Divulgação-Arquivo/Projeto
Guarani - Reservatório com água extraída
do Aquífero Guarani.
14/06/2010 - 08:02
Nas últimas décadas, tem-se atribuído
um papel significativo aos reservatórios
hídricos subterrâneos em todo o mundo.
Esses recursos são vistos como de primordial
importância para alavancar o desenvolvimento
econômico e social e para garantir o abastecimento
urbano. Por outro lado, pesquisas buscam detalhar
as características dos aquíferos mundiais
e traçar mecanismos necessários para
uma utilização sustentável.
O Projeto de Proteção
Ambiental e Desenvolvimento Sustentável do
Sistema Aquífero Guarani, finalizado em 2009,
fez o mapeamento do reservatório, durante
seis anos, e apontou estratégias e instrumentos
para garantir o uso adequado dos recursos hídricos
nas regiões onde está localizado (em
oito estados brasileiros, mais Uruguai, Paraguai
e Argentina).
Agora os governos e atores envolvidos
no projeto do Guarani articulam a melhor forma de
colocar em prática as ações
sugeridas após as análises técnicas.
Enquanto isso, avaliações recentes
de pesquisadores no Norte do País, apontam
para a grande potencialidade do Aquífero
Alter do Chão, na região Amazônica,
onde novos estudos devem comprovar a qualidade e
abrangência do reservatório.
Diferença regional
Como ocorre em outros locais do
planeta, a água doce não está
uniformemente distribuída no Brasil. Há
regiões de extrema escassez e outras com
relativa abundância. O Gerente de Águas
Subterrâneas da Agência Nacional de
Águas (ANA), Fernando Roberto Oliveira, explica
que isso se deve ao fato do terreno ser dividido
em dois grandes e diferentes tipos (sedimentares/
fraturados e os cristalinos).
Os cristalinos seriam encontrados
em regiões com menor potencialidade de água
subterrânea como o semiárido brasileiro.
Os sedimentares e porosos ocupam quase a metade
da área do País, onde estão
localizados os melhores aquíferos nacionais.
Oliveira cita três grandes áreas, mas
reconhece a falta de conhecimento sobre a totalidade
do potencial hídrico brasileiro.
“Temos a Bacia do Paraná,
onde está localizado o Aquífero Guarani;
a Bacia Sedimentar do Maranhão, onde temos
uma série de aquíferos (como o Cabeças
e o Serra Grande); a Bacia Sedimentar do Amazonas,
onde tem se falado mais recentemente do Aquífero
do Alter do Chão como um grande reservatório.
Mas devemos ter, certamente, mais aquíferos
além desses”, acredita Oliveira.
Segundo o gerente da ANA, o Aquífero
Guarani, em termos de área e reserva hídrica,
é um dos maiores do mundo. No Brasil, provavelmente,
se não for o maior está entre os mais
significativos. Talvez só na região
Amazônica, cogita-se a possibilidade de área
superior. Constatação que só
pode ser feita após os estudos sobre superfície,
profundidade e espessura desses aquíferos.
“A região Amazônica
é conhecida pela sua diversidade biológica.
É a maior floresta equatorial do planeta,
com grande volume de água superficial, mas,
certamente, num futuro não muito distante,
também será conhecida como um dos
maiores mananciais de água subterrânea
do mundo. Isso é indiscutível, é
só uma questão de tempo”, garante
Oliveira.
Há ainda a expectativa
do Aquífero Alter do Chão ser bem
maior do que se imagina, com possibilidade da presença
de outras reservas. “A Bacia Sedimentar do Amazonas
pode ter aquíferos que começam na
região de Belém e vão até
o sopé dos Andes. O que levanta a hipótese
da existência de aquíferos transfronteiriços
passando para Peru, Venezuela, Bolívia, Colômbia
e Equador”, relata Oliveira.
A ANA planeja iniciar um estudo
mais detalhado na Bacia do Amazonas ainda neste
ano. A intenção é envolver
também o Alter do Chão. “Tem previsão
orçamentária e o termo de referência
para a contratação dos estudos está
em fase de elaboração”, informa.
