ).
Em nota divulgada à imprensa, os quilombolas
denunciaram que tais mudanças representam
um retrocesso às garantias de seus direitos
sócio-culturais, dentre outras razões,
porque tornam o processo mais burocratizado e moroso.
Não houve transparência
no processo de definição da nova norma.
A minuta foi elaborada por um grupo de trabalho
do governo e, somente após meses de atividade,
os quilombolas foram convocados para referendar
um texto pronto sem ampla possibilidade de contribuição
com o conteúdo do mesmo. Tal fato ocorreu
em dezembro de 2007 quando os quilombolas se recusaram
a tomar parte e denunciaram uma consulta inventada,
que não havia sido seriamente preparada.
Procedimento semelhante irá se repetir agora
na segunda chamada para a consulta prevista para
abril de 2008. Novamente, o prazo e o formato proposto
pela Advocacia Geral da União não
permitirá que a minuta possa ser efetivamente
discutida pelos quilombolas.
Diante do exposto, as organizações
abaixo-assinadas vêm a público:
:: Defender a constitucionalidade
do Decreto 4.887/2003 reforçando que a simples
existência de uma Ação Direta
de Inconstitucionalidade não significa que
a reclamação que ali existe será
julgada procedente pelo Supremo Tribunal Federal.
:: Conclamar os Deputados e Senadores
a Rejeitarem os Decretos Legislativos 44/2007 e
326/2007, seguindo o exemplo da Comissão
de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos
Deputados que aprovou parecer contrário ao
PDC 44, em outubro de 2007.
:: Denunciar que as mudanças
da IN 20/2005 do Incra nos termos propostos pelo
governo representam um retrocesso *na garantia dos
direitos quilombolas reconhecidos na Constituição
Federal, na Convenção 169 da OIT e
no Decreto 4.887/2003.
:: Repudiar a forma não
transparente como o governo federal atuou na elaboração
da nova instrução normativa.
:: Exigir que o governo federal
respeite e garanta as condições adequadas
para que se estabeleça um processo de consulta
legítimo, que permita a ampla discussão
e participação do movimento e da sociedade
civil, conforme determina a Convenção
169 da OIT.
:: Manifestar nossa solidariedade
aos homens e mulheres quilombolas especialmente
nesse momento em que são vítimas de
ataques discriminatórios e injustamente acusados
de levar o conflito para o campo.
de março de 2008
Action Aid
Articulação Regional de Mulheres Negras
Quilombolas do Médio-Mearim
Associação Brasileira de ONGs - ABONG
Associação da Comunidade Quilombola
de Jacarei dos Pretos
Associação de Moradores do Quilombo
Santa Maria dos Pretos
Associação de Moradores do Quilombo
Bom Jesus dos Pretos
Associação de Moradores do Quilombo
Frechal
Associação de Moradores do Quilombo
Santa Rosa dos Pretos
Associação de Moradores do Quilombo
Santo Antonio dos Pretos
Associação Rural de Moradores do Quilombo
Jamary dos Pretos
Balcão de Direitos da Universidade Federal
do Espírito Santo
Centro de Conscientização Negra de
Pedreiras
Centro de Cultura Negra do Maranhão - CCN-MA
Centro de Documentação Eloy Ferreira
da Silva - CEDEFES
Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará
- CEDENPA
Centro pela Justiça e Direito Internacional
- CEJIL
Centro pelo Direito à Moradia contra Despejos
- COHRE
Centro Luiz Freire
Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos
Advogados do Brasil - Seção Rio de
Janeiro
Comissão Pastoral da Terra Regional da Bahia
- CPT-BA
Comissão Pró-Índio de São
Paulo - CPI-SP
Companhia de Dança Afro e Popular Akyloã
Conselho Municipal das Populações
Afro-Descendentes de São Luís
Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil
- CONIC
Coordenadoria Ecumênica de Serviço
- CESE
Koinonia Presença Ecumênica e Serviço
Federação das Comunidades Quilombolas
de Minas Gerais - N´golo
Federação de Órgãos
para Assistência Social e Educacional - FASE
Fórum Estadual de Entidades Negras do Maranhão
Grupo de Negros Palmares Renascendo de Bacabal
Instituto das Mulheres Negras
Instituto de Assessoria às Comunidades Remanescentes
de Quilombos - IACOREQ
Instituto de Estudos Socioeconômicos - INESC
Instituto Socioambiental - ISA
Justiça Global
Mariana Criola
Rede Social de Justiça e Direitos Humanos
União de Moradores do Quilombo Santarém
De cara com o desmatamento
31/03/2008 Em edição especial sobre
a Amazônia, a revista Veja publica foto de
açougueiro e corretor de imóveis que
não tem títulos de propriedade das
terras que vende. O corretor foi autuado duas vezes,
em fevereiro passado, acusado de desmatar área
na futura Resex do Médio Xingu, no Terra
do Meio, no Pará. PF instaurou inquérito
para apurar ameaças sofridas por ribeirinhos
de pessoas que se dizem proprietárias de
terras naquela região.
A edição nº
2054 da revista Veja, de 26 de março de 2008,
com o Especial Amazônia tem como mote "A
verdade sobre as queimadas e o ritmo do desmatamento".
Nas páginas 110 e 111, ao destacar a cidade
de São Félix do Xingu, dá destaque
a um "açougueiro que também vende
terras". Diz que Adebaldo Ferreira de Araújo
"é também corretor de imóveis
e dono de um açougue aberto noite e dia".
Veja destaca que o corretor não possui títulos
de propriedade das terras que vende. A revista não
menciona que em 07/02/2008, foram lavrados dois
autos de infração em nome de Francisco
Adebaldo Ferreira Araújo, acusado de efetuar
desmatamento na área da Resex do Médio
Xingu.
No início de março,
o Procurador da República Marco Antonio Delfino
de Almeida, de Altamira (PA), deu entrada em ação
cautelar com a finalidade de garantir a imediata
retirada de quem não possui títulos
na área onde será criada a Reserva
Extrativista Médio Xingu (Saiba mais). Na
ação, Adebaldo é citado nominalmente.
A Polícia Federal também instaurou
inquérito policial para apurar as ameaças
que pessoas que se dizem proprietárias das
terras onde será criada a Reserva vêm
fazendo aos ribeirinhos e lideranças locais,
na tentativa de intimidá-los e forçar
sua saída. A ação, ainda aguardando
julgamento, obriga a União e o Instituto
Chico Mendes a reprimir a ação de
grileiros de terras e ladrões de madeira
na área da Reserva Extrativista (Resex) do
Médio Xingu. A Resex está em fase
final de implantação, mas, com a demora
em implantá-la, grupos de homens armados
com pistolas e motosserras passaram a percorrer
a região ameaçando os ribeirinhos
e derrubando a mata.
Grileiros e fazendeiros
são acusados pelo MPF de enviar pistoleiros
para ameaçar lideranças das comunidades
tradicionais da área. Ainda não há
identificação dos responsáveis
pelas ameaças e violência na região.
Pelo menos três pessoas foram autuadas pelo
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (Ibama) por desmatamento
ilegal dentro da área da Resex: Francisco
Adebaldo Araújo (o açougueiro corretor),
Alberto Alves Bilmayer e Iraci dos Santos Pereira.