12/08/2025
– Uma pesquisa pioneira realizada em Maceió (AL) encontrou
microplásticos em placentas e cordões umbilicais de
bebês nascidos na capital alagoana. Este é o primeiro
estudo do tipo realizado na América Latina e o segundo no
mundo que conseguiu comprovar a presença dessas partículas
em cordões. Os resultados foram publicados na revista Anais
da Academia Brasileira de Ciências.
"A placenta é um grande
filtro, veja a quantidade de coisas que existem no mundo e são
prejudiciais, mas pouquíssimas passam a placenta. Então,
quando os primeiros estudos encontraram os microplásticos
na placenta, a gente achou que ela estivesse agindo como uma barreira,
só que entre as participantes do nosso estudo, 8 em 10 tinham
mais partículas no cordão umbilical do que na placenta,
então eles passam em uma quantidade grande e estão
indo para os bebês antes mesmo de nascerem. E esse é
um retrato do fim da gestação.
Durante os nove meses, quanto passou?",
destaca Alexandre Urban Borbely, líder do grupo de pesquisa
em Saúde da Mulher e da Gestação na Universidade
Federal de Alagoas (UFAL) e um dos autores da pesquisa.
A equipe analisou amostras de dez
gestantes do Hospital Universitário Professor Alberto Antunes
e do Hospital da Mulher Dra. Nise da Silveira, em Maceió.
Elas foram submetidas à técnica de espectroscopia
Micro-Raman, capaz de identificar a composição química
de moléculas com grande precisão.
As amostras de placenta apresentaram
110 partículas de microplásticos, e 119 foram encontradas
nos cordões umbilicais. Os compostos mais presentes foram
o polietileno, usado na fabricação de embalagens plásticas
descartáveis e a poliamida, que faz parte da composição
de tecidos sintéticos.
Borbely investiga a contaminação
por microplásticos durante a gestação desde
2021. Em 2023, um estudo conjunto com pesquisadores da Universidade
do Hawaí em Manoa já havia comprovado a presença
das partículas em amostras de placentas de mulheres havaianas.
A pesquisa também mostrou que essa contaminação
aumentou ao longo do tempo, já que os microplásticos
foram encontrados em 60% das amostras colhidas em 2006, 90% em 2013
e 100% em 2021.
A parceria foi mantida para a investigação
em Maceió, que também recebeu financiamento da Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas e do Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ).
Apesar de todas as amostras brasileiras estarem contaminadas, elas
apresentaram menos aditivos químicos associados aos polímeros
plásticos do que as amostras norte-americanas.
"A gente buscou mulheres que
foram atendidas pelo SUS, com uma condição socioeconômica
mais vulnerável, porque a grande maioria dos estudos é
feita em países desenvolvidas. Então, a gente quis
trazer a nossa realidade da nossa população. E os
plásticos são formados de polímeros diferentes
que mudam conforme o local", complementa Borbely.
Como os microplásticos estão
presentes até mesmo no ar, não é possível
determinar com precisão a fonte da contaminação,
mas o pesquisador acredita que a poluição marinha
tenha grande contribuição, já que a população
alagoana consome muitos peixes e frutos do mar, inclusive moluscos
filtradores. Outro ponto de origem importante é a água
mineral envasada, que adquire as partículas de forma ainda
mais acelerada quando o galões recebem luz solar.
A pesquisa agora vai ampliar a quantidade
de amostras colhidas para 100 gestantes e buscar correlações
entre a contaminação por microplásticos e complicações
durante a gestação ou problemas de saúde identificados
logo após o nascimento dos bebês. Para isso, está
implementando o Centro de Excelência em Pesquisa de Microplástico,
com verbas da Financiadora de Estudos e Projetos - Finep, do Ministério
da Ciência e Tecnologia. A expectativa, de acordo com o pesquisador
é que esses resultados sejam publicados em 2027:
"A preocupação de todo mundo que trabalha nessa
área hoje é tentar entender o que essa contaminação
está causando, porque isso é muito sério. Toda
essa geração que está vindo já nasce
exposta a esses plásticos dentro do útero. E o plástico
está compondo de alguma maneira o organismo desses indivíduos
desde a formação".
"Um artigo americano que saiu
esse ano mostrou relação entre um polímero
específico encontrado na placenta e casos de prematuridade.
A gente publicou um estudo com células e tecidos humanos
mostrando que os plásticos de poliestireno passam com facilidade
pela barreira placentária e causam alterações
no metabolismo dessa placenta e na produção de radicais
livres, o que também é um indício de que vai
afetar o desenvolvimento do bebê", complementa Borbely.
Para o pesquisador, essas descobertas
acendem um alerta coletivo e político, já que ações
individuais são pouco efetivas para evitar a contaminação:
"O Brasil não tem uma regulamentação para
plástico. E o mais importante aqui é a ação
que vem de cima, do governo, de regular quem está produzindo
o plástico: como deve ser essa produção, o
descarte de plásticos, a implantação de filtros
nessas indústrias. Se a gente conseguir reduzir no ambiente,
consequentemente vamos reduzir o que fica na gente", explica.
Da Agência Brasil
Fotos: Reprodução/Pixabay
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