Desafio sustentável
A água de poços
e fontes vem sendo utilizada intensamente para diversos
fins, tais como abastecimento humano, irrigação,
indústria e lazer. Segundo dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE/2008),
10% dos domicílios brasileiros usam exclusivamente
água subterrânea para o abastecimento.
Na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(Pnad), de 2002, esse percentual era de 9,5%.
Na avaliação do
consultor da Secretaria de Recursos Hídricos
e Ambiente do Ministério do Meio Ambiente
(SRHU-MMA), Luiz Amore, mais que avaliar o potencial,
o uso das águas subterrâneas no território
necessita ser disciplinado e orientado. “O maior
desafio do presente é implementar os instrumentos
de gestão das águas subterrâneas
nos estados e no País para prover a sociedade
da segurança hídrica necessária
ao desenvolvimento sustentável”, ressalta.
Na opinião do geólogo,
a ampliação do conhecimento deve apoiar
as necessidades de avanço dos mecanismos
de proteção e de gestão das
águas subterrâneas no Brasil e em países
vizinhos. Para isso, Amore considera importante
incentivar o trabalho de articulação,
envolvendo governos dos estados, setores acadêmicos,
usuários, associações profissionais
e a sociedade civil.
“Uma grande contribuição
do Projeto Aquífero Guarani foi o desenvolvimento
de instrumentos específicos para a gestão
das águas subterrâneas, que são
perfeitamente aplicáveis pelo conjunto das
instituições responsáveis no
País. A ampliação do Sistema
de Informação do Guarani (Sisag) para
todo o País permitirá consolidar as
informações de poços, dispersas
em distintas instituições”, sugere.
O especialista em engenharia ambiental
sustenta que a implementação de uma
rede nacional de monitoramento das águas
subterrâneas, a exemplo da proposta para o
Guarani, permitirá prover a sociedade das
informações de qualidade e quantidade
necessárias ao uso e proteção
das águas subterrâneas.
Outro aspecto enfatizado é
a necessidade do aprofundamento da gestão
local, apontando para a criação de
Comissões Locais de Apoio à Gestão
(Clag) nas áreas que apresentam problemas
relacionados ao uso e proteção das
águas subterrâneas. “O exercício
da gestão desenvolve as capacidades dos distintos
setores para uma cidadania hídrica realmente
efetiva no País, que está de acordo
com o espírito da Política Nacional
de Recursos Hídricos”, argumenta.
+ Mais
Uso inadequado e poluição
ameaçam reservas de águas subterrâneas
Aequivo Projeto Guarani - Pesquisadora
faz avaliação de amostra de água.
14/06/2010 - 08:06
Nas últimas décadas, tem-se atribuído
aos reservatórios hídricos subterrâneos
um papel de destaque por representarem uma forma
de alavancar o desenvolvimento econômico e
social e garantir o abastecimento da humanidade.
Mas o uso inadequado e a poluição
se tornam cada vez mais ameaças à
preservação e à qualidade dos
recursos para as gerações atuais e
futuras.
Especialistas alertam para a necessidade
de estudos aprofundados sobre esses sistemas e de
providências para evitar o seu mau uso e controlar
os efeitos das atividades potencialmente poluentes,
como resíduos sólidos, excesso de
agroquímicos, construção de
poços de forma irregular, entre outras ações.
Uma das reservas consideradas
mais importantes do mundo é o Aquífero
Guarani; presente em oito estados e em três
países vizinhos: Argentina, Uruguai e Paraguai.
No Brasil, abrange as regiões Centro-Oeste,
Sul e Sudeste, incluindo localidades com grande
importância econômica e zonas de intensa
atividade urbana, industrial e agrícola.
Uso inadequado
Apesar da grande extensão
do Aquífero Guarani, 1,1 milhão de
quilômetro quadrado (Km2), de acordo com o
geólogo, Luiz Amore, observa-se sinais de
exploração exagerada em regiões
específicas como a de Ribeirão Preto,
cidade localizada a 320 km da capital do estado
de São Paulo.
Segundo o pesquisador, o aquífero
rebaixou quase 60 metros, na zona central da cidade,
desde 1970 até hoje. “A própria sociedade
usa ainda o recurso num nível insustentável.
A média de consumo de água nacional
é de 250 litros habitante/dia, em Ribeirão
Preto é de 400 litros/dia e algumas residências
têm aspersores no telhado para reduzir o calor
em determinadas épocas”, informa.
Para Amore, o descontrole e o
interesse especial pela utilização
do recurso têm várias explicações,
entre elas, a qualidade e o baixo custo. “Uma água
pura, limpa, da melhor qualidade e barata. Não
exige tratamento. Tratar água superficial
é muito mais caro”, argumenta.
O especialista em engenharia ambiental
também reforça que o problema do rebaixamento
do aquífero em Ribeirão Preto é
local. “Não afeta nem mesmo as regiões
vizinhas (com exceção de Sertãozinho
que também usa a água subterrânea).
Por isso, é muito importante aprender a usar
e a fomentar a gestão local do Aquífero
Guarani, com a participação da população,
dos órgãos públicos e dos gestores
hídricos da região”, sustenta.
Ribeirão Preto está
localizada numa área de recarga do Guarani,
onde há maior vulnerabilidade natural à
poluição e um intenso uso da água
subterrânea para o abastecimento público.
O fato também de ser um pólo de desenvolvimento
regional, em constante crescimento,motivou a implantação
de um Projeto Piloto no local, onde foi feito o
zoneamento de áreas com o objetivo de preservar
o reservatório natural.
Segundo Amore, a Comissão
Local de Apoio à Gestão, criada no
âmbito do projeto, permitiu a criação
de áreas de zoneamento na região:
áreas onde não se pode mais perfurar
poços; áreas com uso possível
dependendo das circunstâncias e outras destinadas
à preservação. Nestas últimas,
não é permitido impermeabilizar e
nem ter determinados tipos de desenvolvimento urbano
e asfalto.
“Porque, caso contrário,
a água não vai infiltrar e recarregar
o aquífero e o rebaixamento vai piorar. Eles
(agentes públicos e privados de Ribeirão
Preto) começaram a fazer a gestão
do próprio aquífero para o uso sustentável
das águas subterrâneas nos próximos
anos”, comenta Amore.
No Brasil, a água subterrânea
é de domínio dos estados. Na avaliação
do presidente da Associação Brasileira
de Águas Subterrâneas (Abas-RJ), Humberto
Albuquerque, o sistema de gestão nos estados
precisa funcionar de forma adequada, em todo o território
nacional, para não abrir espaço para
as perfurações de poços de
maneira clandestina. “A pessoa começa a usar
e não é do conhecimento público,
dos órgãos gestores”.
”Além da possibilidade
de alterar as condições do reservatório,
não se tem conhecimento da validade das obras
que estão sendo feitas, se está dentro
da técnica exigida para a proteção
do próprio Aquífero, em especial,
nas áreas de recarga do sistema (ponto da
superfície onde ele aflora)”, esclarece o
engenheiro de minas.
A área de afloramento é
por onde a água da chuva e dos rios, que
drenam a região, Infiltra para recarregar
o aquífero. “Essas áreas precisam
ser conhecidas, mapeadas e ter um tratamento adequado
em termos de exploração econômica
em cima delas. Explorações essas que
não levem a contaminação ao
reservatório”, adverte Albuquerque.
Outro fator preocupante, na avaliação
do presidente da Abas, é a dificuldade para
a recuperação destes reservatórios.
“A descontaminação é muito
difícil e muito cara. A água superficial,
num custo relativamente baixo, é possível
conseguir reabilitar, mas quando contamina o aquífero,
os procedimentos são caríssimos e
muito demorados”, explica.
Para o geólogo Luiz Amore,
outro fator a ser considerado é a legislação
que, nesta área, está aquém
da necessidade. “A Política Nacional de Recursos
Hídricos, Lei 9433, avançou muito
na sua implementação para águas
superficiais; mas para águas subterrâneas,
não lidou com esse assunto em profundidade.
É preciso ter mecanismos de gestão,
de forma mais concreta, com normas, etc”, recomenda.